
Reclamação (Seção) Nº 5035975-09.2024.4.04.0000/RS
RELATOR Desembargador Federal CELSO KIPPER
RELATÓRIO
Trata-se de reclamação proposta por G. L. R., com fulcro no art. 988 e seguintes do CPC, em que pleiteia a cassação do acórdão proferido pela 4ª Turma Recursal do Rio Grande do Sul nos autos nº 5012316-89.2021.4.04.7108, com a reabertura da instrução do feito para colheita da prova testemunhal.
Alega a parte reclamante que não foi observada a tese firmada no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) nº 17 deste Tribunal Regional Federal da 4ª Região, porquanto não lhe foi possibilitada a produção de prova testemunhal para a comprovação do trabalho rural em regime de economia familiar, notadamente antes dos doze anos de idade. Argumenta que a autodeclaração não pode constituir obstáculo para efetivação do contraditório mediante a colheita de prova oral em juízo.
O pedido de tutela de urgência foi deferido determinando a suspensão do processo de origem até o julgamento da presente reclamação (ev. 6).
Citado, o INSS apresentou contestação (ev. 15).
Com vista dos autos, o Ministério Público Federal opinou pela procedência da reclamação (ev. 18).
É o relatório.
VOTO
Trata-se de apreciar reclamação segundo a qual a decisão objurgada não observou o acórdão proferido no IRDR nº 17.
A tese firmada no referido julgado tem o seguinte teor:
Não é possível dispensar a produção de prova testemunhal em juízo, para comprovação de labor rural, quando houver prova oral colhida em justificação realizada no processo administrativo e o conjunto probatório não permitir o reconhecimento do período e/ou o deferimento do benefício previdenciário.
Em face disso, a parte reclamante postula o reconhecimento da nulidade do acórdão reclamado, considerando-se que, conforme previsão do art. 947, § 3º, do CPC, as teses aprovadas em Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas vinculam todos os juízes e órgão fracionários, inclusive àqueles que tramitem nos juizados especiais da respectiva região, bem como sua inobservância compromete a competência do Tribunal, fragilizando a autoridade de suas decisões e jurisprudência uniformizada.
Quanto ao caso concreto de que se origina a reclamação, observa-se tratar de pretensão de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição (NB 193.022.754-7), desde a DER (05-03-2020), mediante o reconhecimento, entre outros, do exercício de atividade rural no período de 18-09-1972 a 17-09-1977. O autor é nascido em 18-09-1965.
A ação foi ajuizada em 11-06-2021, com requerimento de designação de audiência para oitiva das testemunhas, que não foi apreciado.
A sentença julgou improcedente o pedido no ponto, resultado mantido em grau recursal pela 1ª Turma Recursal do Rio Grande do Sul.
Daí a irresignação da parte reclamante, que alega que a ausência de produção da prova testemunhal causou prejuízo à comprovação do seu trabalho no meio rural antes dos 12 anos de idade.
Pois bem.
Para a comprovação do tempo de atividade rural faz-se necessário início de prova material, não sendo admitida, via de regra, prova exclusivamente testemunhal (art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91; Súmula 149 do STJ).
A respeito, está pacificado nos Tribunais que não se exige comprovação documental ano a ano do período que se pretende comprovar, seja porque se deve presumir a continuidade nos períodos imediatamente próximos, sobretudo no período anterior à comprovação, à medida que a realidade em nosso país é a migração do meio rural ao urbano, e não o inverso, seja porque é inerente à informalidade do trabalho campesino a escassez documental (TRF4, AC n. 0021566-75.2013.4.04.9999, Sexta Turma, Rel. Des. Celso Kipper, D.E. 27-05-2015; TRF4, AC n. 2003.04.01.009616-5, Terceira Seção, Rel. Des. Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. de 19-11-2009; TRF4, EAC n. 2002.04.01.025744-2, Terceira Seção, Rel. para o Acórdão Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, j. em 14-06-2007; TRF4, EAC n. 2000.04.01.031228-6, Terceira Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, DJU de 09-11-2005).
