Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), instituído pela Lei nº 8.212/1991 e regulamentado por normativas subsequentes, consolidou-se como o instrumento central de registro e comprovação de vínculos e contribuições previdenciárias no Regime Geral da Previdência Social (RGPS). 

A crescente informatização dos processos administrativos previdenciários conferiu a esse cadastro um papel determinante na tomada de decisão do INSS, tanto para o reconhecimento do direito quanto para o cálculo monetário dos benefícios. Nesse contexto, a existência de inconsistências pode comprometer a eficácia do sistema e gerar prejuízos relevantes ao segurado.

O CNIS: conceito, natureza e finalidade

O CNIS é um banco de dados estruturados que consolida informações referentes a vínculos empregatícios, remunerações declaradas, contribuições previdenciárias, dados cadastrais e indicadores de pendências. Ele serve como a principal fonte de prova perante o INSS, sendo utilizado para:

  • confirmação do tempo de contribuição: base para a aferição do período laborado para fins previdenciários;
  • demonstrar a carência: requisito essencial para a maioria dos benefícios do RGPS; 
  • calcular a média das remunerações: fundamental para determinar a Renda Mensal Inicial (RMI) dos benefícios; 
  • identificar tipos de vínculos: diferenciação entre empregado, contribuinte individual, doméstico, segurado especial, entre outros, influenciando as regras de concessão;
  • subsidiar a concessão ou indeferimento de benefícios: serve como principal fonte de dados para a análise do INSS;

A presunção relativa de veracidade das informações do CNIS é um pilar desse sistema, conforme sedimentado pela Súmula nº 75 da Turma Nacional de Uniformização (TNU) e pela jurisprudência já consolidada dos Tribunais. Essa presunção, embora confira força probatória inicial ao CNIS, também reconhece que ele não é infalível.

Súmula nº 75 da TNU – Enunciado:

“A Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) em relação à qual não se aponta defeito formal que lhe comprometa a fidedignidade goza de presunção relativa de veracidade, formando prova suficiente de tempo de serviço para fins previdenciários, ainda que a anotação de vínculo de emprego não conste no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS).”

Para o advogado previdenciário, esta súmula é uma ferramenta de defesa crucial. Ela estabelece que a CTPS, quando sem vícios formais, tem primazia como prova de tempo de serviço, mesmo que o CNIS apresente omissões. Isso significa que, se um vínculo ou período de remuneração está devidamente anotado na CTPS, mas não aparece ou está incorreto no CNIS, o ônus de provar a inveracidade da CTPS recai sobre o INSS, e não sobre o segurado. 

Esta orientação jurisprudencial reforça a possibilidade e a necessidade de contestar informações divergentes da realidade laboral do segurado, como ilustra a decisão abaixo:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONTRATO DE TRABALHO REGISTRADO EM CTPS E NÃO LANÇADO NO CNIS. 1 . Para a obtenção da aposentadoria integral exige-se o tempo mínimo de contribuição (35 anos para homem, e 30 anos para mulher) e será concedida levando-se em conta somente o tempo de serviço, sem exigência de idade ou pedágio, nos termos do Art. 201, § 7º, I, da CF. 2. O contrato de trabalho registrado na CTPS, independente de constar ou não dos dados assentados no CNIS – Cadastro Nacional de Informações Sociais, deve ser contado, pela Autarquia Previdenciária, como tempo de contribuição, em consonância com o comando expresso no Art . 19, do Decreto 3.048/99 e no Art. 29, § 2º, letra “d”, da Consolidação das Leis do Trabalho. 3 . Preenchidos os requisitos, faz jus a parte autora ao benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição. 4. A correção monetária, que incide sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências, e os juros de mora devem ser aplicados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal. 5 . Os juros de mora incidirão até a data da expedição do precatório/RPV, conforme decidido em 19.04.2017 pelo Pleno do e. Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do RE 579431, com repercussão geral reconhecida . A partir de então deve ser observada a Súmula Vinculante nº 17. 6. Os honorários advocatícios devem observar as disposições contidas no inciso II, do § 4º, do Art. 85, do CPC, e a Súmula 111, do e . STJ. 7. 8. Remessa oficial, havida como submetida, provida em parte e apelação desprovida . (TRF-3 – ApCiv: 50066668420204036183, Relator.: Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA, Data de Julgamento: 28/04/2022, 10ª Turma, Data de Publicação: DJEN DATA: 02/05/2022)

Nesse sentido, a análise criteriosa dos dados do CNIS é uma das primeiras e mais importantes tarefas do advogado previdenciário, visando identificar e corrigir potenciais prejuízos ao segurado.

A análise administrativa do INSS e a necessidade de retificação de dados

No exame dos requerimentos de benefício, o INSS utiliza o CNIS como parâmetro prioritário. Todavia, quando o sistema apresenta indicadores de pendência ou ausência de informações essenciais, cabe ao servidor instaurar diligências e promover a adequada retificação dos dados, conforme determina o art. 19 do Decreto nº 3.048/1999 e o art. 67 da Portaria INSS nº 990/2022.

