Teste grátis agora!
VoltarHome/Jurisprudência Previdenciária

PREVIDENCIÁRIO. PRESTAÇÃO DE SAÚDE. PAZOPANIBE. INCORPORAÇÃO AO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. CONTRACAUTELAS. TRF4. 5071950-69.2023.4.04.7100...

Data da publicação: 13/12/2024, 11:53:11

PREVIDENCIÁRIO. PRESTAÇÃO DE SAÚDE. PAZOPANIBE. INCORPORAÇÃO AO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. CONTRACAUTELAS. 1. O medicamento cloridrato de pazopanibe foi incorporado ao Sistema Único de Saúde (SUS), nos termos da Portaria nº 91, de 27 de dezembro de 2018, do Ministério da Saúde, para tratamento de carcinoma renal de células claras metastático, razão pela qual deve ser deferida judicialmente a sua dispensação. 2. A concessão de fármaco de elevado custo por tempo indeterminado exige a adoção de medidas de contracautela, a fim de garantir o exato cumprimento da decisão judicial, inclusive de ofício. (TRF4, AC 5071950-69.2023.4.04.7100, 5ª Turma, Relator OSNI CARDOSO FILHO, julgado em 27/11/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5071950-69.2023.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

RELATÓRIO

Trata-se de ação ordinária na qual a parte autora obteve sentença de procedência, condenando a parte ré a lhe fornecer o medicamento pazopanibe para tratamento de carcinoma renal de células claras (CID C64), no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), mediante a observância de medidas de contracautela.

Em razões de apelação, a União discorreu acerca da doença que acomete a parte autora e sobre o medicamento por ela solicitado. Apontou ofensa à independência dos poderes o deferimento de outros tratamentos e medicamentos que não foram incluídos nos protocolos, expressa ou tacitamente. Tratou do modo de incorporação de novas tecnologias ao SUS e defendeu que se observe a análise feita pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (CONITEC). Ponderou que a concessão judicial do medicamento depende da demonstração da insuficiência da política pública. Postulou a improcedência da ação e, em caráter subsidiário: a) direcionamento do cumprimento da obrigação ao ente estadual, com ressarcimento pro rata em face da União na via administrativa; b) observância do PMVG (Preço Máximo de Venda ao Governo) com o emprego do CAP (Coeficiente de Adequação de Preços) na aquisição do medicamento; e, c) adoção de medidas de contracautela.

Com contrarrazões, vieram os autos.

VOTO

A Constituição Federal (CF) consagra a saúde como direito fundamental, seja ao contemplá-la como direito social no art. 6º, seja ao estabelecê-la como "direito de todos e dever do Estado", no art. 196. O constituinte assegurou, com efeito, a satisfação desse direito "mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos", bem como o "acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação."

Embora a aplicabilidade imediata das normas definidoras de direitos fundamentais seja imposta já pelo §1º do art. 5º da CF, no caso do direito à saúde, foi editada a Lei nº 8.080, a qual expressamente inclui, no campo de atuação do Sistema Único de Saúde (SUS), a assistência farmacêutica (art. 6º, I, d). Desse modo, a Política Nacional de Medicamentos e Assistência Farmacêutica integra a Política Nacional de Saúde, tendo como finalidade garantir a todos o acesso aos medicamentos necessários, quer interferindo em preços, quer fornecendo gratuitamente as drogas de acordo com as necessidades.

Daí não se depreende, todavia, a existência de direito subjetivo a fornecimento de todo e qualquer medicamento. Afinal, mesmo o direito à saúde, a despeito de sua elevada importância, não constitui um direito absoluto. A pretensão de cada postulante deve ser considerada não apenas sob perspectiva individual, mas também à luz do contexto político e social em que esse direito fundamental é tutelado. Isto é, a proteção do direito à saúde, sob o enfoque particular, não pode comprometer a sua promoção em âmbito coletivo, por meio das políticas públicas articuladas para esse fim.

A denominada “judicialização do direito à saúde” impõe, com efeito, tensões de difícil solução. De um lado, a proteção do núcleo essencial do direito à saúde e do “mínimo existencial” da parte requerente, intimamente ligado à dignidade da pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1º, III). De outro, o respeito ao direito dos demais usuários do SUS e a atenção à escassez e à finitude dos recursos públicos, que se projetam no princípio da reserva do possível. Associado a este problema está, de modo mais amplo, o exame do papel destinado ao Poder Judiciário na tutela dos direitos sociais, conforme a Constituição Federal de 1988, que consagra, como se sabe, tanto a inafastabilidade do acesso à justiça (art. 5º, XXXV) como a separação dos Poderes (art. 2º).

A jurisprudência tem apontado parâmetros para equacionar essa contradição, orientando o magistrado no exame, caso a caso, das pretensões formuladas em juízo. Assume especial relevo, nesse contexto, a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal na Suspensão de Tutela Antecipada nº 175, de relatoria do Min. Gilmar Mendes, após a realização de audiências públicas e amplo debate sobre o tema. Nesse precedente, foi assentado que “esse direito subjetivo público é assegurado mediante políticas sociais e econômicas, ou seja, não há um direito absoluto a todo e qualquer procedimento necessário para a proteção, promoção e recuperação da saúde, independentemente da existência de uma política pública que o concretize” (STA 175 AgR, Relator(a): Min. GILMAR MENDES (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 17/03/2010, DJe-076 DIVULG 29-04-2010 PUBLIC 30-04-2010 EMENT VOL-02399-01 PP-00070).

Assim, cumpre examinar, primeiramente, se existe ou não uma política pública que abranja a prestação pleiteada pela parte. Se referida política existir - isto é, se o medicamento solicitado estiver incluído nas listas de dispensação pública do SUS -, não há dúvida de que o postulante tem direito subjetivo à concessão do fármaco, cabendo ao Poder Judiciário assegurar o seu fornecimento.

Todavia, se o medicamento requerido não constar nas listas de dispensação do SUS, extrai-se, do precedente mencionado, a necessidade de se observar alguns critérios, quais sejam: (a) a inexistência de tratamento ou medicamento similar ou genérico oferecido gratuitamente pelo SUS para a doença ou, no caso de existência, sua utilização sem resultado prático ao paciente ou sua inadequação a ele devido a peculiaridades que apresenta; (b) a adequação e a necessidade do tratamento ou do medicamento pleiteado para a moléstia que acomete o paciente; (c) a aprovação do medicamento pela ANVISA; e (d) a não configuração de tratamento experimental.

Atendidos esses requisitos, o medicamento deve ser concedido. Nessa hipótese, não constitui razão suficiente para indeferi-lo a mera invocação, pelo ente público, do princípio da reserva do possível. Nesse sentido, assentou o Min. Celso de Mello:

Cumpre advertir, desse modo, que a cláusula da "reserva do possível" - ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível - não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se, dolosamente, do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade.

(...) entre proteger a inviolabilidade do direito à vida e à saúde - que se qualifica como direito subjetivo inalienável a todos assegurado pela própria Constituição da República (art. 5º, "caput", e art. 196) - ou fazer prevalecer, contra essa prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, entendo, uma vez configurado esse dilema, que razões de ordem ético-jurídica impõem, ao julgador, uma só e possível opção: aquela que privilegia o respeito indeclinável à vida e à saúde humanas.

(...) a missão institucional desta Suprema Corte, como guardiã da superioridade da Constituição da República, impõe, aos seus Juízes, o compromisso de fazer prevalecer os direitos fundamentais da pessoa, dentre os quais avultam, por sua inegável precedência, o direito à vida e o direito à saúde. (STA 175, Rel. Min. Celso de Mello, DJE 30/04/2010)

Demais, o Superior Tribunal de Justiça apreciou recurso especial repetitivo sobre a matéria (REsp 1657156/RJ, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 25/04/2018, DJe 04/05/2018), arrolando três requisitos para a concessão de medicamento não incluído em ato normativo do SUS, conforme se percebe a seguir:

Tema 106: A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: (i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; (ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; (iii) existência de registro na ANVISA do medicamento.

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento de mérito do Tema nº 1234 (RE 1.366.243, Rel. Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 16/09/2024, DJe 19/09/2024), em regime de repercussão geral, fixou as seguintes teses:

I - Competência

1) Para fins de fixação de competência, as demandas relativas a medicamentos não incorporados na política pública do SUS, mas com registro na ANVISA, tramitarão perante a Justiça Federal, nos termos do art. 109, I, da Constituição Federal, quando o valor do tratamento anual específico do fármaco ou do princípio ativo, com base no Preço Máximo de Venda do Governo (PMVG - situado na alíquota zero), divulgado pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED - Lei 10.742/2003), for igual ou superior ao valor de 210 salários mínimos, na forma do art. 292 do CPC.

1.1) Existindo mais de um medicamento do mesmo princípio ativo e não sendo solicitado um fármaco específico, considera-se, para efeito de competência, aquele listado no menor valor na lista CMED (PMVG, situado na alíquota zero).

1.2) No caso de inexistir valor fixado na lista CMED, considera-se o valor do tratamento anual do medicamento solicitado na demanda, podendo o magistrado, em caso de impugnação pela parte requerida, solicitar auxílio à CMED, na forma do art. 7º da Lei 10.742/2003.

1.3) Caso inexista resposta em tempo hábil da CMED, o juiz analisará de acordo com o orçamento trazido pela parte autora.

1.4) No caso de cumulação de pedidos, para fins de competência, será considerado apenas o valor do(s) medicamento(s) não incorporado(s) que deverá(ão) ser somado(s), independentemente da existência de cumulação alternativa de outros pedidos envolvendo obrigação de fazer, pagar ou de entregar coisa certa.

II - Definição de Medicamentos Não Incorporados

2.1) Consideram-se medicamentos não incorporados aqueles que não constam na política pública do SUS; medicamentos previstos nos PCDTs para outras finalidades; medicamentos sem registro na ANVISA; e medicamentos off label sem PCDT ou que não integrem listas do componente básico.

2.1.1) Conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal na tese fixada no tema 500 da sistemática da repercussão geral, é mantida a competência da Justiça Federal em relação às ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na Anvisa, as quais deverão necessariamente ser propostas em face da União, observadas as especificidades já definidas no aludido tema.

III - Custeio

3) As ações de fornecimento de medicamentos incorporados ou não incorporados, que se inserirem na competência da Justiça Federal, serão custeadas integralmente pela União, cabendo, em caso de haver condenação supletiva dos Estados e do Distrito Federal, o ressarcimento integral pela União, via repasses Fundo a Fundo (FNS ao FES), na situação de ocorrer redirecionamento pela impossibilidade de cumprimento por aquela, a ser implementado mediante ato do Ministério da Saúde, previamente pactuado em instância tripartite, no prazo de até 90 dias.

3.1) Figurando somente a União no polo passivo, cabe ao magistrado, se necessário, promover a inclusão do Estado ou Município para possibilitar o cumprimento efetivo da decisão, o que não importará em responsabilidade financeira nem em ônus de sucumbência, devendo ser realizado o ressarcimento pela via acima indicada em caso de eventual custo financeiro ser arcado pelos referidos entes.

3.2) Na determinação judicial de fornecimento do medicamento, o magistrado deverá estabelecer que o valor de venda do medicamento seja limitado ao preço com desconto, proposto no processo de incorporação na Conitec (se for o caso, considerando o venire contra factum proprium/tu quoque e observado o índice de reajuste anual de preço de medicamentos definido pela CMED), ou valor já praticado pelo ente em compra pública, aquele que seja identificado como menor valor, tal como previsto na parte final do art. 9º na Recomendação 146, de 28.11.2023, do CNJ. Sob nenhuma hipótese, poderá haver pagamento judicial às pessoas físicas/jurídicas acima descritas em valor superior ao teto do PMVG, devendo ser operacionalizado pela serventia judicial junto ao fabricante ou distribuidor.