Ademais, está pacificado que constituem prova material os documentos civis (STJ, AR n. 1166/SP, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, Terceira Seção, DJU de 26-02-2007; TRF4, AC 5010621-36.2016.4.04.9999, Sexta Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, j. em 14-12-2016; TRF4, AC n. 2003.71.08.009120- 3, Quinta Turma, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. de 20-05-2008; TRF4, AMS n. 2005.70.01.002060-3, Sexta Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJ de 31-05-2006) – tais como certificado de alistamento militar, certidões de casamento e de nascimento, dentre outros – em que consta a qualificação como agricultor tanto da parte autora como de membros do grupo parental. Assim, os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando integrantes do mesmo núcleo familiar, consubstanciam início de prova material do labor rural (Súmula 73 desta Corte).
No entanto, não existe consenso sobre o alcance temporal dos documentos, para efeitos probatórios, nem se há ou não necessidade de documento relativo ao início do período a ser comprovado. Para chegar a uma conclusão, parece-me necessário averiguar a função da prova material na comprovação do tempo de serviço.
A prova material, conforme o caso, pode ser suficiente à comprovação do tempo de atividade rural, bastando, para exemplificar, citar a hipótese de registro contemporâneo em CTPS de contrato de trabalho como empregado rural. Em tal situação, não é necessária a inquirição de testemunhas para a comprovação do período registrado.
Na maioria dos casos que vêm a juízo, no entanto, a prova material não é suficiente à comprovação de tempo de trabalho, e havia a necessidade de ser corroborada por prova testemunhal. A propósito, jurisprudência de longa data sempre afirmou que o tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea [v. g., TRF4, Terceira Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, EIAC 2000.04.01.107535-1/RS, j. em 08-09-2005, DJ 05-10-2005; TRF4, Terceira Seção, EIAC 1999.04.01.075012-1, j. em 10-11-2005, DJ 30-11-2005; STJ, REsp 1.348.633/SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, j. em 28-08-2013, DJe 05-12-2014 (Tema Repetitivo 638); STJ, Súmula 577; STJ, REsp 1.321.493/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. em 10-10-2012, DJe 19-12-2012 (Tema Repetitivo 554); STJ, AgInt no AREsp 2.160526/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, j. em 13-03-2023, DJe 16-03-2023].
Nesses casos, a prova material (ainda que incipiente) sempre teve a função de ancoragem da prova testemunhal, sabido que esta é flutuante, sujeita a esquecimentos, enganos e desvios de perspectiva. A prova material, portanto, serve de base, sustentação, pilar em que se apoia (apesar dos defeitos apontados) a então necessária prova testemunhal.
Em razão disso, sempre defendi que, no mais das vezes, não se pode averiguar os efeitos da prova material em relação a si mesma, devendo a análise recair sobre a prova material em relação à prova testemunhal, aos demais elementos dos autos e ao ambiente socioeconômico subjacente; em outras palavras, a análise deve ser conjunta. A consequência dessa premissa é que não se pode afirmar, a priori, que há necessidade de documento relativo ao início do período a ser comprovado, ou que a eficácia probatória do documento mais antigo deva retroagir um número limitado de anos. O alcance temporal da prova material dependerá do tipo de documento, da informação nele contida (havendo nuances conforme ela diga respeito à parte autora ou a outrem), da realidade fática presente nos autos ou que deles possa ser extraída e da realidade socioeconômica em que inseridos os fatos sob análise.
De certa forma, tudo o que foi dito até aqui permanece válido, embora seja necessária uma nova contextualização, à vista da inovação legislativa trazida pela Medida Provisória nº 871, de 18-01-2019, convertida na Lei nº 13.846, de 18-06-2019, que alterou os arts. 106 e 55, § 3º, da LBPS, e acrescentou os arts. 38-A e 38-B, para considerar que o tempo de serviço rural será comprovado por autodeclaração do segurado, ratificada por entidades ou órgãos públicos credenciados. Ausente a ratificação, a autodeclaração deverá estar acompanhada de documentos hábeis a constituir início de prova material.
Em face disso, a jurisprudência dessa Corte passou a entender que a autodeclaração prestada pelo segurado é suficiente para, em cotejo com a prova material, autorizar o reconhecimento do tempo agrícola pretendido, sendo devida a oitiva de testemunhas apenas quando se mostre indispensável (AC n. 5023671-56.2021.4.04.9999, Décima Turma, Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, j. em 07-06-2022; AC n. 5023852-57.2021.4.04.9999, Décima Turma, Rel. Des. Federal Marcio Antônio Rocha, j. em 10-05-2022; AC n. 5003119-70.2021.4.04.9999, Nona Turma, Rel. Des. Federal Sebastião Ogê Muniz, j. em 08-04-2022; AC n. 5001363-77.2019.4.04.7127, Sexta Turma, Rel. Des. Federal Taís Schilling Ferraz, j. em 09-03-2022; AG n. 5031738- 34.2021.4.04.0000, Sexta Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, j. em 22-09-2021).
A questão que ainda precisa ser respondida adequadamente é: quando a prova testemunhal permanece indispensável para a comprovação da atividade rural ou da condição de segurado especial?
Vislumbro, desde já, algumas situações em que a prova oral é indispensável à comprovação do tempo de atividade rural. Primeiramente, será indispensável sempre que o magistrado verificar algum ponto a ser melhor esclarecido, visando a completar lacunas da prova material (casos em que esta é escassa), dirimir contradições entre a autodeclaração e as provas materiais, ou destas entre si, para esclarecer dúvidas surgidas por elementos colhidos do CNIS ou PLENUS, para se certificar se a atividade rural era de fato essencial para a subsistência da família, se havia empregados permanentes, enfim, sempre que não houver prova suficiente para o reconhecimento pretendido, e desde que a prova oral possa suprir essa deficiência probatória, valendo-se o magistrado da faculdade-dever de determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito, nos termos do art. 370 do CPC.
Também poderá ser indispensável a prova testemunhal quando o pedido englobe o reconhecimento de atividade rural desenvolvida antes dos 12 anos de idade. Isso porque tal reconhecimento é possível desde que a prova da atividade do menor seja reforçada, mais robusta, demonstrando as atividades desempenhadas, as culturas plantadas ou os animais criados, de forma que seja possível avaliar, no regime de economia familiar, a essencialidade do trabalho rural desenvolvido pela criança para o sustento da família. Em outras palavras, “o tempo de serviço rural anterior aos 12 anos de idade pode ser reconhecido desde que haja prova inequívoca do efetivo exercício de trabalho rural pela parte autora e não apenas auxílio eventual ao grupo familiar” (TRF4, AC 5022088-36.2021.4.04.9999, Décima Turma, Rel. Luiz Fernando Wowk Penteado, j. em 22-03-2022). Ora, se há a necessidade de prova mais robusta ou inequívoca nesse sentido, não será suficiente, via de regra, a autodeclaração do segurado, tornando-se, no mais das vezes (salvo exceções), imprescindível a prova testemunhal.
Importante destacar a aplicabilidade do julgamento do IRDR nº 17 a casos em que há autodeclaração, houve dispensa de prova testemunhal e o conjunto probatório não permite o reconhecimento do período pleiteado.
Com efeito, cumpre reiterar a tese jurídica fixada por esta Corte no julgamento do IRDR nº 17 :
Não é possível dispensar a produção de prova testemunhal em juízo, para comprovação de labor rural, quando houver prova oral colhida em justificação realizada no processo administrativo e o conjunto probatório não permitir o reconhecimento do período e/ou o deferimento do benefício previdenciário.
Ora, se já não era possível dispensar a prova oral mesmo quando houvesse tomada de depoimentos em justificação administrativa – insuficientes, no entanto, a permitir o reconhecimento do tempo rural –, da mesma forma aquela não poderá ser dispensada se o conjunto probatório, formado por início de prova material e autodeclaração, for também insuficiente para tal reconhecimento. A lógica que vingou naquele julgamento é inteiramente aplicável a esses últimos casos, pois as situações são similares.
Na demanda originária, a parte autora pretendeu a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição (NB 193.022.754-7), desde a DER (05-03-2020), mediante o reconhecimento, entre outros, do exercício de atividade rural no período de 18-09-1972 a 17-09-1977. O autor é nascido em 18-09-1965.
A ação foi ajuizada em 11-06-2021, com requerimento de designação de audiência para oitiva das testemunhas, que não foi apreciado.
