
Apelação Cível Nº 5020368-68.2020.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pelo INSS em face de sentença que julgou procedente o pedido da parte autora para reconhecer e averbar tempo especial de 15/06/1992 a 08/08/2014, e consequentemente, determinou a revisão da aposentadoria por tempo de contribuição da parte autora e a condenação do INSS aos valores atrasados da DIB 08/08/2014 ().
Em suas razões recursais, o INSS defende a falta de interesse de agir em face da ausência de requerimento administrativo do período especial pretendido, pugnando pela reforma da sentença. Argumenta que, administrativamente, a parte autora apenas requereu o tempo laborado no meio rural em regime de economia familiar, e nada mais. Defende que a certidão do Município de Crissiumal sequer relata algum período de atividade especial, referindo apenas e tão-somente o labor durante o período em questão. Por fim, defende que o INSS é isento de custas processuais (Lei nº 13.471/10 do Rio Grande do Sul) ().
Sem apresentação de contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
1. Admissibilidade
O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.
2. Interesse de agir
A sentença analisou a questão nos seguintes termos ():



Pois bem.
A controvérsia compreendendo a necessidade de prévio requerimento administrativo como condição para o acesso ao Judiciário restou apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, no julgamento do RE 31.240/MG (Tema 350). Ao definir a tese sobre a questão, assim estabeleceu o STF:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR. 1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo. 2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas. 3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado. 4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão. 5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos. 6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir. 7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir. 8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais. 9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir.
Fixou-se, portanto, a indispensabilidade de prévio requerimento administrativo e não a necessidade de exaurimento da esfera administrativa, nos pedidos de concessão de benefício previdenciário, salvo notório e reiterado entendimento da Administração em sentido contrário ao postulado.
Nos casos de pedidos de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido o prévio requerimento administrativo é dispensável, a não ser que o caso não dependa de análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração.
Observo que no processo, quando da contestação, o INSS não adentrou no mérito da questão e se trata de pedido de revisão com reconhecimento de tempo especial (, pp. 43/44).
A ação foi ajuizada em 14 de junho de 2017, de modo que é necessária a formulação de prévio requerimento administrativo.
Da análise do processo administrativo apresentado pelo autor com a inicial (), observa-se que o único documento referente ao tempo prestado junto à Prefeitura de Crissiumal é o constante na página 07, datado de 16/06/2014, de onde se extrai apenas o tempo de serviço prestado pelo autor:

Os laudo e PPP, sendo este último datado de 2016, foram todos juntados apenas e tão-semente com o inicial, ou seja, bem posteriores ao encerramento do processo administrativo, de 2014.
Ademais, tais folhas sequer foram rubricadas pelo INSS, de onde se conclui que, efetivamente, não fizeram parte do pedido administrativo original.
Some-se a isso o fato de a carta de deferimento administrativo, juntada na p. 37, expedida em 04/setembro/2014, após o deferimento do tempo de serviço rural - este sim requerido - mencionar expressamente que não foram apresentados laudos e formulários de exercício de atividade especial:

Diante do exposto, não há qualquer comprovação de que o segurado tenha, por qualquer forma, levado ao conhecimento do INSS o objeto da demanda.
Observa-se, ainda, que a íntegra do processo administrativo foi juntado pelo INSS na apelação (, pp. 08/31), demonstrando que, naquela ocasião, o autor anexou apenas certidão de tempo de contribuição do período de trabalho junto ao Município de Crissiumal, admitido em 28/05/1992 como operário, estatutário e vinculado ao RGPS, sem maiores especificações (, p. 06).
Por conta dos documentos apresentados administrativamente, sequer há se falar em enquadramento por categoria profissional, porquanto impossível ao INSS, naquela oportunidade, ter ciência da efetiva atividade desempenhada e, muito menos, das condições de trabalho do autor junto ao Município.
A mera juntada da Certidão do município empregador não basta para configurar o interesse processual, pois não é exigível do INSS que, no exercício do seu dever de orientação aos segurados, realize uma análise ampla e total abrangendo qualquer possibilidade de reconhecimento de direitos sequer invocados.
O caso, ademais, não se encaixa em nenhuma das exceções que dispensariam o prévio requerimento administrativo. Veja-se, ainda, que o INSS, na contestação, não adentrou no mérito, conforme já relatado.
Em conclusão, deve ser reformada a sentença para reconhecer a falta de interesse de agir da parte autora, extinguindo o processo sem resolução de mérito por ausência de prévio requerimento administrativo - art. 485, VI, do CPC.
Honorários
Em face da inversão da sucumbência, deverá a parte autora arcar com pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios no percentual mínimo de cada uma das faixas de valor no §3° do artigo 85 do CPC, tendo em conta a pretensão máxima deduzida na petição inicial.
No entanto, resta suspensa a exigibilidade das referidas verbas, por força da gratuidade de justiça, cumprindo ao credor, no prazo assinalado no § 3º do artigo 98 do CPC, comprovar eventual alteração da situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão da benesse.
Anoto que, nos casos de inversão da sucumbência, inaplicável a majoração recursal prevista no §11 do art. 85 do CPC, pois tal acréscimo só é permitido sobre verba anteriormente fixada, consoante definiu o STJ (AgInt no AResp 829.107).
Custas
Sucumbente, a parte autora responde pelas custas e despesas processuais.
No entanto, resta suspensa a exigibilidade das referidas verbas, por força da gratuidade de justiça, cumprindo ao credor, no prazo assinalado no §3º do artigo 98 do CPC, comprovar eventual alteração da situação de insuficiência de recursos justificadora da concessão da benesse.
Prequestionamento
Ficam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pela parte autora cuja incidência restou superada pelas próprias razões de decidir.
Conclusão
Provido o recurso do INSS e, em consequência, extingue-se o processo sem análise de mérito, em face da falta de interesse processual da parte autora, nos termos do art. 485, VI, do CPC.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação do INSS.
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Apelação Cível Nº 5020368-68.2020.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. tempo especial. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. AUSÊNCIA DE prévio REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO.
1. A controvérsia compreendendo a necessidade de prévio requerimento administrativo como condição para o acesso ao Judiciário restou apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, no julgamento do RE 31.240/MG (Tema 350).
2. Fixou-se a indispensabilidade de prévio requerimento administrativo e não a necessidade de exaurimento da esfera administrativa, nos pedidos de concessão de benefício previdenciário, salvo notório e reiterado entendimento da Administração em sentido contrário ao postulado.
3. Nos casos de pedidos de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido o prévio requerimento administrativo é dispensável, a não ser que o caso não dependa de análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração.
4. Não há qualquer comprovação de que o segurado tenha, por qualquer forma, levado ao conhecimento do INSS o objeto da demanda.
5. Interesse de agir não configurado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 26 de setembro de 2024.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 18/09/2024 A 26/09/2024
Apelação Cível Nº 5020368-68.2020.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE
PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
PROCURADOR(A): DANIELE CARDOSO ESCOBAR
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 18/09/2024, às 00:00, a 26/09/2024, às 16:00, na sequência 579, disponibilizada no DE de 09/09/2024.
Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE
Votante: Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE
Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA
Secretária
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