
Apelação Cível Nº 5019419-02.2020.4.04.7200/SC
RELATORA Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pela parte autora contra a sentença que julgou parcialmente procedente o pedido de reconhecimento de tempo de serviço especial, concedendo aposentadoria por tempo de contribuição mediante reafirmação da DER.
O dispositivo da sentença recorrida foi proferido nos seguintes termos:
"JULGO EXTINTO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO o pedido em relação ao período de 01-04-2010 a 01-12-2017, com fulcro no art. 485, VI do CPC;
JULGO PROCEDENTES EM PARTE OS PEDIDOS formulados na inicial e extingo o feito com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, I, do CPC, para condenar o INSS a:
a) AVERBAR como tempo de serviço especial o período de 01-11-1983 a 30-11-1989, com o acréscimo de 40%;
b) IMPLANTAR em favor do autor o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição a partir da DER reafirmada para 15-03-2018;
c) PAGAR os valores atrasados, respeitada a prescrição quinquenal, conforme cálculos a serem realizados em fase de execução.
Em razão do julgamento pelo plenário do STF dos Embargos de Declaração no RE 870.947, em 03-10-2019, definindo o tema 810, e da tese firmada no Tema 905 STJ, incide atualização monetária pelo INPC nos benefícios previdenciários e pelo IPCA-E nos assistenciais.
Juros de mora, contados a partir da citação, devidos no percentual de 0,5% ao mês, nos termos do art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, no período de julho/2009 a abril/2012, a partir de quando passam a seguir o mesmo percentual de juros incidentes sobre a caderneta de poupança, ou seja, 0,5% ao mês, enquanto a taxa SELIC seja superior a 8,5% ao ano, ou 70% da taxa SELIC ao ano, mensalizada, nos demais casos (MP n. 567/2012, convertida na Lei n. 12.703/2012)."
Nas razões recursais, a parte autora sustenta, em síntese, o cerceamento de defesa pelo indeferimento da produção de prova pericial. Requer a anulação da sentença e, subsidiariamente, a sua reforma para que sejam reconhecidos como especiais os períodos de 04/11/1991 a 15/06/1998 (empresa Formanova) e de 01/04/2003 a 28/05/2009 (empresa Novo Espaço), com base na prova emprestada constante dos autos. Postula, ao final, a revisão do benefício e a inversão dos ônus sucumbenciais.
Com as contrarrazões (Evento 38), vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
I - Análise do Mérito
A controvérsia recursal cinge-se a analisar o direito ao reconhecimento da especialidade do labor nos períodos de 04/11/1991 a 15/06/1998, 01/04/2003 a 28/05/2009 e 01/04/2010 a 01/12/2017.
Dos Períodos de 01/04/2003 a 28/05/2009 e 01/04/2010 a 01/12/2017 (Novo Espaço Móveis Ltda)
A parte recorrente alega cerceamento de defesa e requer a análise do mérito dos pedidos referentes ao labor na empresa Novo Espaço Móveis Ltda.
No caso concreto, o juízo a quo extinguiu o feito sem resolução do mérito quanto ao interregno de 01/04/2010 a 01/12/2017 e julgou improcedente o pedido referente ao lapso de 01/04/2003 a 28/05/2009.
No ponto, assim fundamentou a sentença:
De início, reconheço a falta de prévio requerimento em relação ao período de 01-04-2010 a 01-12-2017, vez que, no âmbito administrativo, a parte autora não apresentou nenhum documento que pudesse servir de prova para a alegada especialidade. [...] não houve resistência à pretensão da parte autora por parte do INSS, impendendo à ausência de interesse processual [...]. O autor apresenta, contudo, PPP referente ao primeiro período [...]. Contudo, não há informações quanto à presença de responsável técnico pelos registros ambientais, nem foi juntado laudo técnico pela parte autora, apesar de deferido prazo para tanto, de modo que não há como ser acolhido o pedido.
A sentença deve ser mantida quanto ao período de 01/04/2010 a 01/12/2017 e reformada, para extinguir o feito sem resolução de mérito, quanto ao período de 01/04/2003 a 28/05/2009.
Com relação ao período de 01/04/2010 a 01/12/2017, a decisão que extinguiu o pedido sem resolução de mérito está correta. A análise do processo administrativo demonstra que a pretensão de reconhecimento da especialidade para este interregno não foi submetida à autarquia previdenciária. Correta, portanto, a aplicação do Tema 350 do STF.
Quanto ao período de 01/04/2003 a 28/05/2009, o PPP apresentado (Evento 1, PROCADM42, fls. 52-53) é formalmente inválido, pois omite a identificação do responsável técnico pelos registros ambientais, informação essencial exigida pela legislação previdenciária (art. 58, § 1º, da Lei 8.213/91).
