APELAÇÃO CÍVEL Nº 5009870-93.2014.404.7000/PR
RELATOR | : | PAULO PAIM DA SILVA |
APELANTE | : | BENEDITO EXPEDITO DA SILVA (Espólio) |
PROCURADOR | : | GEORGIO ENDRIGO CARNEIRO DA ROSA (DPU) DPU128 |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. RESTITUIÇÃO. MÁ-FÉ NO ATO DE CONCESSÃO E NO RECEBIMENTO DO BENEFÍCIO.
1. Tendo a revisão administrativa, com cancelamento do benefício, ocorrido em período inferior a 10 anos, resta afastada a alegação de decadência do direito de revisão.
2. A prescrição qüinqüenal para cobrança dos valores inicia-se com a intimação para pagamento, sendo interrompida pelo ajuizamento de ação judicial de cobrança, ainda que extinto o feito sem resolução do mérito.
3. Adotada a concepção ética da boa-fé, predominante no nosso direito, caberá a restituição de valores indevidamente pagos pela Previdência Social, em decorrência de erro administrativo, sempre que a ignorância do erro pelo beneficiário não for desculpável, o que caracteriza má-fé subjetiva.
4. Caso em que presente também a má-fé objetiva, porque o beneficiário participou diretamente das irregularidades na concessão, fornecendo documentos com informações incorretas, e que sabia incorretas.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao apelo, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 25 de fevereiro de 2015.
Juiz Federal Paulo Paim da Silva
Relator
| Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Paulo Paim da Silva, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7317379v2 e, se solicitado, do código CRC C5A9539F. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5009870-93.2014.404.7000/PR
RELATOR | : | PAULO PAIM DA SILVA |
APELANTE | : | BENEDITO EXPEDITO DA SILVA (Espólio) |
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RELATÓRIO
O INSS ajuizou contra o ESPÓLIO DE BENEDITO EXPEDITO DA SILVA ação para cobrança de benefício previdenciário pago indevidamente no período de dezembro/2002 a agosto/2003, ante a alegação de que a concessão decorreu de fraude que teve participação do beneficiário, o que caracterizou a má-fé nos recebimentos.
A sentença foi de procedência, reconhecendo-se o direito à devolução dos valores, bem como caracterizada a fraude no recebimento. Afastou-se decadência e prescrição.
Recorre a DPU em defesa do espólio, alegando decadência e prescrição, bem como boa-fé no recebimento a impedir a devolução dos valores e a irrepetibilidade de verbas alimentares. Ataca os fatores de correção e busca condenação em verba honorária.
Com contrarrazões, vieram os autos.
VOTO
Decadência e prescrição
O benefício foi concedido em dezembro de 2002 e cancelamento em setembro de 2003, após procedimento administrativo em que se garantiu o contraditório e a ampla defesa.
Como entre a concessão e o cancelamento não houve o decurso de mais de 10 anos, não houve decadência do direito de revisão.
É de se observar que o benefício já foi revisto administrativamente, com o cancelamento, não sendo veiculado nesta ação tal pedido.
A prescrição foi corretamente contada na sentença, porquanto esse prazo somente se iniciou com o vencimento da GPS de cobrança enviada pelo INSS, com data para pagamento em 30/11/2008 (evento 1, PROCADM3, p. 33).
A execução fiscal, ajuizada em 13/03/2012, interrompeu o curso desse prazo, que teria reiniciado pela metade com o trânsito em julgado da sentença extintiva, em 11/09/2013.
Assim, quando do ajuizamento deste feito, em 26/02/2014, não é possível reconhecer a prescrição de nenhuma parcela.
Repetição dos valores pagos indevidamente pelo INSS
Os valores de benefício previdenciário pagos indevidamente geram direito à restituição pelo INSS, nos termos do artigo 115 da Lei 8.213/91, quando comprovada a má-fé do beneficiário.
No presente caso, a má-fé foi devidamente analisada e observada na sentença:
Analisando o procedimento administrativo, vê-se que o de cujus instruiu seu pedido de aposentadoria com dois formulários em que afirmada a prestação de trabalho em condições especiais (evento 1, PROCADM2, p. 10 e 11). Tais formulários teriam sido emitidos, respectivamente, por 'Posto de Gasolina N. Sª. da Luz' e 'Transportadora Peixoto Estrada Ltda.'. Além desses períodos computados como especiais, outros teriam sido computados, supostamente com lastro nas CTPS's do de cujus.
A revisão administrativa considerou não comprovados vários vínculos urbanos comuns, além dos dois especiais acima referidos. Intimado a se defender, o de cujus alegou ter destruído 'todas as suas CTPS's por entender que esses documentos não tinham mais qualquer utilidade'.
O INSS deflagrou diligências para averiguar o tempo especial (evento 1, PROCADM2, p. 69-70).
O Núcleo de Auditoria Externo noticiou a impossibilidade de atender à diligência em relação à 'Transportadora Peixoto, Estrada Ltda.', assim justificando (evento 1, PROCADM2, p. 78):
'1. O endereço apontado na RD, R. Joaquim R. Gomes, 1.230, não existe em Curitiba, no Estado do Paraná;
2. Conforme declaração anexa, fornecida pela Junta Comercial do Paraná, não consta registro dessa empresa naquele órgão, até a presente data.
3. Em pesquisa realizada através do convênio entre o INSS e a Delegacia da Receita Federal (documento anexo) verificamos que a empresa é domiciliada à R. Dois, s/nº, bairro Lot. Chac. Paraizo, município de Itu, SP, fone (0011) 782-24507, com CNPJ nº 45.468.865/0001-15. O quadro societário é constituído por:
Décio Peixoto, CPF: 017.908.898-04, domiciliado em Estrada Canguiri, s/n, Três Vendas, Itu, SP;
Fortunata Tozoni Peixoto, Título de Eleitor: 00.026.269.006-04.'
Também em relação à empresa 'Posto de Gasolina N. S. da Luz', o Núcleo de Auditoria Externo informou também a impossibilidade de atender à requisição de diligência, assim justificando (evento 1, PROCADM2, p. 87):
'Em visita ao local apontado na RD, Av. Manoel Ribas, 750, Curitiba, PR, constatamos a existência de um prédio residencial.
No cadastro da Delegacia da Receita Federal/Paraná não existem dados sobre a empresa em questão.
Conforme declaração anexa fornecida pela Junta Comercial do Paraná, mediante ofício do Serviço de Fiscalização número 14.401.2/197/2003, não consta registro dessa empresa naquele órgão até a presente data.'
À vista de tais constatações, o INSS entendeu não restar comprovada a existência de tais estabelecimentos, o que seria determinante da suspensão do benefício.
Merece registro trecho da decisão administrativa que, apreciando a defesa do autor, concluiu pela suspensão do benefício (evento 1, PROCADM2, p. 95-96):
'7. - Podemos ver também às fls. 08 e 09, formulários DSS-8030, utilizados para conversão de atividades como sendo sob condições especiais. A fim de comprovar a veracidade dos formulários [foram requisitadas] Diligências, conforme fls. 65/66, e após a verificação por parte do Serviço de Fiscalização, ficou constatado que:
* a empresa POSTO DE GASOLINA N SRA DA LUZ, período de 03/04/60 a 30/12/68, NÃO EXISTE, NUNCA TEVE REGISTRO NA JUNTA COMERCIAL DO PARANÁ, e no endereço indicado existe um prédio residencial;
* a empresa TRANSPORTADORA PEIXOTO, ESTRADA LTDA., período de 02/01/1969 a 28/12/71, NÃO EXISTE, NÃO CONSTA REGISTRO NA JUNTA COMERCIAL DO PARANÁ e o endereço indicado não existe em Curitiba.
08. - De todo o exposto, conclui-se que o benefício foi concedido irregularmente, causando à Instituição conforme levantamento de fls. 87, o prejuízo no valor de R$ 6.341,00 (seis mil trezentos e quarenta e um reais), valor este que deverá ser atualizado no ato da quitação, referente ao recebimento indevido do benefício no período de 19/12/02 a 01/09/2003.
...
10. - Conforme Auditoria de matrícula (fls. 52), o benefício foi habilitado e concedido pelo servidor Ernande Antonio Comicholi, matrícula nº 0948114, tendo este inserido os seguintes períodos:
...
POSTO DE GASOLINA N SRA DA LUZ (C/CONVERSÃO) 02/04/60 A 30/12/68
TRANSP PEIXOTO ESTRADA LTDA (C/CONVERSÃO) 02/01/69 A 28/12/71
11. - Salientamos ser característica deste servidor, inserir tempo de contribuição para que o segurado com idade inferior a 53 anos alcance o tempo mínimo exigido pela legislação vigente, pois vários outros processos encontram-se em apuração com a mesma irregularidade.'
Intimado da decisão, o de cujus interpôs recurso administrativo, sem trazer esclarecimentos. Juntou, contudo, cópia de uma de suas CTPS's (evento 1, PROCADM3, p. 6-19) contradizendo a alegação inicial de que havia destruído todas. A CTPS em questão teria sido emitida em 10/08/1989, não fazendo prova dos dois vínculos apontados, já que datados de período anterior.
Poder-se-ia alegar que as conclusões do INSS foram precipitadas, já que existiria estabelecimento denominado 'Transportadora Peixoto Estrada Ltda.', situado na cidade de Itu/SP. Ocorre que o formulário em questão, datado de 1992, indicava domicílio na cidade de Curitiba a despeito de não constar qualquer registro na Junta Comercial do Paraná. Era também de 1992 o formulário emitido pelo Posto N. Sª da Luz, constando domicílio em Curitiba a despeito de ausência de registro na Junta Comercial do Estado.
Também se poderia imputar ao servidor mencionado a inclusão dos vínculos, mas sua participação não elide o fato de que os formulários foram apresentados pelo de cujus. Assim, ainda que o servidor do INSS tenha ilegalmente introduzido os vínculos no sistema, não se pode negar que a atuação do de cujus contribuiu para o resultado danoso ao erário.
Nesse contexto, cumpre afastar a alegação de boa-fé, o que implica a legitimidade do pedido de ressarcimento à luz do entendimento prevalecente na Jurisprudência.
Além da má-fé objetiva, demonstrada nos autos, pela participação do beneficiário na fraude, é se acrescentar a existência da má-fé subjetiva, decorrente do fato de continuar se beneficiando de ato ilícito para o recebimento de benefícios.
Entende-se pela existência duas espécies de boa-fé no âmbito do direito. Uma objetiva, referente ao padrão de conduta a ser tomado pelos indivíduos em suas relações sociais, e outra subjetiva, pertinente a aspectos anímicos do indivíduo em situações concretas. No tocante à análise de questões referentes à restituição de benefícios previdenciários é de se perquirir a segunda, a boa-fé subjetiva, que diz respeito ao ânimus do beneficiário.
Neste aspecto refiro conclusão do Desembargador Federal Rômulo Pizzolatti, em artigo intitulado 'A restituição de benefícios previdenciários pagos indevidamente e seus requisitos', inserido na Revista do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, nº 78, p. 11/122, verbis:
'(...) Adotada a concepção ética da boa-fé, predominante no nosso direito, caberá então a restituição de valores indevidamente pagos pela Previdência Social, em decorrência de erro administrativo, sempre que a ignorância do erro pelo beneficiário não for desculpável. A meu ver, não é desculpável o recebimento de benefícios inacumuláveis (Lei nº 8.213, de 1991, art. 124), porque a lei é bastante clara, sendo de exigir-se o seu conhecimento pelo beneficiário. Também não será escusável o recebimento, em virtude de simples revisão, de valor correspondente a várias vezes o valor do benefício. Do mesmo modo, não cabe alegar boa-fé o pensionista que recebe pensão de valor integral e continua a receber o mesmo valor, ciente de que outro beneficiário se habilitou e houve o desdobramento da pensão. De qualquer modo, serão os indícios e circunstâncias que indicarão, em cada caso concreto, se a ignorância do erro administrativo pelo beneficiário é escusável ou não.'
Daí se conclui que se o erro não for desculpável, resta caracterizada a má-fé.
No presente caso, quando do requerimento administrativo o beneficiário forneceu documentos que sabia incorretos, induzindo em erro a Autarquia Previdenciária a conceder um benefício indevido, o que caracteriza má-fé na concessão, a autorizar o pedido de restituição:
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA PELO RECONHECIMENTO DE MÁ-FÉ NA CONCESSÃO. 1. Recebendo benefício previdenciário por erro na concessão, é cabível a restituição, com reconhecimento de má-fé, quando a ignorância do erro pelo beneficiário não for desculpável. 2. Situação em que o beneficiário tinha ciência de que o benefício não lhe era devido, pois quando da concessão foi computado tempo de serviço que sabia inexistente. 3. Caracterizada má-fé no recebimento de benefício indevido afasta-se a ocorrência de prazo decadencial para revisão por parte do INSS. Decadência que corre normalmente, todavia, em relação a pedido do beneficiário para alteração do ato de concessão. (TRF4, AC 5011495-92.2011.404.7122, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Paulo Paim da Silva, juntado aos autos em 30/05/2014)
Confirma-se, pois, o dever de restituir os valores recebidos indevidamente, nos termos da sentença.
Prequestionamento
Para fins de possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores dou por prequestionadas as matérias constitucionais e legais alegadas em recurso pelas partes, nos termos das razões de decidir já externadas no voto, deixando de aplicar dispositivos constitucionais ou legais não expressamente mencionados e/ou tidos como aptos a fundamentar pronunciamento judicial em sentido diverso do declinado.
Ante o exposto, voto por negar provimento ao apelo.
Juiz Federal Paulo Paim da Silva
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 25/02/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5009870-93.2014.404.7000/PR
ORIGEM: PR 50098709320144047000
RELATOR | : | Juiz Federal PAULO PAIM DA SILVA |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal CELSO KIPPER |
PROCURADOR | : | Procuradora Regional da República Solange Mendes de Souza |
APELANTE | : | BENEDITO EXPEDITO DA SILVA (Espólio) |
PROCURADOR | : | GEORGIO ENDRIGO CARNEIRO DA ROSA (DPU) DPU128 |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 25/02/2015, na seqüência 1122, disponibilizada no DE de 10/02/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO APELO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal PAULO PAIM DA SILVA |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal PAULO PAIM DA SILVA |
: | Des. Federal CELSO KIPPER | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
| Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7380151v1 e, se solicitado, do código CRC C4A7D6AA. | |
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