
Apelação Cível Nº 5023709-39.2019.4.04.9999/SC
RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
APELANTE: DEORILDE ALVES
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou improcedente o pedido de concessão do benefício de pensão por morte ().
A recorrente sustenta, em síntese, ser devida a reforma da sentença, tendo em vista a comprovação da qualidade de segurado especial - boia-fria do falecido ().
Oportunizada a apresentação de contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de Admissibilidade
O apelo preenche os requisitos de admissibilidade.
Mérito
A concessão do benefício de pensão por morte, previsto no art. 74 da Lei 8.213/1991, depende do preenchimento dos seguintes requisitos: (1) ocorrência do evento morte, (2) condição de dependente de quem objetiva a pensão e (3) demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito.
Conforme o disposto no art. 26, I, da Lei 8.213/1991, referido benefício independe de carência.
Ressalte-se que o benefício de pensão por morte rege-se pela legislação vigente quando da sua causa legal, em homenagem ao princípio tempus regit actum. O evento óbito, portanto, define a legislação de regência do amparo a ser outorgado aos beneficiários da pensão por morte, oportunidade em que deverão ser comprovados os requisitos necessários à concessão do benefício.
Do Caso Concreto
O ponto controvertido, no presente caso, refere-se à qualidade de segurado do instituidor do benefício - ANSELMO ANTONIO JAHN quando do óbito, ocorrido em 19/06/2013 (, p.2).
A parte autora - companheira de ANSELMO afirma na petição inicial que o falecido trabalhou em propriedades rurais como diarista (boia-fria) até poucos dias antes do óbito ().
A sentença julgou improcedentes os pedidos, pelos seguintes motivos ():
Denota-se da documentação carreada aos autos, inclusive da própria contestação, que a existência de união estável, e, por conseguinte, a qualidade de dependente da autora, companheira do de cujus, restaram devidamente comprovadas, inclusive administrativamente.
No entanto, a qualidade de segurado do instituidor da pensão não restou suficientemente caracterizada, conforme se verá adiante.
O resumo de tempo de contribuição de fls. 43/44, bem como a decisão de fls. 50/51, demonstram que o Sr. Anselmo Antonio Jahn possui contribuições no CNIS, sendo que a última ocorreu em agosto/2007, mantida sua qualidade de segurado até 15.10.2008.
Mais adiante (em 22.5.2012), em perícia realizada administrativamente pelo INSS, em procedimento no qual o de cujus pleiteava a concessão de benefício de prestação continuada, constatou-se que aquele somente conseguia deslocar-se com o auxílio de cadeira de rodas. Tanto é que, na declaração sobre a composição do grupo e renda familiar de fls. 254/255, datada de 18.9.2012, o Sr. Anselmo declarou que não trabalhava.
É consabido que a qualidade de segurado especial do de cujus deve ser comprovada por início de prova material, corroborada por prova testemunhal, no caso de exercer atividade agrícola como volante ou boia-fria ou mesmo como trabalhador rural em regime de economia familiar.
Ocorre que, no caso dos autos, a prova documental, além de frágil, não restou suficientemente corroborada pela testemunhal.
O Sr. Laurindo Granella, informante, disse que conhecia o Sr. Anselmo há mais de 20 anos e que ele realmente trabalhava como diarista rural, "boia-fria", apenas para terceiros, tendo inclusive trabalhado para o declarante. Apesar de não ter sido muito específico no tocante às datas, o depoente, após ser perguntado pelo juízo, confirmou que o Sr. Anselmo somente trabalhou para ele em 2013. Acrescentou, ainda, que nunca havia visto o de cujus de cadeira de rodas.
O Sr. Astor Floss, testemunha, confirmou a condição de diarista/boia-fria do Sr. Anselmo, mas também não foi muito específico no tocante às datas em que o de cujus laborou para ele.
Por fim, o Sr. Antonio Gonçalves, informante, declarou em juízo que viu o Sr. Anselmo trabalhando na roça 15 dias antes de seu falecimento. No entanto, tal fato não encontra amparo documental nos autos.
