
Apelação Cível Nº 5008737-58.2020.4.04.7112/RS
RELATOR Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
RELATÓRIO
O Instituto Nacional do Seguro Social - INSS interpôs recurso de apelação contra sentença, proferida em 03/02/2023, que julgou parcialmente procedente o pedido, nos seguintes termos:
Ante o exposto, indefiro a tutela de urgência e julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados na presente ação, resolvendo o mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para o fim de:
- declarar que a parte autora exerceu atividade urbana, de 15/03/1985 a 20/12/1985, 01/03/1986 a 20/12/1986, 01/03/1987 a 20/12/1987, e tem direito ao seu cômputo para os fins previdenciários legalmente cabíveis;- determinar ao INSS que averbe o tempo reconhecido, somando-o ao tempo de serviço/contribuição já admitido administrativamente com eventuais acréscimos cabíveis;- determinar ao INSS que implante, em favor da parte autora, a aposentadoria a que tem direito, conforme reconhecido na fundamentação supra na sistemática de cálculo mais benéfica;- condenar o INSS a pagar as parcelas vencidas e não pagas, decorrentes do direito aqui reconhecido, desde a DER, devidamente acrescidas de correção monetária e juros de mora nos termos da fundamentação.O benefício emergencial previsto no artigo 2º da Lei 13.982/2020 é inacumulável com benefícios previdenciários e assistenciais, razão pela qual haverá de ser feita a compensação de eventuais valores pagos à parte autora a esse título concomitantemente ao benefício aqui concedidoConsoante dispõe o Código de Processo Civil (Lei n.º 13.105/2015), e tendo em vista a sucumbência recíproca das partes, que reputo equivalente, condeno-as ao pagamento de despesas processuais, na proporção de 50% (cinquenta por cento) cada, inclusive eventuais honorários periciais, que, na hipótese de já terem sido requisitados, via sistema AJG, deverão ser ressarcidos à Seção Judiciária do Rio Grande do Sul.Condeno igualmente as partes a arcarem com honorários advocatícios.A parte ré deverá pagar honorários tendo por base de cálculo o valor devido à parte autora até a data da sentença (Súmulas 111 do STJ e 76 do TRF4). Considerando a sucumbência recíproca, o percentual incidente sobre tal base fica estabelecido em metade do mínimo previsto no § 3º do artigo 85 do CPC, a ser aferido em fase de cumprimento, a partir do cálculo dos atrasados, conforme o número de salários mínimos a que estes correspondam até a data da sentença (inciso II do § 4º do artigo 85 do CPC). Assim, se o valor devido à parte autora, por ocasião da sentença, não ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos, os honorários serão de 5% (cinco por cento) sobre os atrasados devidos até então; se for superior a 200 (duzentos) e inferior a 2.000 (dois mil) salários mínimos, os honorários serão de 5% (cinco por cento) sobre 200 (duzentos) salários mínimos mais 4% (quatro por cento) sobre o que exceder tal montante; e assim por diante.Já a parte autora deverá arcar com honorários de 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa (artigo 85, § 2º, do CPC).Contudo, resta suspensa a exigibilidade das condenações, em face da parte autora, por força da gratuidade da justiça, incumbindo ao credor, no prazo assinalado no § 3º do artigo 98 do CPC, comprovar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão do beneplácito.Não há condenação das partes ao pagamento do restante das custas nos termos do artigo 4º, incisos I e II, da Lei n.º 9.289/1996.
O INSS, em suas razões de apelação, arguiu, preliminarmente, a ilegitimidade passiva para averbação do tempo de serviço de aluno-aprendiz. Aduziu que, durante o período em que o autor atuou como aluno-aprendiz, ele estava vinculado a regime próprio de previdência. No mérito, defendeu a inviabilidade da averbação do período de 15/03/1985 a 20/12/1987 como tempo de atividade urbana. Alegou a ausência de comprovação de remuneração e da execução de encomendas a terceiros.
Apresentadas contrarrazões pela parte autora.
