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Apelação Cível Nº 5004844-89.2024.4.04.9999/RS
RELATOR Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
RELATÓRIO
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo INSS contra sentença proferida pelo Juízo a quo, que julgou PARCIALMENTE PROCEDENTE o(s) pedido(s) formulado(s) na inicial, nos seguintes termos ():
JULGO PROCEDENTE o pedido deduzido pela parte autora em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL ? INSS, para efeito de:
a) RECONHECER o exercício de atividade rural da parte autora no período de 12/09/1986 a 28/02/1993 e 01/12/1993 a 31/01/1995;
b) DETERMINAR a averbação do respectivo tempo de serviço rural de 12/09/1986 a 31/10/1991 nos termos da fundamentação retro;
c) DETERMINAR que a autarquia forneça a guia de recolhimento do período de 01/11/1991 a 28/02/1993 e de 01/12/1993 a 31/01/1995;
d) DECLARAR a inexigibilidade de juros e multa sobre a indenização das contribuições referentes ao período em que a parte autora laborou na atividade rural anteriormente à edição da Medida Provisória n. 1.523/96, fazendo jus à averbação do correspondente tempo de serviço/contribuição;
e) RECONHECER como especiais as atividades urbanas desempenhadas em 01/02/1995 a 07/08/1995 e de 01/04/1997 a 13/04/2017, fazendo convertê-las em tempo de serviço comum pelo multiplicador 1,4 com a respectiva averbação.
f) CONDENAR a parte ré a conceder à autora benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de contribuição com incidência do fator previdenciário, a contar da DER 26/06/2017, condenando a autarquia ao pagamento retroativo das prestações devidas, corrigidos pelo IPCA-E desde a data de cada vencimento a contar da DER, acrescidos de juros de mora a partir da citação, consoante índice que remunera a caderneta de poupança, até 09/12/2021. A partir de então, incide exclusivamente a taxa SELIC, nos termos do art. 3° da EC 113/2021.
O INSS alegou (), em síntese, que não houve comprovação da especialidade dos períodos julgados pela sentença, por exposição ao agente ruído. Ainda, afirmou que deve ser afastado o reconhecimento de período especial e reformada a sentença.
A parte autora (), por seu turno, postulou pelo reconhecimento do período rural de 01/11/1991 a 28/02/1993 e de 01/12/1993 a 31/01/1995. Referiu que foi solicitada a expedição de guias desde a petição inicial ao qual se recusou o INSS. Postula pela reforma da sentença e inclusão dos períodos no cálculo concessório.
Foi oportunizada a apresentação de contrarrazões.
Vieram os autos para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de Admissibilidade.
À luz do estatuído no art. 1.010 do CPC/2015, dentre outros elementos, o recurso de apelação deve apresentar no seu bojo as razões do pedido de reforma ou de decretação de nulidade, tratando-se, portanto, de requisito de admissibilidade da apelação. Por outras palavras, a parte deve expressar as razões de fato e de direito que ensejaram a sua inconformidade com a decisão prolatada, sob pena de ausência de conhecimento do recurso.
A propósito do tema, colaciono os seguintes julgados desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO GENÉRICA. NÃO CONHECIMENTO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. NÃO CONFIGURAÇÃO. 1. Não se conhece do recurso de apelação que veicula apenas alegações genéricas, deixando de impugnar de forma concreta a decisão recorrida, sob pena de violação ao disposto no artigo 932, inciso III, do CPC/2015. 2. A apresentação de apelação genérica, contudo, não tem o condão, por si só, de fazer presumir a ocorrência de litigância de má-fé. Inteligência do artigo 80 do NCPC. (TRF4, AC 5016495-79.2015.404.7107, QUINTA TURMA, Relator para Acórdão ROGER RAUPP RIOS, juntado aos autos em 14/06/2017) (grifo intencional)
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APELAÇÃO. ÔNUS DA IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA. RAZÕES DISSOCIADAS DA SENTENÇA. Não se conhece da apelação que discorre sobre questões desvinculadas da sentença, por não haver impugnação específica ao julgado, conforme previsto no artigo 1.010, III, do NCPC. (TRF4, AC 0016459-45.2016.404.9999, QUINTA TURMA, Relator LUIZ CARLOS CANALLI, D.E. 28/09/2017)
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL. APELAÇÃO GENÉRICA. NÃO CONHECIMENTO. Não se conhece de apelação genérica ou que não impugne especificamente a argumentação exposta na sentença. (TRF4, AC 5029361-37.2019.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, juntado aos autos em 03/12/2020)
No caso dos autos, a parte autora pede que o período rural de 01/11/1991 a 28/02/1993 e de 01/12/1993 a 31/01/1995 seja computado para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição. Contudo, a questão foi decidida na sentença pelo reconhecimento dos períodos e a determinação do INSS de expedição das guias para indenização dos referidos lapsos temporais. Portanto, a inclusão dos períodos no PBC do autor é consequência lógica assim que realizado o pagamento da indenização.
