
Apelação Cível Nº 5007733-79.2025.4.04.9999/PR
RELATORA Juíza Federal IVANISE CORRÊA RODRIGUES PEROTONI
RELATÓRIO
Trata-se de ação de procedimento comum em face do INSS em que a parte autora postula a concessão de salário-maternidade, em virtude do nascimento da filha em 27/06/2023.
Processado o feito, sobreveio sentença, em que julgado improcedente o pedido, uma vez que não comprovada a qualidade de segurada especial da requerente. A parte autora foi condenada ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios de 10% do valor da causa, cuja exigibilidade encontra-se suspensa em virtude da gratuidade da justiça concedida (evento 46).
A demandante apela, sustentando que acostou documentos em nome dos genitores, comprovando o exercício de atividade rural. Alega que já recebeu anteriormente salário-maternidade na condição de rurícola. Pede a reforma do julgado (evento 52).
Com contrarrazões (evento 54), vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
SALÁRIO-MATERNIDADE
O salário-maternidade é benefício previdenciário que tem por objetivo substituir a remuneração da(o) segurada(o) da Previdência Social, em virtude de nascimento de filho ou de adoção ou de guarda judicial para fins de adoção, pago pelo período de 120 dias, com termo inicial entre 28 dias antes do parto e a ocorrência deste.
Dispõe a legislação de regência (Lei 8.213/91):
Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade.
Art. 71-A. Ao segurado ou segurada da Previdência Social que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança é devido salário-maternidade pelo período de 120 (cento e vinte) dias. (Redação dada pela Lei nº 12.873, de 2013).
Inicialmente, o benefício era devido apenas às seguradas empregadas, trabalhadoras avulsas e empregadas domésticas. Pela Lei 8.861/1994 o salário-maternidade foi estendido às seguradas especiais e pela Lei 9.876/1999 passou a abranger todas as seguradas. A partir da edição da Lei nº 10.421/02, o benefício passou a ser devido também nas hipóteses de adoção e de obtenção de guarda judicial para fins de adoção.
A Lei 9.876/1999 incluiu o inciso III no art. 25 da Lei 8.213/91, estabelecendo que as seguradas especiais, facultativas e contribuintes individuais deveriam comprovar carência de 10 meses para fazer jus ao salário-maternidade, ao passo que as demais seguradas eram isentas de tal exigência, segundo o art. 26, II, da Lei de Benefícios.
Entretanto, ao julgar as ADIs 2110 e 2111, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a inconstitucionalidade do referido inciso, por violar os princípios da igualdade e da proteção à maternidade e à criança, afastando a exigência de cumprimento da carência para todas as seguradas.
Assim, os requisitos para concessão do salário-maternidade são: a) comprovação do nascimento de filho/adoção; b) qualidade de segurada(o).
CASO CONCRETO
A maternidade foi comprovada pela juntada da certidão de nascimento da filha, de 27/06/2023, data em que a autora contava 23 anos de idade (evento 1.6).
O pedido administrativo, protocolado em 11/05/2024, foi indeferido em virtude da não comprovação da qualidade de segurada especial (evento 1.5).
Na presente ação, ajuizada em 14/08/2024, foi proferida sentença de improcedência.
A controvérsia recursal cinge-se à comprovação da qualidade de segurada especial da autora previamente ao nascimento da criança. A demandante alega na inicial que desenvolvia atividade campesina com a mãe e com a irmã, na comunidade Slaviero, zona rural de Rio Bonito do Iguaçu/PR.
QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL
O trabalho rural, na condição de segurado especial, está previsto no art. 11, VII e § 1º da Lei 8.213/91, podendo ser demonstrado mediante início de prova material contemporânea dos fatos, complementado por prova testemunhal quando necessário complementar eventuais lacunas, conforme disposto no art. 55, § 3º da mencionada legislação.
Quanto à comprovação, importa consignar que: a) não se admite prova exclusivamente testemunhal (art. 55, § 3º da Lei 8.213/91 e Súmula nº 149 do STJ); b) o rol de documentos listado no art. 106 da Lei de Benefícios não é taxativo, admitindo-se como prova material documentos civis, como certificado de alistamento/dispensa militar e certidões de nascimento, casamento e óbito, entre outros (entendimento deste Tribunal); c) é possível a apresentação de documentos em nome de terceiros integrantes do mesmo grupo familiar (Súmula nº 73 do TRF4).
Para comprovar a condição de rurícola, a demandante anexou documentos, dos quais destaco:
- certidão de nascimento da filha, de 06/2023, em que consta que ela residia na localidade de Slaviero, na zona rural de Rio Bonito do Iguaçu/PR (evento 1.6);
- nota fiscal de produtor rural emitida pelos genitores da requerente, Arquimedes e Joracy de Vasconcelos, em 10/2022, relativa à comercialização de ração (evento 1.10);
- declaração de que Elidiane Vasconcellos (que seria irmã da autora, embora não comprovado nos autos) tinha registro em 2017 no Sistema de Informações de Projetos de Reforma Agrária da Superintendência do Incra do Paraná (evento 1.7).
A autora alegou em sede de apelação que já esteve em gozo de salário-maternidade na condição de rurícola, anexando acórdão desta Corte, no qual não há referência ao período em que concedido o benefício.
Conforme requerido pela demandante, foi oportunizada a produção de prova oral por despacho de 18/03/2025, assinando-se prazo de 10 dias para apresentação dos depoimentos de testemunhas em mídia audiovisual (evento 30).
Em 09/04/2025, a postulante requereu prazo adicional de 15 dias (evento 33), o qual foi concedido. Contudo, não foram juntadas as gravações.
Em 03/06/2025, a magistrada de origem declarou preclusa a produção da prova oral.
Com efeito, o desempenho de atividade rural é marcado, em regra, pela informalidade, devendo as provas serem analisadas em conformidade com essa condição.
No entanto, o conjunto probatório acima referido se mostra frágil e não fornece a necessária segurança acerca do labor rurícola exercido pela demandante.
Tenho que o caso em tela se amolda à tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp nº 1.352.721, pela sistemática dos Recursos Repetitivos (Tema nº 629):
A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.
Assim, em face da carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, o feito deve ser extinto sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, V, do CPC.
No mesmo sentido, os seguintes precedentes:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. REQUISITOS. QUALIDADE DE SEGURADO DO FALECIDO. CONDIÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL. TRABALHADOR RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a) a ocorrência do evento morte; b) a condição de dependente de quem objetiva a pensão; c) a demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito. O benefício independe de carência e é regido pela legislação vigente à época do óbito 2. A qualidade de segurado especial do de cujus deve ser comprovada por início de prova material, corroborada por prova testemunhal, no caso de exercer atividade agrícola como volante ou boia-fria ou mesmo como trabalhador rural em regime de economia familiar. 3. Verificada a ausência de conteúdo probatório válido para instruir a inicial, conforme estabelece o artigo 320 do Código de Processo Civil, resta configurada a hipótese de carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, o que implica decidir a causa sem resolução do mérito, consoante os termos do artigo 485, IV, do Código de Processo Civil. (TRF4, AC 5012379-06.2023.4.04.9999, DÉCIMA TURMA, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 20/12/2023)
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. REQUISITOS. QUALIDADE DE SEGURADO DO FALECIDO. TRABALHADOR RURAL. REVERSÃO DO LOAS EM APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. NÃO COMPROVAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a) a ocorrência do evento morte; b) a condição de dependente de quem objetiva a pensão; c) a demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito. O benefício independe de carência e é regido pela legislação vigente à época do óbito. 2. A qualidade de segurado especial do de cujus deve ser comprovada por início de prova material, corroborada por prova testemunhal, no caso de exercer atividade agrícola como volante ou boia-fria ou mesmo como trabalhador rural em regime de economia familiar. 3. O conjunto probatório dos autos não permite concluir que o instituidor foi trabalhador rural até o período imediatamente anterior ao deferimento do LOAS. Correta a concessão do LOAS, pela autarquia previdenciária, ao invés do benefício assistencial ao deficiente. 4. Ausente início de prova material do labor rural, deve ser extinto o feito sem o julgamento do mérito, nos termos do artigo 485, IV, do Código de Processo Civil, possibilitando que se postule a concessão de benefício em outro momento, caso a parte autora obtenha prova material hábil à comprovação da alegada atividade rurícola do instituidor. (TRF4, AC 5004242-35.2023.4.04.9999, DÉCIMA TURMA, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 11/09/2023)
De ofício, é de ser extinto o feito sem resolução de mérito e julgada prejudicada a apelação da requerente.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Mantida a condenação da autora em custas processuais e em honorários advocatícios, conforme determinado na sentença. Exigibilidade suspensa em virtude da gratuidade da justiça concedida.
PREQUESTIONAMENTO
Objetivando possibilitar o acesso das partes às instâncias superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto.
CONCLUSÃO
De ofício, extinto o feito sem resolução de mérito por ausência de conteúdo probatório apto a instruir a inicial.
Apelação da autora prejudicada.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por, de ofício, extinguir o feito sem resolução de mérito e julgar prejudicada a apelação da autora, nos termos da fundamentação.
Documento eletrônico assinado por IVANISE CORREA RODRIGUES PEROTONI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005389912v6 e do código CRC 14e54444.
Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): IVANISE CORREA RODRIGUES PEROTONIData e Hora: 23/10/2025, às 16:15:10
Conferência de autenticidade emitida em 30/10/2025 13:12:40.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Apelação Cível Nº 5007733-79.2025.4.04.9999/PR
RELATORA Juíza Federal IVANISE CORRÊA RODRIGUES PEROTONI
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. SALÁRIO-MATERNIDADE. QUALIDADE DE SEGURADA ESPECIAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. APELAÇÃO PREJUDICADA.
I. CASO EM EXAME:
1. Ação de procedimento comum em face do INSS para concessão de salário-maternidade, em virtude do nascimento da filha da autora em 27/06/2023. A sentença julgou improcedente o pedido por não comprovação da qualidade de segurada especial. A autora apelou, sustentando a comprovação da atividade rural por documentos dos genitores e o recebimento anterior de salário-maternidade como rurícola.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO:
2. Há duas questões em discussão: (i) a comprovação da qualidade de segurada especial da autora previamente ao nascimento da criança; (ii) a suficiência do conjunto probatório para o reconhecimento do labor rural.
III. RAZÕES DE DECIDIR:
3. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social durante 120 dias, com início entre 28 dias antes do parto e a data de ocorrência deste, conforme o art. 71 da Lei nº 8.213/1991. Os requisitos para a concessão são a comprovação do nascimento de filho/adoção e a qualidade de segurado(a), sendo que a carência foi afastada pelo STF nas ADIs 2110 e 2111. No caso, a maternidade foi comprovada pelo nascimento da filha em 27/06/2023, mas a controvérsia reside na comprovação da qualidade de segurada especial da autora.4. O trabalho rural na condição de segurado especial pode ser demonstrado por início de prova material contemporânea, complementado por prova testemunhal, conforme o art. 11, VII e § 1º, e o art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/1991, não se admitindo prova exclusivamente testemunhal (Súmula nº 149 do STJ). Embora seja possível a apresentação de documentos em nome de terceiros do grupo familiar (Súmula nº 73 do TRF4), o conjunto probatório apresentado pela autora (certidão de nascimento da filha com endereço rural, nota fiscal de produtor rural dos genitores e declaração de registro da irmã no Incra) não forneceu a segurança necessária acerca do labor rurícola. A prova oral, que poderia complementar as lacunas, foi declarada preclusa por não ter sido apresentada.5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial implica carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem julgamento do mérito, nos termos do art. 485, V, do CPC, conforme tese firmada pelo STJ no julgamento do REsp nº 1.352.721 (Tema nº 629). Assim, o feito é extinto sem resolução de mérito, e a apelação da requerente é julgada prejudicada.
IV. DISPOSITIVO E TESE:
6. De ofício, feito extinto sem resolução de mérito. Apelação da autora prejudicada.Tese de julgamento: 7. A ausência de início de prova material robusta para comprovar a qualidade de segurada especial, mesmo com documentos em nome de familiares, leva à extinção do processo sem resolução de mérito.
___________
Dispositivos relevantes citados: Lei nº 8.213/1991, arts. 11, VII, § 1º, 55, § 3º, 71; CPC, art. 485, V.
Jurisprudência relevante citada: STF, ADIs 2110 e 2111; STJ, REsp nº 1.352.721, Tema nº 629; STJ, Súmula nº 149; TRF4, Súmula nº 73; TRF4, AC 5012379-06.2023.4.04.9999, Rel. Márcio Antônio Rocha, j. 20.12.2023; TRF4, AC 5004242-35.2023.4.04.9999, Rel. Luiz Fernando Wowk Penteado, j. 11.09.2023.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, de ofício, extinguir o feito sem resolução de mérito e julgar prejudicada a apelação da autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 21 de outubro de 2025.
Documento eletrônico assinado por IVANISE CORREA RODRIGUES PEROTONI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005389913v6 e do código CRC 43e988d5.
Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): IVANISE CORREA RODRIGUES PEROTONIData e Hora: 23/10/2025, às 16:15:10
Conferência de autenticidade emitida em 30/10/2025 13:12:40.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 14/10/2025 A 21/10/2025
Apelação Cível Nº 5007733-79.2025.4.04.9999/PR
RELATORA Juíza Federal IVANISE CORRÊA RODRIGUES PEROTONI
PRESIDENTE Juíza Federal IVANISE CORRÊA RODRIGUES PEROTONI
PROCURADOR(A) JANUÁRIO PALUDO
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 14/10/2025, às 00:00, a 21/10/2025, às 16:00, na sequência 541, disponibilizada no DE de 03/10/2025.
Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DE OFÍCIO, EXTINGUIR O FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO E JULGAR PREJUDICADA A APELAÇÃO DA AUTORA.
RELATORA DO ACÓRDÃO Juíza Federal IVANISE CORRÊA RODRIGUES PEROTONI
Votante Juíza Federal IVANISE CORRÊA RODRIGUES PEROTONI
Votante Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
SUZANA ROESSING
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 30/10/2025 13:12:40.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas