| D.E. Publicado em 16/07/2018 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0011448-69.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA |
APELANTE | : | JOÃO PEREIRA VIANA |
ADVOGADO | : | Monica Maria Pereira Bichara |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. QUALIDADE DE SEGURADO E CARÊNCIA. BOIA-FRIA. PROVA TESTEMUNHAL. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS. INCAPACIDADE LABORAL. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE DOS PEDIDOS. AUXÍLIO-ACIDENTE. TUTELA DE URGÊNCIA.
1. Tratando-se de trabalhador rural "boia-fria", a exigência de apresentação de início de prova material para comprovação de tempo de serviço tem sido interpretada com temperamento face à dificuldade de comprovação da atividade, exercida sem qualquer formalidade, pelo próprio desconhecimento dos trabalhadores, sempre pessoas carentes e sem qualquer instrução, permitindo-se, em situações extremas, até mesmo a prova exclusivamente testemunhal.
2. A concessão dos benefícios por incapacidade depende de três requisitos: (a) qualidade de segurado do requerente à época do início da incapacidade (artigo 15 da LBPS); (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais, exceto nas hipóteses em que expressamente dispensada por lei; e (c) o advento, posterior ao ingresso no RGPS, de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade laboral que garanta a subsistência do segurado.
3. Tendo em vista a fungibilidade entre os benefícios de auxílio-doença e de auxílio-acidente, preenchidos os requisitos para o gozo de um deles, incumbe ao juiz concedê-lo, ainda que a parte autora tenha requerido apenas a concessão do outro.
4. O direito ao benefício de auxílio-acidente não está condicionado ao grau de incapacidade para o trabalho habitual, bastando que exista a diminuição, ainda que mínima, da aptidão laborativa, oriunda de sequela de acidente de qualquer natureza.
5. Determinada a imediata implantação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do CPC (1973), bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do CPC (2015), independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação e, de ofício, deferir a tutela antecipada, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 05 de julho de 2018.
Juiz Federal Convocado Oscar Valente Cardoso
Relator
| Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Convocado Oscar Valente Cardoso, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9423083v6 e, se solicitado, do código CRC 9E2A1383. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0011448-69.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA |
APELANTE | : | JOÃO PEREIRA VIANA |
ADVOGADO | : | Monica Maria Pereira Bichara |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária ajuizada por JOÃO PEREIRA VIANA em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez.
Em razão da ausência da qualidade de segurado do autor para a obtenção dos benefícios pleiteados, foi prolatada sentença de improcedência, publicada em 26/05/2015, cujo dispositivo ficou assim redigido (fls. 102/106):
Diante do exposto, nos termos do art. 269, inciso I, do Código de Processo Civil, extingo o feito COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO e julgo IMPROCEDENTES os pedidos formulados pela parte autora em face da autarquia ré.
Por conseguinte, CONDENO a parte autora ao pagamento das custas judiciais, despesas processuais, e honorários advocatícios arbitrados em R$1.000,00 (mil reais), na forma do artigo 20, §§3º e 4º, do Código de Processo Civil.
Ressalto que fica sobrestado o ônus da sucumbência até e se, no prazo de 05 (cinco) anos, a parte contrária comprovar não mais subsistir a situação que autorizou o benefício da gratuidade da justiça anteriormente concedido.
A parte-autora apelou (fls. 108/115) requerendo a reforma da sentença para que lhe seja deferido auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, e referindo que há nos autos elementos suficientes a comprovar sua condição de trabalhador rural/segurado especial.
Em suas contrarrazões (fls. 117/119), o INSS defendeu a manutenção da sentença e, na eventualidade de sua reforma, a incidência da prescrição quinquenal sobre as parcelas vencidas.
Vieram os autos a esta Corte.
É o relatório. Peço dia.
Juiz Federal Convocado Oscar Valente Cardoso
Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0011448-69.2015.4.04.9999/PR
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VOTO
Inicialmente, cumpre o registro de que a sentença recorrida foi publicada em data anterior a 18/03/2016, quando passou a vigorar o novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16/03/2015).
BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE
A concessão de benefícios por incapacidade laboral está prevista nos artigos 42 e 59 da Lei nº 8.213/91, verbis:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.
Extraem-se, da leitura dos dispositivos acima transcritos, que são três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: 1) a qualidade de segurado; 2) o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais; e 3) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporário (auxílio-doença).
Tendo em vista que a aposentadoria por invalidez pressupõe incapacidade total e permanente, cabe ao juízo se cercar de todos os meios de prova acessíveis e necessários para análise das condições de saúde do requerente, mormente com a realização de perícia médica.
Aos casos em que a incapacidade for temporária, ainda que total ou parcial, caberá a concessão de auxílio-doença, que posteriormente será convertido em aposentadoria por invalidez (se sobrevier incapacidade total e permanente), auxílio-acidente (se a incapacidade temporária for extinta e o segurado restar com sequela permanente que reduza sua capacidade laborativa) ou extinto (com a cura do segurado).
Quanto ao auxílio-acidente, a Lei nº 8.213/91 estabelece que:
Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.
As sequelas, portanto, devem ser decorrentes de acidente de qualquer natureza, ou seja, decorrente de qualquer ação exógena ao segurado, jamais por causa de doença advinda do próprio organismo de maneira degenerativa, ação endógena. É necessário, apenas, que exista a diminuição da aptidão laborativa oriunda de sequela de acidente de qualquer natureza.
No mesmo sentido foi a definição do tema pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1109595, representativo de controvérsia, assim ementado:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. AUXÍLIO-ACIDENTE. LESÃO MÍNIMA. DIREITO AO BENEFÍCIO.
1. Conforme o disposto no art. 86, caput, da Lei 8.213/91, exige-se, para concessão do auxílio-acidente, a existência de lesão, decorrente de acidente do trabalho, que implique redução da capacidade para o labor habitualmente exercido.
2. O nível do dano e, em consequência, o grau do maior esforço, não interferem na concessão do benefício, o qual será devido ainda que mínima a lesão.
3. Recurso especial provido.
(REsp 1109591/SC, 3ª Seção, Rel. Ministro Celso Limongi, dec. unânime em 25-8-2010, DJe de 8-9-2012)
No que se refere ao período de carência (número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício), estabelecem os artigos 25 e 26 da Lei de Benefícios da Previdência Social:
Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência:
I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 contribuições mensais;
(...)
Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:
I - pensão por morte, auxílio-reclusão, salário-família e auxílio-acidente;
Na hipótese de ocorrer a cessação do recolhimento das contribuições, prevê o artigo 15 da Lei nº 8.213/91 o denominado "período de graça", que permite a prorrogação da qualidade de segurado durante um determinado lapso temporal:
Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.
Decorrido o período de graça, as contribuições anteriores à perda da qualidade de segurado somente serão computadas para efeitos de carência depois que o segurado contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com, no mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido.
Cumpre destacar que no caso dos segurados especiais não há obrigatoriedade de preenchimento do requisito carência, sendo necessária, porém, a comprovação de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, mesmo que de forma descontínua. Assim dispõe o artigo 39 da Lei nº 8.213/91:
Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:
I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido; ou
(...)
Nestes casos, o tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material contemporânea ao período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, e Súmula 149 do STJ. Entretanto, embora o artigo 106 da LBPS relacione os documentos aptos à comprovação da atividade rurícola, tal rol não é exaustivo, sendo admitidos outros elementos idôneos.
A concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez pressupõe a averiguação, por meio de exame médico-pericial, da incapacidade para o exercício de atividade que garanta a subsistência do segurado, e terá vigência enquanto essa condição persistir. Ainda, não obstante a importância da prova técnica, o caráter da limitação deve ser avaliado conforme as circunstâncias do caso concreto. Isso porque não se pode olvidar de que fatores relevantes - como a faixa etária do requerente, seu grau de escolaridade e sua qualificação profissional, assim como outros - são essenciais para a constatação do impedimento laboral e efetivação da proteção previdenciária.