Quanto à rejeição do interstício precedente aos 12 anos de idade, a sentença julgou improcedente o pedido, com destaque para o seguinte excerto:
[...]
No caso, não há como se acolher a pretensão da parte autora, pois não há prova do efetivo exercício de atividade propriamente rurícola pelo demandante antes de completar 12 anos, considerando-se, ainda, o tamanho da propriedade rural, bem como o número de integrantes do núcleo familiar e o fato de a parte autora ter eventualmente estudado no período postulado. Como já referido, em que pese exista corrente jurisprudencial admitindo o reconhecimento do labor rurícola no período que antecede os 12 anos, o fez de forma excepcional, exigindo a prova da efetiva atividade laborativa e a essencialidade do labor do menor de idade para a sobrevivência do grupo familiar, o que não se verifica no caso concreto.
[...]
O voto condutor do acórdão, por sua vez, negou provimento ao recurso do reclamante:
[...]
Do tempo rural de 18/09/1972 a 17/09/1977
Inicialmente, cumpre assinalar que, com relação ao Tema 219 da TNU (“Saber se é possível o computo do tempo de serviço rural àquele que tenha menos de 12 anos de idade”) não havia determinação para suspensão do curso de todas as ações individuais ou coletivas que versassem sobre a matéria.
De resto, a matéria foi definida por aquela Corte, restando assim definida a tese: "É possível o cômputo do tempo de serviço rural exercido por pessoa com idade inferior a 12 (doze) anos na época da prestação do labor campesino".
Sem embargo, essa possibilidade não importa em regra, mas entendimento excepcional a exigir temperamentos a partir do exame do caso concreto, especialmente em relação à necessidade de maior rigor na análise da prova concernente. Com efeito, observe-se a ementa do julgado (sem grifos no original):
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. TEMA 219/TNU. QUESTÃO SUBMETIDA A JULGAMENTO: SABER SE É POSSÍVEL O CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL ÀQUELE QUE TENHA MENOS DE 12 ANOS DE IDADE. RE n. 1.225.475, que tem por objeto ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal em face do Instituto Nacional do Seguro Social, para que a autarquia se abstenha de fixar idade mínima para fins de reconhecimento de tempo de serviço e de contribuição pelo exercício das atividades previstas no art. 11 da Lei 8.213/91. Entendimento do STF no sentido de que "o art. 7°, XXXIII, da Constituição Federal não pode ser interpretado em prejuízo da criança ou adolescente que exerce atividade laboral. regra constitucional que busca a proteção e defesa dos trabalhadores não pode ser utilizada para privá-los dos seus direitos, inclusive, previdenciários". As atividades rurais, por sua própria natureza, exigem, regra geral, bom vigor físico para sua execução, pois são exercidas de modo rústico, em céu aberto, com exposição às intempéries. Em decorrência dessa circunstância, há entendimento no sentido de não ser crível que uma criança de até doze anos de idade incompletos, possua vigor físico necessário para o exercício pleno da atividade rural, sendo sua participação nas lides campesinas, como regra, de caráter limitado, secundário. Todavia, cada ser humano tem sua própria compleição física, possibilitando exceção à regra de que alguém com idade inferior a 12 (doze) anos não tenha "vigor físico necessário para o exercício pleno da atividade rural". Havendo comprovação de que a pessoa com idade inferior a 12 (doze) anos tenha, de fato, exercido atividade rural, deve-se reconhecer o labor campesino efetivamente comprovado, e não fechar os olhos para a realidade fática, prejudicando aqueles a quem se deveria conferir maior proteção social. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça e da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais. Pedido de Uniformização Provido. Retorno dos autos à turma recursal de origem, para que reanalise a questão, adotando a seguinte tese: é possível o cômputo do tempo de serviço rural exercido por pessoa com idade inferior a 12 (doze) anos na época da prestação do labor campesino.
A partir dessa premissa acerca da excepcionalidade do exercício de atividade campesina pelo menor de 12 (doze) anos de idade, é preciso especialmente atentar para o disposto no § 1.º do art. 11 da LBPS, in verbis: "Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes".
As decisões judiciais tem partido de certa presunção implícita de que essa indispensabilidade decorre do ingresso na adolescência. Por outro lado, é imprescindível a comprovação de que a atividade do menor de 12 (doze) anos de idade se mostrava indispensável à subsistência ou ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar.
Sendo assim, o mero auxílio, sem dúvida conveniente porque colaborativo, é insuficiente para o reconhecimento desse direito. Logo, a prova correspondente deve ser mais robusta, não se afigurando bastante apenas a demonstração de que o núcleo familiar exercia atividade rurícola.
Nesse aspecto, cumpre assentar que a parte autora se cingiu a acostar: (I) Ficha de Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Frederico Westphalen/RS, em nome do pai do autor (1964); (II) Certidão de nascimento do autor, qualificando seu pai como agricultor (1965); (III) Guias do ITR em nome do pai do autor (1971 a 1988); (IV) Notas fiscais de produtor rural em nome do pai do autor (1975 a 1986); (V) Notas fiscais emitidas em nome do pai do autor (1975 a 1990); (VI) Ofício de registro de imóveis, comprovando que o pai tinha terra na localidade rural (1976 a 1993); (VII) Declaração para imóvel rural em nome do pai do autor (1978); (VIII) Recibo de entrega emitido pelo Ministério da Agricultura em nome do pai do autor (1978); (IX) Contrato de compra e venda em nome do pai do autor, o qual o qualifica como agricultor (1991); (X) Certidão de casamento em nome do autor e esposa (1993).
Assim, não havendo nenhum elemento probatório indicando a indispensabilidade do trabalho rural pela parte autora em momento anterior ao implemento de seus 12 (doze) anos, segue mantida a sentença de improcedência nesse tópico.
Assim, o recurso do autor não merece provimento neste ponto.
[...]
Nesse cenário, e abordada a questão sob o ângulo jurisprudencial acima expendido, sobretudo no que se refere à exiguidade e à imprecisão documentais inerentes ao labor rural em períodos distantes, a fundamentação acima colacionada evidencia justamente a necessidade de produção de prova testemunhal para averiguação das condições em que as tarefas rurícolas eram efetivamente desempenhadas.
De fato, considerando o óbice elencado pela decisão impugnada - que pode ser sintetizado pela dispensabilidade das atividades porventura realizadas por uma criança menor de 12 anos -, sem o cotejo com outros elementos concretos, não é possível solver a controvérsia, seja para acolher a pretensão da parte autora, seja para afastá-la, materializando-se a prova oral, nessa medida, como condição sine qua non para verificação das condições em que o demandante desempenhava tarefas ínsitas ao labor campesino.
A propósito, cito reclamações apreciadas por esta Terceira Seção que igualmente concluíram pela indispensabilidade da prova testemunhal em casos análogos:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECLAMAÇÃO. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (IRDR) Nº 17. NOVA CONTEXTUALIZAÇÃO À VISTA DA INOVAÇÃO LEGISLATIVA QUE PREVIU A AUTODECLARAÇÃO DO SEGURADO. APLICABILIDADE DA TESE A CASOS EM QUE A AUTODECLARAÇÃO, EM COTEJO COM A PROVA MATERIAL, NÃO PERMITE O RECONHECIMENTO DO PERÍODO PLEITEADO, NOTADAMENTE ANTES DOS DOZE ANOS DE IDADE. 1. À vista da inovação legislativa trazida pela Medida Provisória nº 871, de 18-01-2019, convertida na Lei nº 13.846, de 18-06-2019, que alterou os arts. 106 e 55, § 3º e acrescentou os arts. 38-A e 38-B, todos da LBPS, o tempo de serviço rural será comprovado por autodeclaração do segurado, ratificada por entidades ou órgãos públicos credenciados. Ausente a ratificação, a autodeclaração deverá estar acompanhada de documentos hábeis a constituir início de prova material. 2. Na hipótese de a autodeclaração, em cotejo com a prova material, não ser suficiente para o reconhecimento pretendido, e desde que a prova oral possa suprir essa deficiência probatória, a oitiva de testemunhas é indispensável à comprovação do tempo de atividade rural, valendo-se o magistrado da faculdade-dever de determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito, nos termos do art. 370 do CPC. 3. Se há a necessidade de prova mais robusta para o reconhecimento de atividade rural desenvolvida antes dos 12 (doze) anos de idade, não será suficiente, via de regra, a autodeclaração do segurado, tornando-se, no mais das vezes, imprescindível a prova testemunhal. 