Assim, requer a parte autora a manutenção da sentença. Não há interesse recursal. Assim, não conheço do recurso de apelação do autor no tópico.
Do ruído - Níveis, metodologia, ineficácia de EPI.
Relativamente ao agente nocivo ruído, deve ocorrer efetiva comprovação da exposição, que ocorre nos formulários-padrão, embasados em laudo técnico, ou por perícia técnica produzida em juízo. Dessa maneira, mesmo no período anterior a 28/04/1995, quando ainda vigente enquadramento por categoria profissional, exige-se a demonstração da exposição ao agente ruído.
Para fins de estabelecimento da nocividade do agente, o quadro Anexo do Decreto n.º 53.831, de 25/03/1964, o Anexo I do Decreto n.º 83.080, de 24/01/1979, o Anexo IV do Decreto n.º 2.172, de 05/03/1997, e o Anexo IV do Decreto n.º 3.048, de 06/05/1999, alterado pelo Decreto n.º 4.882, de 18/11/2003, trazem em seu bojo os níveis de pressão sonora para fins de determinação da insalubridade, superiores a 80, 85 e 90 decibéis, de acordo com os Códigos 1.1.6, 1.1.5, 2.0.1 e 2.0.1, in verbis:
Período trabalhado | Enquadramento | Limites de tolerância |
Até 05/03/1997 | 1. Anexo do Decreto nº 53.831/64; 2. Anexo I do Decreto nº 83.080/79; | 1. Superior a 80 dB; 2. Superior a 90 dB. |
De 06/03/1997 a 06/05/1999 | Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 | Superior a 90 dB. |
De 07/05/1999 a 18/11/2003 | Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, na redação original | Superior a 90 dB. |
A partir de 19/11/2003 | Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, com a alteração introduzida pelo Decreto nº 4.882/2003 | Superior a 85 dB. |
Em relação à exposição ao ruído, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.398.260/PR (Tema 694), definiu que a especialidade em razão da exposição ao agente nocivo ruído é regida pela legislação vigente à época da prestação do serviço. Dessa forma, considera-se "especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis até a edição do Decreto 2.172/1997. Após essa data, o nível de ruído considerado prejudicial é o superior a 90 decibéis. Com a entrada em vigor do Decreto 4.882, em 18.11.2003, o limite de tolerância ao agente físico ruído foi reduzido para 85 decibéis" (RESP 1333511 - CASTRO MEIRA).
A respeito dos picos de ruído, o STJ fixou, por meio do REsp 1886795/RS e do REsp 1890010/RS, representativos de controvérsia repetitiva (Tema 1083), a seguinte tese jurídica:
O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço".
Portanto, possível o reconhecimento de atividade especial quando há exposição a picos de ruído superiores aos limites legais e há registro de exposição contínua ao agente nocivo.
A metodologia de aferição NHO-01 da Fundacentro (Nível de Exposição Normalizado - NEN) se tornou obrigatória so mente a partir de 18-11-2003, com a entrada em vigor do Decreto 4.882/2003. Nesses termos, quando a informação acerca do NEN constar do processo, ele será considerado para fins do enquadramento da atividade como especial, uma vez que essa metodologia, que considera as variações da incidência de ruído, efetivamente retrata de modo fiel as condições de trabalho a que o segurado está submetido. Contudo, quando não houver indicação da metodologia utilizada para aferição dos níveis de ruído, ou for utilizada metodologia diversa, o enquadramento deve ser analisado de acordo com a aferição do ruído que for apresentada no processo, bastando que a exposição esteja embasada em estudo técnico realizado por profissional habilitado para tanto (AC 5015224-47.2015.4.04.7200, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, em 19/09/2019; QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, em 08/07/2020; TRF4, AC 5020691-74.2019.4.04.7100, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 07/06/2021).