Dispõe, outrossim, a Lei nº 8.213/91 que a doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito ao benefício, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou lesão.
CASO CONCRETO
Qualidade de segurado e carência mínima
Inicialmente, cabe averiguar acerca da qualidade de segurado do autor, que alega exercer atividade rural na condição de boia-fria.
Quanto à demonstração da prática campesina, deduz-se do artigo 106 que os elementos elencados nos seus incisos I e III, uma vez em nome do interessado e alusivos ao período que se deseja comprovar, constituem prova plena do aludido trabalho - sempre lembrando que é admitida a descontinuidade do labor. Ausentes tais premissas, bem assim tendo sido juntados os demais documentos mencionados naquele dispositivo - cujo rol não é taxativo -, poderá configurar-se um início de prova material na medida em que se reportarem à parte do referido lapso temporal.
Estando os documentos em nome de terceiros - que necessariamente deverão estar vinculados de alguma forma à parte-autora -, a ouvida de testemunhas será indispensável à ampliação da eficácia probatória, em atenção à Súmula 149 do STJ.
O labor rurícola, portanto, deve ter um início de prova material a ser complementado por idônea e robusta prova testemunhal, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, e Súmula 149 do STJ. Não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas início de prova material (como notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do ITR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, etc.) que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar. Por isso, o STJ sedimentou o entendimento de que é possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório (Súmula nº 577). Aquela Egrégia Corte também consolidou entendimento no sentido de atribuir efeitos prospectivos ao início de prova material, reconhecendo-lhe (...) eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à data do documento, desde que corroborado por robusta prova testemunhal (AgInt no REsp 1606371/PR, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 20/04/2017).
No que diz respeito aos denominados boias-frias (trabalhadores informais), diante da dificuldade de obtenção de documentos, o STJ firmou entendimento no sentido de que a apresentação de prova material somente sobre parte do período pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por robusta prova testemunhal (REsp nº 1.321.493-PR, submetido à sistemática dos recursos repetitivos).
No caso em tela, para a comprovação da qualidade de segurado especial, o apelante trouxe aos autos:
a) Cópia de sua certidão de nascimento, datada de 29/05/1953, na qual seu pai está qualificado como lavrador (fl. 11);
b) Cópia autenticada de sua ficha de atendimento no Centro de Saúde de Lunardelli/PR em que está qualificado como lavrador e consta o registro de atendimentos realizados em 29/06/2005, 20/05/2010 e 23/07/2010 (fl. 78);
c) Cópia autenticada de seu cadastro de cliente na loja de materiais de construção Confiança, datado de 22/04/2011, em que está qualificado como lavrador (fl. 79); e
d) Cópia autenticada de seu cadastro de cliente na loja Móveis Marques, datado de 18/06/2011, em que está qualificado como lavrador (fl. 80).
Com efeito, em que pese a fragilidade da prova para todo o período de carência, o início da prova material foi corroborado pelos depoimentos em juízo das testemunhas Alcides Sastre da Silva e Paulo Antônio (fl. 92) que foram uníssonas quanto ao trabalho rural exercido pelo autor na condição de diarista/boia-fria. Ambas afirmaram que conheceram o apelante há mais de 10 anos, quando trabalhavam juntos como boias-frias nas fazendas da região. Também disseram que geralmente os donos das fazendas buscavam os trabalhadores com ônibus ou caminhão para levá-los até a lavoura e que, quando não havia transporte, iam a pé. Os depoentes também anuíram que o autor deixou de trabalhar há uns dois anos em razão de dores na coluna.
É entendimento pacífico do STJ de que, em se tratando de trabalhador rural boia-fria, a exigência de início de prova material deve ser abrandada em face de sua peculiar condição e notável dificuldade em portar documentos que comprovem sua condição de segurado especial.
Em igual sentido é o entendimento deste egrégio Tribunal (grifei):
ATIVIDADE RURAL. COMPROVAÇÃO. PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. BOIA-FRIA. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL, COMPLEMENTADA POR PROVA TESTEMUNHAL. 1. Procede o pedido de aposentadoria rural por idade quando atendidos os requisitos previstos nos artigos 11, VII, 48, § 1º e 142, da Lei nº 8.213/91. 2. Comprovado o implemento da idade mínima (sessenta anos para o homem e de cinquenta e cinco anos para a mulher), e o exercício de atividade rural ainda que de forma descontínua por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência, é devido o benefício de aposentadoria rural por idade à parte autora. 3. Tratando-se de trabalhador rural 'boia-fria', a exigência de apresentação de início de prova material para comprovação de tempo de serviço tem sido interpretada com temperamento face à dificuldade de comprovação da atividade, exercida sem qualquer formalidade, pelo próprio desconhecimento dos trabalhadores, sempre pessoas carentes e sem qualquer instrução, permitindo-se, em situações extremas, até mesmo a prova exclusivamente testemunhal. 4. Hipótese em que o mero recolhimento de contribuições como autônomo, sem prova de que efetivamente desenvolvesse atividades urbanas, não descaracteriza a condição de trabalhador rural, tampouco eventual trabalho urbano entre 1997 e 2012, até porque, como sabido, é admitida a descontinuidade, na esteira de precedentes deste Tribunal, desde que comprovado o efetivo retorno às atividades rurais.
(TRF4, EINF 0021292-48.2012.404.9999, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 31/03/2015)
Ora, é fato notório que a situação dos trabalhadores diaristas rurais é exercida sem qualquer formalidade e, até mesmo, constância, já que nessa atividade específica, na maior parte das vezes, não há qualquer contrato formal assinado entre as partes, e, muito menos, registro em carteira do trabalho. O labor em lavoura é deveras sazonal, dependendo de diversos fatores externos, como variações climáticas e intervalos entre plantio e colheita.
No caso em tela, a prova da atividade rural do autor limita-se à prova testemunhal produzida em juízo e, nesse aspecto, as testemunhas foram coerentes entre si. Entendo, portanto, que o autor efetivamente exerceu atividade rural no período equivalente à carência para o benefício pleiteado.
Incapacidade laborativa
Relativamente à incapacidade para o trabalho, a perícia realizada pelo médico do INSS em 24/04/2012 deu conta de que o autor sofreu uma fratura de costela em 09/02/2012 e que "esteve incapaz laboral temporário recuperado em fratura consolidada de arcos costais dir. sem complicações funcionais limitantes" (fl. 40).
Já, na perícia realizada em 15/05/2013 por médico perito judicial, o laudo técnico trouxe as seguintes informações (fls. 63/65):
a) o autor é portador de sequela de fratura ocorrida em fevereiro/2012 nos arcos costais que já se encontrava cicatrizada à época da perícia;
b) apresenta leves/moderadas restrições físicas para atividades que exijam movimentos com o tórax em função de risco de nova fratura, mas existe uma possibilidade de melhora de seu quadro clínico com uso de medicação e fisioterapia;
c) estima-se um comprometimento de 30% da capacidade laboral do autor; e
d) sua incapacidade é parcial e definitiva.
Como se vê, ambos os laudos concluem que a fratura sofrida pelo autor em fevereiro/2012 encontra-se consolidada - segundo o perito do INSS, desde 31/03/2012 (fl. 40), o que justificaria a concessão de auxílio-doença no intervalo de 09/02/2012 (data do acidente) a 31/03/2012. O perito judicial, no entanto, refere a existência de incapacidade parcial com limitações para o trabalho rurícola ou para outras atividades que exijam força física ou movimentos bruscos com o tórax.
O auxílio-acidente é benefício de natureza indenizatória, por dirigir-se a compensar o segurado por perda funcional parcial em decorrência de acidente. Não é cumulável com o benefício de auxílio-doença ou aposentadoria, sendo devido apenas após a consolidação das lesões decorrentes do acidente - o que, no caso, justificaria sua concessão a partir de 01/04/2012.
Termo Inicial
Ainda sobre o auxílio-doença, dispõe o art. 60 da Lei de Benefícios (grifei):
Art. 60. O auxílio-doença será devido ao segurado empregado a contar do décimo sexto dia do afastamento da atividade, e, no caso dos demais segurados, a contar da data do início da incapacidade e enquanto ele permanecer incapaz. (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)
§ 1º Quando requerido por segurado afastado da atividade por mais de 30 (trinta) dias, o auxílio-doença será devido a contar da data da entrada do requerimento.
Na hipótese dos autos, o autor sofreu acidente em 09/02/2012; esteve incapacitado para o labor de 09/02/2012 a 31/03/2012, a partir de quando ficou com sequela definitiva que reduz a sua capacidade laboral (segundo o perito judicial) e requereu o benefício de auxílio-doença em 18/04/2012 (fl. 21).
Por força do disposto no § 1º do art. 60, acima transcrito, entendo que o autor somente faria jus ao benefício de auxílio-doença a contar da data do requerimento administrativo (em 18/04/2012). Porém, nessa data, já não mais apresentava incapacidade temporária para o labor, mas sequelas consolidadas do acidente sofrido em 09/02/2012. Portanto, por aplicação do princípio da fungibilidade, faz jus o demandante ao benefício de auxílio-acidente desde a data do requerimento administrativo do benefício de auxílio-doença (18/04/2012).
De outro lado, não se há cogitar de falta de prévio requerimento administrativo do auxílio-acidente, uma vez que, diante do requerimento administrativo de auxílio-doença, deveria o INSS, ante a constatação de inexistência de incapacidade laboral, ter avaliado a possibilidade de concessão de auxílio-acidente ao demandante, ou seja, ao benefício ao qual ele fazia jus.
Esta Corte tem entendido, em face da natureza pro misero do Direito Previdenciário e calcada nos princípios da proteção social e da fungibilidade dos pedidos (em equivalência ao da fungibilidade dos recursos), não consistir julgamento ultra ou extra petita a concessão de uma aposentadoria diversa da pedida, uma vez preenchidos os requisitos legais. Isso porque o que a parte pretende é a aposentadoria, e este é o seu pedido, mas o fundamento, sim, variável (por incapacidade, por idade, tempo de serviço etc.). Ou seja, o pedido em sede previdenciária é a concessão de benefício, seja qual for a natureza ou fundamento.
A 3ª Seção deste Tribunal, na sessão de 09/06/2005, ao julgar os Embargos Infringentes em AC nº 2000.04.01.107.110-2, Relator para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, entendeu cabível a concessão de aposentadoria por idade ao invés da aposentadoria por tempo de serviço, aquela decorrente de pedido sucessivo postulado na inicial, mas não renovado em sede de apelação, em razão da natureza pro misero do Direito Previdenciário. Decidiu-se que, em sede previdenciária, o pedido é a concessão de uma prestação previdenciária e, o fundamento, a incapacidade, a velhice, o tempo de serviço.
Outro precedente da 3ª Seção deste Tribunal, apreciando situação semelhante e citando os fundamentos do paradigma acima referido, decidiu no mesmo sentido: EI em AC 2002.04.01.014901-3/SC, Rel. Des. Federal Luís Alberto d'Azevedo Aurvalle, DJU 26/10/2005.
Em verdade, seja em face da natureza pro misero que subjaz ao Direito Previdenciário, ou ainda, pela invocação dos princípios jura novit curia e narra mihi factum dabo tibi ius, especialmente importantes em matéria previdenciária, evidencia-se a não violação dos limites da lide quando deferido benefício diverso do formalmente postulado na inicial.
Portanto, faz jus o demandante ao benefício de auxílio-acidente desde a data do requerimento administrativo do auxílio-doença (18/04/2012), devendo o INSS efetuar o pagamento das parcelas em atraso.