4. Se já não era possível dispensar a prova oral mesmo quando houvesse tomada de depoimentos em justificação administrativa - insuficientes, no entanto, a permitir o reconhecimento do tempo rural -, da mesma forma aquela não poderá ser dispensada se o conjunto probatório, formado por início de prova material e autodeclaração, for também insuficiente para tal reconhecimento. A lógica que vingou naquele julgamento é inteiramente aplicável a esses últimos casos, pois as situações são similares. 5. Reclamação provida para cassar o acórdão do processo originário, reabrindo-se a instrução do feito de forma a propiciar a produção da prova testemunhal. (TRF4, Rcl 5041071-39.2023.4.04.0000, 3ª Seção, Relator para Acórdão CELSO KIPPER, julgado em 02/06/2025)
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECLAMAÇÃO. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (IRDR) Nº 17. NOVA CONTEXTUALIZAÇÃO À VISTA DA INOVAÇÃO LEGISLATIVA QUE PREVIU A AUTODECLARAÇÃO DO SEGURADO. APLICABILIDADE DA TESE A CASOS EM QUE A AUTODECLARAÇÃO, EM COTEJO COM A PROVA MATERIAL, NÃO PERMITE O RECONHECIMENTO DO PERÍODO PLEITEADO, NOTADAMENTE ANTES DOS DOZE ANOS DE IDADE. 1. À vista da inovação legislativa trazida pela Medida Provisória nº 871, de 18-01-2019, convertida na Lei nº 13.846, de 18-06-2019, que alterou os arts. 106 e 55, § 3º e acrescentou os arts. 38-A e 38-B, todos da LBPS, o tempo de serviço rural será comprovado por autodeclaração do segurado, ratificada por entidades ou órgãos públicos credenciados. Ausente a ratificação, a autodeclaração deverá estar acompanhada de documentos hábeis a constituir início de prova material. 2. Na hipótese de a autodeclaração, em cotejo com a prova material, não ser suficiente para o reconhecimento pretendido, e desde que a prova oral possa suprir essa deficiência probatória, a oitiva de testemunhas é indispensável à comprovação do tempo de atividade rural, valendo-se o magistrado da faculdade-dever de determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito, nos termos do art. 370 do CPC. 3. Se há a necessidade de prova mais robusta para o reconhecimento de atividade rural desenvolvida antes dos 12 (doze) anos de idade, não será suficiente, via de regra, a autodeclaração do segurado, tornando-se, no mais das vezes, imprescindível a prova testemunhal. 4. Se já não era possível dispensar a prova oral mesmo quando houvesse tomada de depoimentos em justificação administrativa - insuficientes, no entanto, a permitir o reconhecimento do tempo rural -, da mesma forma aquela não poderá ser dispensada se o conjunto probatório, formado por início de prova material e autodeclaração, for também insuficiente para tal reconhecimento. A lógica que vingou naquele julgamento é inteiramente aplicável a esses últimos casos, pois as situações são similares. 5. Reclamação provida para cassar a sentença do processo originário, reabrindo-se a instrução do feito de forma a propiciar a produção da prova testemunhal. (TRF4, Rcl 5040598-87.2022.4.04.0000, 3ª Seção, Relator CELSO KIPPER, julgado em 27/11/2024)
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECLAMAÇÃO. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (IRDR) Nº 17. 1. A improcedência do pedido fundada em depoimentos de testemunhas colhidos exclusivamente em processo administrativo, contraria o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas n° 17. 2. Reclamação provida para cassar o acórdão do processo originário, reabrindo-se a instrução do feito de forma a propiciar a produção da prova testemunhal em juízo. (TRF4, Rcl 5018573-80.2022.4.04.0000, 3ª Seção, Relator JOSÉ ANTONIO SAVARIS, julgado em 24/10/2024)
No mesmo sentido, os seguintes precedentes de minha Relatoria, igualmente apreciados por esta Terceira Seção em 02-06-2025: Rcl 5003405-04.2023.4.04.0000, Rcl 5021674-91.2023.4.04.0000 e Rcl 5041071-39.2023.4.04.0000.