Esses ajustes são imprescindíveis para:

  • comprovar períodos de contribuição;
  • validar remunerações que comporão o cálculo da RMI;
  • corrigir vínculos com data de início, fim ou categoria equivocada;
  • incluir informações decorrentes de reclamatórias trabalhistas ou acordos administrativos.

A omissão na retificação pode provocar decisões indevidas, violando princípios como o da verdade material e o da eficiência administrativa.

O cálculo da aposentadoria e a relevância das remunerações de 07/1994 até a DER

Desde a implementação do Plano Real, a legislação previdenciária determina que a média salarial das aposentadorias seja calculada com base nas remunerações de julho de 1994 até a Data de Entrada do Requerimento (DER), conforme arts. 29 e 29-A da Lei nº 8.213/1991 e alterações posteriores introduzidas pelo art. 26 da Emenda Constitucional nº 103/2019.

Assim, qualquer inconsistência nesse período pode produzir efeitos significativos no valor do benefício, tais como:

  • redução da média salarial, quando há remunerações zeradas ou inferiores ao valor real;
  • diminuição do tempo de contribuição, em casos de vínculos ausentes;
  • descaracterização de períodos como tempo especial;
  • alteração indevida da regra de cálculo aplicável.

Portanto, um CNIS incompleto não apenas pode levar ao indeferimento do benefício, mas também ao seu cálculo incorreto.

Principais inconsistências encontradas no CNIS

Diversas falhas podem comprometer a fidedignidade do CNIS. Entre as mais recorrentes, destacam-se:

  1. a) Vínculos empregatícios ausentes ou incompletos:
    Erro na entrega da GFIP, omissões no eSocial ou falhas de comunicação entre empregador e sistema.
  2. b) Contribuições recolhidas com erro:
    Preenchimento incorreto de guias pelos contribuintes individuais, pagamentos sem identificação adequada ou inconsistências de competência.
  3. c) Vínculos extemporâneos:
    Dados lançados fora do prazo legal, sujeitos à apresentação de documentos complementares.
  4. d) Remunerações incorretas ou zeradas:
    Informações que reduzem artificialmente a média contributiva.
  5. e) Ações trabalhistas:
    Diferenças salariais, adicionais e reconhecimento de vínculos que nem sempre são automaticamente integrados ao CNIS, exigindo averbação manual.
  6. f) Empregados domésticos antes de 2015:
    Registros frágeis, em razão da ausência de sistema unificado antes do eSocial Doméstico em que os vínculos anotados na CTPS não aparecem no CNIS e precisam ser incluídos de forma manual pelo servidor.
  7. g) Períodos relativos ao RPPS:
    Dependem de Certidão de Tempo de Contribuição (CTC) e seguem regras específicas de transferência, muitas vezes negligenciadas no CNIS.

É importante observar que cada uma dessas inconsistências pode gerar algum tipo de alerta/indicador no CNIS que mostra possíveis erros que podem e devem ser ajustados. 

Os ajustes podem ser realizados antes do encaminhamento de um benefício através de um requerimento específico de ajuste de dados do CNIS (realizado através da plataforma Meu INSS ou pelo canal 135) ou mesmo durante o processo de encaminhamento do benefício (onde é fundamental a existência de um requerimento formal informando ao servidor quais as inconsistências que devem ser corrigidas e enumerando as provas para resolver esse problema).

Salienta-se, que as inconsistências uma vez identificadas podem ser revisadas antes da concessão do benefício, ou depois, através de um processo de revisão de benefício (dentro do prazo decadencial de 10 anos contados do primeiro recebimento do benefício). No entanto, para benefícios indeferidos esse prazo não existe (segundo entendimento do STJ no tema 1370).

Essas inconsistências demonstram que o sistema, embora abrangente, não é infalível, exigindo revisão técnica e documentação robusta.

A análise e retificação do CNIS representam etapas fundamentais para garantir a correta concessão dos benefícios previdenciários. Erros ou lacunas no cadastro podem gerar prejuízos irreparáveis ao segurado, seja pelo indeferimento indevido do pedido, seja pela redução do valor da aposentadoria.

Assim, a atuação de profissionais especializados em Direito Previdenciário torna-se essencial para:

  • identificar inconsistências no CNIS;
  • reunir a documentação adequada;
  • conduzir o pedido de retificação;
  • assegurar que o cálculo do benefício reflita fielmente a realidade contributiva do segurado (sendo realizado antes ou depois da concessão do benefício).

Diante da complexidade normativa e da relevância econômica da aposentadoria, o conhecimento técnico na análise do CNIS não é apenas desejável, é indispensável para evitar prejuízos e garantir a proteção social assegurada pelo sistema previdenciário brasileiro, nesse sentido é imprescindível que as normas infralegais (IN 128/2022 e suas portarias regulamentadoras) sejam apreendidas para que os procedimentos internos do INSS seja seguidos a fim de resolver essas inconsistências e, caso necessário, judicializar com a documentação toda em dia, a fim de evitar problemas com a decisão proferida pelo STJ no tema 1124.

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