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DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. INDÚSTRIA CALÇADISTA. AGENTES QUÍMICOS. LAUDO SIMILAR. REAFIRMAÇÃO DA DER. PROVIMEN...

Data da publicação: 05/11/2025, 07:10:10

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. INDÚSTRIA CALÇADISTA. AGENTES QUÍMICOS. LAUDO SIMILAR. REAFIRMAÇÃO DA DER. PROVIMENTO DA APELAÇÃO DA PARTE AUTORA. DESPROVIMENTO DA APELAÇÃO DO INSS. I. CASO EM EXAME:1. Apelações interpostas pela parte autora e pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos de reconhecimento de tempo de trabalho em condições especiais e concessão de aposentadoria por tempo de contribuição. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO:2. Há três questões em discussão: (i) o cerceamento de defesa pela negativa de produção de prova pericial; (ii) o reconhecimento da especialidade de períodos laborados na indústria calçadista, especialmente após 05/03/1997, por exposição a ruído e agentes químicos (hidrocarbonetos aromáticos/solventes), e a possibilidade de utilização de laudo similar; (iii) a reafirmação da DER, consectários legais e honorários advocatícios. III. RAZÕES DE DECIDIR:3. A preliminar de cerceamento de defesa foi afastada, pois a base probatória dos autos, incluindo formulários e laudos, é suficiente para aferir a especialidade do trabalho, não havendo necessidade de produção de prova pericial adicional.4. Foi dado provimento à apelação da parte autora para reconhecer a especialidade do período de 06/03/1997 a 11/02/1998. A função de Cortador em indústria calçadista implica exposição notória e habitual a agentes químicos (hidrocarbonetos aromáticos/solventes), cuja avaliação é qualitativa e dispensa a análise quantitativa de ruído, conforme a jurisprudência.5. O recurso do autor foi provido para reconhecer a especialidade dos períodos de 12/02/1998 a 28/02/2002 e 01/03/2002 a 18/11/2003. A inatividade da empresa Calçados Racket Ltda. permite o uso de laudo pericial elaborado em empresa similar (prova emprestada), conforme Súmula 106 do TRF4. A atividade na indústria calçadista envolve contato com colas e solventes contendo hidrocarbonetos aromáticos, agentes nocivos de análise qualitativa.6. O recurso do autor foi provido para reconhecer a especialidade do período de 03/05/2004 a 09/11/2017. Embora os laudos da empresa indicassem ruído abaixo do limite, um laudo pericial judicial similar para a função de Modelista na mesma empresa apontou exposição a hidrocarbonetos aromáticos, incluindo benzeno. A avaliação desses agentes é qualitativa, e em caso de divergência de provas, o princípio da precaução e o in dubio pro segurado recomendam a interpretação mais favorável ao requerente.7. Foi negado provimento ao recurso do INSS. Os períodos posteriores a 05/03/1997 na indústria calçadista foram reconhecidos como especiais devido à exposição a agentes químicos (hidrocarbonetos aromáticos/solventes), que são cancerígenos e exigem análise qualitativa, tornando irrelevante a eficácia do EPI. Adicionalmente, os PPPs comprovaram a exposição a ruído acima dos limites de tolerância da legislação vigente.8. A reafirmação da DER é viável por ocasião da liquidação do julgado, conforme a tese firmada pelo STJ no Tema 995/STJ, que permite a reafirmação para o momento de implementação dos requisitos do benefício, mesmo após o ajuizamento da ação, com efeitos financeiros específicos para cada situação.9. Os consectários legais foram fixados com juros conforme o Tema 1170 do STF, e correção monetária pelo INPC até 08/12/2021, e pela taxa SELIC a partir de 09/12/2021, nos termos do art. 3º da EC nº 113/2021.10. Os honorários advocatícios recursais foram redistribuídos, ficando a cargo exclusivo da parte ré, devidos sobre o valor da condenação (parcelas vencidas até o acórdão) ou sobre o valor atualizado da causa, conforme o art. 83, §§ 2º e 3º, do CPC, Súmulas 111 do STJ e 76 do TRF4. IV. DISPOSITIVO E TESE:11. Apelação da parte autora provida. Apelação do INSS desprovida.Tese de julgamento: 12. A especialidade do trabalho em indústria calçadista, especialmente em funções como Cortador e Modelista, pode ser reconhecida pela exposição a agentes químicos (hidrocarbonetos aromáticos/solventes), cuja avaliação é qualitativa e dispensa análise quantitativa de ruído, sendo admissível o uso de laudo similar em caso de inatividade da empresa. ___________Dispositivos relevantes citados: NCPC, art. 487, inc. I; Lei nº 9.289/1996, art. 4º, inc. I e II; CPC, art. 83, §§ 2º e 3º, art. 85, §§ 2º e 3º, inc. I, art. 493, art. 933, art. 1.022, art. 1.025; LINDB, art. 6º; Decreto nº 53.831/1964; Decreto nº 83.080/1979; Decreto nº 2.172/1997; Decreto nº 3.048/1999; Decreto nº 4.882/2003; Portaria Interministerial nº 9/2014; NR-15, Anexo 13; Lei nº 8.213/1991, art. 58, § 2º, art. 124; Medida Provisória nº 1.729/1998; Lei nº 9.732/1998; EC nº 113/2021, art. 3º.Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp nº 1.398.260/PR (Tema 694); STJ, REsp nº 1.886.795/RS (Tema 1083); STF, ARE 664.335/SC; STF, RE 631.240/MG, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 03.09.2014; STJ, Tema 995; STJ, Súmula 111; TRF4, Súmula 106; TRF4, Súmula 76; STF, Tema 1170; TRF4, AC 5001035-06.2020.4.04.7001, 10ª Turma, Rel. Luiz Fernando Wowk Penteado, j. 12.08.2025; TRF4, AC 5071483-41.2019.4.04.7000, 10ª Turma, Rel. Claudia Cristina Cristofani, j. 05.08.2025; TRF4, AC 5022285-31.2021.4.04.7108, 5ª Turma, Rel. Hermes Siedler da Conceição Júnior, j. 17.12.2024; TRF4, AC 5005120-30.2019.4.04.7111, 11ª Turma, Rel. Marcos Roberto Araujo dos Santos, j. 18.04.2023; TRF4, AC 5009530-03.2019.4.04.9999, 11ª Turma, Rel. Ana Cristina Ferro Blasi, j. 18.10.2023; TRF4, AC 2006.71.99.000709-7, Rel. Des. Fed. Celso Kipper, DJU 02.03.2007; TRF4, APELREEX 2008.71.08.001075-4, Rel. Juiz Fed. Guilherme Pinho Machado, D.E. 03.08.2009; TRF4, AC 5002405-37.2018.4.04.7212, 11ª Turma, Rel. Victor Luiz dos Santos Laus, j. 11.06.2025. (TRF 4ª Região, Central Digital de Auxílio 1, 5023001-63.2018.4.04.7108, Rel. ANA RAQUEL PINTO DE LIMA, julgado em 27/10/2025, DJEN DATA: 29/10/2025)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5023001-63.2018.4.04.7108/RS

