
Apelação Cível Nº 5029270-54.2018.4.04.7000/PR
RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
APELANTE: LABORCLIN PROD PARA LABORATORIOS LIMITADA (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMA (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação proposta por LABORCLIN PROD PARA LABORATÓRIOS LTDA contra sentença que julgou improcedente demanda ajuizada sob o procedimento comum buscando a anulação da NLCT nº de controle 9880007, no que tocava à Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental (TCFA) em relação ao período de jan/2008 a abr/2012, objeto do processo administrativo nº 02017.000468/2015-35.
Afirma a apelante possuir como atividade principal a confecção e fornecimento de produtos para laboratórios, e, em caráter secundário, também a fabricação de produtos veterinários. Aduz que a sentença reconhece que segundo demonstrado pela prova pericial produzida, dos produtos produzidos e comercializados pela autora, somente 0,3% de sua produção é destinada ao uso veterinário. Não obstante, o magistrado singular chancelou a cobrança da TCFA -que, segundo aduz, seria devida apenas sobre a parcela de seu faturamento proveniente da atividade secundária - no valor máximo previsto na legislação, com base no enquadramento da empresa (grande porte).
Alega que diferentemente da fabricação de produtos veterinários, a confecção de produtos para laboratórios não está incluída no rol de atividades passíveis de taxação pela TCFA. Sustenta que, ao mensurar o valor da taxa usando por base seu faturamento com ambas suas atividades, e consequentemente enquadrando a empresa como sendo de grande porte, o IBAMA agiu violando o princípio constitucional da legalidade, bem como afrontando a natureza jurídica da taxa, que é totalmente vinculada à atividade de fiscalização das atividades consideradas potencialmente poluidoras. Ainda no ponto, ressalta ser imperioso reconhecer que a TCFA deve incidir apenas sobre a parcela da atividade que é considerada potencialmente poluidora e não sobre a integralidade da produção, sendo totalmente proibida qualquer interpretação extensiva.
Por outro lado, argumenta que ao ajuizar a ação a empresa possuía o entendimento de que os produtos veterinários que comercializa estariam enquadrados em “atividade potencialmente poluidora” passível de incidência da TCFA. No entanto, conforme sua dicção, a perícia realizada atestou que na verdade a Apelante não fabrica produtos veterinários e que, por conseguinte, não incide TCFA sobre qualquer parcela da produção da empresa. Assim, ante a tomada de ciência desse fato novo, requereu que a sentença reconhecesse a completa isenção de TCFA sobre suas atividades, com base no artigo 493 do CPC. Alega que o IBAMA teve a oportunidade de se manifestar sobre o laudo técnico, não havendo falar em cerceamento de defesa da parte ré no ponto.
Conclui afirmando que o laudo produzido nos autos afirma categoricamente que a empresa Laborclin sequer possui equipamentos que poderiam enquadrá-la como uma indústria química. Manter a cobrança da Taxa em um caso como este foge totalmente da hermenêutica da Lei e representa o mais alto grau de injustiça. Requer seja expressamente reconhecida a manutenção do efeito suspensivo ao presente recurso, nos termos do item 3.5 da sentença.
Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.
Em grau recursal, a autora teve indeferido pedido de depósito judicial de valores cobrados em período posterior ao do objeto da demanda (Evento 3). Tal decisão foi objeto de agravo interno pela demandante (Evento 8).
Posteriormente, em petição encartada no Evento 18, a ora apelante manifesta sua desistência em relação ao agravo interno e pedido de liminar que também fora apresentado para o mesmo fim, em razão da perda de objeto ocorrida face ao pagamento do valor controverso no PAF 02017.101006/2017-04.
É o relatório.
VOTO
1. Preliminares
1.1 Recursais
1.1.1 Admissibilidade
Recebo a apelação, porquanto adequada e tempestiva. As custas cabíveis foram recolhidas (Evento 106)
1.2 Processuais
1.2.1 Desistência do agravo interno.
Em petição encartada no Evento 18, a ora apelante manifesta sua desistência em relação ao pedido de limianr e agravo interno em face da decisão do evento 03, em razão da perda de objeto ocorrida face ao pagamento do valor controverso no PAF 02017.101006/2017-04.
Assim, resta homologada a desistência do agravo interno.
