
Apelação Cível Nº 5003174-49.2021.4.04.7112/RS
RELATOR Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
RELATÓRIO
O Instituto Nacional do Seguro Social - INSS interpôs recurso de apelação contra sentença, proferida em 30/8/2021, que julgou parcialmente procedente o pedido, nos seguintes termos:
3. DISPOSITIVO
Ante o exposto, defiro a tutela de urgência e julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados na presente ação, resolvendo o mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para o fim de:- declarar que o trabalho, de 01/01/2014 a 16/03/2019, foi prestado em condições especiais e que a parte autora tem direito à sua conversão para tempo comum com acréscimo;- determinar ao INSS que averbe o tempo reconhecido, somando-o ao tempo de serviço/contribuição já admitido administrativamente com eventuais acréscimos cabíveis;- determinar ao INSS que implante, em favor da parte autora, a aposentadoria a que tem direito, conforme reconhecido na fundamentação supra na sistemática de cálculo mais benéfica;- condenar o INSS a pagar as parcelas vencidas e não pagas, decorrentes do direito aqui reconhecido, desde a DER, devidamente acrescidas de correção monetária e juros de mora nos termos da fundamentação.O benefício emergencial previsto no artigo 2º da Lei 13.982/2020 é inacumulável com benefícios previdenciários e assistenciais, razão pela qual haverá de ser feita a compensação de eventuais valores pagos à parte autora a esse título concomitantemente ao benefício aqui concedidoConsoante dispõe o Código de Processo Civil (Lei n.º 13.105/2015), tendo em vista a ausência de sucumbência substancial da parte autora, condeno a parte ré ao pagamento de despesas processuais, inclusive eventuais honorários periciais, que, na hipótese de já terem sido requisitados, via sistema AJG, deverão ser ressarcidos à Seção Judiciária do Rio Grande do Sul.Condeno ainda a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, tendo por base de cálculo o valor devido à parte autora até a data da sentença (Súmulas 111 do STJ e 76 do TRF4). O percentual incidente sobre tal base fica estabelecido no mínimo previsto no § 3º do artigo 85 do CPC, a ser aferido em fase de cumprimento, a partir do cálculo dos atrasados, conforme o número de salários mínimos a que estes correspondam até a data da sentença (inciso II do § 4º do artigo 85 do CPC). Assim, se o valor devido à parte autora, por ocasião da sentença, não ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos, os honorários serão de 10% (dez por cento) sobre os atrasados devidos até então; se for superior a 200 (duzentos) e inferior a 2.000 (dois mil) salários mínimos, os honorários serão de 10% (dez por cento) sobre 200 (duzentos) salários mínimos mais 8% (oito por cento) sobre o que exceder tal montante; e assim por diante.Não há condenação ao pagamento de custas nos termos do artigo 4º, inciso I, da Lei n.º 9.289/1996.Sentença publicada e registrada eletronicamente.Intimem-se.Incabível a remessa necessária, visto que, invariavelmente, as demandas em curso neste Juízo não superam o patamar que dispensa esse mecanismo processual em conformidade com o disciplinado no inciso I do § 3º do artigo 496 do CPC.
O INSS, em suas razões de apelação, impugnou o valor da causa, sustentando que fora atribuído montante excessivo aos supostos danos morais, para fins de deslocamento da competência dos juizados especiais. Sustentou a existência de coisa julgada relativamente à pretensão formulada pela parte autora. Referiu que no processo n. 5005516-43.2015.4.04.7112, a demandante já havia postulado o reconhecimento da especialidade do período de 01/01/2007 a 25/02/2015, o qual foi parcialmente admitido. Defendeu a necessidade de arbitramento dos honorários advocatícios com distribuição de encargos proporcionalmente à sucumbência. Também requereu seja afastado o enquadramento como especial dos intervalos em que a parte esteve em gozo de auxílio-doença.
VOTO
Impugnação ao valor da causa
O valor da causa deve corresponder à quantia correspondente à soma de todos os pedidos (artigo 292, VI, do CPC).
Contudo, diversas ações têm o critério de fixação do valor da causa expressamente estabelecidos na própria legislação (art. 292 do Código de Processo Civil).