Outrossim, em se tratando de níveis variáveis de ruído, será adotado o critério de “picos de ruído”. Nesse sentido o STJ decidiu, no julgamento do Tema 1.083:
O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço.(REsp 1890010/RS, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 18/11/2021, DJe 25/11/2021)
Ressalta-se, ainda, que mesmo que não se saiba a quantidade exata de tempo de exposição ao agente insalubre, poderá o segurado ter seu período de trabalho reconhecido como especial. Torna-se, nesse caso, necessária a demonstração de que o segurado estava sujeito, diuturnamente, a condições prejudiciais à sua saúde. A propósito, a jurisprudência desta Corte, ipsis litteris:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. INTERMITÊNCIA. (...) 3. Os requisitos da habitualidade e da permanência devem ser entendidos como não-eventualidade e efetividade da função insalutífera, continuidade e não-interrupção da exposição ao agente nocivo. A intermitência refere-se ao exercício da atividade em local insalubre de modo descontínuo, ou seja, somente em determinadas ocasiões. 4. Se o trabalhador desempenha diuturnamente suas funções em locais insalubres, mesmo que apenas em metade de sua jornada de trabalho, tem direito ao cômputo do tempo de serviço especial, porque estava exposto ao agente agressivo de modo constante, efetivo, habitual e permanente.(AC nº 2000.04.01.073799-6/PR,TRF-4ª Região, 6ª Turma, Rel. Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon , DJU 9-5-2001).
Quanto aos equipamentos de proteção individual (EPI), o seu uso revela-se ineficaz para neutralizar os danos causados ao organismo humano no caso do Agente ruído. Isso porque, consoante já identificado pela medicina do trabalho, a exposição a níveis elevados de ruído não causa danos apenas à audição, de sorte que protetores auriculares não são capazes de neutralizar os riscos à saúde do trabalhador. Os ruídos ambientais não são absorvidos apenas pelos ouvidos e suas estruturas condutivas, mas também pela estrutura óssea da cabeça, sendo que o protetor auricular reduz apenas a transmissão aérea e não a óssea, daí que a exposição, durante grande parte do tempo de serviço do segurado produz efeitos nocivos a longo prazo, como zumbidos e distúrbios do sono.
Por essa razão, o STF, no julgamento Tema 555 (ARE nº 664.335) fixou tese segundo a qual “na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria”.
Caso concreto
A sentença analisou a questão nos seguintes termos:
"Tangente ao período de 01/01/2004 a 13/04/2017, o expert concluiu que o autor não exerceu atividades insalubres no referido interregno, em especial, ruído acima dos limites permitidos. (Evento 46, LAUDO1)
No entanto, especificamente quanto ao agente nocivo ruído, a comprovação da especialidade da atividade laboral pressupõe a existência de parecer técnico atestando a exposição do segurado a níveis de pressão sonora acima dos limites de tolerância.
Referidos limites foram estabelecidos, sucessivamente:
- Até 05/03/1997: Anexo do Decreto nº 53.831/64 (superior a 80dB) e Anexo I do Decreto nº 83.080/79 (superior a 90dB);
- De 06/03/1997 a 06/05/1999: Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 (superior a 90 dB);
- De 07/05/1999 a 18/11/2003: Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99, em sua redação original (superior a 90 dB);
- A partir de 19/11/2003: Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99, alterado pelo Decreto n.º 4.882/2003 (superior a 85 dB).
Quanto à questão sobre a neutralização do agente nocivo ruído pelo uso de EPIs, o Supremo Tribunal Federal manifestou-se em sede de repercussão geral (Tema 555 STF):
RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO CONSTITUCIONAL PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ART. 201, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. REQUISITOS DE CARACTERIZAÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO SOB CONDIÇÕES NOCIVAS. FORNECIMENTO DE EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL - EPI. TEMA COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA PELO PLENÁRIO VIRTUAL. EFETIVA EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS À SAÚDE. NEUTRALIZAÇÃO DA RELAÇÃO NOCIVA ENTRE O AGENTE INSALUBRE E O TRABALHADOR. COMPROVAÇÃO NO PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO PPP OU SIMILAR. NÃO CARACTERIZAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS HÁBEIS À CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPECIAL. CASO CONCRETO. AGENTE NOCIVO RUÍDO. UTILIZAÇÃO DE EPI. EFICÁCIA. REDUÇÃO DA NOCIVIDADE. CENÁRIO ATUAL. IMPOSSIBILIDADE DE NEUTRALIZAÇÃO. NÃO DESCARACTERIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES PREJUDICIAIS. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DEVIDO. AGRAVO CONHECIDO PARA NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. 1. Conduz à admissibilidade do Recurso Extraordinário a densidade constitucional, no aresto recorrido, do direito fundamental à previdência social (art. 201, CRFB/88), com reflexos mediatos nos cânones constitucionais do direito à vida (art. 5º, caput, CRFB/88), à saúde (arts. 3º, 5º e 196, CRFB/88), à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CRFB/88) e ao meio ambiente de trabalho equilibrado (arts. 193 e 225, CRFB/88). 2. A eliminação das atividades laborais nocivas deve ser a meta maior da Sociedade - Estado, empresariado, trabalhadores e representantes sindicais -, que devem voltar-se incessantemente para com a defesa da saúde dos trabalhadores, como enuncia a Constituição da República, ao erigir como pilares do Estado Democrático de Direito a dignidade humana (art. 1º, III, CRFB/88), a valorização social do trabalho, a preservação da vida e da saúde (art. 3º, 5º, e 196, CRFB/88), e o meio ambiente de trabalho equilibrado (art. 193, e 225, CRFB/88). 3. A aposentadoria especial prevista no artigo 201, § 1º, da Constituição da República, significa que poderão ser adotados, para concessão de aposentadorias aos beneficiários do regime geral de previdência social, requisitos e critérios diferenciados nos "casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar". 4. A aposentadoria especial possui nítido caráter preventivo e impõe-se para aqueles trabalhadores que laboram expostos a agentes prejudiciais à saúde e a fortiori possuem um desgaste naturalmente maior, por que não se lhes pode exigir o cumprimento do mesmo tempo de contribuição que aqueles empregados que não se encontram expostos a nenhum agente nocivo. 5. A norma inscrita no art. 195, § 5º, CRFB/88, veda a criação, majoração ou extensão de benefício sem a correspondente fonte de custeio, disposição dirigida ao legislador ordinário, sendo inexigível quando se tratar de benefício criado diretamente pela Constituição. Deveras, o direito à aposentadoria especial foi outorgado aos seus destinatários por norma constitucional (em sua origem o art. 202, e atualmente o art. 201, § 1º, CRFB/88). Precedentes: RE 151.106 AgR/SP, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 28/09/1993, Primeira Turma, DJ de 26/11/93; RE 220.742, Rel. Min. Néri da Silveira, julgamento em 03/03/98, Segunda Turma, DJ de 04/09/1998. 6. Existência de fonte de custeio para o direito à aposentadoria especial antes, através dos instrumentos tradicionais de financiamento da previdência social mencionados no art. 195, da CRFB/88, e depois da Medida Provisória nº 1.729/98, posteriormente convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998. Legislação que, ao reformular o seu modelo de financiamento, inseriu os §§ 6º e 7º no art. 57 da Lei n.º 8.213/91, e estabeleceu que este benefício será financiado com recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei nº 8.212/91, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente. 7. Por outro lado, o art. 10 da Lei nº 10.666/2003, ao criar o Fator Acidentário de Prevenção-FAP, concedeu redução de até 50% do valor desta contribuição em favor das empresas que disponibilizem aos seus empregados equipamentos de proteção declarados eficazes nos formulários previstos na legislação, o qual funciona como incentivo para que as empresas continuem a cumprir a sua função social, proporcionando um ambiente de trabalho hígido a seus trabalhadores. 8. O risco social aplicável ao benefício previdenciário da aposentadoria especial é o exercício de atividade em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física (CRFB/88, art. 201, § 1º), de forma que torna indispensável que o indivíduo trabalhe exposto a uma nocividade notadamente capaz de ensejar o referido dano, porquanto a tutela legal considera a exposição do segurado pelo risco presumido presente na relação entre agente nocivo e o trabalhador. 9. A interpretação do instituto da aposentadoria especial mais consentânea com o texto constitucional é aquela que conduz a uma proteção efetiva do trabalhador, considerando o benefício da aposentadoria especial excepcional, destinado ao segurado que efetivamente exerceu suas atividades laborativas em "condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física". 10. Consectariamente, a primeira tese objetiva que se firma é: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial. 11. A Administração poderá, no exercício da fiscalização, aferir as informações prestadas pela empresa, sem prejuízo do inafastável judicial review. Em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete. 12. In casu, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído, desde que em limites acima do limite legal, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas. O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente. O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente. 13. Ainda que se pudesse aceitar que o problema causado pela exposição ao ruído relacionasse apenas à perda das funções auditivas, o que indubitavelmente não é o caso, é certo que não se pode garantir uma eficácia real na eliminação dos efeitos do agente nocivo ruído com a simples utilização de EPI, pois são inúmeros os fatores que influenciam na sua efetividade, dentro dos quais muitos são impassíveis de um controle efetivo, tanto pelas empresas, quanto pelos trabalhadores. 14. Desse modo, a segunda tese fixada neste Recurso Extraordinário é a seguinte: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria. 15. Agravo conhecido para negar provimento ao Recurso Extraordinário. (ARE 664335, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 4-12-2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-029 DIVULG 11-2-2015 PUBLIC 12-2-2015)
Quanto ao trabalho prestado a partir de 19/11/2003, ainda que ausente informação acerca da técnica utilizada na aferição do nível de pressão sonora, há conclusão da condição agressiva da atividade prestada pela parte autora, decorrente da exposição, habitual e permanente, a ruído superior a 85 dB(A), razão pela qual é possível o seu enquadramento como nociva.