Sendo assim, demonstrado que o acórdão proferido no processo nº 5012316-89.2021.4.04.7108 vulnerou o entendimento adotado no incidente, é de rigor a cassação da decisão, reabrindo-se a instrução do feito de forma a propiciar a produção da prova testemunhal.
Ante o exposto, voto por julgar procedente a reclamação.
Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005438757v6 e do código CRC c0f4703e.
Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): CELSO KIPPERData e Hora: 23/10/2025, às 20:45:01
Conferência de autenticidade emitida em 30/10/2025 13:12:53.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Reclamação (Seção) Nº 5035975-09.2024.4.04.0000/RS
RELATOR Desembargador Federal CELSO KIPPER
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECLAMAÇÃO. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (IRDR) Nº 17. NOVA CONTEXTUALIZAÇÃO À VISTA DA INOVAÇÃO LEGISLATIVA QUE PREVIU A AUTODECLARAÇÃO DO SEGURADO. APLICABILIDADE DA TESE A CASOS EM QUE A AUTODECLARAÇÃO, EM COTEJO COM A PROVA MATERIAL, NÃO PERMITE O RECONHECIMENTO DO PERÍODO PLEITEADO, NOTADAMENTE ANTES DOS DOZE ANOS DE IDADE.
1. À vista da inovação legislativa trazida pela Medida Provisória nº 871, de 18-01-2019, convertida na Lei nº 13.846, de 18-06-2019, que alterou os arts. 106 e 55, § 3º e acrescentou os arts. 38-A e 38-B, todos da LBPS, o tempo de serviço rural será comprovado por autodeclaração do segurado, ratificada por entidades ou órgãos públicos credenciados. Ausente a ratificação, a autodeclaração deverá estar acompanhada de documentos hábeis a constituir início de prova material.
2. Na hipótese de a autodeclaração, em cotejo com a prova material, não ser suficiente para o reconhecimento pretendido, e desde que a prova oral possa suprir essa deficiência probatória, a oitiva de testemunhas é indispensável à comprovação do tempo de atividade rural, valendo-se o magistrado da faculdade-dever de determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito, nos termos do art. 370 do CPC.
3. Se há a necessidade de prova mais robusta para o reconhecimento de atividade rural desenvolvida antes dos 12 (doze) anos de idade, não será suficiente, via de regra, a autodeclaração do segurado, tornando-se, no mais das vezes, imprescindível a prova testemunhal.
4. Se já não era possível dispensar a prova oral mesmo quando houvesse tomada de depoimentos em justificação administrativa – insuficientes, no entanto, a permitir o reconhecimento do tempo rural –, da mesma forma aquela não poderá ser dispensada se o conjunto probatório, formado por início de prova material e autodeclaração, for também insuficiente para tal reconhecimento. A lógica que vingou naquele julgamento é inteiramente aplicável a esses últimos casos, pois as situações são similares.
5. Reclamação provida para cassar a sentença e o acórdão do processo originário, reabrindo-se a instrução do feito de forma a propiciar a produção da prova testemunhal.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, julgar procedente a reclamação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 23 de outubro de 2025.
Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005438758v2 e do código CRC d6505528.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO PRESENCIAL DE 23/10/2025
Reclamação (Seção) Nº 5035975-09.2024.4.04.0000/RS
RELATOR Desembargador Federal CELSO KIPPER
PRESIDENTE Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
PROCURADOR(A) VITOR HUGO GOMES DA CUNHA
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Presencial do dia 23/10/2025, na sequência 31, disponibilizada no DE de 13/10/2025.
Certifico que a 3ª Seção, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 3ª SEÇÃO DECIDIU, POR UNANIMIDADE, JULGAR PROCEDENTE A RECLAMAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Votante Juíza Federal IVANISE CORRÊA RODRIGUES PEROTONI
Votante Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Votante Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
Votante Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
Votante Juíza Federal LUÍSA HICKEL GAMBA
Votante Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
MÁRCIA CRISTINA ABBUD
Secretária
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