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DIREITO DA SAÚDE. AÇÃO DE RESSARCIMENTO EM FACE DA UNIÃO. CUSTEIO DE REALIZAÇÃO DE PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. PROCEDIMENTO DE ALTA COMPLEXIDADE. RESPONSABILIDAD...

Data da publicação: 12/12/2024, 21:24:07

DIREITO DA SAÚDE. AÇÃO DE RESSARCIMENTO EM FACE DA UNIÃO. CUSTEIO DE REALIZAÇÃO DE PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. PROCEDIMENTO DE ALTA COMPLEXIDADE. RESPONSABILIDADE INTEGRAL DA UNIÃO. 1. Dado que se trata de procedimento de alta complexidade, nos termos da Portaria n. 204/2007 do Ministério da Saúde, é da União a responsabilidade integral pelo procedimento cirúrgico. 2. Ainda que a União não tenha integrado o polo passivo da ação na qual determinado o fornecimento da medicação, não há óbice ao ressarcimento formulado pelo ente estadual na via judicial, uma vez que consta expressamente do Tema 793 do STF que compete à autoridade judicial determinar o ressarcimento a quem, por conta da solidariedade entre os entes federados, suportou os ônus do tratamento. 3. Inarredável, portanto, a conclusão de que recai sobre a União a responsabilidade pelo custeio do tratamento deferido nos autos do processo que tramitou na Justiça Estadual. (TRF4, AC 5002674-08.2024.4.04.7102, 4ª Turma, Relator MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS, julgado em 09/10/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5002674-08.2024.4.04.7102/RS

RELATOR: Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS

RELATÓRIO

Trata-se de ação ajuizada pelo Estado do Rio Grande do Sul contra a União objetivando provimento jurisdicional que declare a obrigação da União a ressarci-lo das despesas suportadas devido à realização do procedimento cirúrgico (Artroplastia Total Cimentada de ambos os joelhos) em hospital privado em virtude da ausência de vagas no sistema público de saúde, objeto do processo judicial n.º 5000293-24.2015.8.21.0154 da Justiça Estadual, devendo incidir correção monetária e juros legais sobre o valor da verba a ser ressarcida.​

Processado o feito, sobreveio sentença de procedência (evento 20, SENT1), cujo dispositivo restou assim redigido:

ANTE O EXPOSTO, rejeito as preliminares e a prescrição suscitadas e, no mérito, julgo procedente o pedido formulado na peça inicial para condenar a União no ressarcimento do valor suportado pelo Estado do Rio Grande do Sul nos autos do processo nº 5000293-24.2015.8.21.0154, devidamente atualizado (tópico 3.4).

Condeno a União no pagamento dos honorários advocatícios ao patrono da parte adversa, verba que fixo em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, §§3º e 4º, do CPC.

Partes isentas do pagamento de custas (art. 4º, da Lei nº 9.289/96).

Irresignada, apela a União (evento 17, APELAÇÃO1). Sustenta, em suas razões recursais a) preliminarmente, a sua ilegitimidade passiva; b) a ausência de pretensão resistida, por parte da ré, em virtude de que os pedidos de ressarcimento encontram-se em trâmite no Ministério da Saúde; c) a prescrição da pretensão de obter ressarcimento; d) a impossibilidade jurídica da pretensão da ressarcimento entre entes públicos de despesa com medicamento concedido judicialmente pela Justiça Estadual, sob pena de violação aos princípios da separação dos poderes e da legalidade administrativa e orçamentária; e) a necessária observância do Tema 793, firmado no RE 855.178; f) que não cabe à União ressarcir os entes federados derrotados em demandas judiciais, das quais sequer participou e, consequentemente, não teve oportunidade de defesa; muito menos em casos de medicamentos não previstos na relação nacional de medicamentos oncológicos; e g) que a formulação da política de medicamentos não é exclusiva da União e, além disso, os demais entes federados devem instituir suas listas de medicamentos suplementares. Na hipótese de manutenção da sentença, requer: i) que a obrigação de ressarcimento da União se restrinja a 1/3 do valor despendido para a aquisição do medicamento na demanda estadual; e ii) a redução do valor da condenação em honorários advocatícios.

