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DIREITO PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECLAMAÇÃO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. IRDR. PRESUNÇÃO ABSOLUTA DE MISERABILIDADE. RECLAMAÇÃO PROCEDENTE. TRF4. 50003...

Data da publicação: 31/10/2025, 07:08:53

DIREITO PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECLAMAÇÃO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. IRDR. PRESUNÇÃO ABSOLUTA DE MISERABILIDADE. RECLAMAÇÃO PROCEDENTE. I. CASO EM EXAME:1. Reclamação proposta em face de decisão de Turma Recursal que, ao negar benefício assistencial, desrespeitou a tese jurídica firmada no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) 12 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), que estabelece presunção absoluta de miserabilidade. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO:2. A questão em discussão consiste em saber se a decisão impugnada desconsiderou o precedente vinculante do IRDR 12/TRF4, que fixou a presunção absoluta de miserabilidade para a concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS) quando a renda familiar per capita é inferior a 1/4 do salário-mínimo. III. RAZÕES DE DECIDIR:3. A tese do IRDR 12/TRF4 estabelece presunção absoluta de miserabilidade para a concessão do benefício assistencial quando a renda mensal per capita da família é inferior a 1/4 do salário-mínimo, conforme o art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993.4. A tese jurídica firmada por Tribunal Regional Federal em IRDR é de observância obrigatória em toda a região, inclusive para os Juizados Especiais Federais, nos termos do art. 985, I, do CPC.5. A tese da TNU no Tema 122, que considera a presunção de miserabilidade relativa, não afasta a aplicação do precedente obrigatório regional, pois as decisões da TNU não possuem status de precedente obrigatório, não constando do rol do art. 927 do CPC.6. O objetivo do IRDR 12/TRF4 é conter o subjetivismo judicial na avaliação da miserabilidade em situações de baixa renda per capita, dispensando esforço interpretativo e probatório.7. No caso concreto, a renda familiar per capita era nula no período controverso (excluindo a aposentadoria do esposo, por analogia ao Estatuto do Idoso), o que, pela tese do IRDR 12/TRF4, gera presunção absoluta de vulnerabilidade socioeconômica.8. A decisão reclamada, ao analisar subjetivamente as condições de vida da requerente (boas condições da residência, veículo, contribuição como facultativa, auxílio de familiares) para afastar a miserabilidade, desconsiderou a presunção absoluta e contrariou o precedente vinculante. IV. DISPOSITIVO E TESE:9. Reclamação julgada procedente.Tese de julgamento: 10. A tese do IRDR 12/TRF4, que estabelece presunção absoluta de miserabilidade para BPC/LOAS quando a renda familiar per capita é inferior a 1/4 do salário-mínimo, é de observância obrigatória pelos Juizados Especiais Federais da região, não podendo ser afastada por análise subjetiva das condições de vida ou por tese da TNU em sentido contrário. ___________Dispositivos relevantes citados: Lei nº 8.742/1993, art. 20, § 3º; CPC, arts. 927, 985, I, § 1º, 988, IV, § 4º, e 992.Jurisprudência relevante citada: TRF4, IRDR 12 (50130367920174040000), j. 21.02.2018; TRF4, Rcl 5001287-84.2025.4.04.0000, Rel. p/ Acórdão Paulo Afonso Brum Vaz, j. 24.07.2025. (TRF 4ª Região, 3ª Seção, 5000324-76.2025.4.04.0000, Rel. LUÍSA HICKEL GAMBA, julgado em 23/10/2025, DJEN DATA: 24/10/2025)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Reclamação (Seção) Nº 5000324-76.2025.4.04.0000/RS

RELATOR Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

RELATÓRIO

Trata-se de reclamação proposta em face decisão proferida, nos autos do processo 5002377-16.2020.4.04.7110, pela 4ª Turma Recursal.