3.3) As ações que permanecerem na Justiça Estadual e cuidarem de medicamentos não incorporados, as quais impuserem condenações aos Estados e Municípios, serão ressarcidas pela União, via repasses Fundo a Fundo (FNS ao FES ou ao FMS). Figurando somente um dos entes no polo passivo, cabe ao magistrado, se necessário, promover a inclusão do outro para possibilitar o cumprimento efetivo da decisão.

3.3.1) O ressarcimento descrito no item 3.3 ocorrerá no percentual de 65% (sessenta e cinco por cento) dos desembolsos decorrentes de condenações oriundas de ações cujo valor da causa seja superior a 7 (sete) e inferior a 210 (duzentos e dez) salários mínimos, a ser implementado mediante ato do Ministério da Saúde, previamente pactuado em instância tripartite, no prazo de até 90 dias.

3.4) Para fins de ressarcimento interfederativo, quanto aos medicamentos para tratamento oncológico, as ações ajuizadas previamente a 10 de junho de 2024 serão ressarcidas pela União na proporção de 80% (oitenta por cento) do valor total pago por Estados e por Municípios, independentemente do trânsito em julgado da decisão, a ser implementado mediante ato do Ministério da Saúde, previamente pactuado em instância tripartite, no prazo de até 90 dias. O ressarcimento para os casos posteriores a 10 de junho de 2024 deverá ser pactuado na CIT, no mesmo prazo.

IV - Análise judicial do ato administrativo de indeferimento de medicamento pelo SUS

4) Sob pena de nulidade do ato jurisdicional (art. 489, § 1º, V e VI, c/c art. 927, III, §1º, ambos do CPC), o Poder Judiciário, ao apreciar pedido de concessão de medicamentos não incorporados, deverá obrigatoriamente analisar o ato administrativo comissivo ou omissivo da não incorporação pela Conitec e da negativa de fornecimento na via administrativa, tal como acordado entre os Entes Federativos em autocomposição no Supremo Tribunal Federal.

4.1) No exercício do controle de legalidade, o Poder Judiciário não pode substituir a vontade do administrador, mas tão somente verificar se o ato administrativo específico daquele caso concreto está em conformidade com as balizas presentes na Constituição Federal, na legislação de regência e na política pública no SUS.

4.2) A análise jurisdicional do ato administrativo que indefere o fornecimento de medicamento não incorporado restringe-se ao exame da regularidade do procedimento e da legalidade do ato de não incorporação e do ato administrativo questionado, à luz do controle de legalidade e da teoria dos motivos determinantes, não sendo possível incursão no mérito administrativo, ressalvada a cognição do ato administrativo discricionário, o qual se vincula à existência, à veracidade e à legitimidade dos motivos apontados como fundamentos para a sua adoção, a sujeitar o ente público aos seus termos.

4.3) Tratando-se de medicamento não incorporado, é do autor da ação o ônus de demonstrar, com fundamento na Medicina Baseada em Evidências, a segurança e a eficácia do fármaco, bem como a inexistência de substituto terapêutico incorporado pelo SUS.

4.4) Conforme decisão da STA 175-AgR, não basta a simples alegação de necessidade do medicamento, mesmo que acompanhada de relatório médico, sendo necessária a demonstração de que a opinião do profissional encontra respaldo em evidências científicas de alto nível, ou seja, unicamente ensaios clínicos randomizados, revisão sistemática ou meta-análise.

V - Plataforma Nacional

5) Os Entes Federativos, em governança colaborativa com o Poder Judiciário, implementarão uma plataforma nacional que centralize todas as informações relativas às demandas administrativas e judiciais de acesso a fármaco, de fácil consulta e informação ao cidadão, na qual constarão dados básicos para possibilitar a análise e eventual resolução administrativa, além de posterior controle judicial.

5.1) A porta de ingresso à plataforma será via prescrições eletrônicas, devidamente certificadas, possibilitando o controle ético da prescrição, a posteriori, mediante ofício do Ente Federativo ao respectivo conselho profissional.

5.2) A plataforma nacional visa a orientar todos os atores ligados ao sistema público de saúde, possibilitando a eficiência da análise pelo Poder Público e compartilhamento de informações com o Poder Judiciário, mediante a criação de fluxos de atendimento diferenciado, a depender de a solicitação estar ou não incluída na política pública de assistência farmacêutica do SUS e de acordo com os fluxos administrativos aprovados pelos próprios Entes Federativos em autocomposição.

5.3) A plataforma, entre outras medidas, deverá identificar quem é o responsável pelo custeio e fornecimento administrativo entre os Entes Federativos, com base nas responsabilidades e fluxos definidos em autocomposição entre todos os Entes Federativos, além de possibilitar o monitoramento dos pacientes beneficiários de decisões judiciais, com permissão de consulta virtual dos dados centralizados nacionalmente, pela simples consulta pelo CPF, nome de medicamento, CID, entre outros, com a observância da Lei Geral de Proteção da Dados e demais legislações quanto ao tratamento de dados pessoais sensíveis.

5.4) O serviço de saúde cujo profissional prescrever medicamento não incorporado ao SUS deverá assumir a responsabilidade contínua pelo acompanhamento clínico do paciente, apresentando, periodicamente, relatório atualizado do estado clínico do paciente, com informações detalhadas sobre o progresso do tratamento, incluindo melhorias, estabilizações ou deteriorações no estado de saúde do paciente, assim como qualquer mudança relevante no plano terapêutico.

VI - Medicamentos incorporados

6) Em relação aos medicamentos incorporados, conforme conceituação estabelecida no âmbito da Comissão Especial e constante do Anexo I, os Entes concordam em seguir o fluxo administrativo e judicial detalhado no Anexo I, inclusive em relação à competência judicial para apreciação das demandas e forma de ressarcimento entre os Entes, quando devido.