RELATORA Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA

RELATÓRIO

 

Trata-se de Apelação interposta pela PARTE AUTORA e pelo Réu Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) contra a sentença que assim se pronunciou quanto ao pedido inicial (evento 37, SENT1):

Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos, resolvendo o mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do NCPC, para:

a) declarar que o trabalho, de 29/01/1988 a 04/05/1992, 05/05/1992 a 16/11/1994, 23/11/1994 a 05/03/1997, 19/11/2003 a 20/04/2004, foi prestado em condições especiais e que a Parte Autora tem direito a, se o caso, vê-lo convertido para tempo comum;

b) determinar ao INSS que retifique a data de saída do requerente junto à empresa Racket Calçados (Tecnoeva Tecnologia em EVA Ltda) para 20/04/2004;

c) determinar ao INSS que implante, em favor da Parte Autora, a aposentadoria por tempo de contribuição, devida em decorrência do reconhecimento do tempo aqui tratado (NB 185.187.973-8), na sistemática de cálculo mais benéfica, nos termos da fundamentação;

d) condenar o INSS a pagar as parcelas vencidas e não pagas, decorrentes da concessão da aposentadoria, desde 15/04/2019, as quais deverão ser corrigidas monetariamente pelo INPC desde o vencimento de cada parcela e acrescida do percentual de juros idêntico ao utilizado para remunerar os depósitos em conta poupança, estes a partir da citação.

Diante da sucumbência recíproca, distribuo entre as partes, embora isentas das custas processuais (artigo 4º, incisos I e II, da Lei n.º 9.289/1996), os honorários advocatícios, fixados estes em 10% sobre o valor devido até a presente sentença (artigo 85, §§ 2º e 3º, inciso I, do Novo Código de Processo Civil c/c Súmulas 111 do STJ e 76 do TRF4), na proporção de 3% a serem pagos pela parte autora e 7% pela parte ré ao patrono da outra parte, não sendo compensáveis os montantes. A condenação do autor, contudo, fica suspensa em função da gratuidade da justiça.

Nas razões recursais (evento 42, APELAÇÃO1), a parte autora sustenta, preliminarmente, cerceamento de defesa pela negativa de produção de prova pericial para comprovar a exposição a agentes químicos nos períodos de 06/03/1997 a 11/02/1998, 12/02/1998 a 28/02/2002, 01/03/2002 a 18/11/2003 e 03/05/2004 a 09/11/2017, e postula a concessão integral da gratuidade da justiça também para a prova pericial. Alternativamente, requer o reconhecimento dos períodos especiais com aplicação de laudo similar, para a concessão de aposentadoria especial.

Por sua vez, o INSS, em suas razões (evento 47, APELAÇÃO1), sustenta a ausência de interesse processual na reafirmação da DER, a improcedência do reconhecimento da atividade especial pós-05/03/1997, e impugna a condenação em honorários advocatícios e juros moratórios

Com as contrarrazões (evento 45, CONTRAZ1 e evento 51, CONTRAZAP1), vieram os autos para esta Corte.

É o relatório.

VOTO

I - Cerceamento de Defesa

Nas razões de apelação, a parte autora aduziu, preliminarmente, a ocorrência de cerceamento de defesa, ante a negativa de produção de prova pericial junto à empresas Paquetá Calçados S.A. e Calçados Racket Ltda., postulando a anulação da sentença, com retorno dos autos à origem para reabertura da instrução processual.

Importa destacar, outrossim, que o afastamento da alegação de cerceamento de defesa não pressupõe o automático reconhecimento da especialidade do período requerido. O retorno dos autos à origem, quando cabível, justifica-se pela ausência nos autos de documentação suficiente para esclarecer as condições de trabalho vivenciadas pela parte autora. Existindo tal documentação, de que são exemplos os formulários e laudos, não há falar em cerceamento de defesa. Entretanto, se a documentação trazida a exame não corroborar o quanto alegado pela parte autora em relação a determinado período alegadamente laborado sob condições especiais, haverá, na verdade, situação de contrariedade e inconformismo com o resultado alcançado, e não propriamente cerceamento do direito de defesa.

Afasto a preliminar.

II - Análise do Mérito

A controvérsia recursal cinge-se ao reconhecimento das condições especiais da atividade laboral da parte autora.

A sentença de origem não reconheceu a especialidade, fundamentando que:

CASO CONCRETO

Carência

Não há controvérsia, já que o INSS apurou administrativamente mais de 180 contribuições até a DER (Evento 13, PROCADM2, pág 55 a 60).

Tempo Especial

Analisando-se as especificidades do tempo alegadamente especial invocado pela Parte Autora, tem-se o que segue:

Períodos reconhecidos como especiais

Empresa:  Paquetá Calçados S.A

Períodos:  29/01/1988 a 04/05/1992

Função e setor:  Serviços Gerais

Provas: PPP (Evento 13, PROCADM2, pág. 7/8), CTPS (Evento 13, PROCADM1, pág 72)

Conclusão:

O formulário apresentado foi emitido pela empresa e contém a indicação do responsável técnico pelos registros ambientais, elidindo a necessidade de apresentação de laudo pericial.

Considerando que o documento indica que a Parte Autora, no exercício de suas atividades habituais e permanentes, não ocasionais nem intermitentes, esteve exposta a ruído superior a 80dB, está comprovada a especialidade do período.