O Código de Processo Civil de 2015 possibilita, para contornar a ausência de adequação do valor da indenização pretendida, expressamente a modificação ex officio do valor da causa pelo juiz, quando verificar que não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão ou ao proveito econômico perseguido pelo autor (art. 292, §3º).
Embora as ações indenizatórias, inclusive as fundadas em dano moral, devam ser dimensionadas com base no valor pretendido (art. 292, inciso V, do CPC), a atribuição de montante excessivo abre a oportunidade a que se proceda retificação de ofício do valor da causa, conforme o critério objetivo definido pela jurisprudência da 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Nas ações previdenciárias, o valor atribuído à indenização por dano moral não pode ultrapassar ou, ainda, ser desproporcional às parcelas vencidas e vincendas do benefício previdenciário. Esse é o entendimento reiterado da Terceira Seção deste Tribunal (5026471-62.2013.4.04.0000, Relator Celso Kipper, juntado aos autos em 13/05/2014; 5030391-39.2016.4.04.0000, Relator Paulo Afonso Brum Vaz, juntado aos autos em 08/08/2016; 5030397-46.2016.4.04.0000, Relator Fernando Quadros da Silva, juntado aos autos em 28/09/2017; 5006622-31.2018.4.04.0000, Relator Luz Carlos Canalli, juntado aos autos em 03/04/2018). A título de exemplo, cabe mencionar este acórdão:
CONFLITO DE COMPETÊNCIA. PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. DANO MORAL. VALOR DA CAUSA INFERIOR A 60 SALÁRIOS MÍNIMOS. COMPETÊNCIA. JUIZADO ESPECIAL FEDERAL. RETIFICAÇÃO DE OFÍCIO. POSSIBILIDADE. 1. A Terceira Seção desta Corte manifestou entendimento no sentido de que a condenação por dano moral deve ter como limite o total das parcelas vencidas, acrescidas de doze vincendas, relativas ao benefício pretendido. 2. Consoante a jurisprudência desta Corte, não se admite que a postulação de indenização por danos morais seja desproporcional ao proveito econômico a ser obtido com o resultado da pretensão principal, ou seja, o valor da compensação deve ter como limite o equivalente ao total das parcelas vencidas mais doze vincendas do benefício previdenciário pretendido, ao menos para o fim provisório de adequar o valor da causa, com vistas à fixação da competência para o julgamento do feito. 3. No caso em apreço, o valor da causa, somado o montante relativo à indenização por danos morais, não supera o limite de sessenta salários mínimos na data do ajuizamento da ação, motivo pelo qual a competência para processar e julgar o feito pertence ao Juizado Especial Federal. (TRF4 5030321-22.2016.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 11/04/2017) - Grifei
Ressalvo minha posição pessoal a respeito, inclusive, do arbitramento de valor máximo para o fim de retificação de ofício do valor da causa. Todavia, é esta a orientação ainda vigente na 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que me obrigo a adotar no julgamento da matéria a partir de precedentes originados no referido órgão colegiado anteriores à minha participação.
O que não me parece possível é ir extremadamente além, limitar o pedido da parte, sob o argumento impróprio de que o valor máximo de danos morais atinge na jurisprudência uma quantia determinada e, por este motivo, poderia o juiz intervir para controlar de ofício o valor da causa.
O controle de ofício do valor da causa, a meu ver, não vai ao ponto de autorizar o magistrado a proferir juízo de mérito a respeito da quantificação que entende devida do montante máximo dos danos morais.
Caso concreto
No presente caso, a ação nº 5003174-49.2021.4.04.7112 foi ajuizada, com o seguinte requerimento (evento 1, INIC1):
[...]
57. Isto posto, requer digne-se V. Exa., em: a) Receber a presente, condenando o instituto requerido ao pedido retro; b) Citar o instituto requerido na pessoa do seu procurador, para que conteste, querendo, sob pena de confissão e revelia; c) Condenar o Instituto requerido ao pagamento das custas do processo, honorários pericial, contábil e advocatícios, este a base de 20% sobre o valor das parcelas atrasadas até o julgamento procedente do feito; d) Conceder a gratuidade da justiça, por ser o requerente pobre na acepção legal do termo; e) Condenar o Instituto ao pagamento de indenização pelos danos extrapatrimoniais; f)Pela possibilidade de realização de audiência de conciliação g) Protesta provar o alegado por todos os meios de provas admitidos em lei em especial: Dá-se a causa o valor de R$ 98.096,06
Conforme os cálculos juntados (evento 1, CALC3), o autor cumulou o pedido do pagamento de parcelas vencidas (R$ 36.707,82) e vincendas (R$ 17.388,24) com o pedido de danos morais (R$ 44.000,00), atribuindo à causa o valor total de R$ 98.096,06, quantia que supera sessenta salários mínimos, na data da propositura da ação. É descabida, portanto, a remessa dos autos ao juizado especial federal.
Desta forma, observada a jurisprudência da 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, não se verifica a desproporção no valor dos danos morais que motivam o pedido de indenização.
Coisa julgada
A controvérsia diz respeito à ocorrência da coisa julgada em relação ao pedido de reconhecimento de tempo especial no período de 01/01/2007 a 25/02/2015.
Segundo o artigo 337, §4º, do Código de Processo Civil, há coisa julgada quando se repete ação que já foi decidida por sentença transitada em julgado. Por sua vez, o mesmo artigo, no §2º, estabelece que uma ação é idêntica a outra quando possui as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido.
Araken de Assis (in Processo Civil Brasileiro, v. III Parte Especial: Procedimento Comum - da demanda à coisa julgada; Revista dos Tribunais, 2ª ed. revista e atualizada), transcreve lição de Barbosa Moreira que a define (cf. A eficácia preclusiva da coisa julgada material no sistema do processo civil brasileiro, nº 3, p. 110): "impedimento que surge, com o trânsito em julgado, à discussão e apreciação das questões suscetíveis de influir, por sua solução, no teor do pronunciamento judicial."
E esclarece, na mesma obra acima referida (p. 1.459) o renomado processualista do Rio Grande do Sul:
O propósito manifesto da eficácia preclusiva consiste em aumentar a proteção conferida à regra jurídica concreta formulada na sentença. O vínculo especial derivado da autoridade da coisa julgada impede o juiz de apreciar, outra vez, o objeto litigioso anteriormente julgado, individualizado por seus três elementos - as partes, a causa petendi, e o pedido - considerando as questões suscitadas, debatidas e decididas.
E prossegue:
Ora, a eficácia (ou função) negativa da coisa julgada, ou o veto à discussão e julgamento da repetição do autor, em primeiro lugar revela-se insuficiente para garantir a segurança jurídica do réu vitorioso. Pouca ou quase nenhuma utilidade ostentaria a coisa julgada, estabilizando a regra jurídica concreta formulada pela autoridade judiciária em benefício da paz social, limitando-se a obstar a reprodução de demanda idêntica em processo ulterior (art. 337, §4º). O autor reabriria o conflito, invocando causa petendi preexistente ao julgado - não há dúvida de que a coisa julgada não alcançará fatos supervenientes à última oportunidade de alegação no processo antecedente - e, poderia fazê-lo paulatinamente, submetendo o réu a investidas periódicas, sob o pretexto da falta de identidade total das pretensões. Eis o motivo por que não é aceitável, em princípio, a tese segundo a qual todos os fatos constitutivos concebíveis não constituem premissa necessária do juízo de improcedência.
Com efeito, é a hipótese verificada nos autos.
No caso sob exame, no processo n° 5005516-43.2015.4.04.7112, houve pedido de reconhecimento de atividade especial do período de 01/01/2007 a 25/02/2015, tendo sido julgado parcialmente procedente o pedido.
Naquela ação, foram reconhecidos apenas os intervalos de 01/01/2007 a 07/09/2011 e de 08/09/2011 a 31/12/2013.
Nesta ação, a autora postula a especialidade do período de 01/01/2014 a 16/03/2019.
Logo, parcela do intervalo ora postulado, de 01/01/2014 a 25/02/2015 encontra-se atingido pela coisa julgada.
O intervalo de 26/02/2015 a 16/03/2019 não foi atingido pela coisa julgada.
Portanto, alguns dos interregnos objeto dessa lide já foram pleiteados no outro feito.
Havendo decisão de mérito transitada em julgado sobre a questão antecedente ao reconhecimento da especialidade do tempo de serviço, é inviável a análise de mérito do pedido.
Note-se que o acórdão que manteve a decisão na ação pretérita produz coisa julgada material, já que houve decisão de mérito. A coisa julgada secundum eventum probationis, que ocorre se todos os meios de prova forem esgotados, é admitida em casos excepcionais, expressamente previstos na legislação (art. 103, incisos I e II, do Código de Defesa do Consumidor; art. 18 da Lei nº 4.717/1965; art. 19 da Lei nº 12.016/2009).
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça possui precedentes que reconhecem a possibilidade de renovar ação já decidida por sentença transitada em julgado, com fundamento em novas provas, somente em ações de investigação de paternidade e de desapropriação. Salvo essas exceções, a desconstituição da coisa julgada material exige a propositura de ação rescisória, cujas hipóteses de cabimento são arroladas taxativamente no Código de Processo Civil. Neste sentido, cita-se o seguinte acórdão do STJ:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. AJUIZAMENTO DE AÇÃO ANTERIOR. PEDIDO JULGADO IMPROCEDENTE POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. JUÍZO DE MÉRITO. PRECEDENTES DO STJ. AJUIZAMENTO DE NOVA E IDÊNTICA AÇÃO DE RITO ORDINÁRIO COM A JUNTADA DE DOCUMENTOS. IMPOSSIBILIDADE. ÓBICE DE COISA JULGADA MATERIAL. VIA ADEQUADA PARA DESCONSTITUIÇÃO. AÇÃO RESCISÓRIA. ART. 485, CAPUT, DO CPC. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO. 1. 'Dúvida não há, portanto, de que a insuficiência ou falta de provas acarreta a improcedência do pedido, não a extinção do processo sem julgamento do mérito. Se o autor não consegue provar o fato constitutivo de seu direito, deverá sofrer as conseqüências da ausência ou insuficiência de provas, que invariavelmente será a improcedência de seu pedido, nos termos do art. 269-1, CPC. Em outras palavras, não provado o direito postulado, o julgador deve negar a pretensão, que ocorrerá com o julgamento de mérito do pedido' (REsp 330.172/RJ, Quarta Turma, Rel. Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, DJ 22/4/02). 2. A reversão de julgamento de mérito acobertado pela autoridade da coisa julgada material, nos termos da sistemática processual civil em vigor, reclama o manejo de competente ação rescisória, actio autônoma, a teor do art. 485, caput, do CPC. 3. Recurso especial improvido. (REsp 873.884/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 02/03/2010, DJe 29/03/2010)
Por esses fundamentos, da-se provimento à apelação no ponto.
Cômputo do período em gozo de auxílio-doença como tempo especial
Discute-se sobre a possibilidade do cômputo do tempo em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença previdenciário como tempo de serviço especial.
A 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça julgou o Recurso Especial n° REsp 1.759.098/RS, submetido à sistemática de recursos repetitivos, fixando a seguinte tese (Tema nº 998):
O segurado que exerce atividades em condições especiais, quando em gozo de auxílio-doença, seja acidentário ou previdenciário, faz jus ao cômputo desse mesmo período como tempo de serviço especial.
Eis a ementa do julgado:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL ADMITIDO COMO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 1.036 DO CÓDIGO FUX. POSSIBILIDADE DE CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL, PARA FINS DE APOSENTADORIA, PRESTADO NO PERÍODO EM QUE O SEGURADO ESTEVE EM GOZO DE AUXÍLIO-DOENÇA DE NATUREZA NÃO ACIDENTÁRIA. PARECER MINISTERIAL PELO PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO. RECURSO ESPECIAL DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Até a edição do Decreto 3.048/1999 inexistia na legislação qualquer restrição ao cômputo do tempo de benefício por incapacidade não acidentário para fins de conversão de tempo especial. Assim, comprovada a exposição do segurado a condições especiais que prejudicassem a sua saúde e a integridade física, na forma exigida pela legislação, reconhecer-se-ia a especialidade pelo período de afastamento em que o segurado permanecesse em gozo de auxílio-doença, seja este acidentário ou previdenciário.
2. A partir da alteração então promovida pelo Decreto 4.882/2003, nas hipóteses em que o segurado fosse afastado de suas atividades habituais especiais por motivos de auxílio-doença não acidentário, o período de afastamento seria computado como tempo de atividade comum.
3. A justificativa para tal distinção era o fato de que, nos períodos de afastamento em razão de benefício não acidentário, não estaria o segurado exposto a qualquer agente nocivo, o que impossibilitaria a contagem de tal período como tempo de serviço especial.
4. Contudo, a legislação continuou a permitir o cômputo, como atividade especial, de períodos em que o segurado estivesse em gozo de salário-maternidade e férias, por exemplo, afastamentos esses que também suspendem o seu contrato de trabalho, tal como ocorre com o auxílio-doença não acidentário, e retiram o Trabalhador da exposição aos agentes nocivos. Isso denota irracionalidade na limitação imposta pelo decreto regulamentar, afrontando as premissas da interpretação das regras de Direito Previdenciário, que prima pela expansão da proteção preventiva ao segurado e pela máxima eficácia de suas salvaguardas jurídicas e judiciais.
5. Não se pode esperar do poder judicial qualquer interpretação jurídica que venha a restringir ou prejudicar o plexo de garantias das pessoas, com destaque para aquelas que reinvindicam legítima proteção do Direito Previdenciário. Pelo contrário, o esperável da atividade judicante é que restaure visão humanística do Direito, que foi destruída pelo positivismo jurídico.
6. Deve-se levar em conta que a Lei de Benefícios não traz qualquer distinção quanto aos benefícios auxílio-doença acidentário ou previdenciário. Por outro lado, a Lei 9.032 ampliou a aproximação da natureza jurídica dos dois institutos e o § 6o. do artigo 57 da Lei 8.213 determinou expressamente que o direito ao benefício previdenciário da aposentadoria especial será financiado com os recursos provenientes da contribuição deque trata o art. 22, II da Lei 8.212, cujas alíquotas são acrescidas conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa, alíquotas, estas, que são recolhidas independentemente de estar ou não o Trabalhador em gozo de benefício.
7. Note-se que o custeio do tempo de contribuição especial se dá por intermédio de fonte que não é diretamente relacionada à natureza dada ao benefício por incapacidade concedido ao segurado, mas sim quanto ao grau preponderante de risco existente no local de trabalho deste, o que importa concluir que, estando ou não afastado por benefício movido por acidente do trabalho, o segurado exposto a condições nocivas à sua saúde promove a ocorrência do fato gerador da contribuição previdenciária destinada ao custeio do benefício de aposentadoria especial.
8. Tais ponderações, permitem concluir que o Decreto 4.882/2003 extrapolou o limite do poder regulamentar administrativo, restringindo ilegalmente a proteção exclusiva dada pela Previdência Social ao trabalhador sujeito a condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou a sua integridade física.
9. Impõe-se reconhecer que o segurado faz jus à percepção de benefício por incapacidade temporária, independente de sua natureza, sem que seu recebimento implique em qualquer prejuízo na contagem de seu tempo de atividade especial, o que permite a fixação da seguinte tese: O segurado que exerce atividades em condições especiais, quando em gozo de auxílio-doença, seja acidentário ou previdenciário, faz jus ao cômputo desse mesmo período como tempo de serviço especial.
10. Recurso especial do INSS a que se nega provimento.
(REsp 1759098/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/06/2019, DJe 01/08/2019)
Logo, não há óbice para o cômputo de tempo de atividade especial de períodos em que a segurada esteve em gozo de auxílio-doença.
CONTAGEM DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
TEMPO DE SERVIÇO COMUM
| Data de Nascimento | 04/10/1963 |
|---|---|
| Sexo | Feminino |
| DER | 16/03/2019 |
- Tempo já reconhecido pelo INSS:
Marco Temporal | Tempo | Carência |
Até a data da EC nº 20/98 (16/12/1998) | 7 anos, 1 meses e 9 dias | 80 carências |
Até a data da Lei 9.876/99 (28/11/1999) | 8 anos, 0 meses e 21 dias | 91 carências |
Até a DER (16/03/2019) | 27 anos, 4 meses e 9 dias | 315 carências |
- Períodos acrescidos:
Nº | Nome / Anotações | Início | Fim | Fator | Tempo | Carência |
1 | - | 04/08/1986 | 28/10/1987 | 0.20 | 1 ano, 2 meses e 25 dias | 15 |
2 | - | 19/11/2003 | 31/07/2006 | 0.20 | 2 anos, 8 meses e 12 dias | 33 |
3 | - | 31/08/2006 | 31/12/2006 | 0.20 | 0 anos, 4 meses e 0 dias | 5 |
4 | - | 31/01/2007 | 07/09/2011 | 0.20 | 4 anos, 7 meses e 7 dias | 57 |
5 | - | 08/09/2011 | 31/12/2013 | 0.20 | 2 anos, 3 meses e 23 dias | 27 |
6 | - | 26/02/2015 | 16/03/2019 | 0.20 | 4 anos, 0 meses e 21 dias | 50 |
Marco Temporal | Tempo de contribuição | Carência | Idade | Pontos (Lei 13.183/2015) |
Até a data da EC nº 20/98 (16/12/1998) | 7 anos, 4 meses e 8 dias | 95 | 35 anos, 2 meses e 12 dias | inaplicável |
Pedágio (EC 20/98) | 7 anos, 0 meses e 20 dias | |||
Até a data da Lei 9.876/99 (28/11/1999) | 8 anos, 3 meses e 20 dias | 106 | 36 anos, 1 meses e 24 dias | inaplicável |
Até a DER (16/03/2019) | 30 anos, 4 meses e 29 dias | 502 | 55 anos, 5 meses e 12 dias | 85.8639 |
- Aposentadoria por tempo de serviço / contribuição
Em 16/12/1998 (EC 20/98), a segurada não tem direito à aposentadoria por tempo de serviço, ainda que proporcional (regras anteriores à EC 20/98), porque não cumpre o tempo mínimo de serviço de 25 anos, nem a carência mínima de 102 contribuições.
Em 28/11/1999 (Lei 9.876/99), a segurada não tem direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição (CF/88, art. 201, § 7º, inc. I, com redação dada pela EC 20/98), porque não preenche o tempo mínimo de contribuição de 30 anos e nem a carência de 108 contribuições. Ainda, não tem interesse na aposentadoria proporcional por tempo de contribuição (regras de transição da EC 20/98), porque o pedágio é superior a 5 anos.
Em 16/03/2019 (DER), a segurada tem direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição (CF/88, art. 201, § 7º, inc. I, com redação dada pela EC 20/98). O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei 9.876/99, com a incidência do fator previdenciário, uma vez que a pontuação totalizada (85.86 pontos) é inferior a 86 pontos (Lei 8.213/91, art. 29-C, inc. II, incluído pela Lei 13.183/2015).
Honorários advocatícios
A sucumbência parcial da parte autora, determinada pela improcedência do pedido relativo à indenização por danos morais, impõe a sua condenação ao pagamento da parcela correspondente aos ônus sucumbenciais. Afinal, o valor da indenização postulada corresponde a parcela expressiva do pedido.
Conforme o entendimento da Terceira Seção do Tribunal, o acolhimento do pedido principal e a rejeição da pretensão de pagamento de danos morais implica reconhecimento de sucumbência recíproca (TRF4, Terceira Seção, EINF 5000062-27.2011.404.7014, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, 13/09/2013).
Sucumbência recíproca
Arbitra-se o valor dos honorários de acordo com os percentuais estabelecidos no §3º do art. 85 do CPC, em grau mínimo, uma vez que não houve, na presente demanda, complexidade que justifique a adoção de outro percentual. A base de cálculo dos honorários devidos em favor do INSS deve ser o valor da causa, atualizado monetariamente desde a data do ajuizamento. A base de cálculo dos honorários devidos em favor da parte autora deve ser as parcelas vencidas até a data da sentença, segundo o entendimento da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e da Súmula nº 76 deste Tribunal Regional Federal. Entretanto, a exigibilidade dessa obrigação fica suspensa em relação à parte autora, por força da Gratuidade da Justiça, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC.
Tutela específica
Considerando os termos do que dispõe o art. 497 do CPC, que repete dispositivo constante do art. 461 do antigo CPC, e o fato de que, em princípio, esta decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (TRF4, AC 2002.71.00.050349-7, Terceira Seção, Relator para Acórdão Celso Kipper, D.E. 01/10/2007), o julgado deve ser cumprido imediatamente, observando-se o prazo de trinta dias úteis.
Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
| TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB | |
|---|---|
| Cumprimento | Implantar Benefício |
| NB | 1903069987 |
| Espécie | Aposentadoria por Tempo de Contribuição |
| DIB | 16/03/2019 |
| DIP | Primeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício |
| DCB | |
| RMI | A apurar |
| Segurado Especial | Não |
| Observações | |
Requisite a Secretaria da 5ª Turma o cumprimento desta decisão à CEAB (Central Especializada de Análise de Benefícios).
Conclusão
Dou parcial provimento à apelação do INSS, apenas para extinguir sem exame de mérito o pedido quanto ao período de 01/01/2014 a 25/02/2015, pela formação da coisa julgada e para reconhecer a sucumbência recíproca.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto no sentido de dar parcial provimento à apelação do INSS e, de ofício, determinar a implantação imediata do benefício, por meio da CEAB.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005336162v7 e do código CRC ca7e117e.
Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHOData e Hora: 31/10/2025, às 18:01:53
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Apelação Cível Nº 5003174-49.2021.4.04.7112/RS
RELATOR Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. COISA JULGADA. VALOR DA CAUSA. DANO MORAL. CÔMPUTO DE PERÍODO EM GOZO DE BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE COMO TEMPO ESPECIAL.
1. Quando a pretensão da parte autora se traduz em modificação de julgamento de ação precedente, reconhece-se a existência de coisa julgada, em razão da tríplice identidade de partes, pedido e causa de pedir, relativamente ao período debatido na primeira ação.
2. Nas ações previdenciárias em que há pedido de valores referentes a benefícios previdenciários ou assistenciais cumulado com pedido de indenização por dano moral, o valor da causa deve corresponder à soma dos pedidos (CPC, art. 292, inciso VI), ou seja, às parcelas vencidas do benefício, acrescidas de doze vincendas (CPC, art. 292, §§ 1º e 2º), além do valor pretendido a título de dano moral (CPC, art. 292, inciso V), que não possui necessária vinculação com o valor daquelas e não pode ser limitado de ofício pelo juiz, salvo em casos excepcionais, de flagrante exorbitância, em atenção ao princípio da razoabilidade (Incidente de Assunção de Competência nº 5050013-65.2020.4.04.0000).
3. O segurado que exerce atividades em condições especiais, quando em fruição de auxílio-doença, acidentário ou previdenciário, tem direito ao cômputo desse mesmo período como tempo de serviço especial (Tema 998 do Superior Tribunal de Justiça).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS e, de ofício, determinar a implantação imediata do benefício, por meio da CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de outubro de 2025.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005336163v4 e do código CRC 94b7f39a.
Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHOData e Hora: 31/10/2025, às 18:01:53
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 17/10/2025 A 24/10/2025
Apelação Cível Nº 5003174-49.2021.4.04.7112/RS
RELATOR Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PRESIDENTE Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
PROCURADOR(A) VITOR HUGO GOMES DA CUNHA
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 17/10/2025, às 00:00, a 24/10/2025, às 16:00, na sequência 301, disponibilizada no DE de 08/10/2025.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E, DE OFÍCIO, DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO, POR MEIO DA CEAB.
RELATOR DO ACÓRDÃO Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
Votante Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
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