
Agravo de Instrumento Nº 5027129-66.2025.4.04.0000/RS
RELATORA Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
RELATÓRIO
Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão que redimensionou o valor da causa, para adequar o montante de indenização por dano moral, e indeferiu o pedido de antecipação de tutela objetivando a concessão de benefício assistencial à pessoa com deficiência sob o fundamento de que "não há, por ora, prova inequívoca do enquadramento da parte autora na condição de pessoa com deficiência, requisito essencial para a concessão do benefício requerido." ().
A parte agravante alega que cabe a ela mensurar o dano moral sofrido, não se evidenciando, no presente caso, a desproporção entre o valor postulado e o dano alegado, estando em conformidade com o critério definido no julgamento do IAC 9 deste Tribunal.
Quanto ao pedido de antecipação de tutela, sustenta que os atestados e exames médicos anexados aos autos são suficientes para demonstrar a condição de pessoa com deficiência na medida em que "a parte agravante, menor de idade, se encontra em situação de saúde grave, na qual, é portador de doença rara – Transtorno de Personalidade Boderline (CID F60.3), apresentando quadro psiquiátrico e neurológico grave, com comprometimento funcional severo, bem como, é portadora do CID M41.9 – Escoliose dorso-lombar e Baskula de Bacia com limitação e rotação do tronco."
Pede a antecipação dos efeitos da tutela recursal para imediata concessão do benefício assistencial.
Foi deferido parcialmente o pedido de antecipação de tutela para manter o valor da causa atribuído pela parte autora e consequente competência do juízo com atribuição para o rito comum.
As partes foram intimadas sendo o INSS para contrarrazões.
Remetidos os autos ao MPF para parecer.
É o relatório.
VOTO
Preliminarmente, retifico erro material na decisão inicial para que dela passe a constar a seguinte fundamentação em relação ao valor do dano moral:
"Esta 3ª Seção, no julgamento do IAC 9 (505001365.2020.4.04.0000), estabeleceu a seguinte tese:
Nas ações previdenciárias em que há pedido de valores referentes a benefícios previdenciários ou assistenciais cumulado com pedido de indenização por dano moral, o valor da causa deve corresponder à soma dos pedidos (CPC, art. 292, inciso VI), ou seja, às parcelas vencidas do benefício, acrescidas de doze vincendas (CPC, art. 292, §§ 1º e 2º), além do valor pretendido a título de dano moral (CPC, art. 292, inciso V), que não possui necessária vinculação com o valor daquelas e não pode ser limitado de ofício pelo juiz, salvo em casos excepcionais, de flagrante exorbitância, em atenção ao princípio da razoabilidade.
Esta Relatora, assim como os integrantes da 6º Turma, diante da ressalva presente no precedente em referência e da competência absoluta dos Juizados Especiais Federais para causas de até 60 salários mínimos, vinha avaliando, caso a caso, a razoabilidade do valor da causa fixado nas demandas previdenciárias com pedidos de danos morais e compreendendo, à luz da jurisprudência das Turmas da 3ª Seção desta Corte, pela possibilidade de limitação nos casos em que a quantia requerida na inicial carecesse razoabilidade. Nesse sentido, e adotando também o método bifásico, orientado pelo Superior Tribunal de justiça, vinha-se entendendo que não se poderia considerar razoável a prefixação do valor da causa, para fins de danos morais em quantia superior a R$20 mil, salvo em hipóteses nas quais a inicial já trouxesse elementos específicos, apontando para a gravidade do caso e justificando a superação dos valores médios adotados nas ações previdenciárias. Essa interpretação, obviamente, vinha sendo adotada apenas para fins de controle do valor da causa, em nada interferindo na possibilidade de, na sequência, em sentença, serem arbitrados valores diversos.
No entanto, no julgamento de sucessivas Reclamações contra decisões desta 6ª Turma (trago como representativa a Reclamação 5032389-61.2024.4.04.0000/TRF4), a 3ª Seção entendeu que não é possível a aferição de razoabilidade que vinha sendo feita e que a ressalva, ao final da tese do IAC 9, só poderia ser invocada em casos de extrema e flagrante exorbitância. Embora o conceito de flagrante exorbitância seja indeterminado, em todas as reclamações que foram julgadas e independentemente do valor de indenização estimado pela parte, o entendimento foi pela possibilidade de escolha do valor da causa e pela impossibilidade de controle.
Em tais condições, e com o objetivo de não tumultuar o andamento dos processos, com possibilidades de recursos, reclamações ou mesmo repetição de atos processuais, entendi por aplicar a decisão da 3ª Seção, tal como assentada nas reclamações, sem deixar, porém, de registrar meu entendimento contrário, inclusive quanto à impossibilidade prática do controle caso a caso da razoabilidade, o que sempre me pareceu não ter sido vedado aos magistrados no julgamento do IAC 9. Assim o faço, também, porque tenho identificado nas demandas individuais que a fixação do valor da causa em quantias muito superiores ao razoável, acaba servindo como estratégia para escolha do juízo com atribuição para o rito comum, em hipóteses de competência absoluta dos Juizados Especiais Federais, com possibilidade de configuração de litigância abusiva, tal como previsto pelo Conselho Nacional de Justiça na Recomendação 159/2024.
Dito isso, concluo pela possibilidade da fixação do valor da causa na quantia pretendida e pela consequente fixação da competência do juízo com atribuição para o rito comum."
Quanto ao pedido de antecipação de tutela para concessão do benefício assistencial, da decisão inicial assim constou:
"(...)
É o breve relatório. Decido.
Os critérios de concessão do benefício assistencial estão previstos na Lei n.º 8.742/1993, especialmente nos arts. 20 e 20-B.
Consoante se depreende da leitura desses dispositivos legais, a avaliação atinente ao impedimento de longo prazo da pessoa com deficiência deve ser feita considerando mais do que as condições médico-biológicas do requerente.
Incorporando o significado de pessoa com deficiência já previsto na Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (promulgada pelo Decreto 6.949, de 25 de agosto de 2009), a nova redação dada ao artigo 20, §2º da LOAS pela Lei 12.470/2011 passou a associar o conceito de incapacidade a "impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas", do que se infere que a análise dos requisitos ao benefício deve alcançar fatores sociais, ambientais e familiares cuja influência seja tão negativa no desempenho da pessoa a ponto de impedir sua inserção na sociedade em igualdade de condições com os demais.
Há que se ponderar sobre a história de vida do requerente, seu contexto social e familiar, estabelecendo-se como premissa um conceito ampliado de impedimento de longo prazo, que traduza a situação capaz de comprometer a funcionalidade do indivíduo na tentativa de prover o próprio sustento, quando não há também a possibilidade de tê-lo provido pelos seus familiares.
A nova legislação não tratou separadamente os requisitos da incapacidade e socioeconômico, mas tomando-os como aspectos integrantes e correlacionados de um mesmo pressuposto para a concessão do benefício de prestação continuada.
O benefício assistencial à pessoa com deficiência requerido em 19/11/2024 foi indeferido sob o fundamento de que o requerente "Não atende ao critério de deficiência para acesso ao BPC-LOAS" (, pg. 34/35).
Para demonstrar o contrário, a parte agravante anexa aos autos atestado médico firmado por neurologista, datado de 18/11/2024, com o diagnóstico de transtorno de personalidade borderline (CID F 60.3), com prescrição de medicação e encaminhamento para tratamento psicológico ().
Diante de tais circunstâncias, tem-se que os elementos de prova existentes nos autos até o momento não são bastantes para desconstituir a presunção de legitimidade da perícia médica do INSS, afigurando-se razoável, portanto, que haja a devida complementação a fim de possibilitar a formação de um juízo seguro acerca da pretensão deduzida pela parte, conforme inclusive já determinado pelo Juízo a quo.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESTABELECIMNTO DE BENEFÍCIO. AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA (AUXÍLIO-DOENÇA). ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REQUISITOS. - O art. 59 da Lei nº 8.213/91, dispõe que o auxílio-doença é devido ao segurado que, havendo cumprido o período de carência, salvo as exceções legalmente previstas, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos. - Havendo controvérsia sobre incapacidade laborativa da parte autora, afigura-se razoável que haja a devida complementação da prova técnica, de modo a possibilitar a formação de um juízo seguro acerca da pretensão deduzida. (TRF4, AG 5001573-96.2024.4.04.0000, 6ª Turma, Relator RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, julgado em 24/04/2024)
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. INSTRUÇÃO PROCESSUAL. NECESSIDADE. Não demonstrada a probabilidade do direito, ante a necessidade de instrução processual para aferir com exatidão o cumprimento dos requisitos para a concessão de benefício de auxílio-doença, é de ser indeferido o pedido de antecipação de tutela. (TRF4, AG 5008415-29.2023.4.04.0000, 5ª Turma, Relator ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, julgado em 25/07/2023)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA DE URGÊNCIA. RESTABELECIMENTO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUSÊNCIA DE REQUISITO LEGAL. 1. Os requisitos para a concessão da tutela de urgência são a probabilidade do direito pleiteado e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, acaso não concedida. 2. A apresentação de documentos médicos obtidos unilateralmente e a ausência de outros elementos que comprovem a incapacidade da autora para o trabalho são insuficientes para infirmar a presunção de legitimidade de que goza a perícia administrativa, sendo indispensável a produção de prova pericial no processo judicial. (TRF4, AG 5017110-74.2020.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 06/12/2020)
Portanto, a despeito do conjunto probatório existente nos autos, por ora, ainda não é possível verificar a verossimilhança do direito almejado, que pressupõe mais esclarecimentos acerca de fatos complexos, sendo que inclusive já houve determinação de realização de prova pericial.
Dispositivo
Ante o exposto, defiro parcialmente a antecipação de tutela para manter o valor da causa atribuído pela parte autora e pela consequente fixação da competência do juízo com atribuição para o rito comum.
Intimem-se, sendo a parte agravada para contrarrazões.
Após, ao MPF para parecer."
Não vejo razão agora para modificar tal entendimento.
Ante o exposto, retifico, de ofício, o erro material da decisão inicial, nos termos da fundamentação, e voto por dar parcial provimento ao agravo de instrumento.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005333840v4 e do código CRC d7017689.
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Agravo de Instrumento Nº 5027129-66.2025.4.04.0000/RS
RELATORA Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. VALOR DA CAUSA. PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO.
I. CASO EM EXAME:
1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que redimensionou o valor da causa, para adequar o montante de indenização por dano moral, e indeferiu o pedido de antecipação de tutela para concessão de benefício assistencial à pessoa com deficiência.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO:
2. Há duas questões em discussão: (i) a possibilidade de o juiz limitar de ofício o valor da causa referente ao dano moral em ações previdenciárias; e (ii) a suficiência dos documentos médicos para demonstrar a condição de pessoa com deficiência para fins de antecipação de tutela do benefício assistencial.
III. RAZÕES DE DECIDIR:
3. Retificação, de ofício, de erro material na decisão inicial quanto ao valor da causa para dano moral. A 3ª Seção do TRF4, no julgamento do IAC 9 e em sucessivas Reclamações, firmou entendimento de que o valor da causa referente ao dano moral em ações previdenciárias não pode ser limitado de ofício pelo juiz, salvo em casos de extrema e flagrante exorbitância. Embora a fixação de valores elevados possa ser uma estratégia para escolha de juízo, conforme Recomendação nº 159/2024 do CNJ, foi mantido o valor da causa atribuído pela parte autora, o que define a competência do juízo com atribuição para o rito comum.4. O pedido de antecipação de tutela para concessão do benefício assistencial foi indeferido porque os atestados médicos apresentados não são suficientes para desconstituir a presunção de legitimidade da perícia administrativa do INSS. A análise da condição de pessoa com deficiência, conforme a Lei nº 8.742/1993 e a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (Decreto nº 6.949/2009), exige a consideração de fatores sociais, ambientais e familiares, demandando complementação da prova técnica e instrução processual, conforme jurisprudência do TRF4.
IV. DISPOSITIVO E TESE:
5. Agravo de instrumento parcialmente provido.Tese de julgamento: 6. Em ações previdenciárias com pedido de dano moral, o valor da causa atribuído pela parte autora não pode ser limitado de ofício pelo juiz, salvo em casos de extrema e flagrante exorbitância. 7. A antecipação de tutela para benefício assistencial à pessoa com deficiência exige prova inequívoca da condição de deficiência, não sendo suficientes, em regra, apenas atestados médicos unilaterais para desconstituir a perícia administrativa e dispensar a instrução probatória.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 30 de outubro de 2025.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005333841v7 e do código CRC 9b676815.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 23/10/2025 A 30/10/2025
Agravo de Instrumento Nº 5027129-66.2025.4.04.0000/RS
RELATORA Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PRESIDENTE Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PROCURADOR(A) CAROLINA DA SILVEIRA MEDEIROS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 23/10/2025, às 00:00, a 30/10/2025, às 16:00, na sequência 565, disponibilizada no DE de 14/10/2025.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.
RELATORA DO ACÓRDÃO Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
Votante Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
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