6.1) A(o) magistrada(o) deverá determinar o fornecimento em face de qual ente público deve prestá-lo (União, estado, Distrito Federal ou Município), nas hipóteses previstas no próprio fluxo acordado pelos Entes Federativos, anexados ao presente acórdão.

Na mesma linha de orientação, foram formuladas pelo Supremo Tribunal Federal as teses no âmbito do Tema nº 6 da repercussão geral (RE 566471, Rel. Ministro Marco Aurélio, Tribunal Pleno, julgado em 20/09/2024, DJe 30/09/2024):

1. A ausência de inclusão de medicamentos nas listas de dispensação do Sistema Único de Saúde - SUS (RENAME, RESME, REMUNE, entre outras) impede, como regra geral, o fornecimento do fármaco por decisão judicial, independentemente do custo.

2. É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento registrado na ANVISA, mas não incorporado às listas de dispensação do Sistema Único de Saúde, desde que preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos, cujo ônus probatório incumbe ao autor da ação:

(a) negativa de fornecimento do medicamento na via administrativa, nos termos do item "4" do Tema 1.234 da repercussão geral;

(b) ilegalidade do ato de não incorporação do medicamento pela Conitec, ausência de pedido de incorporação ou da mora na sua apreciação, tendo em vista os prazos e critérios previstos nos artigos 19-Q e 19-R da Lei n° 8.080/1990 e no Decreto n° 7.646/2011;

(c) impossibilidade de substituição por outro medicamento constante das listas do SUS e dos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas;

(d) comprovação, à luz da medicina baseada em evidências, da eficácia, acurácia, efetividade e segurança do fármaco, necessariamente respaldadas por evidências científicas de alto nível, ou seja, unicamente ensaios clínicos randomizados e revisão sistemática ou meta-análise;

(e) imprescindibilidade clínica do tratamento, comprovada mediante laudo técnico fundamentado, descrevendo inclusive qual o tratamento já realizado; e

(f) incapacidade financeira de arcar com o custeio do medicamento.

3. Sob pena de nulidade da decisão judicial, nos termos do artigo 489, §1°, incisos V e VI, e artigo 927, inciso III, §1°, ambos do Código de Processo Civil, o Poder Judiciário, ao apreciar pedido de concessão de medicamentos não incorporados, deverá obrigatoriamente:

(a) analisar o ato administrativo comissivo ou omissivo de não incorporação pela Conitec ou da negativa de fornecimento da via administrativa, à luz das circunstâncias do caso concreto e da legislação de regência, especialmente a política pública do SUS, não sendo possível a incursão no mérito do ato administrativo;

(b) aferir a presença dos requisitos de dispensação do medicamento, previstos no item 2, a partir da prévia consulta ao Núcleo de Apoio Técnico do Poder Judiciário (NATJUS), sempre que disponível na respectiva jurisdição, ou a entes ou pessoas com expertise técnica na área, não podendo fundamentar a sua decisão unicamente em prescrição, relatório ou laudo médico juntado aos autos pelo autor da ação; e

(c) no caso de deferimento judicial do fármaco, oficiar aos órgãos competentes para avaliarem a possibilidade de sua incorporação no âmbito do SUS.

As teses acima descritas, inclusive, foram transformadas em enunciados de súmula vinculante, na forma do art. 103-A da Constituição Federal:

Súmula vinculante nº 60 - O pedido e a análise administrativos de fármacos na rede pública de saúde, a judicialização do caso, bem ainda seus desdobramentos (administrativos e jurisdicionais), devem observar os termos dos 3 (três) acordos interfederativos (e seus fluxos) homologados pelo Supremo Tribunal Federal, em governança judicial colaborativa, no tema 1.234 da sistemática da repercussão geral (RE 1.366.243).

Súmula vinculante nº 61 - A concessão judicial de medicamento registrado na ANVISA, mas não incorporado às listas de dispensação do Sistema Único de Saúde, deve observar as teses firmadas no julgamento do Tema 6 da Repercussão Geral (RE 566.471).

Deduzidas essas considerações sobre a questão de fundo, passa-se ao exame do mérito.

Conforme laudo médico acostado ao processo originário (evento 1, LAUDO5), firmado por oncologistas vinculados a entidade registrada no Ministério da Saúde como Centro de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (CACON), a parte autora é portadora de neoplasia maligna de rim (CID C64), com metástases, de modo que o remédio requerido se destina a retardar a progressão da lesão.

Em síntese, o paciente necessita do tratamento por correr risco de evolução de sua doença com complicações e eventual condução a óbito precoce.

Sempre que há a discussão sobre tratamentos, medicamentos e outras tecnologias em saúde, o requerente deve cumprir ônus probatório para convencer o juiz da existência de evidência científica quanto ao resultado pretendido.

Sobreleva, nessa ordem de ideias, o valor probatório de documentos e outros elementos que digam respeito casuístico à situação médica daquele que busca em juízo a tutela do direito à saúde.

Faculta-se, inclusive, a realização de parecer técnico junto aos órgãos de assessoramento técnico do Poder Judiciário (Núcleo de Apoio Técnico do Poder Judiciário - NATJUS).

Nessa linha, o enunciado n.º 18 aprovado na I Jornada de Direito da Saúde do Conselho Nacional de Justiça prescreve:

ENUNCIADO Nº 18

Sempre que possível, as decisões liminares sobre saúde devem ser precedidas de notas de evidência científica emitidas por Núcleos de Apoio Técnico em Saúde -NATS.

Foi produzida nota técnica no processo originário (evento 18, NOTATEC1), com a seguinte conclusão:

(...)