 

Empresa:  Paquetá Calçados S.A

Períodos:   05/05/1992 a 16/11/1994

Função e setor:  Serviços Gerais/Cortador

Provas: PPP (Evento 13, PROCADM2, pág. 9/10), CTPS (Evento 13, PROCADM1, pág 72)

Conclusão:

O formulário apresentado foi emitido pela empresa e contém a indicação do responsável técnico pelos registros ambientais, elidindo a necessidade de apresentação de laudo pericial.

O documento indica que a Parte Autora, no exercício de suas atividades habituais e permanentes, não ocasionais nem intermitentes, esteve exposta a ruído.

Embora o formulário aponte medições de ruído variáveis, não há indicação de alteração da atividade desempenhada pela autora ou do lay-out da empresa.

No entanto, não é necessária a análise de laudo realizado em outra empresa, uma vez que, nos intervalos de 05/05/1992 a 31/12/1992 e de 01/01/1994 a 16/11/1994, os levantamentos realizados pela própria empresa indicavam a exposição a ruído acima dos níveis de tolerância, os quais podem ser considerados também para o período de 01/01/1993 a 31/12/1993.

Portanto, está comprovada a especialidade do período de 05/05/1992 a 16/11/1994.

 

Empresa:  Calçados Racket Ltda.

Períodos:  23/11/1994 a 11/02/1998

Função e setor:  Cortador

Provas: CTPS (Evento 13, PROCADM1, pág. 73), DSS 8030 (Evento 13, PROCADM2, pág 14), Laudo (Evento 13, PROCADM1, pág 45/48)

Conclusão

Considerando que o formulário e o laudo pericial indicam que a Parte Autora, no exercício de suas atividades habituais e permanentes, não ocasionais nem intermitentes, esteve exposta a ruído de 81dB, está comprovada a especialidade do período de 23/11/1994 a 05/03/1997.

Considerando que a partir de 06/03/1997 o limite de tolerância passou a ser de 90dB, não é possível o enquadramento do intervalo posterior.

Nos termos do despacho do evento 24, a mera alegação de imprecisão dos levantamentos ou a existência de levantamentos divergentes, realizados em outra empresa, são insuficientes a incutir dúvida fundada acerca do laudo técnico emitido pelo empregador, razão pela qual restou indeferido o pedido de análise de laudo similar ou de realização de perícia técnica.

 

Empresa:  Calçados Racket Ltda.

Períodos:  01/03/2002 a 20/04/2004

Função e setor:  Auxiliar de Modelista

Provas:  CTPS (Evento 13, PROCADM1, pág. 74), PPP (Evento 13, PROCADM2, pág 15/16), laudo técnico (evento 31)

Conclusão:

Embora o formulário PPP indique exposição a ruído de 57,6dB, o laudo técnico elaborado pela empresa, contendo indicação de levantamentos de ruído dentro das previsões da NHO-01 (Evento 31, ANEXO5), informa que a parte autora, no exercício de atividades de modelagem, estava exposta a ruído médio de 86,3dB (LAVG).

No entanto, considerando que o limite de tolerância vigente até 18/11/2003 era de 90dB,  está comprovada a especialidade do período de 19/11/2003 a 20/04/2004. 

Nos termos do despacho do evento 24, a mera alegação de imprecisão dos levantamentos ou a existência de levantamentos divergentes, realizados em outra empresa, são insuficientes a incutir dúvida fundada acerca do laudo técnico emitido pelo empregador, razão pela qual restou indeferido o pedido de análise de laudo similar ou de realização de perícia técnica.

Períodos não reconhecidos como especiais

Empresa:  Calçados Racket Ltda.

Períodos:  12/02/1998 a 28/02/2002

Função e setor:  Serviços Gerais de Modelagem

Provas: CTPS (Evento 13, PROCADM1, pág. 73), DSS 8030 (Evento 13, PROCADM2, pág 13), Laudo (Evento 13, PROCADM1, pág 45/48), laudos técnicos (evento 31)

Conclusão

Embora o formulário indique exposição a ruído de 83dB, o laudo técnico elaborado pela empresa, contendo indicação de levantamentos de ruído dentro das previsões da NHO-01 (Evento 31, ANEXO5), informa que a parte autora, no exercício de atividades de modelagem, estava exposta a ruído médio de 86,3dB (LAVG).

No entanto, considerando que o limite de tolerância vigente à época era de 90dB, não está comprovada a especialidade do período.

Nos termos do despacho do evento 24, a mera alegação de imprecisão dos levantamentos ou a existência de levantamentos divergentes, realizados em outra empresa, são insuficientes a incutir dúvida fundada acerca do laudo técnico emitido pelo empregador, razão pela qual restou indeferido o pedido de análise de laudo similar ou de realização de perícia técnica.

 

Empresa:  Paquetá Calçados S.A

Períodos:  03/05/2004 a 14/03/2018

Função e setor:  Modelista

Provas: PPP (Evento 13, PROCADM2, pág. 11/12), CTPS (Evento 13, PROCADM1, pág. 74), Laudos da empresa (Evento 27, LAUDO19 a 21)

Conclusão

O formulário emitido pela empresa informa, no exercício de atividades como modelista, a exposição a ruído de 67 e 65dB.

Intimada, a empresa apresentou laudos técnicos, no entanto, não trouxe os levantamentos de 1996, referidos no formulário.

No entanto, é possível a análise dos levantamentos realizados pela empresa em 2006, 2010 e 2015, contemporâneos ao exercício de atividade pelo autor.

No entanto, em nenhum dos levantamentos, as medições referentes às atividades exercidas nos diferentes setores de modelagem ultrapassam o nível de tolerância de 85dB.

Nos termos do despacho do evento 24, a mera alegação de imprecisão dos levantamentos ou a existência de levantamentos divergentes, realizados em outra empresa, são insuficientes a incutir dúvida fundada acerca do laudo técnico emitido pelo empregador, razão pela qual restou indeferido o pedido de análise de laudo similar ou de realização de perícia técnica.

Portanto, não é possível o reconhecimento da especialidade no período.

Portanto, reconheço a especialidade dos períodos de atividade de 29/01/1988 a 04/05/1992, 05/05/1992 a 16/11/1994, 23/11/1994 a 05/03/1997, 19/11/2003 a 20/04/2004.

A decisão do juízo a quo merece reparos.

A orientação desta Corte Federal está assim sedimentada quanto ao reconhecimento do tempo especial diante da categoria profissional até 28/04/1995 e pela exposição ao(s) agente(s) nocivo(s):

AGENTE NOCIVO: RUÍDO

O reconhecimento da especialidade da atividade pela exposição a ruído exige a demonstração da efetiva exposição, mediante aferição do nível de decibéis (dB) por meio de parecer técnico. Os limites de tolerância para ruído são:  Até 05.03.1997: Superior a 80 dB(A) (Decreto nº 53.831/64 e Decreto nº 83.080/79). De 06.03.1997 a 18.11.2003: Superior a 90 dB(A) (Decreto nº 2.172/97 e Decreto nº 3.048/99). O Superior Tribunal de Justiça (Tema 694 - REsp n° 1398260/PR) pacificou que é impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB. A partir de 19.11.2003: Superior a 85 dB(A) (Decreto nº 3.048/99, alterado pelo Decreto nº 4.882/2003). Metodologia de Medição (NEN/Pico): O Superior Tribunal de Justiça (Tema 1083 - REsp 1886795/RS) fixou que o reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição. A exigência do NEN no LTCAT e PPP é a partir do Decreto n. 4.882/2003. (TRF4, AC 5001035-06.2020.4.04.7001, 10ª Turma , Relator para Acórdão LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO , julgado em 12/08/2025). EPI´s: Eventual utilização de EPI´s é irrelevante para elidir a nocividade decorrente da exposição ao ruído excessivo, conforme decisão do STF no ARE 664.335/SC.

AGENTES QUÍMICOS (ÓLEOS, GRAXAS, HIDROCARBONETOS)

A exposição a hidrocarbonetos aromáticos, como óleos e graxas de origem mineral, é qualitativa, pois se tratam de agentes químicos reconhecidamente cancerígenos, conforme a Portaria Interministerial nº 9/2014 e o Anexo 13 da NR-15. A utilização de EPI, ainda que atenue a exposição, não é capaz de neutralizar completamente o risco, conforme decidido pelo TRF4 no IRDR Tema 15. (TRF4, AC 5071483-41.2019.4.04.7000, 10ª Turma , Relatora para Acórdão CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI , julgado em 05/08/2025

TRABALHADOR INDÚSTRIA DE CALÇADOS

Até 03/12/1998, é possível o enquadramento como especial do labor exercido pelo trabalhador nas funções de serviços gerais na indústria calçadista.

É fato notório que, nas empresas do ramo calçadista, os operários são contratados como serviços gerais, ajudante, auxiliar, atendente, entre outros, mas que a atividade efetiva consiste no trabalho manual do calçado, em suas várias etapas industriais. É sabido, também, que a indústria calçadista sempre depende da cola para a industrialização dos seus produtos. A cola utilizada em época remota era composta por derivados de hidrocarbonetos, cujos vapores acarretavam graves efeitos na saúde do trabalhador.

Sobre o tema, destaco os seguintes julgados desta Corte:

EMENTA: DIREITO PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. INEXISTÊNCIA. INTERESSE PROCESSUAL. TEMPO ESPECIAL. AGENTES QUÍMICOS HIDROCARBONETOS. INDÚSTRIA CALÇADISTA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1.A base probatória dos autos é suficiente para aferir a eventual especialidade do trabalho prestado pela parte autora nos períodos em controvérsia, razão pela qual não merece guarida a preliminar de cerceamento de defesa. 2. O Supremo Tribunal Federal definiu que: (a) para os pedidos de concessão de benefício, não se exige o prévio requerimento quando a postura do INSS for notória e reiteradamente contrária à postulação do segurado; (b) para os pedidos de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício, somente se exige o prévio requerimento para matéria de fato não levada ao conhecimento da Administração (RE 631.240/MG, Relator Min. Roberto Barroso, Tribunal Pleno, julgado em 03/09/2014). 3. Assim, nos casos em que a autarquia previdenciária adotar posição notoriamente contrária ao pleito, está caracterizado o interesse processual para deduzir o pedido em juízo ainda que a matéria fática não seja avaliada previamente. 4. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida. 5. A exposição a agentes químicos hidrocarbonetos permite o enquadramento como especial de período de labor por mera avaliação qualitativa, e independente da análise quantitativa de níveis de concentração. 6. Comprovada a exposição do segurado a agentes nocivos elencados na Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos (Linach), Portaria Interministerial nº 9, de 07/10/2014, deve ser reconhecida a especialidade pela presença do agente no ambiente de trabalho, sendo irrelevante o uso de EPI ou EPC, bem como inexigíveis a permanência na exposição ou a mensuração quantitativa do agente nocivo. 7. No caso de trabalhadores da indústria calçadista, as atividades desempenhadas pelos contratados como serviços gerais notoriamente envolvem o contato com agentes químicos nas etapas de produção dos calçados, admitindo-se como prova da especialidade o laudo pericial por similaridade produzido em juízo. 8. Preenchidos os requisitos, nos termos da legislação aplicável, deve ser concedido o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição. 9. Honorários advocatícios majorados em razão da sucumbência recursal. (TRF4, AC 5022285-31.2021.4.04.7108, 5ª Turma, Relator para Acórdão HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR, julgado em 17/12/2024). Grifei.

APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REVISÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. TEMPO ESPECIAL. SERVIÇOS GERAIS EM INDÚSTRIA CALÇADISTA. PERÍODO ANTERIOR A 28/05/1995. 1. Havendo nos autos documentos suficientes para o convencimento do juízo acerca das condições de trabalho vivenciadas pela parte autora, não há falar em cerceamento de defesa decorrente do indeferimento da produção de prova pericial. 2. Na linha dos precedentes deste Tribunal, formados a partir do que foi constatado em inúmeras demandas similares, tem-se que a regra é a indústria calçadista utilizar cola para a industrialização dos seus produtos, sendo que a cola utilizada em época remota era composta por derivados de hidrocarbonetos, cujos vapores acarretavam graves efeitos na saúde do trabalhador. Considera-se, ainda, que os operários são contratados como serviços gerais, ajudante, auxiliar, atendente, entre outros, mas a atividade efetiva consiste no trabalho manual do calçado, em suas várias etapas industriais. 3. Ainda que não haja nos autos referência ao uso de cola no cargo de serviços gerais em indústria calçadista, com relação aos agentes químicos, como se trata de períodos anteriores a 28/04/1995, a CTPS é prova bastante no caso concreto, visto que, considerando o ramo da atividade da empresa e o período em que as atividades foram exercidas, é possível concluir pela ocorrência de exposição a agentes nocivos. (TRF4, AC 5005120-30.2019.4.04.7111, Décima Primeira Turma, Relator Marcos Roberto Araujo dos Santos, juntado aos autos em 18-4-2023). Grifei.