VOTO
Ilegitimidade passiva
A legitimidade constitui uma das condições da ação, ao lado do interesse de agir. Neste contexto, a legitimidade passiva se refere à pertinência subjetiva da demanda, ou seja, à identificação do réu como a pessoa que, em tese, deve suportar os efeitos da sentença. Em outras palavras, para que a ação possa ser julgada, é necessário que o autor ajuíze o pedido contra quem, de fato, tem uma relação jurídica com a pretensão deduzida em juízo.
No caso sob exame, verifica-se que, conforme a própria documentação anexada aos autos, notadamente a certidão emitida pela Escola Técnica de Agricultura Dr. João Simplicio Alves de Carvalho, atesta que a instituição era mantida pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul e que, durante o período em que o autor a frequentou, não possuía regime próprio (evento 21, DECL2). Confira-se:

Desse modo, a averbação do tempo de serviço reconhecido deve ser feita no Regime Geral de Previdência Social, e o dever de realizar essa averbação compete ao INSS. Fica, portanto, manifesta sua legitimidade para figurar no polo passivo da presente demanda.
Assim, a apelação deve ser desprovida no ponto.
Tempo de serviço como aluno-aprendiz
O Superior Tribunal de Justiça manifesta o entendimento de que o período em que o estudante frequentou escola industrial ou técnica federal, escolas equiparadas (industrial ou técnica, mantida e administrada pelos Estados ou Distrito Federal, autorizada pelo Governo Federal) ou escolas reconhecidas (industrial ou técnica, mantida e administrada pelos Municípios ou pela iniciativa privada, autorizada pelo Governo Federal), na condição de aluno-aprendiz, pode ser computado para fins previdenciários após o período de vigência do Decreto-Lei nº 4.073/1942, desde que seja possível a contagem recíproca, haja retribuição pecuniária à conta dos cofres públicos, ainda que de forma indireta, e o exercício da atividade seja voltado à formação profissional do estudante (REsp 1676809/CE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 26/09/2017, DJe 10/10/2017; AgRg no REsp 1213358/RS, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 24/05/2016, DJe 02/06/2016; AgRg no REsp 931763/RS, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 01/03/2011, DJe 16/03/2011).
Dessa forma, a averbação como tempo de contribuição do período em que o segurado foi aluno-aprendiz, em princípio, deve observar a Súmula 96 do Tribunal de Contas da União:
Conta-se para todos os efeitos, como tempo de serviço público, o período de trabalho prestado, na qualidade de aluno-aprendiz, em Escola Pública Profissional, desde que comprovada a retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de alimentação, fardamento, material escolar e parcela de renda auferida com a execução de encomendas para terceiros.
Conforme a inteligência dada pela Súmula 96 do TCU, o Decreto-Lei nº 4.073 (Lei Orgânica do Ensino Industrial) permite a contagem do período de aprendizado profissional como tempo de serviço nessas situações:
a) frequência em escolas técnicas ou industriais mantidas por empresas de iniciativa privada, desde que reconhecidas e dirigidas a seus empregados aprendizes, bem como o realizado com base no Decreto nº 31.546, de 6 de outubro de 1952, em curso do Serviço Nacional da Indústria ou Serviço Nacional do Comércio ou instituições por eles reconhecidas, para formação profissional metódica de ofício ou ocupação do trabalhador menor;
b) frequência em cursos de aprendizagem ministrados pelos empregadores a seus empregados em escolas próprias para essa finalidade ou em qualquer outro estabelecimento de ensino industrial;
c) frequência em escolas industriais ou técnicas da rede de ensino federal, escolas equiparadas ou reconhecidas, desde que tenha havido retribuição pecuniária à conta do orçamento respectivo do ente federativo, ainda que fornecida de maneira indireta ao aluno.
A Lei nº 3.552, de 1959, não revogou tacitamente o Decreto-Lei nº 4.073. A lei posterior apenas promoveu a reorganização escolar e administrativa dos estabelecimentos de ensino industrial, sem alterar a natureza e a finalidade dessas instituições de ensino, definidas na Lei Orgânica do Ensino Industrial. A inovação conferida pela Lei nº 3.552 refere-se precipuamente à personalidade jurídica própria e à autonomia didática, técnica, administrativa e financeira dos estabelecimentos de ensino industrial. Assinale-se que, inclusive, a nova lei prevê a autorização para que os alunos executassem encomendas de terceiros, mediante remuneração, e recebessem a contrapartida pelos serviços. Veja-se o teor do art. 32 da Lei nº 3.552:
Art 32. As escolas de ensino industrial, sem prejuízo do ensino sistemático, poderão aceitar encomendas de terceiros, mediante remuneração.