Oportunizadas as contrarrazões (evento 29, CONTRAZAP1), vieram os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

PRELIMINARMENTE

Ilegitimidade passiva

A legitimidade das partes ad causam é uma condição da ação em que o indivíduo exerce o direito subjetivo material como o titular da ação (legitimidade ativa), podendo ser demandado apenas aquele que seja titular da obrigação correspondente (legitimidade passiva).

Ademais, com base no art. 17 do CPC, a legitimidade deve ser analisada sumariamente de acordo com os elementos da demanda expostos na petição inicial, identificando se a confirmação dos fatos alegados poderia levar à procedência da ação em face do réu indicado pelo autor.

No caso, considerando que a controvérsia consiste justamente na análise da possibilidade de direcionar-se a cobrança da despesa havida na aludida ação contra a União, não há que se falar em ilegitimidade passiva.

Portanto, no presente caso, a apelante é parte legítima para responder pela ação de ressarcimento na qual o Estado alega ter custeado tratamento cujo financiamento seria de responsabilidade da União.

Rejeitada a preliminar.

Falta de interesse de agir

Ao contestar o feito, a ré adentrou no mérito da demanda, razão pela qual presente a pretensão resistida.

A ré limita-se a afirmar em sua contestação que "a questão do ressarcimento pleiteado já está sendo resolvida na via administrativa", sem juntar ao autos cópia do processo ou qualquer documentação apta a comprovar o atual andamento do pedido de ressarcimento, ou seja, apresenta tese baseada em meras alegações genéricas.

Ademais, no caso, é inexigível que o autor formule previamente pedido administrativo de ressarcimento, uma vez que o processo que originou a dívida, objeto da presente ação regressiva, foi proposta contra o Estado do RS, tramitando, por lógico, na Justiça Estadual, ou seja, a União sequer foi parte naquela demanda.

Rejeitada a preliminar.

Prescrição

As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, assim como todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Pública, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem, nos termos do artigo 1º do Decreto 20910/32, in verbis:

Art. 1º As dívidas passivas da união, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em 5 (cinco) anos, contados da data do ato ou fato do qual se originaram.

Ainda que os bloqueios de valores se tenham dado no curso do processo de conhecimento, somente quando do trânsito em julgado dessa ação que pleiteava o tratamento com verbas públicas, é que se pode considerar como certa e definitiva a condenação, bem como garantido o direito de regresso.

Mutatis mutandis, não é outra a orientação desta Corte:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO CIVIL. DEVOLUÇÃO DE VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE POR FORÇA DE TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE REVOGADA. RESSARCIMENTO NOS PRÓPRIO AUTOS. PRESCRIÇÃO. 1. A lei processual civil garante ao réu a possibilidade de buscar, nos próprios autos em que tiver sido concedida a medida, o ressarcimento nos casos de antecipação da tutela que vem a ser revogada (art. 302, I e parágrafo único, do CPC). 2. A certeza quanto à existência de valores a serem restituídos em decorrência de antecipação de tutela posteriormente revogada e a exigibilidade do respectivo crédito se dá, de forma definitiva, apenas a partir do trânsito em julgado da ação, sendo este o termo inicial da prescrição da pretensão executória. 3. Decorridos menos de cinco antos entre o trânsito em julgado da ação e o ajuizamento da execução, não resta configurada prescrição da execução. (TRF4, AG 5016371-96.2023.4.04.0000, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 24/08/2023) (grifei)

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO. SENTENÇA JUDICIAL POSTERIORMENTE REFORMADA. DEVOLUÇÃO DE VALORES. PRESCRIÇÃO. 1. Conforme o art. 103, parágrafo único, da Lei 8.213/1991: "Prescreve em cinco anos, a contar da data em que deveriam ter sido pagas, toda e qualquer ação para haver prestações vencidas ou quaisquer restituições ou diferenças devidas pela Previdência Social, salvo o direito dos menores, incapazes e ausentes, na forma do Código Civil". 2. Em se tratando de pretensão de ressarcimento fundada em decisão judicial, o processo administrativo de cobrança realizado pelo INSS não configura causa interruptiva da prescrição, pois não tem efeito constitutivo sobre o fato, objeto da decisão judicial, cujo trânsito em julgado é o marco inicial da contagem do prazo prescricional. (TRF4, AC 5004603-35.2017.4.04.7001, DÉCIMA TURMA, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 30/09/2020) (grifei)

Na hipótese, o trânsito em julgado da sentença prolatada nos autos do processo nº 5000293-24.2015.8.21.0154 ocorreu em 21/01/2021 (processo 5002674-08.2024.4.04.7102/RS, evento 1, OUT6; p. 136), de modo que não ocorreu a prescrição do direito de ressarcimento, uma vez que a presente ação foi ajuizada em 08/04/2024 (evento 1, INIC1), não transcorrendo, pois, o lapso quinquenal.

Rejeito, também, a prejudicial de mérito.

MÉRITO

Responsabilidade pelo custeio de procedimento de alta complexidade

O Estado do Rio Grande do Sul busca o ressarcimento dos valores que despendeu no Processo nº 5000293-24.2015.8.21.0154, cujo objeto foi o custeio do procedimento cirúrgico de alta complexidade, do sistema osteomuscular, especificamente, Artroplastia Total Primária do Joelho.

Acerca da responsabilidade pelo custeio efetivo dos tratamentos deferidos judicialmente e custeados pelo Estado do Rio Grande do Sul, a sentença recorrida assim registra (evento 20, SENT1):

O Estado do RS busca o ressarcimento do valor que suportou nos autos do processo nº 5000293-24.2015.8.21.0154, o qual tramitou na Justiça Estadual, cujo objeto foi o custeio de cirurgia de artroplastia total de joelho, realizada em hospital privado em razão da deficiência de leitos no SUS.

A Justiça Estadual determinou o bloqueio do valor de R$ 106.926,64 dos cofres do Estado do RS (1.5, p. 137 e 1.6, p.17), sendo restituída a importância de R$ 25.569,40 (1.6, p.p. 28, 37 e 95 e 1.2) a título de saldo de recursos constritos e desnecessários para o custeio. Foi prolatada sentença de procedência (1.6; p.p. 125-132), com a condenação do Estado do RS e do Município de Agudo a custear as despesas da cirurgia, com trânsito em julgado em 21/01/2021 (1.6; p. 136).

​Dessarte, seguindo o entendimento referido nos tópicos anteriores, o Estado do RS pode, sim, exigir dos demais codevedores o valor da dívida por ele quitada, por meio da presente ação de regresso. Nessa linha:

EMENTA: DIREITO À SAÚDE. LEGITIMIDADE PASSIVA. INTERNAÇÃO HOSPITALAR. UTI. AUSÊNCIA DE LEITO NO SUS. HOSPITAL PARTICULAR. RESSARCIMENTO PELO PODER PÚBLICO. 1. A responsabilidade dos Entes Federados configura litisconsórcio passivo, podendo a ação em que se postula fornecimento de prestação na área da saúde ser proposta contra a União, Estado ou Município, individualmente ou de forma solidária, podendo a autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro. Eventual acerto de contas em virtude do rateio estabelecido, deve ser realizado administrativamente ou em ação própria. (Recurso Extraordinário (RE 855.178, Tema 793). 2. (...) (TRF4, AC 5003231-48.2017.4.04.7002, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 09/09/2020)

Com efeito, no caso concreto - que trata de custeio das despesas com procedimento cirúrgico (artroplastia de joelho: média/alta complexidade ), e que não há pronunciamento judicial quanto ao ressarcimento do ente que suportou o encargo financeiro -, a responsabilidade deve ser atribuída apenas à União. Isso porque compete a tal entidade federada o financiamento de procedimento de média e alta complexidade, nos termos do art. 16 da Lei nº 8.080/90. Nesse sentido (grifei):

EMENTA: EMENTA CÍVEL. SAÚDE. PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. IMPLANTAÇÃO DE PRÓTESES. TEMA 793. CUSTEIO DO TRATAMENTO PELA UNIÃO. UTILIZAÇÃO DE PRÓTESES FORNECIDAS PELO SUS. 1. Cabe à União o financiamento das ações relativas ao bloco de Atenção de Média e Alta Complexidade Ambulatorial e Hospitalar (AMACAH). E nesse contexto está a assistência ao paciente que necessita realizar artroplastia total de joelho. Os tratamentos de traumatologia e ortopedia estão enquadrados como Procedimentos de Alta Complexidade em Traumato-Ortopedia do SUS, conforme a Portaria GM/MS nº 221, de 15 de fevereiro de 2005, que instituiu a Política de Alta Complexidade em Traumatologia e Ortopedia (consolidada pela Portaria GM/MS Consolidada nº 02, de 28 de setembro de 2017), regulamentada pela Portaria SAS/MS nº 90, publicada em 27 de março de 2009, a qual conceitua as Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Traumatologia e Ortopedia e Centro de Referência de Alta Complexidade em Traumatologia e Ortopedia. 2. Entretanto, diante da notória falta de estrutura da União para realizar a execução/prestação dos serviços, a responsabilidade desta deve ficar a cargo do gestor local estadual e, eventualmente, municipal, com ulterior ressarcimento, na esfera administrativa, dos custos pela União. 3. Este Colegiado, alinhando-se à posição do Supremo Tribunal Federal, passou a definir, para os casos que envolvam procedimentos de alta complexidade, como se verifica nos autos, os seguintes critérios para cumprimento da obrigação solidária: a) ao Estado do Rio Grande do Sul, caberá a obrigação de fazer/entregar, sob pena de multa diária para a hipótese de descumprimento; b) à União, caberá efetuar, administrativamente, o ressarcimento integral dos valores despendidos pelo Estado do Rio Grande do Sul; c) o Município, quando integrar o polo passivo, pela proximidade com o cidadão, poderá ficar, em eventual acerto com o Estado do Rio Grande do Sul, responsável pela guarda e entrega direta do medicamento à parte autora. 4. As próteses utilizadas no procedimento cirúrgico devem ser aquelas fornecidas pelo SUS, porquanto a aquisição dos materiais utilizados na rede pública de saúde passa, na maioria dos casos, por processos licitatórios, cujos valores são, teoricamente, menos dispendiosos ao erário. 5. Recurso da União desprovido e recursos do Estado do Rio Grande do Sul e Município parcialmente providos. ( 5000704-76.2020.4.04.7113, QUINTA TURMA RECURSAL DO RS, Relator ANDREI PITTEN VELLOSO, julgado em 31/05/2021)

O valor exato devido será apurado na fase de cumprimento de sentença, após a devida atualização, nos termos do tópico seguinte.

Diante disso, o pedido autoral merece acolhimento.

Do que se vê dos autos originários, é indubitável a responsabilidade da União pelo custeio do procedimento de alta complexidade, mesmo que a sua determinação tenha sido judicialmente direcionada ao Estado do Rio Grande do Sul.

O procedimento realizado é de alta complexidade, conforme se infere do Sistema de Gerenciamento da Tabela de Procedimentos, Medicamentos e OPM do SUS - SIGTAP. Tal possibilidade encontra respaldo no entendimento exarado pelo STF por ocasião do julgamento do RE 855.178 (Tema 793), no qual restou reconhecida a solidariedade entre os entes da federação em ações judiciais que versem a respeito de prestações em matéria de saúde.

Em que pese a União não tenha figurado no processo judicial, tal fato, contudo, não impede que, em ação autônoma, o Estado do Rio Grande Sul postule o ressarcimento dos valores empregados no custeio de tratamento que é de responsabilidade da União, notadamente porque também tal possibilidade encontra-se expressa no Tema 793 do Supremo Tribunal Federal, verbis:

Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro.

A circunstância de a ação anterior ter sido ajuizada pelo particular apenas em face de um dos entes da federação e que, em razão disso, tenha sido o ente estadual compelido ao custeio do procedimento cirúrgico, não afasta a responsabilidade da União.

A sentença está alinhada a precedentes deste Regional em casos análogos, no sentido de que é da União a responsabilidade integral pelo custeio do procedimento cirúrgico em questão, dado que se trata de procedimento de alta complexidade, conforme regulamentação da Portaria nº 204 de 29 de janeiro de 2007, do Ministério da Saúde. Cito, nesse sentido:

ADMINISTRATIVO. DIREITO DA SAÚDE. INTERNAÇÃO EM LEITO DE UTI. ALTA COMPLEXIDADE. CONDENAÇÃO DO ESTADO EM AÇÃO JUDICIAL. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. TEMA 793/STF. RESSARCIMENTO EM FACE DA UNIÃO. CABIMENTO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. 1. Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro (Tema 793). 2. A solidariedade reconhecida é aquela que obriga os entes da Federação brasileira a organizarem o Sistema Único de Saúde e não se esquivarem das tarefas que lhes são atribuídas pela Constituição, pela lei e pelas normas e acordos realizados pelos gestores do SUS. Uma vez organizado o sistema, e divididos os recursos e as responsabilidades de cada ente federativo, deve-se respeitar essa divisão, obrigando-se cada ente à consecução daquilo a que se propôs. 3. Considerando que a prestação de saúde postulada (internação em leito de UTI) é de Alta Complexidade Hospitalar, conforme regulamentação da Portaria n.º 204 de 29 de janeiro de 2007, cabe à União a responsabilidade por seu financiamento, nada obstante o tratamento postulado seja exigível solidariamente de qualquer dos réus. 4. Inarredável, portanto, a conclusão de que recai sobre a União a responsabilidade pelo custeio do tratamento deferido nos autos do processo que tramitou na Justiça Estadual. 5. A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação. A partir de fevereiro de 2004 até junho de 2009, a correção monetária dos valores devidos deverá ser efetuada com a utilização do INPC (art. 29-B da Lei n.º 8.213/91), e com a incidência de juros moratórios, a contar da citação, de 1% ao mês. A partir de 01/07/2009, data em que passou a viger a Lei n.º 11.960, de 29/06/2009, publicada em 30/06/2009, que alterou o art. 1º-F da Lei n.º 9.494/97, e nos termos da decisão do STF, no RE 870947, a atualização monetária será pelo IPCA-E e os juros moratórios seguirão os juros aplicados à caderneta de poupança, não capitalizados, até novembro de 2021. Após, deverá ser adotada unicamente a Taxa Selic, acumulada mensalmente, nos termos do art. 3º da EC n.º 113, de 08/12/2021. (TRF4, AC 5043295-87.2023.4.04.7100, QUARTA TURMA, Relator SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, juntado aos autos em 21/02/2024)

ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. AÇÃO DE RESSARCIMENTO CONTRA A UNIÃO. INTERNAÇÃO EM UTI. PROCEDIMENTO DE ALTACOMPLEXIDADE. CONDENAÇÃO DO ESTADO EM AÇÃO JUDICIAL. TEMA 793 DO STF. 1. Ainda que todos os entes federativos sejam solidariamente responsáveis pelos serviços públicos de saúde, vislumbra-se o dever da Uniãoquanto ao financiamento dos procedimentos de média e alta complexidade a serem realizados no SUS, nos termos da Portaria n. 204/2007 do Ministério da Saúde. 2. Apelação desprovida. (TRF4 5009889-40.2021.4.04.7102, TERCEIRA TURMA, Relator CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, juntado aos autos em 24/10/2023)

(destaquei)

Impedir o Estado do Rio Grande do Sul de exercer a ação regressiva para o ressarcimento do valor utilizado para realização do procedimento cirúrgico, em última análise, é burlar o regramento legal que estabelece as repartições de competências para fins de financiamento do Sistema Único de Saúde, onerando somente um ente da federação, em absoluta afronta às normas legais vigentes.

Em decorrência da competência comum, os entes da federação são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro (Tema 793 do STF).

Nesses moldes, a fim de otimizar a compensação entre os entes federados, compete à autoridade judicial, diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, direcionar, caso a caso, o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro.

Por fim, a solidariedade reconhecida é aquela que obriga os entes da Federação brasileira a organizarem o Sistema Único de Saúde e não se esquivarem das tarefas que lhes são atribuídas pela Constituição, pela lei e pelas normas e acordos realizados pelos gestores do SUS. Uma vez organizado o sistema, e divididos os recursos e as responsabilidades de cada ente federativo, deve-se respeitar essa divisão, obrigando-se cada ente à consecução daquilo a que se propôs.

Inarredável, portanto, a conclusão de que recai sobre a União a responsabilidade pelo custeio do tratamento de saúde deferido nos autos do processo n.º 5000293-24.2015.8.21.0154.

Logo, deve ser mantida a sentença, na íntegra.

Consectários legais. Juros moratórios e correção monetária.

De início, importa esclarecer que a correção monetária e os juros de mora, sendo consectários da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados até mesmo de ofício. Assim, sua alteração não implica falar em reformatio in pejus.

Em 03/10/2019, o STF concluiu o julgamento dos Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema nº 810), em regime de repercussão geral, rejeitando-os e não modulando os efeitos do julgamento proferido em 20/09/2017.

Com isso, ficou mantido o seguinte entendimento:

1. No tocante às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios idênticos aos juros aplicados à caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/1997 com a redação dada pela Lei 11.960/2009.

2. O artigo 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei 11.960/2009, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina, devendo incidir o IPCA-E, considerado mais adequado para recompor a perda do poder de compra.

Assim, a partir de 29/06/2009 deve incidir juros moratórios idênticos aos juros aplicados à caderneta de poupança e o IPCA-E como índice de correção monetária, até o advento da EC 113/2021.

Já a partir de 09/12/2021, deve incidir o art. 3º da EC 113/2021, a qual estabelece que, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente.

Registro, por oportuno, que o fato de a citação ter ocorrido em data posterior a a vigência da EC nº 113/2021 não afasta a incidência da taxa SELIC, na medida em que este indexador é aplicável também no período em que o débito será apenas corrigido monetariamente, por força da norma constitucional.

Sucumbência recursal.

Não se aplica à hipótese a fixação da verba honorária por equidade, porquanto o proveito econômico buscado na presente ação não é inestimável, dado que é possível aferir concretamente o montante em relação ao qual o Estado do Rio Grande do Sul busca o ressarcimento em face da União.

Por fim, em razão da improcedência do recurso de apelação da União, fulcro no § 11 do artigo 85 do CPC de 2015, a verba honorária deve ser elevada para 11% (onze por cento) sobre o valor da condenação.

Desprovido, portanto, o pedido subsidiário da União.

Conclusão.

Mantida a sentença no ponto em que reconheceu o direito do ente estadual ao ressarcimento dos custos com o medicamento efetivamente utilizado no tratamento deferido nos autos do processo n.º 5000293-24.2015.8.21.0154, que tramitou perante a Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, tudo nos termos da fundamentação.

Dispositivo.

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da União.​​​​



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TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5002674-08.2024.4.04.7102/RS

RELATOR: Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS

EMENTA

direito DA saúde. AÇÃO DE RESSARCIMENTO EM FACE DA UNIÃO. CUSTEIO DE REALIZAÇÃO de procedimento cirúrgico. PROCEDIMENTO DE ALTA COMPLEXIDADE. RESPONSABILIDADE INTEGRAL DA UNIÃO.

1. Dado que se trata de procedimento de alta complexidade, nos termos da Portaria n. 204/2007 do Ministério da Saúde, é da União a responsabilidade integral pelo procedimento cirúrgico.

2. Ainda que a União não tenha integrado o polo passivo da ação na qual determinado o fornecimento da medicação, não há óbice ao ressarcimento formulado pelo ente estadual na via judicial, uma vez que consta expressamente do Tema 793 do STF que compete à autoridade judicial determinar o ressarcimento a quem, por conta da solidariedade entre os entes federados, suportou os ônus do tratamento.

3. Inarredável, portanto, a conclusão de que recai sobre a União a responsabilidade pelo custeio do tratamento deferido nos autos do processo que tramitou na Justiça Estadual.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação da União, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 09 de outubro de 2024.



Documento eletrônico assinado por MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004718624v3 e do código CRC 2c993533.Informações adicionais da assinatura:
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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 02/10/2024 A 09/10/2024

Apelação Cível Nº 5002674-08.2024.4.04.7102/RS

RELATOR: Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS

PRESIDENTE: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

PROCURADOR(A): FÁBIO BENTO ALVES

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 02/10/2024, às 00:00, a 09/10/2024, às 16:00, na sequência 479, disponibilizada no DE de 19/09/2024.

Certifico que a 4ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 4ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA UNIÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS

Votante: Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS

Votante: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

Votante: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

GILBERTO FLORES DO NASCIMENTO

Secretário



Conferência de autenticidade emitida em 12/12/2024 18:24:07.


Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

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