
Mandado de Segurança (Turma) Nº 5015896-14.2021.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
IMPETRANTE: OTAVIO DA LUZ RAQUEL
IMPETRADO: Juízo Federal da 2ª VF de Caxias do Sul
RELATÓRIO
Otavio da Luz Raquel impetrou mandado de segurança, com pedido de liminar, contra decisão proferida na Carta Precatória n° 5012441-94.2020.4.04.7107, em trâmite na 2ª Vara Federal de Caxias do Sul/RS, que deixou de designar as perícias solicitadas e determinou a devolução do expediente ao juízo deprecante. Atente-se para o teor da decisão:
Trata-se de Carta Precatória remetida a este Juízo a fim de ser realizada perícia na área de engenharia e segurança do trabalho em processo no qual a parte autora postula o reconhecimento do caráter especial de alguns períodos de labor.
Inicialmente, cabe tecer algumas considerações acerca da Recomendação Conjunta nº 01, 15/12/2015, do CNJ, que vem sendo observada em casos como o analisado, e que assim dispõe:
(...). Art. 1º Recomendar aos Juízes Federais e aos Juízes de Direito com competência previdenciária ou acidentária, nas ações judiciais que visem à concessão de benefícios de aposentadoria por invalidez, auxílio-doença e auxílio-acidente e dependam de prova pericial médica, que:
I - ao despacharem a inicial, considerem a possibilidade de, desde logo, determinarem a realização de prova pericial médica, com nomeação de perito do Juízo e ciência à parte Autora dos quesitos a ele dirigidos, facultando-se às partes a apresentação de outros quesitos e indicação de assistentes técnicos, e, se possível, designando data, horário e local para o ato;
II - a citação do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) seja realizada acompanhada de laudo da perícia judicial, possibilitando a apresentação de proposta de acordo ou resposta pela Procuradoria-Geral Federal;
III - priorizem a concentração das perícias, viabilizando a participação da assistência técnica das partes;
IV - também ao despachar a inicial, intimem o INSS para, sempre que possível, fazer juntar aos autos cópia do processo administrativo (incluindo eventuais perícias administrativas) e/ou informes dos sistemas informatizados relacionados às perícias médicas realizadas.
Art. 2º Recomendar aos Juízes Federais, aos Juízes de Direito com competência previdenciária ou acidentária, ao INSS e aos Procuradores Federais que atuam na representação judicial do INSS, nas ações judiciais que visem à concessão de benefícios de aposentadoria por invalidez, auxílio-doença e auxílio-acidente e dependam de prova pericial médica, no quanto respectivamente couber, que:
I - incluam nas propostas de acordo e nas sentenças a Data da Cessação do Benefício (DCB) e a indicação de eventual tratamento médico, sempre que o laudo pericial apontar período para recuperação da capacidade laboral, sem prejuízo de eventual requerimento administrativo para prorrogação do benefício, de cuja análise dependerá a sua cessação, ou de novo requerimento administrativo para concessão de outro benefício;
II - a apresentação de proposta de acordo ou resposta se dê preferencialmente por ocasião da audiência;
III - adotem os quesitos unificados previstos no Anexo, sem prejuízo da indicação de quesitos pelas partes ou pelo juiz da causa.
Art. 3º O Conselho Nacional de Justiça e a Procuradoria Geral Federal manterão grupo de trabalho responsável por monitorar os resultados da presente Recomendação, inclusive no tocante à análise quantitativa e qualitativa das ações propostas. (...).
Denota-se que a referida recomendação, ao sugerir a concentração das perícias, não traduz a possibilidade de um Juízo deprecar a outro, de competência diversa, a realização da prova pericial.
A recomendação é para que os Juízes Federais e Estaduais concentrem a realização das perícias a fim de viabilizar a participação da assistência técnica das partes. A sugestão tem lógica, pois as perícias pertinentes à concessão de benefícios por incapacidade, em regra, são realizadas no prédio sede desta Subseção Judiciária. Assim, com a concentração dos atos atinentes às perícias, facilita-se a atuação do expert e a participação das partes interessadas.
Aliás, este Juízo tem conhecimento acerca de decisões deferindo a realização de perícias da área médica, solicitadas por meio de carta precatória originárias de comarcas estaduais, porém, quando se trata de prova necessária em ações que visam a concessão de benefício por incapacidade.
Na hipótese, verifica-se que o autor da ação requereu o reconhecimento do caráter especial de labor para fins de averbação de acréscimo de tempo decorrente da conversão junto ao INSS e a concessão do benefício de aposentadoria.
Em relação à prova pericial nas ações que a parte autora busca o reconhecimento da especialidade de períodos de atividade com exposição a agentes nocivos à saúde, este Juízo não costuma determinar a realização de prova pericial. A propósito, cabe ressaltar que a Justiça Federal também vem sofrendo contingenciamento de despesas, o que acabou afetando as verbas destinadas ao pagamento de peritos, tornando inviável a realização da prova técnica em questão.
Então, em tais casos, tenho determinado à parte autora que apresente o(s) levantamento(s) de riscos ambientais elaborado(s) pela(s) empresa(s) no(s) lapso(s) em discussão. Não havendo laudo contemporâneo, requisita-se o primeiro levantamento realizado pela ex-empregadora.
Na remota hipótese de a(s) empresa(s) não possui(rem) laudo(s), determina-se a parte autora que apresente laudo de empresa similar com avaliação do setor e das atividades idênticas às descritas no formulário / PPP.
Este Juízo não está a negar apoio ao Juízo Deprecante. Contudo, em regra, não se determina a realização de prova pericial para a comprovação de tempo especial nesta Subseção Judiciária de Caxias do Sul, por convencimento de que cabe à parte autora a devida instrução do feito com a apresentação do(s) laudo(s) da(s) empresa(s) ou de laudo de empresa similar.
Diante do exposto, deixo de designar as perícias solicitadas e determino devolução deste expediente ao Juízo Deprecante, pelo meio mais célere.
Cumpra-se.
O impetrante relatou que ajuizou ação de concessão de aposentadoria junto a 2ª Vara Federal de Jaraguá do Sul/SC, processo que tramita sob o nº 5002748-95.2020.404.7201/SC, no qual foi reconhecido o direito de produzir prova técnico-pericial para os períodos em que trabalhou exposto a agentes insalubres, tendo em vista a incongruência dos perfis profissiográficos previdenciários (PPPs) que foram apresentados pelas empresas. Aduziu que foi, então, expedida carta precatória para o fim de designação e realização perícia, a ser realizada em empresas situadas na Subseção de Caxias do Sul/RS. Referiu que o MM. Juízo deprecado recebeu a carta e, sem intimar a parte interessada, negou-se ao cumprimento do ato, de forma ilegal e injustificada. Argumentou que somente pode ser recusado o cumprimento de uma precatória quando não estiverem presentes os requisitos de forma. Destacou, assim, que é vedado ao juiz deprecado a negativa de cumprimento por motivo de mérito. Postulou fosse determinada a reabertura do processo nº 5012441-94.2020.4.04.7107/RS e o consequente cumprimento da carta precatória para cumprimento das diligências acerca da designação de prova técnico-pericial nas empresas em que o impetrante laborou e que são pertencentes à Subseção Judiciária de Caxias do Sul.
Foi deferido o pedido de liminar, para, com fundamento no art. 7º, III, da Lei 12.016, suspender parcialmente o ato coator até julgamento definitivo do órgão colegiado.
O benefício da gratuidade da justiça foi deferido à conta do que está disposto nos artigos 98 e 99 do CPC.
Notificada, a autoridade impetrada informou que foi determinado o levantamento da baixa da carta precatória para fins de realização das perícias técnicas requeridas (evento 12).
O Ministério Público Federal manifestou-se pelo prosseguimento da tramitação do processo, sem emitir, entretanto, parecer sobre o mérito da pretensão recursal.
VOTO
O mandado de segurança contra decisão judicial é cabível apenas em situações excepcionais, nas quais se constate ilegalidade flagrante e grave, abuso de poder, ou, ainda, a prolação de decisão que se possa qualificar como teratológica. Também, à luz da Lei n.º 12.016 e da Súmula nº 267 do Supremo Tribunal Federal, somente deve ser admitido o mandado de segurança na ausência de possibilidade de impugnação da decisão judicial por recurso com efeito suspensivo ou por meio de correição parcial.
No presente caso, a controvérsia ora posta não se amolda, a princípio, nem no artigo 1.015 do Código de Processo Civil, que prevê as hipóteses de cabimento do agravo de instrumento, nem no art. 164 do Regimento Interno do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que disciplina a correição parcial.
Então, admite-se esta impetração.
Com efeito, o ato ora inquinado de ilegal é a decisão judicial que negou cumprimento à carta precatória, que fora expedida em observância à decisão proferida no evento 33 do procedimento comum n.º 5002748-95.2020.4.04.7201, para a realização de prova pericial.
Assim dispõe o art. 267 do Código de Processo Civil (CPC):
Art. 267. O juiz recusará cumprimento a carta precatória ou arbitral, devolvendo-a com decisão motivada quando:
I - a carta não estiver revestida dos requisitos legais;
II - faltar ao juiz competência em razão da matéria ou da hierarquia;
III - o juiz tiver dúvida acerca de sua autenticidade.
Em regra, cabe ao juízo deprecado dar cumprimento à carta precatória, sem perquirir o motivo ou o mérito da ordem deprecada. As hipóteses que autorizam a recusa de cumprimento da carta estão exaustivamente previstas no art. 267 do CPC (art. 209 do CPC revogado).
Não cabe alegar, para se eximir do cumprimento da carta precatória, a discordância em relação à necessidade e utilidade na realização da prova.
Em resumo, se a carta se reveste dos requisitos formais, se é competente o juízo para seu cumprimento e se este não tiver dúvida a respeito de sua autenticidade, não há fundada justificativa para deixar de cumpri-la.
A Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região já decidiu nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. RECUSA DE CUMPRIMENTO DE CARTA PRECATÓRIA. O juiz somente pode recusar o cumprimento de carta precatória por algum dos motivos previstos no art. 267 do Código de Processo Civil. Precedentes da 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. (TRF4 5013731-91.2021.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 04/05/2021)
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. COMPETÊNCIA DELEGADA DO ART. 109, §3º, DA CF/88. RECUSA AO CUMPRIMENTO DE CARTA PRECATÓRIA PARA REALIZAÇÃO DE PERÍCIA. Não é dado ao Juízo Federal recusar o cumprimento de carta precatória oriunda da Justiça Estadual, no exercício da competência delegada, salvo nas hipóteses previstas no art. 209 do Código de Processo Civil/1973 e 267 do Código de Processo Civil/2015. Precedentes da 3ª Seção. (TRF4 5036863-17.2020.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 25/11/2020)
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. CARTA PRECATÓRIA. RECUSA DE CUMPRIMENTO. HIPÓTESE NÃO ABRANGIDA PELO ARTIGO 267 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. 1. A recusa ao cumprimento de carta precatória deve observar os motivos previstos no artigo 267 do Código de Processo Civil. 2. Precedentes da 3ª Seção deste Tribunal. 3. Não sendo este o caso dos autos, impõe-se o reconhecimento da competência do juízo suscitado. (TRF4 5036637-12.2020.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 28/08/2020)
Em face do que foi dito, voto no sentido de conceder a segurança, nos termos da fundamentação.
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Mandado de Segurança (Turma) Nº 5015896-14.2021.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
IMPETRANTE: OTAVIO DA LUZ RAQUEL
IMPETRADO: Juízo Federal da 2ª VF de Caxias do Sul
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. RECUSA AO CUMPRIMENTO DE CARTA PRECATÓRIA PARA REALIZAÇÃO DE PERÍCIA.
O juiz somente pode recusar o cumprimento de carta precatória por algum dos motivos previstos no art. 267 do Código de Processo Civil. Precedentes da 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, conceder a segurança, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 20 de julho de 2021.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002660266v4 e do código CRC 3d2b8eca.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 13/07/2021 A 20/07/2021
Mandado de Segurança (Turma) Nº 5015896-14.2021.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): EDUARDO KURTZ LORENZONI
IMPETRANTE: OTAVIO DA LUZ RAQUEL
ADVOGADO: GABRIELA SIMOR (OAB RS095145)
IMPETRADO: Juízo Federal da 2ª VF de Caxias do Sul
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 13/07/2021, às 00:00, a 20/07/2021, às 14:00, na sequência 393, disponibilizada no DE de 02/07/2021.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONCEDER A SEGURANÇA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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