Conforme entendimento consolidado, a apresentação de um PPP formalmente correto é pressuposto para a análise do direito. Nesse sentido, aplicando-se a lógica do Tema 629 do STJ, que, embora trate da desnecessidade do laudo quando o PPP é suficiente, pressupõe a validade formal deste, a ausência de um documento minimamente apto a comprovar o direito impede a análise do mérito.
Assim, a solução adequada não é a improcedência, mas a extinção do processo sem resolução de mérito, por ausência de pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo, permitindo que a parte ajuíze nova ação com a documentação correta.
Da Atividade Especial no período de 04/11/1991 a 15/06/1998 (Formanova Indústria e Comércio de Móveis Ltda)
A parte recorrente postula a reforma da sentença para que seja reconhecida a especialidade do labor neste período, com base em prova emprestada.
No caso concreto, o juízo de origem indeferiu o pedido com a seguinte fundamentação:
[...] deferido prazo para que o autor demonstrasse a similaridade das empresas, com mesmo porte e mesmas condições ambientais, limitou-se a alegar se tratarem de empresas de mesmo ramo de atividade, o que não se mostra bastante para o pretendido. [...] não há comprovação de mesmo porte e condições ambientais entre as empresas, o que impede o reconhecimento da especialidade.
A decisão merece parcial reforma.
Está provado nos autos que a empresa Formanova teve sua falência decretada (Evento 21, COMP2), o que justifica a utilização de prova por similaridade.
A análise dos documentos juntados com a inicial demonstra a similaridade de objeto social ("fabricação de móveis") e de porte (capital social idêntico) entre a empresa empregadora e a empresa paradigma, validando o uso da prova emprestada.
O PPP apresentado (Evento 1, PROCADM42, fls. 50-51) informa exposição a ruído com média de 87,5 dB(A). A análise da especialidade deve observar os limites de tolerância vigentes em cada época:
De 04/11/1991 a 05/03/1997:
O limite de tolerância era superior a 80 dB(A) (Decreto nº 53.831/64). Como a exposição média (87,5 dB(A)) era superior a este patamar, o reconhecimento da especialidade neste intervalo é devido.
De 06/03/1997 a 15/06/1998:
O limite de tolerância foi elevado para superior a 90 dB(A) (Decreto nº 2.172/97). Como a exposição média (87,5 dB(A)) é inferior a este limite, não é possível o enquadramento da atividade como especial neste intervalo.
Assim, o recurso da parte autora merece provimento para reconhecer como especial, pela exposição a ruído, apenas o período de 04/11/1991 a 05/03/1997.
Do Recálculo do Tempo de Contribuição
O tempo de contribuição da parte autora deve ser recalculado para incluir o acréscimo decorrente da conversão dos períodos especiais reconhecidos.
Tempo apurado pelo INSS na DER (01/12/2017): 32 anos, 3 meses e 12 dias.
Kremer & Cia Ltda (01/11/1983 a 30/11/1989): 6 anos e 1 mês (reconhecido na sentença).
Formanova (04/11/1991 a 05/03/1997): 5 anos, 4 meses e 2 dias (reconhecido neste acórdão).
Acréscimos da Conversão (fator 0,4):
Kremer & Cia Ltda: 2 anos, 5 meses e 6 dias.
Formanova: 2 anos, 1 mês e 19 dias.
Com o acréscimo dos períodos especiais reconhecidos, a parte autora totaliza 36 anos, 10 meses e 7 dias de tempo de contribuição na data do requerimento administrativo original (DER), em 01/12/2017.
Dessa forma, o segurado já preenchia os 35 anos de contribuição necessários para a aposentadoria por tempo de contribuição na DER original. A decisão da sentença, que concedeu o benefício apenas mediante reafirmação da DER para 15/03/2018, deve ser reformada para fixar o início do benefício na DER.
II - Consectários, Honorários e Prequestionamento
Consectários Legais
Os consectários legais devem ser fixados, quanto aos juros, nos termos do que definido pelo STF no julgamento do Tema 1170. No que tange à correção monetária, até 08/12/2021, deve ser aplicado o INPC (Lei 11.430/06).
A partir de 09/12/2021, incidirá a taxa SELIC, para todos os fins (correção, juros e compensação da mora), conforme o art. 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021.
Honorários Advocatícios
Diante do resultado do recurso, que reconheceu tempo suficiente para a concessão do benefício na DER, a parte autora decaiu de parte mínima do pedido, devendo o INSS arcar com a integralidade dos ônus sucumbenciais (art. 86, parágrafo único, do CPC).
Inverte-se, pois, a sucumbência fixada na sentença e condena-se o INSS ao pagamento de honorários advocatícios. O percentual será definido em fase de liquidação de sentença, de acordo com as faixas de valores previstas no art. 85, § 3º, do CPC. A base de cálculo será o valor da condenação, limitado às parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 111 do STJ).