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO ESPECIAL. REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA SOCIAL (RPPS). ILEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. EMPRESAS CALÇADISTAS. LAUDO SIMILAR. POSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO. REAFIRMAÇÃO DA DER (TEMA 995 STJ). VERBA HONORÁRIA. DEFLAÇÃO. 1. O INSS não detém legitimidade para figurar no polo passivo de lide em que se discute reconhecimento de atividade especial exercida em regime próprio de previdência social. 2. O reconhecimento da especialidade obedece à disciplina legal vigente à época em que a atividade foi exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador, de modo que, uma vez prestado o serviço sob a vigência de certa legislação, o segurado adquire o direito à contagem na forma estabelecida, bem como à comprovação das condições de trabalho como então exigido, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial. 3. Não há óbice à utilização de laudo pericial elaborado em uma empresa, para comprovar a especialidade do labor em outra do mesmo ramo e no exercício de função semelhante. 4. A realidade e a singularidade das funções dos trabalhadores nas indústrias de calçados não pode ser ignorada, sendo fato notório que, em empresas desse ramo, os operários são comumente contratados como serviços gerais, ajudante, auxiliar, atendente, entre outros, mas sua atividade efetiva consiste, via de regra, no trabalho manual do calçado, em suas várias etapas industriais. É patente, ainda, que a indústria calçadista sempre depende da cola para a industrialização dos seus produtos. 5. É possível a reafirmação da DER para o momento em que restarem implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos artigos 493 e 933 do CPC, observada a causa de pedir (Tema 995, do STJ). 6. Conforme os preceitos do art. 85 do CPC, o INSS deverá arcar com o pagamento dos honorários advocatícios no patamar mínimo de cada uma das faixas de valor, considerando as variáveis dos incisos I a IV do §2º e §3º do artigo 85 do CPC/2015, incidente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença (Súmulas 111 do Superior Tribunal de Justiça e 76 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região). 7. Devem ser aplicados os índices de deflação na correção monetária do crédito previdenciário, preservando-se o valor nominal, uma vez que não há ofensa aos princípios constitucionais da irredutibilidade e da preservação do valor real dos proventos. Precedentes deste Tribunal. (TRF4, Décima Primeira Turma, AC 5009530-03.2019.4.04.9999, Relator Ana Cristina Ferro Blasi, juntado aos autos em 18-10-2023). Grifei.

Vale destacar ainda, que não se desconhece a inexistência de previsão legal da categoria de trabalhador na indústria calçadista ou algo equivalente nos decretos regulamentares. Entretanto, é importante esclarecer que o reconhecimento da especialidade aqui efetuado não equivale a um enquadramento por categoria profissional, visto que decorre de pacificada construção jurisprudencial, fruto de reiteradas ações judiciais propostas ao longo do tempo, nas quais a prova técnica evidencia a execução do labor em um único pavilhão, o qual, via de regra, não possui separação entre os setores e, invariavelmente, aponta a execução de atividades que demandam o contato diuturno com agentes químicos, sobretudo, hidrocarbonetos aromáticos.

Observo, ainda, que o uso de EPI somente é considerado para o labor desempenhado a partir de 03/12/1998, em virtude da alteração efetuada no § 2º do art. 58 da Lei 8.213/1991 pela Medida Provisória 1.729, de 02/12/1998, convertida na Lei 9.732, de 11/12/1998.

Assim, considero possível o enquadramento como tempo especial dos períodos em que exercidas atividades em empresas do ramo calçadista até 03/12/1998, ainda que não apresentados formulários comprobatórios das condições ambientais.

UTILIZAÇÃO DE LAUDO SIMILAR

Observo que, muitas vezes, a solução para a busca da melhor resposta às condições ambientais de trabalho, com a presença ou não de agentes nocivos, é a avaliação dessas em estabelecimento de atividade semelhante àquele em que laborou originariamente o segurado, no qual poderão estar presentes os mesmos agentes nocivos, o que pode vir a ensejar um juízo conclusivo a respeito.

Logo, em tese, não há óbice à utilização de laudo pericial elaborado em uma empresa, para comprovar a especialidade do labor em outra do mesmo ramo e no exercício de função semelhante. Nesse sentido, é a jurisprudência dominante deste Tribunal: AC 2006.71.99.000709-7, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, DJU 2/3/2007 e APELREEX 2008.71.08.001075-4, Relator Juiz Federal Guilherme Pinho Machado, D.E. 3/8/2009.

Ademais, a Súmula 106 deste TRF assim estabelece: "Quando não é possível a realização de perícia técnica no local de trabalho do segurado, admite-se a produção desta prova em empresa similar, a fim de aferir a exposição aos agentes nocivos e comprovar a especialidade do labor".

Análise do Caso Concreto:

Recurso do Autor

1. Período: 06/03/1997 a 11/02/1998 (Calçados Racket Ltda. - Cortador)

Consta CTPS (evento 13, PROCADM1, fls. 73) indicando que o autor trabalhou na função de Cortador e de Serviços Gerais em Indústria Calçadista:

A sentença reconheceu o período de 23/11/1994 a 05/03/1997 pela exposição a ruído (81dB). O período subsequente (06/03/1997 a 11/02/1998 e 12/02/1998 a 03/12/1998) foi negado porque o limite de ruído passou a ser 90 dB.

Contudo, considerando a função de Cortador e o fato de o labor ter sido prestado em uma indústria calçadista, deve ser aplicado o entendimento jurisprudencial que reconhece a especialidade em virtude da exposição notória e habitual a agentes químicos (hidrocarbonetos aromáticos/solventes), inerentes às etapas de produção do calçado. Essa exposição é de avaliação qualitativa e dispensa a análise quantitativa do ruído.

O fato de a indústria calçadista utilizar colas e insumos químicos nocivos, e a função de Cortador estar intrinsecamente ligada à manipulação desses materiais ou à proximidade com eles, considero possível o enquadramento como tempo especial dos períodos em que exercidas atividades em empresas do ramo calçadista até 03/12/1998

Portanto, dou provimento à apelação da parte autora para reconhecer a especialidade do período.

2. Períodos: 12/02/1998 a 28/02/2002 (Calçados Racket - Serviços Gerais de Modelagem); 01/03/2002 a 18/11/2003 (Calçados Racket - Auxiliar de Modelista)

Consta CTPS do autor nos autos (evento 13, PROCADM1, fls. 73), indicando o exercício de Serviços Gerais de Modelagem em Indústria Calçadista:

O juiz de primeira instância não reconheceu a especialidade porque o ruído de 81dB estava abaixo do limite de 90dB vigente à época.

Em consulta ao sítio da Receita Estadual, verifica-se a inatividade da empresa:

Conforme a jurisprudência desta Corte, e considerando que a empresa Calçados Racket Ltda. encontra-se inativa, o que impossibilita a realização de perícia no local, é admissível o uso de laudo pericial elaborado em empresa similar (prova emprestada) para comprovar a especialidade.

A utilização de prova emprestada é legítima quando não é possível a realização de perícia técnica no local de trabalho do segurado, a fim de aferir a exposição aos agentes nocivos e comprovar a especialidade do labor (Súmula 106 do TRF4).

Nos autos, consta Laudo Pericial Judicial (evento 1, PROCADM11, fls. 31) feito em empresa similar, para mesma função do Autor, sendo constatado que:

Considerando que a atividade desenvolvida na indústria calçadista é inerente ao contato com colas e solventes, contendo hidrocarbonetos aromáticos, e admitindo-se a prova por similaridade devido à inatividade da empresa, resta comprovada a exposição a agente nocivo de análise qualitativa.

Portanto, dou provimento ao Recurso do autor no ponto e reconheço a especialidade do período.

3. Período: 03/05/2004 a 09/11/2017 (Paquetá - Modelista).

A sentença negou o período, pois os laudos apresentados pela empresa indicavam ruído abaixo de 85dB.

Consta CTPS da Autora indicando o exercício do cargo de Modelista em Indústria Calçadista (Paquetá Calçados/Disport do Brasil Ltda):

Também consta nos auto PPP da autora (evento 1, PROCADM11, fls. 03), o qual aponta que:

Analisando-se a jurisprudência desta Corte, verifico que, no processo 50002747120234047129, foi analisada, com base em Laudo Pericial Judicial, a função por ele exercida no período ora analisado (MODELISTA). Na ocasião, essas foram as conclusões adotadas no voto do relator, que confirmou a decisão de primeira instância pelos próprios fundamentos, seguindo à unanimidade:

EmpresaPAQUETA CALCADOS LTDA - EM RECUPERACAO JUDICIAL

Períodos: 09/03/2009 a 17/02/2010

Função e setor:    Modelista III - modelagem marcas

Provas:

CTPS: Evento 1, CTPS6, Página 7

Formulário: PPP -  Evento 12, PPP1 - com indicação de responsável técnico

laudo pericial judicial realizado na mesma empresa - evento 22, LAUDO15

Conclusão:

 PPP regularmente emitido, exposição a ruído de 55 a 75,7 dB(A), o que está abaixo do limite de 85 dB vigente no período.

Porém, o laudo pericial judicial similar realizado na emsma empresa e paraq a mesma atividade indica exposição a hidrocarbonetos aromáticos, inclusive benzeno, o que autoriza o enquadramento pelo cód. 1.0.19, do Anexo IV, Dec. 3.048/99De ressaltar que a avaliação da nocividade dos hidrocarbonetos aromáticos é qualitativa, já que constam do Anexo 13 da NR-15 do MTE.

Diante do exposto, caracterizada  a especialidade do labor.

No referido Laudo, apontou-se que:

Penso que idênticas conclusões são aplicáveis a este feito, de forma que reputo comprovada a exposição do autor, de forma habitual e permanente, hidrocarbonetos.

Com efeito, é cediço que, se a função e o ambiente laboral são os mesmos, e as medições técnicas variam de tempo em tempo, exsurge verdadeiro quadro de incerteza científica, o qual, incidindo o princípio da precaução e do in dubio pro segurado, recomenda interpretação mais favorável ao requerente. Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. RUÍDO. PROVA TÉCNICA. DIVERGÊNCIA. IN DUBIO PRO SEGURADO. PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO. ESPECIALIDADE RECONHECIDA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. 1. Considerando-se a exposição a agente prejudicial à saúde, e havendo divergência entre a prova técnica, deve-se adotar a conclusão mais protetiva ao segurado, independente do agente nocivo em tela, vide o princípio da precaução e a necessidade de acautelar o direito à saúde do profissional. 2. Mesmo eventualmente sendo o laudo pericial ou documento técnico utilizado posterior, descabe presumir que, na data da prestação dos serviços, havia maior proteção, antes pelo contrário, a agressão dos agentes era igual ou maior, visto que, naquela assentada, havia maior escassez de recursos materiais e tecnológicos para atenuar sua nocividade. 3. No presente caso, considerando os documentos técnicos e os parâmetros telados, exsurge exposição a agente físico ruído acima do limite de tolerância. 4. Apelação parcialmente provida. (TRF4, AC 5002405-37.2018.4.04.7212, 11ª Turma, Relator para Acórdão VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, julgado em 11/06/2025)

Com isso, deve-se reconhecer a especialidade do período 03/05/2004 a 09/11/2017.

Portanto, dou provimento ao recurso do Autor no ponto, para reconhecer a especialidade do período.

Recurso do INSS

O INSS contesta o reconhecimento da atividade especial em período posterior a 05/03/1997, alegando que os PPPs não registram exposição habitual e permanente a fatores de risco acima dos limites de tolerância. A autarquia defende que o reconhecimento pela exposição ao ruído deve seguir os limites temporais (90 dB de 06/03/1997 a 18/11/2003; 85 dB a partir de 19/11/2003). O INSS também rejeita a possibilidade de afastar os registros do PPP com base em laudo similar ou extemporâneo.

 Conforme a análise detalhada do Recurso do Autor, os períodos posteriores a 05/03/1997 na indústria calçadista (Calçados Racket e Paquetá Calçados S.A.) são reconhecidos como especiais pela exposição a agentes químicos (Hidrocarbonetos Aromáticos/Solventes), que são considerados agentes cancerígenos. Para agentes cancerígenos, o entendimento consolidado é que a análise é qualitativa, dispensando a avaliação quantitativa (como a medição do ruído) e tornando irrelevante a alegação de eficácia do EPI.

Já em relação ao ruído, tem-se que os PPPs juntados pelo autor evidenciaram a exposição acima dos limites de tolerância previstos na legislação vigente na época.

Portanto, pelos fundamentos expostos na sentença, nego provimento ao recurso do INSS e mantenho o reconhecimento da especialidade.

Da soma do tempo para obtenção do benefício.

A implementação dos requisitos para a concessão/revisão da aposentadoria por tempo de contribuição/especial deverá ser verificada pelo juízo de origem através da liquidação do julgado. Em caso de implantação do benefício, deverá ser observada a hipótese de cálculo que for mais vantajosa ao autor, dentre as que resultarem possíveis.

Na hipótese de concessão de aposentadoria especial / revisão de espécie para fins de concessão de aposentadoria especial, deverá ser observada a tese jurídica fixada pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 709.

Benefícios inacumuláveis.

Fica desde logo autorizado o desconto integral, sobre as parcelas vencidas, dos valores eventualmente recebidos, a contar da DIB, a título de benefício inacumulável, nos termos do art. 124 da Lei nº 8.213/1991 e à luz da vedação ao enriquecimento sem causa.

Reafirmação da DER

A matéria não comporta maiores digressões, visto que o STJ, em sede recurso repetitivo (Tema 995/STJ), fixou a seguinte tese:

É possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em queimplementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê nointerstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instânciasordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir.

No tocante aos efeitos financeiros:

a) reafirmação da DER durante o processo administrativo: efeitos financeiros  a partir da implementação dos requisitos e os juros de mora a partir da citação;

b) implementação dos requisitos entre o final do processo administrativo e o ajuizamento da ação: efeitos financeiros e juros de mora a partir da citação;

c) implementados os requisitos após o ajuizamento da ação: efeitos financeiros a partir da implementação dos requisitos; juros de mora apenas se o INSS não implantar o benefício no prazo de 45 dias da intimação da respectiva decisão, contados a partir desse termo final.

Assim, viável a reafirmação da DER por ocasião da liquidação do julgado, cumprindo à parte autora, em sede de cumprimento de sentença, indicar a data para a qual pretende ver reafirmada a DER de seu benefício de aposentadoria, acompanhada de planilha de contagem de tempo de serviço/contribuição e comprovação da existência de contribuições vertidas após a DER, observada a data desta Sessão de Julgamento como limite para fins de reafirmação.

Registro que somente os recolhimentos sem pendências administrativas podem ser considerados para tal finalidade.

III - Consectários, Honorários e Prequestionamento

Consectários Legais Os consectários legais devem ser fixados, quanto aos juros, nos termos do que definido pelo STF no julgamento do Tema 1170. No que tange à correção monetária, até 08/12/2021, deve ser aplicado o INPC (Lei 11.430/06). A partir de 09/12/2021, incidirá a taxa SELIC, para todos os fins (correção, juros e compensação da mora), conforme o art. 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021.

Honorários Advocatícios Recursais 

Tendo em vista a modificação da sucumbência, devem ser redistribuídos os honorários, que ficarão a cargo exclusivo da parte ré, sendo devidos sobre o valor da condenação, nos patamares mínimos previstos no art. 83, §§2º e 3º, do CPC, considerando-se, para tanto, as parcelas vencidas até a data do presente Acórdão (Sumulas 111 do STJ e 76 do TRF4), ou, em não havendo proveito econômico, sobre o valor atualizado da causa.

Prequestionamento Para fins de acesso às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as questões e os dispositivos legais invocados pelas partes, nos termos dos artigos 1.022 e 1.025 do CPC, evitando-se a oposição de embargos de declaração com propósito de prequestionamento.

Dispositivo

Voto por dar  provimento à apelação da parte autora e por negar provimento à apelação do INSS.




Documento eletrônico assinado por ANA RAQUEL PINTO DE LIMA, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005415556v11 e do código CRC e89f8147.

Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): ANA RAQUEL PINTO DE LIMAData e Hora: 29/10/2025, às 14:46:04

 


 

5023001-63.2018.4.04.7108
40005415556 .V11


Conferência de autenticidade emitida em 05/11/2025 04:10:03.



Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5023001-63.2018.4.04.7108/RS

RELATORA Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA

EMENTA

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. INDÚSTRIA CALÇADISTA. AGENTES QUÍMICOS. LAUDO SIMILAR. REAFIRMAÇÃO DA DER. PROVIMENTO DA APELAÇÃO DA PARTE AUTORA. DESPROVIMENTO DA APELAÇÃO DO INSS.

I. CASO EM EXAME:

1. Apelações interpostas pela parte autora e pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos de reconhecimento de tempo de trabalho em condições especiais e concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO:

2. Há três questões em discussão: (i) o cerceamento de defesa pela negativa de produção de prova pericial; (ii) o reconhecimento da especialidade de períodos laborados na indústria calçadista, especialmente após 05/03/1997, por exposição a ruído e agentes químicos (hidrocarbonetos aromáticos/solventes), e a possibilidade de utilização de laudo similar; (iii) a reafirmação da DER, consectários legais e honorários advocatícios.

III. RAZÕES DE DECIDIR:

3. A preliminar de cerceamento de defesa foi afastada, pois a base probatória dos autos, incluindo formulários e laudos, é suficiente para aferir a especialidade do trabalho, não havendo necessidade de produção de prova pericial adicional.4. Foi dado provimento à apelação da parte autora para reconhecer a especialidade do período de 06/03/1997 a 11/02/1998. A função de Cortador em indústria calçadista implica exposição notória e habitual a agentes químicos (hidrocarbonetos aromáticos/solventes), cuja avaliação é qualitativa e dispensa a análise quantitativa de ruído, conforme a jurisprudência.5. O recurso do autor foi provido para reconhecer a especialidade dos períodos de 12/02/1998 a 28/02/2002 e 01/03/2002 a 18/11/2003. A inatividade da empresa Calçados Racket Ltda. permite o uso de laudo pericial elaborado em empresa similar (prova emprestada), conforme Súmula 106 do TRF4. A atividade na indústria calçadista envolve contato com colas e solventes contendo hidrocarbonetos aromáticos, agentes nocivos de análise qualitativa.6. O recurso do autor foi provido para reconhecer a especialidade do período de 03/05/2004 a 09/11/2017. Embora os laudos da empresa indicassem ruído abaixo do limite, um laudo pericial judicial similar para a função de Modelista na mesma empresa apontou exposição a hidrocarbonetos aromáticos, incluindo benzeno. A avaliação desses agentes é qualitativa, e em caso de divergência de provas, o princípio da precaução e o in dubio pro segurado recomendam a interpretação mais favorável ao requerente.

7. Foi negado provimento ao recurso do INSS. Os períodos posteriores a 05/03/1997 na indústria calçadista foram reconhecidos como especiais devido à exposição a agentes químicos (hidrocarbonetos aromáticos/solventes), que são cancerígenos e exigem análise qualitativa, tornando irrelevante a eficácia do EPI. Adicionalmente, os PPPs comprovaram a exposição a ruído acima dos limites de tolerância da legislação vigente.8. A reafirmação da DER é viável por ocasião da liquidação do julgado, conforme a tese firmada pelo STJ no Tema 995/STJ, que permite a reafirmação para o momento de implementação dos requisitos do benefício, mesmo após o ajuizamento da ação, com efeitos financeiros específicos para cada situação.9. Os consectários legais foram fixados com juros conforme o Tema 1170 do STF, e correção monetária pelo INPC até 08/12/2021, e pela taxa SELIC a partir de 09/12/2021, nos termos do art. 3º da EC nº 113/2021.10. Os honorários advocatícios recursais foram redistribuídos, ficando a cargo exclusivo da parte ré, devidos sobre o valor da condenação (parcelas vencidas até o acórdão) ou sobre o valor atualizado da causa, conforme o art. 83, §§ 2º e 3º, do CPC, Súmulas 111 do STJ e 76 do TRF4.

IV. DISPOSITIVO E TESE:

11. Apelação da parte autora provida. Apelação do INSS desprovida.Tese de julgamento: 12. A especialidade do trabalho em indústria calçadista, especialmente em funções como Cortador e Modelista, pode ser reconhecida pela exposição a agentes químicos (hidrocarbonetos aromáticos/solventes), cuja avaliação é qualitativa e dispensa análise quantitativa de ruído, sendo admissível o uso de laudo similar em caso de inatividade da empresa.

___________

Dispositivos relevantes citados: NCPC, art. 487, inc. I; Lei nº 9.289/1996, art. 4º, inc. I e II; CPC, art. 83, §§ 2º e 3º, art. 85, §§ 2º e 3º, inc. I, art. 493, art. 933, art. 1.022, art. 1.025; LINDB, art. 6º; Decreto nº 53.831/1964; Decreto nº 83.080/1979; Decreto nº 2.172/1997; Decreto nº 3.048/1999; Decreto nº 4.882/2003; Portaria Interministerial nº 9/2014; NR-15, Anexo 13; Lei nº 8.213/1991, art. 58, § 2º, art. 124; Medida Provisória nº 1.729/1998; Lei nº 9.732/1998; EC nº 113/2021, art. 3º.

Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp nº 1.398.260/PR (Tema 694); STJ, REsp nº 1.886.795/RS (Tema 1083); STF, ARE 664.335/SC; STF, RE 631.240/MG, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 03.09.2014; STJ, Tema 995; STJ, Súmula 111; TRF4, Súmula 106; TRF4, Súmula 76; STF, Tema 1170; TRF4, AC 5001035-06.2020.4.04.7001, 10ª Turma, Rel. Luiz Fernando Wowk Penteado, j. 12.08.2025; TRF4, AC 5071483-41.2019.4.04.7000, 10ª Turma, Rel. Claudia Cristina Cristofani, j. 05.08.2025; TRF4, AC 5022285-31.2021.4.04.7108, 5ª Turma, Rel. Hermes Siedler da Conceição Júnior, j. 17.12.2024; TRF4, AC 5005120-30.2019.4.04.7111, 11ª Turma, Rel. Marcos Roberto Araujo dos Santos, j. 18.04.2023; TRF4, AC 5009530-03.2019.4.04.9999, 11ª Turma, Rel. Ana Cristina Ferro Blasi, j. 18.10.2023; TRF4, AC 2006.71.99.000709-7, Rel. Des. Fed. Celso Kipper, DJU 02.03.2007; TRF4, APELREEX 2008.71.08.001075-4, Rel. Juiz Fed. Guilherme Pinho Machado, D.E. 03.08.2009; TRF4, AC 5002405-37.2018.4.04.7212, 11ª Turma, Rel. Victor Luiz dos Santos Laus, j. 11.06.2025.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Central Digital de Auxílio 1 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora e por negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 27 de outubro de 2025.




Documento eletrônico assinado por ANA RAQUEL PINTO DE LIMA, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005415557v4 e do código CRC d360548d.

Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): ANA RAQUEL PINTO DE LIMAData e Hora: 29/10/2025, às 14:46:03

 


 

5023001-63.2018.4.04.7108
40005415557 .V4


Conferência de autenticidade emitida em 05/11/2025 04:10:03.



Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 20/10/2025 A 27/10/2025

Apelação Cível Nº 5023001-63.2018.4.04.7108/RS

RELATORA Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA

PRESIDENTE Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 20/10/2025, às 00:00, a 27/10/2025, às 16:00, na sequência 7, disponibilizada no DE de 09/10/2025.

Certifico que a Central Digital de Auxílio 1, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A CENTRAL DIGITAL DE AUXÍLIO 1 DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E POR NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.

RELATORA DO ACÓRDÃO Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA

Votante Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA

Votante Juíza Federal ALINE LAZZARON

Votante Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS

MÁRCIA CRISTINA ABBUD

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 05/11/2025 04:10:03.



Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

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