O reclamante sustenta, em síntese, que o acórdão impugnado desrespeitou a autoridade daquilo que decidido no julgamento do IRDR 12 deste Tribunal RegionalPede seja julgada procedente a presente reclamação a fim de ser cassada a decisão impugnada.

A autoridade reclamada não prestou informações.

O INSS apresentou contestação.

O Ministério Público Federal opinou pela procedência da reclamação.

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

A Terceira Seção deste Tribunal Regional Federal, na sessão de 21.02.2018, ao julgar o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas 12 (50130367920174040000), fixou a seguinte tese jurídica (evento 66, ACOR3):

O limite mínimo previsto no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 ('considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo') gera, para a concessão do benefício assistencial, uma presunção absoluta de miserabilidade.

O IRDR 12 foi admitido e julgado por este Tribunal Regional quando ainda se reconhecia a possibilidade de apreciar o incidente oriundo de ação com trâmite perante o Juizado Especial Federal (TRF4 5033207-91.2016.4.04.0000, CORTE ESPECIAL, Relator RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, juntado aos autos em 05/10/2016).

Posteriormente, à luz do entendimento que veio a ser firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 1.881.272 e do AREsp 1.617.595, este Regional passou a não mais admitir a instauração de IRDR proveniente de ação do JEF (TRF4 5005810-47.2022.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 28/05/2022).

Não obstante a atual compreensão desta Corte Regional, fato é que, no dia 12.09.2024, operou-se o trânsito em julgado do acórdão paradigma do IRDR 12 (evento 186, DESPADEC44evento 186, RELVOTO75 e evento 186, CERTTRAN84), que havia sido instaurado a partir de processo do Juizado Especial.

Convém registrar que a tese jurídica firmada por Tribunal Regional Federal em IRDR é de observância obrigatória em toda a região, inclusive para os Juizados Especiais Federais. Assim dispõe o art. 985 do CPC:

Art. 985. Julgado o incidente, a tese jurídica será aplicada:

I - a todos os processos individuais ou coletivos que versem sobre idêntica questão de direito e que tramitem na área de jurisdição do respectivo tribunal, inclusive àqueles que tramitem nos juizados especiais do respectivo Estado ou região;

II - aos casos futuros que versem idêntica questão de direito e que venham a tramitar no território de competência do tribunal, salvo revisão na forma do art. 986 .

§ 1º Não observada a tese adotada no incidente, caberá reclamação.

(grifei)

O papel do incidente de resolução de demandas repetitivas instaurado por Tribunal Regional Federal é justamente o de definir a interpretação sobre determinada questão jurídica no âmbito da respectiva região a fim de conferir maior segurança jurídica e tratamento isonômico na aplicação do Direito aos jurisdicionados que litigam tanto no juízo comum quanto no JEF.

Longe de se negar a importância da missão da TNU na uniformização da interpretação de lei federal pelas Turmas Recursais de diferentes regiões, é preciso destacar, no entanto, que o legislador não conferiu status de precedente obrigatório às suas decisões (estas não constam do rol do art. 927 do CPC). A existência de tese jurídica firmada pela TNU sequer poderia obstar a instauração de IRDR, diferentemente do que ocorre quando o tema já tiver sido afetado para julgamento no regime dos recursos repetitivos pelo STF ou pelo STJ (assim estatui o art. 976, § 4º, do CPC: É incabível o incidente de resolução de demandas repetitivas quando um dos tribunais superiores, no âmbito de sua respectiva competência, já tiver afetado recurso para definição de tese sobre questão de direito material ou processual repetitiva). Disso se depreende que a aplicação obrigatória da tese jurídica firmada em IRDR por Tribunal Regional independe da existência de tese (anterior ou posterior) fixada pela TNU em sentido contrário.