2. Mérito
Inicialmente, cabe verificar se a autora exerce atividade potencialmente poluidora que justifique a cobrança da taxa impugnada.
No concernente, determina o art. 17-C, da Lei nº 6.931/81, na redação dada pela Lei nº 10.165/00:
Art. 17-C. É sujeito passivo da TCFA todo aquele que exerça as atividades constantes do Anexo VIII desta Lei.
No Anexo VIII, há uma relação de "atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos ambientais" que ensejam a fiscalização pelo IBAMA.
A controvérsia versada nos autos cinge-se ao enquadramento ou não das atividades da autora nas atividades passíveis de fiscalização pelo IBAMA, constantes do referido Anexo VIII.
O Anexo VIII da Lei 6.938/81 elenca as "atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos ambientais", nele constando:
Código | Categoria | Descrição | Pp/gu |
15 | Indústria Química | - produção de substâncias e fabricação de produtos químicos, fabricação de produtos derivados do processamento de petróleo, de rochas betuminosas e da madeira; fabricação de combustíveis não derivados de petróleo, produção de óleos, gorduras, ceras, vegetais e animais, óleos essenciais, vegetais e produtos similares, da destilação da madeira, fabricação de resinas e de fibras e fios artificiais e sintéticos e de borracha e látex sintéticos, fabricação de pólvora, explosivos, detonantes, munição para caça e desporto, fósforo de segurança e artigos pirotécnicos; recuperação e refino de solventes, óleos minerais, vegetais e animais; fabricação de concentrados aromáticos naturais, artificiais e sintéticos; fabricação de preparados para limpeza e polimento, desinfetantes, inseticidas, germicidas e fungicidas; fabricação de tintas, esmaltes, lacas, vernizes, impermeabilizantes, solventes e secantes; fabricação de fertilizantes e agroquímicos; fabricação de produtos farmacêuticos e veterinários; fabricação de sabões, detergentes e velas; fabricação de perfumarias e cosméticos; produção de álcool etílico, metanol e similares. | Alto |
No caso concreto, foi realizada prova pericial no curso da demanda, por perita técnica nomeada pelo juízo, cuja conclusão foi taxativa: a empresa autora não fabrica produtos farmacêuticos ou veterinários. Segundo a expert, ainda (Evento 82 LAUDOPERIC1):
(...) por não ter sido identificados equipamentos de fabricação de produtos químicos na empresa LABORCLIN, não é possível afirmar que existe confecção (fabricação ou criação) de produtos químicos. As atividades verificadas em todas as linhas de produção durante a visita pericial mostraram ser de preparação de meios de cultura e de fracionamento para formulações específicas para diagnósticos médicos e produto veterinário.
(...)
Não foram identificados equipamentos de fabricação de produtos químicos na empresa LABORCLIN. Portanto, não é possível a fabricação própria dos produtos químicos usados como matérias primas. Verificou-se apenas atividades de preparação de meios de cultura e de fracionamento para formulações específicas para diagnósticos médicos e produto veterinário.
(...)
Nenhuma atividade de fabricação de produtos químicos ou veterinários foi identificada. Foram identificadas atividades de preparação de produtos químicos e de produto veterinário. (...)
A LABORCLIN não fabrica produtos farmacêuticos ou veterinários. A empresa prepara meios de cultura e formulações específicas para diagnósticos médicos e produto veterinário
(...)
Nenhuma das atividades da empresa se enquadra na Produção de substâncias e fabricação de produtos químicos, descritas na Ficha Técnica de Enquadramento 15- 1, visto não ocorrer fabricação de produtos farmacêuticos ou veterinários, como definido em itens anteriores.
Assim, a atividade que a autora exerce não pode ser considerada poluidora, não podendo ser comparada a uma fábrica de produtos farmacêuticos e/ou veterinários.
A sentença julgou improcedente a demanda, dispondo que a atividade de fabricação de produtos veterinários é uma das atividades exercidas pela autora, conforme consta do contrato social apresentado nos autos e conforme declarado ao órgão ambiental no âmbito administrativo.
Discordo, contudo, do MM. julgador singular, por entender que a redação do contrato social não se sobrepõe ao resultado da perícia técnica produzida. É dizer, a autora não exerce atividade de fabrição de produtos veterinários, consoante cabalmente concluído pela expert judicial.