Parágrafo único. A execução dessas encomendas, sem prejuízo da aprendizagem sistemática, será feita pelos alunos, que participarão da remuneração prestada.
O Supremo Tribunal Federal já decidiu que, para o reconhecimento do tempo de serviço como aluno-aprendiz, não basta a percepção de vantagem direta ou indireta, sendo necessário comprovar a efetiva execução do ofício para o qual o aluno recebia instrução, mediante encomendas de terceiros. Nesse sentido:
CONTRADITÓRIO – PRESSUPOSTOS – LITÍGIO – ACUSAÇÃO. O contraditório, base maior do devido processo legal, requer, a teor do disposto no inciso LV do artigo 5º da Constituição Federal, litígio ou acusação, não alcançando os atos sequenciais alusivos ao registro de aposentadoria. PROVENTOS DA APOSENTADORIA – TEMPO DE SERVIÇO – ALUNO-APRENDIZ – COMPROVAÇÃO. O cômputo do tempo de serviço como aluno-aprendiz exige a demonstração da efetiva execução do ofício para o qual recebia instrução, mediante encomendas de terceiros. (MS 31518, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 07/02/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-202 DIVULG 05-09-2017 PUBLIC 06-09-2017)
Agravo regimental no mandado de segurança. 2. Tribunal de Contas da União. 3. Aposentadoria. 4. Cômputo do tempo laborado na condição de aluno-aprendiz. Princípio da segurança jurídica. 5. Impossibilidade da aplicação da nova interpretação da Súmula 96 do TCU, firmada no Acórdão 2.024/2005, às aposentadorias concedidas anteriormente. Precedentes do STF. 6. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada. 7. Agravo regimental a que se nega provimento. (MS 28965 AgR, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 10/11/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-239 DIVULG 25-11-2015 PUBLIC 26-11-2015)
De acordo com essa orientação, os seguintes julgados deste Tribunal Regional Federal:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL. PROVA DA INDISPENSABILIDADE. PROVA TESTEMUNHAL INDEFERIDA. CERCEAMENTO DE DEFESA. TEMPO DE SERVIÇO COMO ALUNO-APRENDIZ. RECONHECIDO. REVISÃO. TUTELA ESPECÍFICA. 1. O indeferimento da prova testemunhal, no caso, configura cerceamento de defesa, devendo ser anulada a sentença para reabertura da instrução processual. 2. Para fins de reconhecimento do tempo de serviço prestado na condição de aluno-aprendiz, é necessária a comprovação dos seguintes requisitos: (1) prestação de trabalho na qualidade de aluno-aprendiz e (2) retribuição pecuniária à conta do orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de (a) alimentação, (b) fardamento, (c) material escolar e (d) parcela de renda auferida com a execução de encomendas por terceiros. Requisitos preenchidos. 3. Determinado o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício concedido ou revisado. (TRF4, AC 5013681-58.2019.4.04.7009, DÉCIMA TURMA, Relatora CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, juntado aos autos em 07/07/2023)
PREVIDENCIÁRIO. ALUNO-APRENDIZ. PROVA DE TRABALHO E REMUNERAÇÃO. 1. Admite-se o cômputo da atividade prestada como aluno-aprendiz, independentemente do recolhimento de contribuições, assim considerada aquela exercida em escola pública profissional ou de ensino federal (escola técnica federal) que, em face do trabalho prestado (vínculo empregatício), recebeu remuneração, mesmo que de forma indireta, à conta do orçamento público. 2. Embora a remuneração possa ser indireta, ela necessariamente deve representar uma contraprestação pela atividade laboral exercida, assim compreendida aquela que, no contexto das escolas técnicas públicas, envolva a execução do ofício para o qual recebia instrução, mediante encomendas de terceiros, comercialização de produtos ou prestação de serviço público. (TRF4, AC 5005738-33.2018.4.04.7200, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relatora ELIANA PAGGIARIN MARINHO, juntado aos autos em 12/07/2023)