Destarte, não restando comprovada, à saciedade, a qualidade de segurado doinstituidor da pensão, fracassa a pretensão autoral.
Como regra geral, a comprovação do tempo de atividade rural para fins previdenciários exige, pelo menos, início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea (art. 55, § 3º, da Lei 8.213/1991; Recurso Especial Repetitivo 1.133.863/RN, Rel. Des. convocado Celso Limongi, 3ª Seção, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011).
A jurisprudência a respeito da matéria encontra-se pacificada, retratada na Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, que possui o seguinte enunciado: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de benefício previdenciário.
O início de prova material, de outro lado, não precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado, bastando ser contemporâneo aos fatos alegados. A prova testemunhal, desde que robusta, é apta a comprovar os claros não cobertos pela prova documental (STJ, AgRg no REsp 1.217.944/PR, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª Turma, julgado em 25/10/2011, DJe 11/11/2011; TRF4, EINF 0016396-93.2011.4.04.9999, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 16/04/2013).
Para comprovação do trabalho rural alegado foram apresentados os seguintes documentos:
- Certidão de óbito de ANSELMO em que consta a profissão de "agricultor" (, p. 2);
- Carteira de trabalho e CNIS do falecido, com último vínculo empregatício registrado no ano de 2007 (, p. 2/3);
- Certidão de nascimento da filha do casal - Tainara Gláucia Jahn, ocorrido em 18/06/1995, da qual depreende-se a profissão dos pais "agricultores" (, p.7);
- Ficha de cadastro da família perante a Secretaria Municipal de Saúde de Pinhalzinho/SC, datada em 10/12/2009, em que verifica-se a ocupação do finado como "diarista" (; p. 7);
- Contrato particular de prestação de serviços em que ANSELMO fica responsável pela "arrancação de feijão de uma área de 141659 m²", com início em 16/12/1994 ();
- Contrato de parceria entre o falecido e Paulo Gilberto Albrecht em que fica acordado que ANSELMO e sua família irão "colher, secar, emfardar, acompanhar a entrega" de baixeiro de fumo, datado em 10/12/2002 ().
Houve ainda a oitiva de testemunhas, conforme resumos que seguem:
Antônio Gonçalves (): afirma que conhece a autora desde que ela tinha uns 15 anos. Que a autora e o falecido viveram juntos aproximadamente 20/25 anos. Refere que Anselmo era diarista no interior, prestando serviços como "quebrar milho, plantar feijão, no fumo" e que trabalhou com o falecido como diarista há uns 15 anos. Relembra de alguns lugares em que Anselmo trabalhou e destaca que a autora exercia a mesma atividade. Informa que o casal trabalhou até uns 15 dias antes do óbito e que eles não possuíam terra nem maquinários. Quanto ao pagamento, informa que era uns R$50,00 por dia. Que o casal não tinha outra fonte de renda e sobrevivia apenas das diárias, sendo que a autora continua trabalhando na mesma atividade.
Laurindo Granella (): confirma que era amigo do casal, conhecendo Anselmo há aproximadamente uns 20 anos. Afirma que o falecido trabalhava como diarista no interior, inclusive para o depoente. Não tem conhecimento de que o falecido tenha trabalhado em outra atividade. Perguntado se Anselmo estava de cadeira de rodas em período anterior ao óbito, refere que "não tem lembrança". Conhece vários vizinhos que utilizavam dos serviços de Anselmo. Alega que o casal sempre trabalhou junto e apenas para terceiros, de forma braçal. Que o falecido trabalhou para o depoente uns 15 ou 20 dias antes do óbito e que ele "com certeza" não conseguiria se manter sem a atividade agrícola, sendo que a autora ainda vive de tal trabalho.
Astor Floss (): afirma que conhece o casal há 17 anos e que Anselmo era "boia-fria, diarista", desempenhando serviços na lavoura para "muita gente", sendo que a autora ajudava na roça. Não possuíam terra própria, somente trabalhavam para terceiros e não realizavam atividades urbanas. Confirma que já utilizou dos serviços do falecido, pagando por dia. Explica que a produção era realizada sempre em nome do contratante. Que o casal era carente e não conseguiria se manter sem o trabalho rural de Anselmo, afirmando que atualmente a autora vive da roça.
Em que pese os depoimentos prestados pelas testemunhas sejam no sentido de que o falecido trabalhava como diarista na lavoura (evento5), inexiste início de prova material contemporâneo ao óbito.
Ao contrário, o finado requereu benefício assistencial de prestação continuada na condição de pessoa com deficiência, nos meses de abril (NB 551.122.543-2) e setembro (NB 553.665.873-1) de 2012, nos quais declarou não estar trabalhando ( e ).
Além disso, na Carteira de Trabalho há vínculos de emprego na construção civil, inclusive o último registro é no cargo de carpinteiro, no ano de 2007 (, p. 2). A autora também apresenta vínculo de emprego urbano entre 01/11/2011 e 20/04/2012 (, p. 3), o que contradiz as afirmações das testemunhas no sentido de que o casal sempre trabalhou na lavoura, para terceiros.
Importante registrar que os contratos de parceria agrícola apresentados são todos anteriores ao último vínculo de emprego em 2007, de cunho urbano. Ainda, o endereço do falecido constante na certidão de óbito e nos pedidos de concessão de benefício assistencial, qual seja, Avenida Palmas, cidade de Pinalzinho, indica residência em área urbana (, p. 2 e , p. 4).
É possível que o falecido tenha realizado algum tipo de trabalho até o óbito, apesar dos pedidos de concessão de benefício assistencial. Contudo, nada indica que o labor exercido por último tenho sido na condição de boia-fria.
Desse modo, inexistente início material contemporâneo ao óbito, não é possível o reconhecimento da condição de segurado especial do falecido. É dizer, não há razões para a reforma da sentença e concessão do benefício de pensão.
Honorários Recursais
Considerando a manutenção da sentença e tendo em conta o disposto no § 11 do art. 85 do CPC, majoro a verba honorária para 12% do valor da causa atualizado, mantida a suspensão por conta da justiça gratuita deferida.
Prequestionamento
No que concerne ao prequestionamento, tendo sido a matéria analisada, não há qualquer óbice, ao menos por esse ângulo, à interposição de recursos aos tribunais superiores.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da parte autora.
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Apelação Cível Nº 5023709-39.2019.4.04.9999/SC
RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
APELANTE: DEORILDE ALVES
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE SEGURADO DO INSTITUIDOR. SEGURADO ESPECIAL. BOIA-FRIA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. INEXISTÊNCIA.
1. A concessão do benefício de pensão por morte, previsto no art. 74 da Lei 8.213/1991, depende do preenchimento dos seguintes requisitos: (1) ocorrência do evento morte, (2) condição de dependente de quem objetiva a pensão e (3) demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito.
2. O benefício de pensão por morte rege-se pela legislação vigente quando da sua causa legal, em homenagem ao princípio tempus regit actum. O evento óbito, portanto, define a legislação de regência do amparo a ser outorgado aos beneficiários da pensão por morte, oportunidade em que deverão ser comprovados os requisitos necessários à concessão do benefício.
3. A comprovação do tempo de atividade rural para fins previdenciários exige, pelo menos, início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea (art. 55, § 3º, da Lei 8.213/1991; Recurso Especial Repetitivo 1.133.863/RN, Rel. Des. convocado Celso Limongi, 3ª Seção, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011).
4. Hipótese em que não há início de prova material contemporâneo ao óbito do instituidor do benefício, não sendo possível o reconhecimento da qualidade de segurado especial e a concessão da pensão por morte.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 17 de fevereiro de 2023.
Documento eletrônico assinado por ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003711286v5 e do código CRC 640cd52f.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 10/02/2023 A 17/02/2023
Apelação Cível Nº 5023709-39.2019.4.04.9999/SC
RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: DEORILDE ALVES
ADVOGADO(A): MARLON ALDEBRAND (OAB SC023423)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA
Secretária
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