Logo, em que pese constar, na claúsula 3ª do contrato social, que o objeto da sociedade é a industrialização e comercialização de produtos médicos e veterinários, tal equívoco, por si só, não autoriza a cobrança da TCFA, haja vista a ausência de fato gerador - o qual é dependente da atividade funcional do empreendimento, assim entendido o desempenho efetivo das operações poluidoras ou potencialmente poluidoras.
Do mesmo modo, não é o mero registro cadastral junto à autarquia que fará as vezes da hipótese de incidência tributária. O fato de a autora possuir inscrição no IBAMA não tem o condão de autorizar a cobrança da TCFA, porquanto imprescindível, para a existência da obrigação tributária, o lastro ofertado pelo prefalado fato gerador.
Ainda, a cobrança da TCFA é proporcional ao tamanho da empresa e a extensão do (possível) dano ao meio ambiente. Nesse sentindo, o precedente desta Corte:
EMENTA: TRIBUTÁRIO. TAXA DE CONTROLE E FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL - TCFA. LEI N. 10.165/2000. PODER DE POLÍCIA DO IBAMA. CONSTITUCIONALIDADE. 1. A Lei n.º 10.165/2000 criou a Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental - TCFA, que, conforme o art. 17-B da lei, tem como fato gerador o exercício regular do poder de polícia pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA para o controle e fiscalização das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais. 2. A TCFA tem previstos na lei instituidora todos os elementos constitutivos: o sujeito ativo é o IBAMA (art. 17-B), sendo que os sujeitos passivos estão estabelecidos no art. 17-C e no Anexo VIII. O fato gerador, por sua vez, previsto no citado art. 17-B, é o regular exercício do poder de polícia, albergado constitucionalmente pela norma insculpida no art. 145, II. No tocante ao valor devido a título da exação, trata-se de tributo fixo, sendo que a tabela constante do Anexo IX, que determina o quantum a pagar, apenas reflete o fato de que, quanto maior a dimensão, bem como o potencial de poluição e grau de utilização de recursos naturais da empresa, maior será a demanda pela extensão e intensidade da atividade fiscalizatória prestada pelo IBAMA, em observância aos princípios da capacidade contributiva e da isonomia. 3. Tendo sido respeitados os princípios da capacidade contributiva e da isonomia, e levado em conta a dimensão da atividade estatal requerida - já que o produto de sua arrecadação custeia tão-somente a atividade fiscalizatória do IBAMA direcionada aos próprios sujeitos passivos arrolados no anexo VIII da Lei n.º 10.165/2000 - a mesma não se afigura inconstitucional, estando em perfeita consonância com os preceitos constitucionais tributários, inclusive o art. 145, § 2º, da Carta Magna. 4. Precedente do STF (RE 416601/SC). (TRF4, AC 2008.71.00.032023-0, SEGUNDA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, D.E. 17/02/2010)
Do inteiro teor do referido julgado, extrai-se a seguinte fundamentação, aplicável in casu:
(...)
IV) Sobre a base de cálculo da TCFA
No tocante ao valor do tributo, prevê o art. 17-D:
"Art. 17-D. A TCFA é devida por estabelecimento e os seus valores são os fixados no Anexo IX desta Lei." (NR)
§ 1o Para os fins desta Lei, consideram-se:
I - microempresa e empresa de pequeno porte, as pessoas jurídicas que se enquadrem, respectivamente, nas descrições dos incisos I e II do caput do art. 2o da Lei no 9.841, de 5 de outubro de 1999;
II - empresa de médio porte, a pessoa jurídica que tiver receita bruta anual superior a R$ 1.200.000,00 (um milhão e duzentos mil reais) e igual ou inferior a R$ 12.000.000,00 (doze milhões de reais);
III - empresa de grande porte, a pessoa jurídica que tiver receita bruta anual superior a R$ 12.000.000,00 (doze milhões de reais).
§ 2o O potencial de poluição (PP) e o grau de utilização (GU) de recursos naturais de cada uma das atividades sujeitas à fiscalização encontram-se definidos no Anexo VIII desta Lei.
§ 3o Caso o estabelecimento exerça mais de uma atividade sujeita à fiscalização, pagará a taxa relativamente a apenas uma delas, pelo valor mais elevado."