Nesse sentido, a tese jurídica firmada pela TNU no julgamento do Tema 122 (O critério objetivo consubstanciado na exigência de renda familiar per capita inferior a ¼ do salário-mínimo gera uma presunção relativa de miserabilidade, que pode, portanto, ser afastada por outros elementos de prova), porque carente de efeito vinculante, não constitui motivo suficiente para repelir a aplicação do precedente obrigatório regional ou para caracterizar distinção do caso em relação aos contornos do IRDR 12/TRF4. O precedente obrigatório somente poderia ser rechaçado em caso de reconhecida distinção, de revisão da tese pelo Tribunal que julgou o IRDR ou de suplantação da tese por tribunal superior.

Com isso, considerada a força obrigatória do acórdão proferido em IRDR, é preciso verificar a adequação do acórdão impugnado nesta reclamação à tese jurídica firmada no repetitivo regional ou a presença de eventual distinção no caso concreto.

Pois bem. Extrai-se da ratio decidendi do precedente vinculante regional formado a partir do julgamento do IRDR 12 do TRF4 que o reconhecimento da presunção absoluta de miserabilidade visa justamente a conter o subjetivismo judicial na avaliação da miserabilidade naquelas situações em que a renda per capita declarada/provada se mostrar inferior a 1/4 do salário mínimo. Transcrevo, nesse sentido, o seguinte excerto da fundamentação do acórdão paradigma do IRDR 12/TRF4 (evento 66, RELVOTO1):

[...]

Outra corrente entende que se cuida de uma presunção relativa de miserabilidade, tal qual recentemente concluiu a Quarta Turma Recursal do RS, verbis:

A exclusão de tais rendas (e dos seus beneficiários) torna a renda per capita abaixo do limite que servia de parâmetro para aferir a miserabilidade (1/4 do salário mínimo). No entanto, de acordo com o atual entendimento da TNU, o fato de a renda familiar estar abaixo do limite legal, não serve para presumir miserabilidade (Recurso Cível 5003996-54.2015.4.04.7110, Relator Juiz Federal Osório Ávila Neto, sessão do dia 29 de março de 2017, grifei)

O precedente da TNU referido considerou que a presunção decorrente da renda mínima per capita 'pode ser afastada quando o conjunto probatório, examinado globalmente, demonstra que existe renda não declarada, ou que o requerente do benefício tem as suas necessidades amparadas adequadamente pela sua família' (TNU, INUJ no Processo nº 5000493-92.2014.4.04.7002, Relator Juiz Federal Daniel Machado da Rocha).

Com efeito, a técnica legislativa adotada - presunção legal absoluta - dispensa o esforço interpretativo e probatório, permitindo, no caso em tela, que a Administração não tivesse que analisar de forma exaustiva e quase que impossível mesmo de ser investigada a situação particularizada de cada aspirante ao BPC, a exemplo do que fizera ao determinar como absoluta a presunção de dependência do cônjuge, companheiro (a), filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave, previstos no art. 16, I, da Lei 8.213/91, que especifica os 'dependentes de primeira classe'.

Desse modo,  não há motivo para perquirir a renda desses dependentes de primeira classe para a configuração da dependência econômica necessária para o reconhecimento da condição de dependente do segurado da Previdência Social, nos termos do art. 16, § 4º, da LBPS/91, tampouco caberia duvidar da condição de miserabilidade daqueles cuja renda familiar sequer atinge o patamar mínimo fixado pela LOAS (1/4 do salário mínimo)!

Saliente-se, por oportuno, que dados da pesquisa Deficiência e Estado, ANIS 2008 e 2009, fornecidos pelo INSS, atestam que apenas 13,2% dos requerimentos administrativos de BPC são indeferidos em razão da renda per capita superior a um quarto de salário mínimo, enquanto que 82,7% dos indeferimentos é motivado por parecer contrário da perícia médica.

Esse percentual reduzido de indeferimentos por excedimento de renda permite confirmar a eficácia da presunção legal (absoluta) de vulnerabilidade aos que comprovem a renda no patamar máximo permitido pela lei.

Por isso, não compensaria ao INSS fazer a investigação particularizada de eventual sinal de riqueza do aspirante ao benefício. Gastaria mais para isso do que despende com eventuais benefícios indevidos.

Da mesma forma, o Poder Judiciário não pode ser mais realista do que o próprio Rei, investigando o que a via administrativa não se interessa. Até porque isso implicaria adoção de um critério anti-isonômico. Para alguns se faz a análise, quando judicializado o pedido, e para outros, que obtém o benefício na via administrativa, não.

Note-se que esse raciocínio está amparado na jurisprudência consolidada dos Tribunais Superiores.

[...] grifei.

Qualquer objeção à renda familiar per capita, tal como a alegação de possível renda ocultada ou não detectada, deve ser afirmada e demonstrada pelo INSS ou revelada na prova dos autos por meio de evidências gritantes de riqueza incompatível com a baixa renda. Não se pode admitir a presunção de renda oculta a partir de meras suspeitas ou indícios decorrentes de boas condições de habitação ou de materiais empregados em sua construção ou de mobília e eletrodomésticos que a guarnecem, muitas vezes adquiridos por obra de uma vida laboral do sujeito e de sua família, que apontam para a segurança financeira de outra época, na qual havia capacidade de obtenção de renda, mas que não retratam a atual situação de penúria vivenciada, decorrente de contingências sociais advenientes (idade avançada ou deficiência - TRF4, Rcl 5001287-84.2025.4.04.0000, 3ª Seção, Relator para Acórdão PAULO AFONSO BRUM VAZ, julgado em 24/07/2025).

No caso concreto, a decisão reclamada aponta as seguintes condições (e.62.1  do feito originário):

No caso concreto, a sentença assim fundamentou a procedência do pedido (evento 19):

 

Pretende a parte autora  a concessão de amparo social à pessoa idosa.

(...)

A parte autora é pessoa idosa, conforme comprovam seus documentos pessoais juntados ao processo.

No presente caso, somente há controvérsia quanto ao preenchimento do requisito socioeconômico.

A perícia socioeconômica realizada concluiu que, em que pese as ressalvas da perita, não há miserabilidade na residência da requerente, conforme trechos destacados abaixo (evento 11).

Durante a entrevista social foi observado que a família reside em uma casa simples, porém muito limpa e organizada. Provém seu sustento com bastante dificuldade uma vez que a única renda fixa no momento é o valor de um salário mínimo proveniente da aposentadoria do senhor José Carlos. Ocorre que a autora além de ser idosa e não gozar da mesma disposição para realizar atividades laborais,ainda conta com agravante do seu esposo ser oncológico, demandando dessa forma grande parte do seu tempo para auxilia-lo no tratamento, acompanhando as sessões de quimioterapia e consultas. Cabe salientar que Patrick, filho da autora está morando novamente com os pais e neste mês recebe a última parcela do seguro desemprego conforme mencionado anteriormente.

(...)

Embora a casa não apresente sinais de miserabilidade cabe salientar que a casa é emprestada.

Porém, não obstante a referência a não existir sinais de miserabilidade na residência do polo ativo, entendo possível o deferimento do benefício.

Primeiramente, em respeito aos princípios da igualdade e da razoabilidade, entendo que deve ser excluído do cálculo da renda familiar per capita qualquer benefício de valor mínimo recebido por maior de 65 anos, independentemente se assistencial ou previdenciário, aplicando-se, analogicamente, o disposto no parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso.

Desse modo, excluindo-se da renda familiar a aposentadoria no valor de 01 salário-mínimo do esposo da requerente - Sr. Jose Carlos - oriunda do benefício 41/1789070403 que titulariza, remanescem como componentes do grupo familiar apenas a requerente e seu filho maior, Patrick, que não possuem qualquer rendimento fixo, consoante destacado pela perita.Importante mencionar que, quanto ao filho, este foi inserido recentemente no grupo familiar, pois voltou a morar com os pais após seu divórcio. Ainda, Patrick recebeu a última parcela de seguro-desemprego em outubro de 2020, pelo que não conta atualmente com qualquer renda, de modo que essa recente alteração do grupo familiar não modifica, em nada, a renda familiar - que continua sendo composta somente pela aposentoria de José Carlos.

Portanto, é inequívoco que parte autora não conta, assim como seu grupo familiar, com rendimentos bastantes à manutenção de uma vida digna, o que evidencia situação de vulnerabilidade social - fato esse que não é afastado pelas boas condições da residência (vide imagens que acompanham o laudo).

Portanto, tenho que a autora faz jus à concessão do benefício assistencial pleiteado.

Além disso, diferente do alegado pelo INSS em Contestação (evento 17), o fato da requerente contribuir como Facultativo não prejudica a concessão do benefício, porque não altera a situação de vulnerabilidade social evidenciada e, respeitado o limite da renda, não há qualquer vedação legal quanto ao ponto.

Dessa forma, a parte autora tem direito ao benefício a partir da data de entrada de entrada do requerimento - DER (24.10.2018).

 

Quanto ao Sr. José, este teve sua aposentadoria por idade cessada em 19/01/2021 devido a seu falecimento (evento 44, CNIS1), o que resultou em recebimento, pela parte autora, do benefício assistencial deferida em sede de tutela de urgência na sentença de 24/10/2018 a 18/01/2021, em virtude da concessão de pensão por morte decorrente do falecimento de seu ex-cônjuge a partir de 19/01/2021 (evento 57, CNIS1).

 

Analisando o conjunto probatório coligido aos autos resta evidente que a autora  tinha suas necessidades supridas por familiares no período controverso entre a DER 24/10/2018 até 18/01/2021, ainda que não possuísse nenhuma fonte de renda declarada além do benefício previdenciário no valor de 1 salário mínimo de seu esposo (José Carlos).

Ademais, as fotografias anexadas ao laudo demonstram uma residência em boas condições de habitação, em padrão típico da classe média (evento 11, LAUDO1).

Destaco, ainda, trechos do laudo social que mostram que as despesas declaradas são compatíveis com o orçamento familiar e que não se observam sinais de miserabilidade, inclusive contando a família com veículo próprio:

 

3. Enumere a assistente social as principais despesas suportadas pelo grupo familiar (se

possível comprovadas documentalmente).As principais despesas suportadas pelo grupo familiar são:Luz: R$114,80 reaisAgua: em média R$96,00 reais.Super mercado em torno de R$1000,00 reaisRemédios: em torno de R$100 reais.Contribuição previdência social: 114,00 reais.

4. Descreva a assistente social o imóvel em que reside a parte autora, indicando o material utilizado na construção (alvenaria, madeira etc.), o número de cômodos e estado de conservação geral. Trata-se de imóvel próprio (ou da família do periciando)? Em caso negativo

(imóvel de terceiro), é alugado ou cedido gratuitamente? Qual o valor do aluguel e demaisencargos?A autora reside em uma casa emprestada pela irmã, de alvenaria em conservação razoável. A casa possui 5 peças.

5. Há veículos, telefones fixo ou celular, eletrodomésticos e outros utensílios na casa em quereside a parte autora? Quais e quantos? Estão em bom estado?A autora dispõe de um veículo antigo já quitado da época que senhor José Carlos trabalhava, dentre os eletrodomésticos estão geladeira, uma televisão, um fogão, uma máquina de lavar roupa, dois celulares, um ventilador. O estado de conservação é razoável.

(...)

7. Existem sinais de miserabilidade na residência do autor?

Embora a casa não apresente sinais de miserabilidade cabe salientar que a casa é emprestada.

 

De se destacar, ainda, que a autora contribuiu como facultativa de 07/2014 a 02/2020 (evento 57, CNIS1), o que também vai de encontro ao conceito de miserabilidade.

 

Por fim, o filho Patrick  (evento 43, CNIS1) teve vínculo de empreog de 18/12/2017 a 16/04/2018 (comsalário superior a R$ 3.000,00) e de 18/03/2019 a 03/04/2020 (com salário de aproximadamente R$ 1.500,00), com notícia de que, à época do estudo social, estava recebendo seguro-desemprego, sem qualquer notícia de incapacidade para o trabalho que o impedisse de reingressar no mercado de trabalho e continuar auxiliando no sustendo da família.

Dessa forma, resta claro que a família possuía recursos suficientes para prover as necessidades básicas da autora de forma digna, não necessitando de amparo do Estado no período controverso entre a DER 24/10/2018 até 18/01/2021 (véspera do dia em que a autora teve deferido benefício de pensão por morte, benefício inacumulável com o benefício assistencial, na forma do § 4º do art. 20 da Lei 8.742/93.

O benefício é dado àqueles que não possuem meios de prover a sua subsistência ou de tê-la provida por sua família. A obrigação do Estado é apenas secundária, sendo a obrigação principal dada aos familiares.

Esclareço que, embora o limite mínimo previsto no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93  gere, por conta do decidido no IRDR 12 do TRF4, para a concessão do benefício assistencial, uma presunção absoluta de miserabilidade, não se pode olvidar que o direito ao amparo assistencial pressupõe o preenchimento dos requisitos : a) condição de deficiente  ou idoso  e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) do demandante.

A inexistência de renda ou de renda inferior a 1/4 do salário mínimo não podem ser tratadas como equivalentes à situação de renda não detectada, porquanto provocam resultados diversos nas condições de vida de quem solicita o benefício:  quando a renda é inexistente ou inferior a 1/4 do salário mínimo, o observador externo percebe o desamparo, a penúria, a miséria das condições de vida do requerente, ao passo que, quando há renda, ainda que não detectada, as condições de vida do requerente são percebidas como dignas por quem observa o quadro, pois, ainda que se perceba a pobreza nas condições de vida do requerente, estas não são extremas. 

Vê-se, pois, que não basta a mera formalidade de se decretar a inexistência da renda para qualifcar o requerente ao benefício; há que se apurar se estão presentes materialmente na vida do requerente as condições extremas de penúria para, aí sim, alcançar o benefício estatal. Ou seja, a inexistência ou insuficiência de renda não pode ser meramente formal, mas concreta, irradiando-se sob as condições de vida do requerente.

[...]

Concluo, pois, que não observar a existência da miséria concreta nas condições de vida do requerente significa, ao fim, promover grave injustiça, na medida em que se permitiria que pessoas com renda indetectável ou que mantenham patrimônio significativo sem, contudo, indicar a existência de renda, se apropriassem destes recursos destinados ao verdadeiramente credores dele, a população que vive em situação de extrema pobreza.

Seria, ao fim, instituir mais uma odiosa forma de indevida transferência de renda em favor dos mais favorecidos (membros da classe média ou pobre, ausente situação de extrema pobreza) em prejuízo dos extremamente pobres, estes sim os verdadeiros e únicos destinatários da proteção estatal.

Ou seja, uma vez que a solicitação de BPC reclama, dentre outros requisitos, que se afira a existência concreta de estado de miséria daquele que o pleiteia, a única dicção possível para a presunção absoluta estabelecida pelo IRDR Tema 12 é a de que a inexistência de renda não é  meramente formal, mas concreta, e é confirmada pela verificação de que as condições em que vive o requerente são de extrema pobreza, justamente porque não possui renda alguma ou esta é insuficiente. 

No caso concreto, a parte autora não se encontra em situação de risco, de desamparo, pois evidencia um padrão de vida totalmente incompatível com sua alegada miserabilidade. Ademais, o auxílio financeiro recebido por familiares representa, na prática, renda per capita superior a 1/4 do salário mínimo.

Logo, não se pode cogitar de afronta à tese firmada no julgamento do IRDR n. 12 do TRF da 4ª Região.

[...]

Por tais razões, a parte autora não tem direito ao benefício postulado desde a DER 24/10/2018 até 18/01/2021.

Merece, portanto, ser provido o recurso do INSS.

Registre-se que, a prevalecer o posicionamento da Turma Recursal, retornaria-se ao status quo anterior à fixação da tese do IRDR 12/TRF4, no qual, ainda que a renda mensal per capita familiar se revelasse abaixo do patamar previsto em lei, pedidos de BPC eram negados judicialmente sob análise e fundamentação subjetivista das condições de habitação ou de vida.

Há de se concluir, portanto, que o órgão julgador reclamado, ao negar a prestação de benefício assistencial, contrariou o entendimento firmado no julgamento do IRDR 12/TRF4, consoante opinou o parecer da Procuradoria Regional da República da 4ª Região (e. 17.1):

No caso dos autos (processo n. 5002377-16.2020.4.04.7110/RS), consta que a parte autora, idosa, com mais de 65 anos, no período controverso, anterior ao falecimento do marido (de 24/10/2018 - data da entrada do requerimento do benefício assistencial até 18/01/2021 - data da concessão do benefício de pensão por morte), o grupo familiar era composto por ela e pelo marido, sendo que a renda era nula porquanto advinha unicamente do benefício de aposentadoria por idade deste último, no importe de um salário mínimo, a qual deve ser excluída do cálculo da renda familiar. Por isso, aduz que o entendimento da 4ª Turma Recursal do Rio Grande do Sul, no sentido de que a parte reclamante não se encontra em situação de absoluto desamparo, contraria o julgado antes referido (IRDR nº 12 do TRF4), que pacificou o entendimento de que se a renda per capita for inferior ao limite a 1⁄4 de salário, há presunção absoluta de hipossuficiência econômica.

Em que pese constatada a renda familiar inferior ao patamar legal, o acórdão prosseguiu na análise das condições de vida do grupo familiar, para, então, negar o benefício.

O entendimento firmado na IRDR 12/TRF4 consolidou a presunção absoluta de hipossuficiência econômica a partir do preenchimento do critério objetivo de renda irradia efeitos em todas as demandas que tramitem sob abrangência jurisdicional do Tribunal, independentemente da existência de tese em sentido contrário firmada pela TNU.

Desse modo, uma vez constatada a inexistência de renda para o núcleo familiar da parte reclamante no período controverso supra referido, aplica-se a presunção absoluta de vulnerabilidade socioeconômica, com o que se “dispensa o esforço interpretativo e probatório”, nas palavras do voto exarado no IRDR 12.

A reclamação, portanto, deve ser julgada procedente com fundamento nos arts. 988, IV, e § 4º, e 992 do CPC, a fim de cassar a decisão impugnada para que outra seja prolatada pela autoridade reclamada em conformidade com a tese jurídica firmada no IRDR 12/TRF4.

Ante o exposto, voto por julgar procedente a reclamação.




Documento eletrônico assinado por LUISA HICKEL GAMBA , Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005419072v4 e do código CRC cd1eb522.

Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): LUISA HICKEL GAMBA Data e Hora: 24/10/2025, às 18:21:26

 


 

5000324-76.2025.4.04.0000
40005419072 .V4


Conferência de autenticidade emitida em 31/10/2025 04:08:52.



Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Reclamação (Seção) Nº 5000324-76.2025.4.04.0000/RS

RELATOR Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

EMENTA

DIREITO PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECLAMAÇÃO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. IRDR. PRESUNÇÃO ABSOLUTA DE MISERABILIDADE. RECLAMAÇÃO PROCEDENTE.

I. CASO EM EXAME:

1. Reclamação proposta em face de decisão de Turma Recursal que, ao negar benefício assistencial, desrespeitou a tese jurídica firmada no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) 12 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), que estabelece presunção absoluta de miserabilidade.

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO:

2. A questão em discussão consiste em saber se a decisão impugnada desconsiderou o precedente vinculante do IRDR 12/TRF4, que fixou a presunção absoluta de miserabilidade para a concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS) quando a renda familiar per capita é inferior a 1/4 do salário-mínimo.