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. ALUNO-APRENDIZ. AUSÊNCIA DE PROVA DA RETRIBUIÇÃO PECUNIÁRIA. REAFIRMAÇÃO DA DER. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. 1. Segundo a atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o cômputo do tempo de serviço como aluno-aprendiz exige a demonstração da efetiva execução do ofício, mediante encomendas de terceiros, não bastando a percepção de vantagem indireta (alimentação, alojamento, material escolar, uniformes). 2. A reafirmação da data de entrada do requerimento administrativo (DER), antes inclusive admitida pela administração previdenciária (IN 77/2015), tem lugar também no processo judicial, uma vez verificado o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício, como fato superveniente, após o ajuizamento da ação ou da própria decisão recorrida, de ofício ou mediante petição da parte. 3. Se o segurado se filiou à Previdência Social antes da vigência da EC nº 20/98 e conta tempo de serviço posterior àquela data, deve-se examinar se preenchia os requisitos para a concessão de aposentadoria por tempo de serviço, à luz das regras anteriores à EC nº 20/1998, de aposentadoria por tempo de contribuição pelas regras permanentes previstas nessa Emenda Constitucional e de aposentadoria por tempo de contribuição proporcional ou integral pelas regras de transição, devendo-lhe ser concedido o benefício mais vantajoso. (TRF4, AC 5004280-82.2017.4.04.7113, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 15/12/2020)
PREVIDENCIÁRIO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. TEMPO DE TRABALHO COMO ALUNO-APRENDIZ. CÔMPUTO. POSSIBILIDADE. COMPROVAÇÃO. REQUISITOS PREENCHIDOS. ATIVIDADE RURAL. ATIVIDADE ESPECIAL. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPECIAL. NECESSIDADE DE AFASTAMENTO DA ATIVIDADE ESPECIAL. ART. 57, § 8.º DA LEI 8.213/1991. CONSTITUCIONALIDADE. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TUTELA ESPECÍFICA. 1. Fica suspenso o prazo prescricional durante o trâmite do processo administrativo. 2. O aproveitamento do período de aprendizado profissional em escola técnica como tempo de serviço pressupõe a comprovação de que além da relação de ensino, tenha havido, ainda que sem a devida formalização, relação de emprego entre aluno e estabelecimento. 3. Evidenciado o desempenho de atividade mediante contraprestação, seja por intermédio do recebimento de alimentação, fardamento e material escolar, seja mediante renda auferida com a comercialização de produtos para terceiros, é possível o reconhecimento para fins previdenciários do lapso desempenhado como aluno-aprendiz. 4. Apresentada a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho, o respectivo tempo de serviço especial deve ser reconhecido. 5. Cumprida a carência e demonstrado o exercício de atividades em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física durante o período exigido pela legislação, é devida à parte autora a concessão de aposentadoria especial. 6. No julgamento do RE 791.961/PR, Tema 709 da repercussão geral, o STF reconheceu a constitucionalidade do § 8.º do art. 57 da Lei 8.213/1991, que veda a percepção do benefício de aposentadoria especial pelo segurado que continuar exercendo atividade nociva, ou a ela retornar. A Corte ainda estabeleceu que, nas hipóteses em que o trabalhador continua a exercer o labor especial após a solicitação da aposentadoria, a data de início do benefício e os efeitos financeiros da concessão serão devidos desde a DER. Dessa forma, somente após a implantação do benefício, seja na via administrativa, seja na via judicial, torna exigível o desligamento da atividade nociva, sendo que o retorno voluntário ao trabalho nocivo ou a sua continuidade não implicará a cassação ou cancelamento da aposentadoria, mas sim a cessação de seu pagamento, a ser promovida mediante devido processo legal, incumbindo ao INSS, na via administrativa, oportunizar ao segurado prazo para que regularize a situação. 7. Se o segurado implementar os requisitos para a obtenção de aposentadoria pelas regras anteriores à Emenda Constitucional 20/1998, pelas regras de transição e/ou pelas regras vigentes até a promulgação da Emenda Constitucional 103/2019, poderá inativar-se pela opção que lhe for mais vantajosa. 8. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). (TRF4, AC 5051349-18.2018.4.04.7100, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 07/10/2021)
Exame da atividade exercida na condição de aluno-aprendiz
Esclarece-se, inicialmente, que o magistrado de origem reconheceu que, nos períodos de 15/03/1985 a 20/12/1985, 01/03/1986 a 20/12/1986 e 01/03/1987 a 20/12/1987, o autor exerceu atividade como aluno-aprendiz.
Salienta-se que, embora a "Certidão Aluno Aprendiz" mencione os períodos de 01/03/1985 a 20/12/1985, 01/03/1986 a 20/12/1986 e 01/03/1987 a 20/12/1987 (evento 21, DECL2, p. 1), o juízo singular reconheceu que a data de início da atividade deveria ser fixada em 15/03/1985 (e não 01/03/1985), possivelmente em função de contrato de trabalho registrado na CTPS, cuja data de término ocorreu em 14/03/1985 (evento 1, PROCADM8, p. 3).
Contra o reconhecimento da atividade como aluno-aprendiz, interpôs o INSS o seu recurso de apelação.
Passa-se a examinar a questão.
No caso, para comprovar o tempo de serviço na condição de aluno-aprendiz, foi juntada "Certidão Aluno Aprendiz" (evento 21, DECL2, p. 1), em que consta que o autor frequentou a Escola Técnica de Agricultura (ETA) Dr. João Simplício Alves de Carvalho, nos períodos de 01/03/1985 a 20/12/1985, 01/03/1986 a 20/12/1986 e 01/03/1987 a 20/12/1987.
Consta, expressamente, nesse documento, que "os alunos desempenhavam serviços didáticos e pedagógicos, na execução das atividades práticas dos projetos agrícolas; porém não recebendo remuneração, mas recebiam alojamento coletivo, alimentação, assistência médica e material escolar. Conforme a súmula 96 do TCU art.92, inciso II, da Instrução Normativa INSS/PRES nº45 de 06 de Agosto de 2010." (evento 21, DECL2, p. 1). Por oportuno, apresenta-se excerto desse documento (evento 21, DECL2, p. 1):

Observa-se que também foi juntada declaração da instituição, em que consta que o autor frequentou o Curso Técnico em Pecuária, sendo que "a remuneração indireta que recebia era alimentação, estadia e assistência médica, complementada pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul de forma gratuita, tanto para o sistema de internato como semi-internato." (evento 21, DECL1, p. 2). Nesse sentido, apresenta-se o seguinte excerto (evento 21, DECL1, p. 2):

As declarações escritas firmadas por testemunhas confirmam o teor da certidão emitida pela instituição de ensino no sentido de que não havia remuneração, mas fornecimento de alimentação, moradia e materiais didáticos (evento 56). Ademais, observa-se que as testemunhas também registram que eram realizadas atividades práticas relacionadas com o curso técnico. A título de exemplo, apresentam-se os seguintes excertos:
evento 56, DEPOIM_TESTEMUNHA4:

evento 56, DEPOIM_TESTEMUNHA6:

evento 56, DEPOIM_TESTEMUNHA9:

Além das aulas práticas, salienta-se que uma das testemunhas também destaca que "A produção da Escola era parte utilizada para o próprio consumo e o excedente era vendido em local próprio da Escola." (evento 56, DEPOIM_TESTEMUNHA8, p. 2-3). Por oportuno, apresenta-se o referido excerto (evento 56, DEPOIM_TESTEMUNHA8, p. 2-3):

![]()
Considerando que é mencionado que parte da produção era utilizado na própria escola técnica e parte da produção (excedente) era comercializado com terceiros em local próprio da escola, está preenchido o requisito indicado pelo STF no julgamento do MS 31518/DF, no qual se afirma que "O elemento essencial à caracterização do tempo de serviço como aluno-aprendiz não é a percepção de vantagem direta ou indireta, mas a efetiva execução do ofício para o qual recebia instrução, mediante encomendas de terceiros." (Informativo 853 STF, disponível em http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/download/zip/informativo853.zip)
Assim, tendo como referência os documentos juntados, pode-se concluir que o autor frequentou o Curso Técnico em Pecuária na Escola Técnica de Agricultura (ETA) Dr. João Simplício Alves de Carvalho, nos períodos de 15/03/1985 a 20/12/1985, 01/03/1986 a 20/12/1986 e 01/03/1987 a 20/12/1987. No referido curso, eram desempenhadas atividades teóricas e eram executadas atividades práticas, sendo o excedente comercializado com terceiros. A escola era mantida por meio de recursos públicos, sendo que os valores oriundos da comercialização do excedente possivelmente também eram utilizados para a manutenção da própria instituição.