Prequestionamento
Para fins de acesso às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as questões e os dispositivos legais invocados pelas partes, nos termos dos artigos 1.022 e 1.025 do CPC, evitando-se a oposição de embargos de declaração com propósito de prequestionamento.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação da parte autora para: a) reformar em parte a sentença para reconhecer como especial o período de 04/11/1991 a 05/03/1997, determinando ao INSS sua averbação com o fator de conversão 1,4; b) reformar a sentença para extinguir, sem resolução de mérito, o pedido de reconhecimento de tempo especial referente ao período de 01/04/2003 a 28/05/2009, por ausência de pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo; c) reformar a sentença para condenar o INSS a conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição a partir da DER original (01/12/2017); e d) inverter os ônus da sucumbência, nos termos da fundamentação.
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Apelação Cível Nº 5019419-02.2020.4.04.7200/SC
RELATORA Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. TEMPO ESPECIAL. RUÍDO. PROVA POR SIMILARIDADE. VÍCIO FORMAL NO PPP. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. A controvérsia consiste em saber: (i) se a ausência de identificação do responsável técnico no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) impede a análise de mérito do pedido de tempo especial; (ii) se é possível o reconhecimento de tempo especial com base em prova por similaridade (PPP baseado em laudo de outra empresa), quando a empregadora original teve sua falência decretada; e (iii) qual o termo inicial do benefício após o recálculo do tempo de contribuição.
2. A ausência de informação essencial no PPP, como a identificação do responsável técnico pelos registros ambientais, constitui vício formal que impede a análise do mérito, justificando a extinção do processo sem resolução de mérito quanto ao respectivo período, a fim de oportunizar ao segurado a produção de prova adequada em nova ação.
3. É cabível o uso de prova por similaridade quando comprovada a extinção da empresa empregadora. A demonstração de identidade de objeto social e de porte empresarial (aferido pelo capital social) entre as empresas é suficiente para validar o uso do laudo paradigma.
4. O enquadramento da atividade especial por exposição a ruído deve observar estritamente os limites de tolerância vigentes à época da prestação do serviço. A exposição a nível médio de 87,5 dB(A) autoriza o reconhecimento do labor no período com limite superior a 80 dB(A) (até 05/03/1997), mas não no período com limite superior a 90 dB(A) (a partir de 06/03/1997).
5. Com o reconhecimento de tempo especial adicional, o segurado implementou os requisitos para a aposentadoria por tempo de contribuição na data do requerimento administrativo original (DER), o que afasta a necessidade de reafirmação da DER determinada na sentença.
6. Apelação da parte autora parcialmente provida para: (i) reconhecer parte do tempo de serviço como especial; (ii) extinguir sem resolução de mérito pedido referente a período com prova documental formalmente inválida; e (iii) conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER original.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Central Digital de Auxílio 1 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora para: a) reformar em parte a sentença para reconhecer como especial o período de 04/11/1991 a 05/03/1997, determinando ao INSS sua averbação com o fator de conversão 1,4; b) reformar a sentença para extinguir, sem resolução de mérito, o pedido de reconhecimento de tempo especial referente ao período de 01/04/2003 a 28/05/2009, por ausência de pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo; c) reformar a sentença para condenar o INSS a conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição a partir da DER original (01/12/2017); e d) inverter os ônus da sucumbência, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 27 de outubro de 2025.
Documento eletrônico assinado por ANA RAQUEL PINTO DE LIMA, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005414669v3 e do código CRC f30301fa.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 20/10/2025 A 27/10/2025
Apelação Cível Nº 5019419-02.2020.4.04.7200/SC
RELATORA Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
PRESIDENTE Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 20/10/2025, às 00:00, a 27/10/2025, às 16:00, na sequência 60, disponibilizada no DE de 09/10/2025.
Certifico que a Central Digital de Auxílio 1, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A CENTRAL DIGITAL DE AUXÍLIO 1 DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARA: A) REFORMAR EM PARTE A SENTENÇA PARA RECONHECER COMO ESPECIAL O PERÍODO DE 04/11/1991 A 05/03/1997, DETERMINANDO AO INSS SUA AVERBAÇÃO COM O FATOR DE CONVERSÃO 1,4; B) REFORMAR A SENTENÇA PARA EXTINGUIR, SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO, O PEDIDO DE RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL REFERENTE AO PERÍODO DE 01/04/2003 A 28/05/2009, POR AUSÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DE DESENVOLVIMENTO VÁLIDO E REGULAR DO PROCESSO; C) REFORMAR A SENTENÇA PARA CONDENAR O INSS A CONCEDER À PARTE AUTORA O BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO A PARTIR DA DER ORIGINAL (01/12/2017); E D) INVERTER OS ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA.
RELATORA DO ACÓRDÃO Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
Votante Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
Votante Juíza Federal ALINE LAZZARON
Votante Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
MÁRCIA CRISTINA ABBUD
Secretária
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