III. RAZÕES DE DECIDIR:

3. A tese do IRDR 12/TRF4 estabelece presunção absoluta de miserabilidade para a concessão do benefício assistencial quando a renda mensal per capita da família é inferior a 1/4 do salário-mínimo, conforme o art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993.

4. A tese jurídica firmada por Tribunal Regional Federal em IRDR é de observância obrigatória em toda a região, inclusive para os Juizados Especiais Federais, nos termos do art. 985, I, do CPC.5. A tese da TNU no Tema 122, que considera a presunção de miserabilidade relativa, não afasta a aplicação do precedente obrigatório regional, pois as decisões da TNU não possuem status de precedente obrigatório, não constando do rol do art. 927 do CPC.

6. O objetivo do IRDR 12/TRF4 é conter o subjetivismo judicial na avaliação da miserabilidade em situações de baixa renda per capita, dispensando esforço interpretativo e probatório.

7. No caso concreto, a renda familiar per capita era nula no período controverso (excluindo a aposentadoria do esposo, por analogia ao Estatuto do Idoso), o que, pela tese do IRDR 12/TRF4, gera presunção absoluta de vulnerabilidade socioeconômica.

8. A decisão reclamada, ao analisar subjetivamente as condições de vida da requerente (boas condições da residência, veículo, contribuição como facultativa, auxílio de familiares) para afastar a miserabilidade, desconsiderou a presunção absoluta e contrariou o precedente vinculante.

IV. DISPOSITIVO E TESE:

9. Reclamação julgada procedente.Tese de julgamento: 10. A tese do IRDR 12/TRF4, que estabelece presunção absoluta de miserabilidade para BPC/LOAS quando a renda familiar per capita é inferior a 1/4 do salário-mínimo, é de observância obrigatória pelos Juizados Especiais Federais da região, não podendo ser afastada por análise subjetiva das condições de vida ou por tese da TNU em sentido contrário.

___________

Dispositivos relevantes citados: Lei nº 8.742/1993, art. 20, § 3º; CPC, arts. 927, 985, I, § 1º, 988, IV, § 4º, e 992.

Jurisprudência relevante citada: TRF4, IRDR 12 (50130367920174040000), j. 21.02.2018; TRF4, Rcl 5001287-84.2025.4.04.0000, Rel. p/ Acórdão Paulo Afonso Brum Vaz, j. 24.07.2025.

 

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, julgar procedente a reclamação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 23 de outubro de 2025.




Documento eletrônico assinado por LUISA HICKEL GAMBA , Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005419073v4 e do código CRC 6e7f00e1.

Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): LUISA HICKEL GAMBA Data e Hora: 24/10/2025, às 18:21:26

 


 

5000324-76.2025.4.04.0000
40005419073 .V4


Conferência de autenticidade emitida em 31/10/2025 04:08:52.



Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO PRESENCIAL DE 23/10/2025

Reclamação (Seção) Nº 5000324-76.2025.4.04.0000/RS

RELATORA Juíza Federal LUÍSA HICKEL GAMBA

PRESIDENTE Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

PROCURADOR(A) VITOR HUGO GOMES DA CUNHA

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Presencial do dia 23/10/2025, na sequência 19, disponibilizada no DE de 13/10/2025.

Certifico que a 3ª Seção, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 3ª SEÇÃO DECIDIU, POR UNANIMIDADE, JULGAR PROCEDENTE A RECLAMAÇÃO.

RELATORA DO ACÓRDÃO Juíza Federal LUÍSA HICKEL GAMBA

Votante Juíza Federal LUÍSA HICKEL GAMBA

Votante Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante Desembargador Federal CELSO KIPPER

Votante Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA

Votante Juíza Federal IVANISE CORRÊA RODRIGUES PEROTONI

Votante Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

Votante Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA

Votante Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

Votante Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR

MÁRCIA CRISTINA ABBUD

Secretária



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