No caso dos autos, o período analisado é posterior a 19/11/2003 (de 01/01/2004 a 13/04/2017). Para o referido interregno, o expert referiu que no local de trabalho do autor havia geração de ruído com níveis variando entre 85,0 db(A) e 95,0 db(A) (Evento 46, LAUDO1).
A nocividade do trabalho não foi neutralizada pelo uso de EPIs. A um, porque a utilização de equipamentos de proteção individual é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador. A dois, porque o STF, em regime de repercussão geral, deixou assentado que, nas hipóteses de submissão a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracterizaria o tempo de serviço especial para aposentadoria (ARE nº 664.335, Relator Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, DJE 12/02/2015), conforme já referido.
Nesse passo, é possível o reconhecimento como tempo especial as atividades que o autor exerceu no período de 01/01/2004 a 13/04/2017.
Neste ponto a utilização de equipamento de proteção individual (EPI) não afasta a especialidade da atividade desenvolvida com exposição habitual e permanente a níveis de ruído acima dos limites de tolerância estabelecidos na legislação, pois não logra neutralizar os danos causados pelo ruído no organismo do trabalhador1.
A sentença não merece reparos em sua análise dos períodos objeto de recurso, porquanto apreciou a prova juntada pelas partes em sua integralidade e com respeito aos entendimentos consolidados nesta corte em seus pontos controvertidos, como exposto anteriormente, na forma de premissas de análise.
De fato, a prova produzida indica que o segurado esteve exposto aos agentes nocivos ruído ensejadores da especialidade do labor durante os períodos impugnados, não neutralizados pelo eventual uso de EPI, fato que, nos termos já expostos, conduz ao reconhecimento pleiteado.
Portanto, improcede o apelo autárquico quanto aos períodos reconhecidos como especiais pela sentença, que deve ser mantida.
Honorários advocatícios
Deve ser mantida a condenação em honorários advocatícios imposta na sentença.
Implantação do benefício - Tutela Específica
Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do CPC, a qual se dará em duas etapas.
Na primeira, deverá o INSS disponibilizar, em 20 (vinte) dias, a(s) guia(s) de pagamento necessária(s) para o pagamento da indenização das contribuições relativas ao período de labor rural reconhecido na sentença, de 01/11/1991 a 28/02/1993 e de 01/12/1993 a 31/01/1995, com prazo de vencimento de 30 (trinta) dias.
Comprovado o recolhimento da guia nos autos, deverá o INSS implantar o benefício em até 30 dias.
| TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB | |
|---|---|
| Cumprimento | Implantar Benefício |
| NB | 1776241433 |
| Espécie | Aposentadoria por Tempo de Contribuição |
| DIB | 26/06/2017 |
| DIP | |
| DCB | |
| RMI | |
| Segurado Especial | Não |
| Observações | null |
A presente determinação se dá sem prejuízo do transcurso dos prazos recursais e do trânsito em julgado e devolução dos autos à origem, hipótese em que a continuidade do cumprimento da presente ordem prosseguirá nos autos do cumprimento de sentença.
Conclusão
- Não conhecido o apelo da parte autora
- Negado provimento ao apelo do INSS;
- Mantidos os honorários como fixados em sentença.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por não conhecer o recurso da parte autora, negar provimento ao recurso do INSS e determinar a imediata implantação do benefício, via CEAB.
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Apelação Cível Nº 5004844-89.2024.4.04.9999/RS
RELATOR Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO RURAL E ESPECIAL. RECURSO DO AUTOR NÃO CONHECIDO. RECURSO DO INSS DESPROVIDO.
I. CASO EM EXAME:
1. Apelação cível interposta pelo INSS contra sentença que reconheceu períodos de atividade especial por exposição a ruído e pela parte autora buscando o reconhecimento de período rural sem indenização prévia, em ação de aposentadoria por tempo de contribuição.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO:
2. Há duas questões em discussão: (i) a comprovação da especialidade dos períodos de trabalho por exposição ao agente ruído; e (ii) a necessidade de indenização prévia para o cômputo de tempo rural já reconhecido em sentença.
III. RAZÕES DE DECIDIR:
3. O recurso de apelação da parte autora, que busca o reconhecimento do período rural de 01/11/1991 a 28/02/1993 e de 01/12/1993 a 31/01/1995 para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, não foi conhecido por ausência de interesse recursal. A sentença já havia reconhecido tais períodos e determinado a expedição de guias para indenização dos referidos lapsos temporais, sendo a inclusão no cálculo concessório uma consequência lógica após o pagamento da indenização.4. Foi negado provimento ao recurso do INSS, mantendo-se o reconhecimento do período de 01/01/2004 a 13/04/2017 como tempo especial. A decisão se baseia na comprovação da exposição do segurado a níveis de ruído variando entre 85,0 dB(A) e 95,0 dB(A), que superam o limite de 85 dB(A) estabelecido a partir de 19/11/2003 pelo Decreto nº 4.882/2003. Adicionalmente, o uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) não descaracteriza a especialidade da atividade, conforme tese firmada pelo STF no Tema 555 (ARE nº 664.335), que reconhece a ineficácia dos EPIs para neutralizar integralmente os danos causados pelo ruído ao organismo do trabalhador.5. Determinou-se a imediata implantação do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a contar da DER 26/06/2017, nos termos do art. 497 do CPC. O INSS deverá, em 20 dias, disponibilizar as guias para indenização do período rural de 01/11/1991 a 28/02/1993 e de 01/12/1993 a 31/01/1995. Após a comprovação do recolhimento, o benefício deverá ser implantado em até 30 dias.
IV. DISPOSITIVO E TESE:
6. Recurso da parte autora não conhecido. Recurso do INSS desprovido. Imediata implantação do benefício.Tese de julgamento: 7. O recurso de apelação que busca a manutenção de um ponto da sentença já favorável ao recorrente não deve ser conhecido por ausência de interesse recursal.
8. A exposição a ruído acima dos limites legais de tolerância, mesmo com o uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria, conforme tese firmada pelo STF (Tema 555).
___________
Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 80, 497, 932, inc. III, e 1.010, inc. III; Decreto nº 53.831/1964; Decreto nº 83.080/1979; Decreto nº 2.172/1997; Decreto nº 3.048/1999; Decreto nº 4.882/2003; EC nº 113/2021, art. 3º.
Jurisprudência relevante citada: STF, ARE nº 664.335 (Tema 555), Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 04.12.2014; STJ, REsp 1.398.260/PR (Tema 694); STJ, REsp 1.886.795/RS e REsp 1.890.010/RS (Tema 1083), Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Seção, j. 18.11.2021; TRF4, AC 5016495-79.2015.404.7107, 5ª Turma, Rel. Roger Raupp Rios, j. 14.06.2017; TRF4, AC 0016459-45.2016.404.9999, 5ª Turma, Rel. Luiz Carlos Canalli, D.E. 28.09.2017; TRF4, AC 5029361-37.2019.4.04.9999, 5ª Turma, Rel. Gisele Lemke, j. 03.12.2020.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, não conhecer o recurso da parte autora, negar provimento ao recurso do INSS e determinar a imediata implantação do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 10 de novembro de 2025.
Documento eletrônico assinado por HERMES SIEDLER DA CONCEICAO JUNIOR, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005446981v4 e do código CRC 041a3552.
Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): HERMES SIEDLER DA CONCEICAO JUNIORData e Hora: 11/11/2025, às 08:16:23
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 03/11/2025 A 10/11/2025
Apelação Cível Nº 5004844-89.2024.4.04.9999/RS
RELATOR Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
PRESIDENTE Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
PROCURADOR(A) CARMEM ELISA HESSEL
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 03/11/2025, às 00:00, a 10/11/2025, às 16:00, na sequência 1046, disponibilizada no DE de 23/10/2025.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NÃO CONHECER O RECURSO DA PARTE AUTORA, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS E DETERMINAR A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.
RELATOR DO ACÓRDÃO Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
Votante Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
Votante Juiz Federal SELMAR SARAIVA DA SILVA FILHO
Votante Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
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