Registro, por oportuno, que não há parcelas prescritas, uma vez que a presente demanda foi ajuizada em 28/05/2012.
CONSECTÁRIOS DA CONDENAÇÃO
Correção Monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelo INPC a partir de 04/2006 (Lei nº 11.430/06, que acrescentou o artigo 41-A à Lei nº 8.213/91), conforme decisão do STF no RE nº 870.947, DJE de 20/11/2017, e do STJ no REsp nº 1.492.221/PR, DJe de 20/03/2018.
Juros Moratórios
a) os juros de mora de 1% (um por cento) ao mês serão aplicados a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009;
b) a partir de 30/06/2009, os juros moratórios serão computados de acordo com os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme dispõe o artigo 5º da Lei nº 11.960/09, que deu nova redação ao artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, consoante decisão do STF no RE nº 870.947, DJE de 20/11/2017 e do STJ no REsp nº 1.492.221/PR, DJe de 20/03/2018.
Honorários Advocatícios
Os honorários advocatícios são devidos pelo INSS no percentual de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência, nos termos das Súmulas 111 do STJ e 76 do TRF/4ª Região, respectivamente, verbis:
Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre as prestações vencidas após a sentença.
Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência.
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas processuais no Foro Federal (artigo 4º, I, da Lei n.º 9.289/96), mas não quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF/4ª Região).
Honorários periciais
Sucumbente, deve o INSS suportar o pagamento do valor fixado a título de honorários periciais (fl. 58).
TUTELA ANTECIPADA
Quanto à antecipação dos efeitos da tutela, nas causas previdenciárias deve-se determinar a imediata implementação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do Código de Processo Civil (1973), bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do Código de Processo Civil (2015), independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário (TRF4, Questão de Ordem na AC 2002.71.00.050349-7, Rel. para Acórdão, Des. Federal Celso Kipper, 3ª S., j. 09/08/2007).
Assim sendo, o INSS deverá implantar o benefício concedido no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias.
Na hipótese de a parte-autora já estar em gozo de benefício previdenciário, o INSS deverá implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
Faculta-se à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Em homenagem aos princípios da celeridade e da economia processual, tendo em vista que o INSS vem opondo embargos de declaração sempre que determinada a implantação imediata do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação dos artigos 128 e 475-O, I, do CPC/1973, e 37 da CF, esclareço que não se configura a negativa de vigência a tais dispositivos legais e constitucionais. Isso porque, em primeiro lugar, não se está tratando de antecipação ex officio de atos executórios, mas, sim, de efetivo cumprimento de obrigação de fazer decorrente da própria natureza condenatória e mandamental do provimento judicial; em segundo lugar, não se pode, nem mesmo em tese, cogitar de ofensa ao princípio da moralidade administrativa, uma vez que se trata de concessão de benefício previdenciário determinada por autoridade judicial competente.
PREQUESTIONAMENTO
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto.
CONCLUSÃO
a) apelação: provida para conceder à parte-autora o benefício de auxílio-acidente;
b) de ofício, deferir a antecipação da tutela, determinando a implantação do benefício.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto no sentido de dar provimento à apelação e, de ofício, deferir a tutela antecipada.
Juiz Federal Convocado Oscar Valente Cardoso
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 05/07/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0011448-69.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00008174620128160156
RELATOR | : | Juiz Federal OSCAR VALENTE CARDOSO |
PRESIDENTE | : | Luiz Fernando Wowk Penteado |
PROCURADOR | : | Dr.Marcus Vinícius Aguiar Macedo |
APELANTE | : | JOÃO PEREIRA VIANA |
ADVOGADO | : | Monica Maria Pereira Bichara |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 05/07/2018, na seqüência 114, disponibilizada no DE de 18/06/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E, DE OFÍCIO, DEFERIR A TUTELA ANTECIPADA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal OSCAR VALENTE CARDOSO |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal OSCAR VALENTE CARDOSO |
: | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO | |
: | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA |
Suzana Roessing
Secretária de Turma
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