4.10 Justificativa para Prescrição

A parte autora apresenta laudo médico informando o diagnóstico de carcinoma de células claras renais, em julho de 2015. Foi inicialmente tratado com cirurgia (nefrectomia direita), sem evidência de doença metastática naquele momento. Seguiu em acompanhamento médico e em 2021 foi diagnosticada progressão da doença em pâncreas. Foi submetido a nova cirurgia (pancreatectomia com esplenectomia), que confirmou o diagnóstico. Em julho de 2023, foi novamente diagnosticado com lesões metastáticas (em pâncreas, pulmão e fígado). Neste contexto, pleiteia tratamento com o medicamento pazopanibe.

(...)

A doença à distância deve ser tratada com terapias sistêmicas que consistem de citocinas (interferona alfa e interleucina-2), quimioterapia citotóxica (5-fluorouracil, capecitabina, doxorrubicina, gemcitabina e vinblastina), antiangiogênicos (pazopanibe, sunitinibe, sorafenibe e bevacizumabe) e inibidores da via de sinalização mTOR (everolimo e tensirolimo) (3–6). Inexistem estudos comparativos diretos que permitam asseverar em definitivo a eficácia de cada um dos medicamentos sistêmicos disponíveis, havendo apenas indicação de maior índice terapêutico para antiangiogênicos ou inibidores mTOR frente ao uso de placebo ou interferona, a um custo elevado para os sistemas de saúde, e de quimioterapia citotóxica no câncer renal com diferenciação sarcomatoide.

O tratamento de pacientes com metástase pode envolver uma combinação de medicamentos, estando entre eles, recomendado pela CONITEC como primeira linha, o pazopanibe ou o sunitibe. (5, 7).

(...)

6.1 Efetividade, eficácia e segurança:

O pazopanibe é um inibidor de múltiplas tirosina-quinases, ativo contra receptores de VEGF, PDGF e c-kit, que são importantes para a sinalização da angiogênese tumoral (8). Dessa forma, sua atividade tumoral ocorre por diminuição da formação de vasos no tumor, diminuindo a sobrevivência e a disseminação das células malignas.

Ensaio clínico randomizado, duplo-cego, comparou pazopanibe (n=290) com placebo (n=145) (9). Foram incluídos pacientes com carcinoma renal de células claras com capacidade funcional preservada (ECOG 0 ou 1). O desfecho primário foi tempo livre de progressão. Caso ocorresse progressão, o cegamento era quebrado e os pacientes poderiam receber alguma terapia ativa (podendo ser pazopanibe) à critério médico. No grupo placebo, 66% dos pacientes tiveram que receber uma nova terapia, enquanto que no grupo intervenção 30%. Estimada por análise estatística post-hoc, considerando aqueles pacientes que migraram do grupo placebo para o grupo tratamento, constatou-se ganho de sobrevida livre de progressão da doença com o uso do pazopanibe (9,7 versus 7,4 meses), com razão de riscos aferida em 0,5 (IC95% de 0,315 a 0,762; P=0,002). Provavelmente em função da possibilidade de os pacientes passarem a receber medicamento ativo após progressão da doença não foi verificada diferença em sobrevida global entre pazopanibe e placebo (22,9 vs. 20,5 meses respectivamente; HR 0,91; IC95% de 0,71 a 1,16; P=0,224). U

m segundo ensaio clínico randomizado, aberto, de fase 3, avaliou a não inferioridade do pazopanibe versus o sunitinibe (10). Para isso, foram incluídos pacientes, maiores de 18 anos de idade, com diagnóstico de carcinoma renal de células claras metastático que não foram submetidos a nenhum tratamento prévio e com performance funcional de pelo menos Karnofsky 70 (ECOG 0-1). O desfecho primário foi sobrevida livre de progressão da doença. Pazopanibe e sunitinibe apresentaram sobrevida livre de progressão dentro da margem de não inferioridade. Entretanto, houve maior incidência de efeitos adversos no grupo que utilizou sunitinibe (10).

Haaland e colaboradores (2014) conduziram uma revisão sistemática com metanálise para comparar a eficácia e a segurança de bevacizumabe, pazopanibe ou sunitinibe no tratamento de carcinoma renal de células claras metastático. Foi realizada comparação indireta dos quatro principais ensaios clínicos, cujos desfechos primários foram sobrevida global, sobrevida livre de progressão e taxa de resposta (11). Na comparação pazopanibe versus interferona, o pazopanibe prolongou sobrevida global (HR 0,74, IC95% de 0,57 a 0,97), sobrevida livre de progressão da doença (HR 0,56, IC95% de 0,42 a 0,76) e taxa de resposta (OR 8,51, IC95% de 5,2 a 13,93) (11).

6.2 Benefício/efeito/resultado esperado da tecnologia: aumento de sobrevida livre de progressão em comparação ao placebo.

(...)

6.3 Conclusão técnica: favorável.

6.4 Justificativa:

Existe evidência de boa qualidade metodológica que comprova a eficácia e segurança do uso de pazopanibe para o tratamento do câncer de rim de subtipo células claras com aumento de sobrevida livre de progressão e com possível ganho de sobrevida global.

A razão incremental de custo-efetividade, apesar de elevada (duas vezes o nosso PIB per capita), está dentro do limiar máximo (três vezes o PIB per capita) usualmente recomendado na literatura. Ademais, a CONITEC avaliou o uso desse medicamento para essa condição e, após análise dos resultados, consulta pública e debate em plenário, emitiu decisão de recomendação de incorporação do medicamento no sistema público para esse cenário clínico.

No mesmo sentido, é possível constatar, em consulta efetuada ao Sistema Nacional de Pareceres e Notas Técnicas (e-NatJus), constituído de acordo com o Provimento nº 84/2019 do Conselho Nacional de Justiça, que têm prevalecido avaliações técnicas favoráveis à proposição de pazopanibe em circunstâncias similares aos autos. Destacam-se as Notas Técnicas nº 2376401, nº 2406522 e nº 2401673.

Observa-se que a parte autora possui diagnóstico sugestivo de carcinoma renal de células claras metástastico.

A propósito, cumpre observar que, nos dias 07 e 08 de novembro de 2018, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS - CONITEC, em sua 72ª reunião ordinária, recomendou a incorporação do cloridrato de pazopanibe e do malato de sunitinibe para carcinoma renal de células claras metastático.4

Como revela o relatório, a recomendação realizada pelo órgão técnico é dirigida especificamente ao carcinoma renal de células claras metastático, o que é o caso dos autos.

A incorporação foi levada a efeito pela Portaria nº 91, de 27 de dezembro de 2018, do Ministério da Saúde5, por conta da recomendação da CONITEC, o que corrobora o direito subjetivo da parte autora à concessão do medicamento pleiteado.

Portanto, o diagnóstico e a correspondente prescrição médica, firmados por entidade hospitalar qualificada como CACON, seguem diretrizes clínicas do próprio sistema público de saúde.

Foi estipulado prazo máximo de oferta pelo SUS de cento e oitenta dias:

O SECRETÁRIO DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INSUMOS ESTRATÉGICOS DO MINISTÉRIO DA SAÚDE, no uso de suas atribuições legais e com base nos termos dos art. 20 e art. 23 do Decreto 7.646, de 21 de dezembro de 2011, resolve:

Art.1º Incorporar o cloridrato de pazopanibe e malato de sunitinibe para carcinoma renal de células claras metastático, mediante negociação de preço e conforme o modelo da Assistência Oncológica no SUS, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS.

Art.2º Conforme determina o art. 25 do Decreto 7.646/2011, o prazo máximo para efetivar a oferta pelo SUS é de cento e oitenta dias.

Art.3º O relatório de recomendação da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (CONITEC) sobre essas tecnologias estará disponível no endereço eletrônico: http://conitec.gov.br/.

Art.4º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.

Esse prazo venceu em 26 de junho de 2019.

Embora o pazopanibe tenha sido incorporado ao SUS para tratamento de carcinoma renal de células claras metastático pela Portaria nº 91, de 27 de dezembro de 2018, a certidão negativa acostada aos autos originários demonstra que ainda não está disponível. Não se trata de justificativa razoável para o indeferimento do pedido, em face de notória ampliação da política pública.

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região firmou jurisprudência favorável à dispensação, a exemplo dos seguintes arestos:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. PAZOPANIBE. CARCINOMA RENAL DE CÉLULAS CLARAS. INCORPORADO AO SUS. TUTELA PROVISÓRIA. VIABILIDADE. FIXAÇÃO DE CONTRACAUTELAS. (...). 3. O medicamento Pazopanibe, por apresentar impacto na sobrevida livre de progressão e por ter sido incorporado no âmbito do SUS, torna-se, com base na Medicina Baseada em Evidências, imprescindível para o tratamento de Carcinoma Renal de Células Claras. 4. Necessária a fixação de medidas de contracautelas, considerando que a dispensação do medicamento foi deferida por tempo largo. (TRF4, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5043575-18.2023.4.04.0000, 5ª Turma, Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 01/03/2024)

DIREITO À SAÚDE.FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. IMPRESCINDIBILIDADE DO MEDICAMENTO DEMONSTRADA. PAZOPANIBE. CÂNCER DE RIM METASTÁTICO. MEDICAMENTO INCORPORADO AO SUS.CUMPRIMENTO/FORNECIMENTO. (...) 3. Considerando tratar-se de medicamento com decisão de incorporação ao SUS e comprovada sua imprescindibilidade e adequação ao caso concreto, a parte faz jus ao seu fornecimento pelo Poder Público. (...) (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5003880-76.2023.4.04.7010, 10ª Turma, Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 20/03/2024)

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PRESTAÇÃO DE SAÚDE. PAZOPANIBE. INCORPORAÇÃO AO SUS. SOLIDARIEDADE PASSIVA. RESPONSABILIDADE FINANCEIRA. CONTRACAUTELAS. PRAZO. 1. O Cloridrato de Pazopanibe foi incorporado ao Sistema Único de Saúde (SUS), nos termos da Portaria nº 91, de 27 de dezembro de 2018, do Ministério da Saúde, para o tratamento de carcinoma renal de células claras metastático. 2. Não obstante a dispensação de medicação oncológica seja exigível dos réus solidariamente, cabe à União o ressarcimento administrativo integral das despesas eventualmente promovidas pelos demais litisconsortes. 3. A concessão de fármaco de elevado custo por tempo indeterminado exige a adoção de medidas de contracautela, a fim de garantir o exato cumprimento da decisão judicial, inclusive de ofício. 4. O prazo de 15 (quinze) dias é razoável para a satisfação ordinária de medida antecipatória em matéria de saúde. (TRF4, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5042765-43.2023.4.04.0000, 5ª Turma, Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 03/03/2024)

DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. PAZOPANIBE. NEOPLASIA MALIGNA RENAL INEFICÁCIA DA POLÍTICA PÚBLICA. EFICÁCIA E ADEQUAÇÃO DO MEDICAMENTO. INCOPORAÇÃO AO SUS. CONCESSÃO JUDICIAL DO FÁRMACO POSTULADO. POSSIBILIDADE. ATRIBUIÇÕES. CUSTEIO. RESSARCIMENTO. Tratando-se de adoção de uma política pública de saúde, caberá aos profissionais de saúde, dentro de suas melhores convicções profissionais, tomarem as decisões que espelhem os interesses de toda a Sociedade. Não há razoabilidade em se admitir a opinião isolada de um único médico, sem que se aponte erro na política pública, com suficiente e racional fundamentação e com enfrentamento das informações que subsidiaram a decisões públicas. Considerando que a CONITEC reconheceu haver vantagem terapêutica no uso da tecnologia, que foi integrada ao rol da assistência farmacêutica do SUS para tratamento da patologia que acomete à parte autora, confirmando a adequação e a pertinência do pedido, cabível a dispensação do fármaco. (...) (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5009980-50.2023.4.04.7009, 10ª Turma, Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 20/12/2023)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO ONCOLÓGICO. NEOPLASIA MALIGNA DO RIM. PAZOPANIBE 400MG. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO. TEMA 1.234/STF. (...) Hipótese em que demonstrada a adequação do tratamento com pazopanibe para carcinoma renal, diante da incorporação ao SUS por meio da Portaria nº 91/2018 do Ministério da Saúde. (...) (TRF4, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5028501-21.2023.4.04.0000, 6ª Turma, Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 09/11/2023)

É a hipótese, portanto, de confirmar a sentença, com base nas normas constitucionais que garantem o direito à saúde como dever do Estado.

O pedido subsidiário pertinente ao Preço Máximo de Venda ao Governo (PMVG) não merece conhecimento, diante de ausência de interesse recursal, uma vez que a sentença não apresenta disposição em sentido contrário.

CONTRACAUTELAS

Justifica-se, mesmo de ofício, a estipulação de contracautelas. Neste aspecto, em acréscimo àquelas já fixadas na decisão recorrida, cumpre determinar que, em se tratando de medicamento oncológico, a aquisição, armazenamento e dispensação devem ser realizadas por instituição de saúde vinculada ao SUS.

A entrega da medicação ao paciente deverá ser realizada através da unidade oncológica onde é realizado o tratamento, mediante a renovação periódica da prescrição médica. Assim, cumpre determinar à parte ré o fornecimento da medicação, na forma prescrita, em serviço de saúde integrante da Rede de Atenção Oncológica, onde a parte autora recebe atendimento.

Nessa linha, o enunciado da Súmula nº 99 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

A dispensação de medicamento oncológico, judicialmente determinada, far-se-á exclusivamente por estabelecimentos de saúde credenciados junto à Rede de Atenção Oncológica - CACON ou UNACON.

Deverá a parte ré assegurar a renovação do estoque do medicamento em tempo hábil a partir da apresentação do respectivo receituário médico no âmbito do SUS. Enquanto demonstrado o sucesso da terapia no controle da progressão da doença, descabe restringir a obtenção do medicamento, condicionada, é claro, à avaliação contínua da evolução do tratamento.

A parte autora deve informar imediatamente a suspensão ou interrupção do tratamento, e devolver, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, os medicamentos e insumos excedentes ou não utilizados, a contar da suspensão ou interrupção do tratamento.

CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO

O Supremo Tribunal Federal, no dia 23 de maio de 2019, fixou a seguinte tese de repercussão geral (Tema 793):

Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), nessa linha, enunciou na II Jornada de Direito da Saúde:

60 – Saúde Pública - A responsabilidade solidária dos entes da Federação não impede que o Juízo, ao deferir medida liminar ou definitiva, direcione inicialmente o seu cumprimento a um determinado ente, conforme as regras administrativas de repartição de competências, sem prejuízo do redirecionamento em caso de descumprimento.

O financiamento dos medicamentos oncológicos ocorre por intermédio de APAC-Oncologia (Autorização para Procedimento de Alta Complexidade), cujo custeio é federal, conforme dispõem a Portaria 876/2013 (art. 8º, II) e a Portaria de Consolidação 6/2017 (artigos 173 a 175), ambas do Ministério da Saúde.

Os estabelecimentos credenciados podem adotar o esquema terapêutico que consideram mais eficiente para o quadro clínico do paciente e, posteriormente, são ressarcidos pelo sistema de APAC-Onco. O valor de cada APAC é delimitado pelo SUS (Sistema Único de Saúde) de acordo com um código específico para cada tipo de neoplasia, estadiamento e linha de tratamento.

Assim, incumbe integralmente à União o custeio de medicamento oncológico, com ressarcimento administrativo integral dos custos eventualmente despendidos pelos litisconsortes.

Em 16 de setembro de 2024, no julgamento do Recurso Extraordinário 1.366.243, o Supremo Tribunal Federal mais uma vez examinou a questão e estabeleceu em tese de repercussão geral (Tema 1234):

III - Custeio

3) As ações de fornecimento de medicamentos incorporados ou não incorporados, que se inserirem na competência da Justiça Federal, serão custeadas integralmente pela União, cabendo, em caso de haver condenação supletiva dos Estados e do Distrito Federal, o ressarcimento integral pela União, via repasses Fundo a Fundo (FNS ao FES), na situação de ocorrer redirecionamento pela impossibilidade de cumprimento por aquela, a ser implementado mediante ato do Ministério da Saúde, previamente pactuado em instância tripartite, no prazo de até 90 dias.

3.1) Figurando somente a União no polo passivo, cabe ao magistrado, se necessário, promover a inclusão do Estado ou Município para possibilitar o cumprimento efetivo da decisão, o que não importará em responsabilidade financeira nem em ônus de sucumbência, devendo ser realizado o ressarcimento pela via acima indicada em caso de eventual custo financeiro ser arcado pelos referidos entes.

3.2) Na determinação judicial de fornecimento do medicamento, o magistrado deverá estabelecer que o valor de venda do medicamento seja limitado ao preço com desconto, proposto no processo de incorporação na Conitec (se for o caso, considerando o venire contra factum proprium/tu quoque e observado o índice de reajuste anual de preço de medicamentos definido pela CMED), ou valor já praticado pelo ente em compra pública, aquele que seja identificado como menor valor, tal como previsto na parte final do art. 9º na Recomendação 146, de 28.11.2023, do CNJ. Sob nenhuma hipótese, poderá haver pagamento judicial às pessoas físicas/jurídicas acima descritas em valor superior ao teto do PMVG, devendo ser operacionalizado pela serventia judicial junto ao fabricante ou distribuidor.

(...)

3.4) Para fins de ressarcimento interfederativo, quanto aos medicamentos para tratamento oncológico, as ações ajuizadas previamente a 10 de junho de 2024 serão ressarcidas pela União na proporção de 80% (oitenta por cento) do valor total pago por Estados e por Municípios, independentemente do trânsito em julgado da decisão, a ser implementado mediante ato do Ministério da Saúde, previamente pactuado em instância tripartite, no prazo de até 90 dias. O ressarcimento para os casos posteriores a 10 de junho de 2024 deverá ser pactuado na CIT, no mesmo prazo.

(...)

VI - Medicamentos incorporados

6) Em relação aos medicamentos incorporados, conforme conceituação estabelecida no âmbito da Comissão Especial e constante do Anexo I, os Entes concordam em seguir o fluxo administrativo e judicial detalhado no Anexo I, inclusive em relação à competência judicial para apreciação das demandas e forma de ressarcimento entre os Entes, quando devido.

6.1) A(o) magistrada(o) deverá determinar o fornecimento em face de qual ente público deve prestá-lo (União, estado, Distrito Federal ou Município), nas hipóteses previstas no próprio fluxo acordado pelos Entes Federativos, anexados ao presente acórdão.

As teses acima descritas, inclusive, foram transformadas em enunciado sintetizado de súmula vinculante, na forma do art. 103-A da Constituição Federal, com a seguinte redação:

Súmula vinculante 60 - O pedido e a análise administrativos de fármacos na rede pública de saúde, a judicialização do caso, bem ainda seus desdobramentos (administrativos e jurisdicionais), devem observar os termos dos 3 (três) acordos interfederativos (e seus fluxos) homologados pelo Supremo Tribunal Federal, em governança judicial colaborativa, no tema 1.234 da sistemática da repercussão geral (RE 1.366.243).

Assim, o cumprimento da medida judicial é exigível contra os réus solidariamente, ressalvado o ressarcimento desses recursos mediante ajuste no âmbito administrativo pelos entes envolvidos na prestação de saúde, devendo ser observado o fluxo dos acordos homologados pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 1.234 da sistemática da repercussão geral.

Considerando que a sentença foi proferida em data anterior à publicação da nova tese enunciada pelo Supremo Tribunal Federal, cabe ao juízo de origem adotar as providências compatíveis no cumprimento do presente julgado.

Verifica-se que a sentença atribuiu responsabilidade solidária aos entes federados réus e determinou que a União providencie o ressarcimento administrativamente, de modo que não prospera o recurso neste aspecto.

PREQUESTIONAMENTO

O enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal, assim como a análise da legislação aplicável, são suficientes para prequestionar junto às instâncias superiores os dispositivos que as fundamentam. Assim, deixa-se de aplicar os dispositivos legais ensejadores de pronunciamento jurisdicional distinto do que até aqui foi declinado. Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração tão somente para este fim, o que evidenciaria finalidade procrastinatória do recurso, passível de cominação de multa.

Em face do que foi dito, voto por dar parcial provimento à apelação, na parte conhecida, exclusivamente para ampliar as contracautelas, nos termos da fundamentação.



Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004803387v3 e do código CRC e7847218.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 1/12/2024, às 13:25:51


1. https://www.pje.jus.br/e-natjus/notaTecnica-dados.php?output=pdf&token=nt:237640:1721848051:75cfe52cba221ac4d21b336fc3b78b3b1f32257e628b5cc9da97909b0ed5e931
2. https://www.pje.jus.br/e-natjus/notaTecnica-dados.php?output=pdf&token=nt:240652:1721848045:93c2b506c7910cd40971acc3f7ff0d99dfdd545392d714613d9f443523e12a1c
3. https://www.pje.jus.br/e-natjus/notaTecnica-dados.php?output=pdf&token=nt:240167:1721848043:25fe55311722fe78646ccb9b2c81fff5f37032224722d61fbca3d7f0c2b6fb6c
4. http://conitec.gov.br/images/Relatorios/2018/Relatorio_SunitinibeePazopanibe_CarcinomaRenal.pdf
5. http://conitec.gov.br/images/Relatorios/Portaria/2018/PortariasSCTIE_89a91_2018.pdf

5071950-69.2023.4.04.7100
40004803387.V3


Conferência de autenticidade emitida em 13/12/2024 08:53:10.


Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5071950-69.2023.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. PRESTAÇÃO DE SAÚDE. PAZOPANIBE. INCORPORAÇÃO AO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. CONTRACAUTELAS.

1. O medicamento cloridrato de pazopanibe foi incorporado ao Sistema Único de Saúde (SUS), nos termos da Portaria nº 91, de 27 de dezembro de 2018, do Ministério da Saúde, para tratamento de carcinoma renal de células claras metastático, razão pela qual deve ser deferida judicialmente a sua dispensação.

2. A concessão de fármaco de elevado custo por tempo indeterminado exige a adoção de medidas de contracautela, a fim de garantir o exato cumprimento da decisão judicial, inclusive de ofício.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, na parte conhecida, exclusivamente para ampliar as contracautelas, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 27 de novembro de 2024.



Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004803389v4 e do código CRC af701bfe.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 1/12/2024, às 13:25:51


5071950-69.2023.4.04.7100
40004803389 .V4


Conferência de autenticidade emitida em 13/12/2024 08:53:10.


Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 19/11/2024 A 27/11/2024

Apelação Cível Nº 5071950-69.2023.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PRESIDENTE: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

PROCURADOR(A): ELTON VENTURI

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 19/11/2024, às 00:00, a 27/11/2024, às 16:00, na sequência 473, disponibilizada no DE de 07/11/2024.

Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO, NA PARTE CONHECIDA, EXCLUSIVAMENTE PARA AMPLIAR AS CONTRACAUTELAS.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

Votante: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR

LIDICE PENA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 13/12/2024 08:53:10.


Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

O Prev já ajudou mais de 140 mil advogados em todo o Brasil.Faça cálculos ilimitados e utilize quantas petições quiser!

Teste grátis agora!