Esse dispositivo é complementado pelo Anexo IX da Lei, que prevê ser o tributo devido por estabelecimento, pelas pessoas físicas, microempresas e empresas de pequeno, médio e grande porte, conforme o potencial de poluição e o grau de utilização dos recursos, de acordo com os valores ali fixados.
Cumpre salientar que se trata de tributo fixo, sendo que a tabela constante do Anexo IX, a qual determina o quantum a pagar, apenas reflete o fato de que, quanto maior a dimensão, bem como o potencial de poluição e grau de utilização de recursos naturais da empresa, maior será a demanda pela extensão e intensidade da atividade fiscalizatória prestada pelo IBAMA.
Em outras palavras, a relação entre o exercício do poder de polícia para fiscalização de atividades poluidoras, o efetivo potencial de poluição e grau de utilização de recursos naturais e a receita auferida pelo sujeito passivo estabelece-se pelo fato de quem mais vende o produto objeto do processo poluidor mais polui e, conseqüentemente, exige do poder público maior exercício do poder de polícia (AI n.º 2002.04.01.004327-2/SC, Segunda Turma, Rel. Des. Federal Vilson Darós, unânime, DJU de 23.05.02 - bol. 144/02).
Conforme se observa no art. 9º da Lei n.º 6.938/81, que dispõe sobre os instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente, a serem implementados pelo IBAMA - órgão formulador, coordenador e executor da mesma (art. 2º da Lei n.º 7.735/89), as atividades da autarquia, concernentes aos sujeitos passivos da exação, não se restringem ao licenciamento e à revisão de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras (inciso IV), mas incluem o estabelecimento de padrões de qualidade ambiental (inciso I), o zoneamento ambiental (inciso II), a avaliação de impactos ambientais e a manutenção dos Cadastros de Atividades e Instrumentos de Defesa Ambiental (inciso VIII) e de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais (inciso XII). Por essas razões, a existência das 15 classes de valores elencadas no diploma que criou a TCFA (indo desde zero, para as pessoas físicas e microempresas de pequeno e médio porte, até R$ 2.250,00 para as empresas de grande porte e alto potencial de poluição e grau de utilização de recursos naturais) advém do adequado zelo do legislador pela observância dos princípios da capacidade contributiva e da isonomia, tanto é que a incidência da taxa se dá por estabelecimento.
Vale dizer: o valor da TCFA é legalmente estabelecido, com base no princípio da capacidade contributiva e da isonomia, levando em conta a dimensão da atividade estatal requerida, sendo que o produto de sua arrecadação custeia tão-somente a atividade fiscalizatória do IBAMA direcionada aos próprios sujeitos passivos arrolados no anexo VIII da Lei n.º 10.165/2000. Por essa razão, a mesma não se afigura inconstitucional, estando em perfeita consonância com os preceitos constitucionais tributários, inclusive o art. 145, § 2º, da Carta Magna.
Nesse mesmo sentido, volto a citar a paradigmático voto do eminente Min. Carlos Velloso no RE 416601:
" (...) Finalmente, o art. 17-D cuida da base de cálculo da taxa: ela será devida por estabelecimento e os seus valores são os fixados no Anexo IX, variando em razão do potencial de poluição e grau de utilização de recursos naturais, que será de pequeno, médio e alto, variando para microempresas, empresas de pequeno porte, empresa de médio porte e empresa de grande porte. O tratamento tributário dispensado aos contribuintes observa a expressão econômica destes. É dizer, as pessoas jurídicas pagarão maior ou menor taxa em função da potencialidade poluidora da atividade exercida, levando-se em conta, ademais, se se trata de microempresa, empresa de pequeno porte, empresa de médio porte e empresa de grande porte, vale dizer, os defeitos apontados pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento da cautelar pedida na ADI 2.178/DF, no que toca à alíquota, então inexistente, foram corrigidos.
Bem por isso, Sacha Calmon, no parecer citado - fls. 374 e seguintes - opina no sentido da observância, no caso, do princípio da proporcionalidade. Escreve: "(...) No particular, duas objeções são lançadas contra a TCFA:
a de que varia segundo a receita bruta do estabelecimento contribuinte, adotando critério de quantificação próprio dos impostos;
a de que seria excessivamente onerosa.
É noção cediça que a base de cálculo das taxas deve mensurar o custo da atuação estatal que constitui o aspecto material de seu fato gerador (serviço público específico e divisível ou exercício do poder de polícia).
Não se pode ignorar, contudo, a virtual impossibilidade de aferição matemática direta do custo de cada atuação do Estado (a coleta do lixo de um determinado domicílio, ao longo de um mês; a emissão de um passaporte; etc.). O cálculo exigiria chinesices como a pesquisa do tempo gasto para a confecção de cada passaporte, e a sua correlação com o salário-minuto dos funcionários encarregados e o valor do aluguel mensal do prédio da Polícia Federal onde o documento foi emitido, entre outras variáveis intangíveis, de modo a colher o custo de emissão de cada passaporte, para a exigência da taxa correspectiva (que variaria para cada contribuinte, segundo o seu documento tivesse exigido maior ou menor trabalho ou tivesse sido emitido em prédio próprio ou alugado). O mesmo se diga quanto à coleta de lixo: imagine-se o ridículo de obrigarem-se os lixeiros, tais ourives, a pesar com balança de precisão os detritos produzidos dia a dia por cada domicílio, para que a taxa pudesse corresponder ao total de lixo produzido a cada mês pelo contribuinte.
O Direito não pode ignorar a realidade sobre a qual se aplica. O princípio da praticabilidade, tão bem trabalhado entre nós por MISABEL DERZI, jurisdiciza essa constatação elementar, que tampouco passa despercebida ao STF. Nos autos da Representação de Inconstitucionalidade n.º 1.077/84, Rel. Min. MOREIRA ALVES, declarou a Corte que não se pode exigir do legislador mais do que "equivalência razoável entre o custo real dos serviços e o montante a que pode ser compelido o contribuinte a pagar, tendo em vista a base de cálculo estabelecida pela lei e o quantum da alíquota por esta fixado".
Ora, é razoável supor que a receita bruta de um estabelecimento varie segundo o seu tamanho e a intensidade de suas atividades.
É razoável ainda pretender que empreendimentos com maior grau de poluição potencial ou de utilização de recursos naturais requeiram controle e fiscalização mais rigorosos e demorados da parte do IBAMA.
(...)."
Acrescenta Sacha Calmon que, se "o valor da taxa varia segundo o tamanho do estabelecimento a fiscalizar", o que implica maior ou menor trabalho por parte do poder público, maior ou menor exercício do poder de polícia, "é mais do que razoável afirmar que acompanha de perto o custo da fiscalização que constitui sua hipótese de incidência", com atendimento, em conseqüência, "na medida do humanamente possível", dos "princípios da proporcionalidade e da retributividade".
Conclui o mestre mineiro o seu parecer:
"Oportuno relembrar que uma das principais críticas que se fizeram à TCA, instituída pela Lei n.º 9.960/2000 e declarada inconstitucional pelo STF nos autos da ADIn n.º 2.178-8, condenava justamente a indiferenciação do valor da taxa na proporção do porte econômico do contribuinte (voto do Relator, Min. ILMAR GALVÃO).
Quanto à suposta abusividade do valor da TCFA, cumpre registrar que seu montante vai de R$ 50,00 (cinqüenta reais), para a microempresa com alto grau de poluição potencial ou de utilização de recursos naturais, até o teto de R$ 2.250,00 (dois mil e duzentos e cinqüenta reais) por estabelecimento de empresa de grande porte também enquadrada no grau máximo de poluição ou utilização.
Não parecem valores excessivos, ainda mais quando se pensa no custo de fiscalização de uma plataforma de petróleo em alto mar, que depende de deslocamento em helicóptero, emprego de equipamentos de segurança os mais modernos, grande número de homens e de horas despendidas...
Pense-se também na extensão de uma mina de ferro, na elevada especialização de uma indústria química...
Esclareça-se, por fim, que são apenas vinte as atividades sujeitas à TCFA (cf. Anexo IX da Lei n.º 6.938/81), das quais não mais do que seis estão qualificadas como de alto grau de poluição ou utilização, sujeitando o respectivo prestador - se for empresa de grande porte - ao pagamento do valor máximo."
(...)
Neste caso, o laudo pericial também assevera que a empresa fornece 595 produtos para o mercado, sendo 2 deles destinados ao uso veterinário (PROCIOCLIN suíno e VERRUCLIN) representando, portanto, 0,3% da sua produção. (Evento 82 LAUDOPERIC1 pág. 18).
Logo, possui razão a autora ao insurgir-se contra o fato de ser cobrada, segundo aduz, no patamar máximo previsto para a TCFA, ante seu enquadramento como empresa de grande porte.
Afinal, como já dito, o que legitima a cobrança da Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental é a ocorrência de seu fato gerador, qual seja, o exercício regular do poder de polícia conferido ao IBAMA para controle e fiscalização das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais, e não a inscrição da pretensa devedora no cadastro do órgão de fiscalização.
Logo, tenho que houve equívoco por parte do IBAMA, que se baseou em uma informação prestada por parte da autora, sem verificar, em sua atividade fiscalizatória vinculada, que se tratava de empresa que não exerce uma atividade poluidora.
Por conseguinte, não é devida a taxa se a autora não exerce atividade poluidora.
Por fim, cabível a aplicação do art. 493 do CPC ao presente caso, haja vista a superveniência de fato novo capaz de influir no desfecho da lide. Com efeito, a prova pericial produzida no curso da ação - trazendo a lume a inexistência de qualquer atividade sujeita à cobrança da TCFA - ampara a extensão do pedido formulado pela demandante, cabendo observar seu requerimento expresso de consideração do laudo técnico junto ao juízo sentenciante, o qual determinou a intimação da ré para manifestar-se. Não há falar, portanto, em inovação recursal e/ou cerceamento de defesa, ante a presença do contraditório e análise do pedido na sentença. Nesse sentido:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA. INCAPACIDADE LABORAL TEMPORÁRIA. TERMO INICIAL. INCAPACIDADE SUPERVENIENTE. TERMO FINAL. CONSECTÁRIOS LEGAIS DA CONDENAÇÃO. PRECEDENTES DO STF (TEMA 810) E STJ (TEMA 905). HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. TUTELA ESPECÍFICA. 1. São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: 1) a qualidade de segurado; 2) o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais; 3) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporário (auxílio-doença). 2. O cancelamento/cessação ou indeferimento do benefício pelo INSS é suficiente para que o segurado ingresse com a ação judicial, não sendo necessário o exaurimento da via administrativa. 3. O segurado portador de enfermidade que o incapacita temporariamente para o trabalho, com chance de recuperação e reabilitação, tem direito à concessão do benefício de auxílio-doença. 4. Ainda que tenha sido atestada a incapacidade laboral da parte autora em data superveniente ao seu requerimento administrativo, é possível que lhe seja concedido judicialmente o benefício por incapacidade, acaso preenchidos os demais requisitos. 5. O fato de vir a ser constatada situação diversa posteriormente ao ajuizamento da demanda não impede a concessão do benefício, haja vista que "se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão", nos termos do art. 493 do CPC. 6. Em relação ao termo inicial, o entendimento que vem sendo adotado é no sentido de que, evidenciado que a incapacidade laboral já estava presente quando do requerimento administrativo/da cessação do benefício pela autarquia previdenciária, mostra-se correto o estabelecimento do termo inicial do benefício previdenciário em tal data. 7. O artigo 60 da Lei 8.213/91 estabelece que o auxílio-doença será devido enquanto o segurado permanecer incapaz. Portanto, é inviável ao julgador monocrático fixar termo final para o benefício de auxílio-doença, haja vista este tipo de benefício tem por natureza a indeterminação. 8. O princípio da sucumbência, adotado pelo art. 85, §10, do CPC, encontra-se contido no princípio da causalidade, segundo o qual aquele que deu causa à instauração do processo deve arcar com as despesas dele decorrentes. 9. Critérios de correção monetária e juros de mora em consonância com o precedente do STF no RE nº 870.947, DJE de 20-11-2017 e do STJ no REsp nº 1.492.221/PR, DJe de 20-3-2018. 10. O cumprimento imediato da tutela específica independe de requerimento expresso do segurado ou beneficiário, e o seu deferimento sustenta-se na eficácia mandamental dos provimentos fundados no artigo 461 do CPC/73, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537 do CPC/15. (TRF4, AC 5006925-21.2018.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 26/05/2021) (grifei)
REMESSA NECESSÁRIA. PROCEDIMENTO COMUM. TRIBUTÁRIO. PARCELAMENTO. PERT. FATO SUPERVENIENTE. 1. Nos termos do art. 493 do CPC, "se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão". 2. Mantida, em remessa necessária, sentença que entendeu aplicável ao caso o novo prazo de adesão ao Programa Especial de Regularização Tributária pela IN 1.855/18. 3. Remessa necessária desprovida. (TRF4, REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL Nº 5022590-53.2018.4.04.7000, 1ª Turma, Juíza Federal ANDRÉIA CASTRO DIAS MOREIRA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 07/12/2020)
Com razão, portanto, a recorrente, merecendo ser provido o apelo, com a reforma da sentença de improcedência do feito.
3. Ônus da sucumbência
Quanto aos honorários, nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a fixação da verba honorária dar-se-á sobre o valor da condenação ou do proveito econômico (art. 85, §3º, do CPC), ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa.
Neste caso, os honorários advocatícios devem ser fixados sobre o valor da causa, nos percentuais mínimos previstos nos incisos do § 3º do art. 85 do CPC, observado o escalonamento do § 5º do mesmo artigo. O percentual será de 10%, quando o valor se enquadrar no critério estabelecido no inciso I do § 3º; em 8% quando enquadrado no inciso II, e assim sucessivamente, conforme escalonamento previsto no § 5º.
4. Prequestionamento
Em arremate, consigno que o enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal, assim como a análise da legislação aplicável, são suficientes para prequestionar junto às instâncias Superiores os dispositivos que as fundamentam. Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração para esse exclusivo fim, o que evidenciaria finalidade procrastinatória do recurso, passível de cominação de multa (art. 1.026, § 2º, do CPC).
5. Dispositivo
Ante o exposto, voto por homologar a desistência do Agravo Interno e por dar provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por FRANCISCO DONIZETE GOMES, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002610000v46 e do código CRC a291be2d.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): FRANCISCO DONIZETE GOMES
Data e Hora: 18/6/2021, às 20:9:27
Conferência de autenticidade emitida em 26/06/2021 04:01:06.

Apelação Cível Nº 5029270-54.2018.4.04.7000/PR
RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
APELANTE: LABORCLIN PROD PARA LABORATORIOS LIMITADA (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMA (RÉU)
EMENTA
TRIBUTÁRIO. TCFA. ATIVIDADE POTENCIALMENTE POLUIDORA. NÃO REALIZAÇÃO. INEXIGIBILIDADE. laudo pericial superveniente. fato novo. art. 493 do cpc. aplicabilidade.
1. Tendo sido demonstrado que a atividade exercida pela autora não se enquadra na definição constante na notificação de lançamento fiscal da TCFA, não há falar em fato gerador ou exigibilidade da referida taxa.
2. Não é o mero registro cadastral junto à autarquia que fará as vezes da hipótese de incidência tributária. O fato de a autora possuir inscrição no IBAMA não tem o condão de autorizar a cobrança da TCFA, porquanto imprescindível, para a existência da obrigação tributária, o lastro ofertado pelo fato gerador.
3. Segundo o art. 493 do CPC, "Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão". Precedentes desta Corte.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, homologar a desistência do Agravo Interno e por dar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 18 de junho de 2021.
Documento eletrônico assinado por FRANCISCO DONIZETE GOMES, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002610001v4 e do código CRC c1d036a2.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): FRANCISCO DONIZETE GOMES
Data e Hora: 18/6/2021, às 20:9:27
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 11/06/2021 A 18/06/2021
Apelação Cível Nº 5029270-54.2018.4.04.7000/PR
RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
PRESIDENTE: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
PROCURADOR(A): CARLOS EDUARDO COPETTI LEITE
APELANTE: LABORCLIN PROD PARA LABORATORIOS LIMITADA (AUTOR)
ADVOGADO: MANOELE KRAHN (OAB PR043592)
ADVOGADO: LUIZA DE ARAUJO FURIATTI (OAB PR045697)
APELADO: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMA (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 11/06/2021, às 00:00, a 18/06/2021, às 16:00, na sequência 431, disponibilizada no DE de 01/06/2021.
Certifico que a 1ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 1ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, HOMOLOGAR A DESISTÊNCIA DO AGRAVO INTERNO E POR DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
Votante: Juiz Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
MARIA CECÍLIA DRESCH DA SILVEIRA
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 26/06/2021 04:01:06.