Estão, portanto, caracterizados os períodos de 15/03/1985 a 20/12/1985, 01/03/1986 a 20/12/1986 e 01/03/1987 a 20/12/1987 como aluno-aprendiz, devendo esses intervalos ser averbados e utilizados como tempo de contribuição e carência.
Honorários advocatícios
Desprovido o recurso interposto pelo réu da sentença de parcial procedência do pedido, devem os honorários de advogado ser majorados, com o fim de remunerar o trabalho adicional do procurador da parte em segundo grau de jurisdição.
Considerada a disposição do art. 85, §11, do Código de Processo Civil (CPC), majora-se em 20% a verba honorária fixada na sentença devida pelo INSS, observados os limites máximos previstos nas faixas de incidência do art. 85, § 3º, do CPC, sem prejuízo daqueles fixados na sentença em seu favor.
Tutela específica
Considerando os termos do que dispõe o art. 497 do CPC, que repete dispositivo constante do art. 461 do antigo CPC, e o fato de que, em princípio, esta decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (TRF4, AC 2002.71.00.050349-7, Terceira Seção, Relator para Acórdão Celso Kipper, D.E. 01/10/2007), o julgado deve ser cumprido imediatamente, observando-se o prazo de trinta dias úteis.
Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
| TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB | |
|---|---|
| Cumprimento | Implantar Benefício |
| NB | |
| Espécie | Aposentadoria por Tempo de Contribuição |
| DIB | |
| DIP | Primeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício |
| DCB | |
| RMI | A apurar |
| Segurado Especial | Não |
| Observações | |
Requisite a Secretaria da 5ª Turma o cumprimento desta decisão à CEAB (Central Especializada de Análise de Benefícios).
Conclusão
Apelação do INSS improvida.
De ofício, determinada a implantação imediata do benefício, por meio da CEAB, e majorados os honorários advocatícios.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto no sentido de negar provimento à apelação do INSS e, de ofício, determinar a implantação imediata do benefício, por meio da CEAB, e majorar os honorários advocatícios.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005372313v21 e do código CRC 2b480c08.
Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHOData e Hora: 30/10/2025, às 16:43:03
Conferência de autenticidade emitida em 06/11/2025 04:09:08.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Apelação Cível Nº 5008737-58.2020.4.04.7112/RS
RELATOR Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. ALUNO-APRENDIZ. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. Segundo a atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o cômputo do tempo de serviço como aluno-aprendiz exige a demonstração da efetiva execução do ofício, mediante encomendas de terceiros, não bastando a percepção de vantagem indireta (alimentação, alojamento, material escolar, uniformes).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e, de ofício, determinar a implantação imediata do benefício, por meio da CEAB, e majorar os honorários advocatícios, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de outubro de 2025.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005372314v7 e do código CRC 06a621cf.
Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHOData e Hora: 30/10/2025, às 16:43:03
Conferência de autenticidade emitida em 06/11/2025 04:09:08.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 17/10/2025 A 24/10/2025
Apelação Cível Nº 5008737-58.2020.4.04.7112/RS
RELATOR Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PRESIDENTE Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
PROCURADOR(A) VITOR HUGO GOMES DA CUNHA
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 17/10/2025, às 00:00, a 24/10/2025, às 16:00, na sequência 337, disponibilizada no DE de 08/10/2025.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E, DE OFÍCIO, DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO, POR MEIO DA CEAB, E MAJORAR OS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
RELATOR DO ACÓRDÃO Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
Votante Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
Conferência de autenticidade emitida em 06/11/2025 04:09:08.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas