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DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A AGENTES BIOLÓGICOS E QUÍMICOS. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO....

Data da publicação: 12/11/2025, 07:08:59

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A AGENTES BIOLÓGICOS E QUÍMICOS. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME:1. Apelação cível interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) contra sentença que reconheceu a especialidade de períodos de trabalho e concedeu aposentadoria por tempo de contribuição, determinando a averbação do tempo especial convertido em comum e a implantação do benefício mais vantajoso a partir da DER (29/10/2021). II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO:2. Há duas questões em discussão: (i) a possibilidade de afastamento do reconhecimento da especialidade dos períodos de 01/06/2006 a 17/03/2008 e 09/01/2012 a 13/11/2019; (ii) a possibilidade de afastamento da concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição. III. RAZÕES DE DECIDIR:3. A especialidade do tempo de serviço é reconhecida conforme a legislação vigente à época da atividade, integrando o direito adquirido do trabalhador, sendo possível a conversão de tempo especial em comum mesmo após 1998, conforme o REsp Repetitivo nº 1.151.363 do STJ.4. Para o período de 01/06/2006 a 17/03/2008, a atividade de trabalhador da pecuária polivalente foi comprovada por PPP e laudo similar, indicando exposição a agentes biológicos (Butox, dectomax, bactérias, fungos, parasitas e protozoários), o que autoriza o reconhecimento da especialidade com base nos Decretos 53.831/1964 (código 1.3.1) e 2.172/1997 (código 3.0.1).5. Para o período de 09/01/2012 a 13/11/2019, a atividade de trabalhador agropecuário em geral foi comprovada por PPP e laudo similar, indicando exposição a hidrocarbonetos (álcalis cáusticos, gasolina, diesel, óleos, graxas e lubrificantes) e agentes biológicos (bactérias, parasitas, fungos, vírus e microrganismos no trato com animais e suas fezes), o que autoriza o reconhecimento da especialidade com base nos Decretos 53.831/1964 (código 1.3.1) e 2.172/1997 (código 3.0.1).6. A exposição a agentes biológicos não exige que a atividade esteja arrolada nos decretos, sendo o rol meramente exemplificativo, e o risco de contágio é habitual e inerente às atividades desempenhadas na pecuária, bastando um único contato com o agente infeccioso, conforme Temas 205 e 211 da TNU e jurisprudência da TRU4.7. A utilização de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) não afasta o reconhecimento da especialidade para agentes biológicos, pois não há constatação de eficácia na atenuação do agente nocivo, conforme o Manual da Aposentadoria Especial do INSS (2017, item 3.1.5).8. A exposição a hidrocarbonetos aromáticos, por serem substâncias reconhecidamente cancerígenas, dispensa a análise quantitativa e o uso de EPIs não elide a nocividade, conforme o IRDR15/TRF4 e o Tema 1090/STJ.9. Em situações de incerteza científica sobre os efeitos nocivos do ambiente de trabalho, o princípio da precaução impõe a adoção da solução mais protetiva à saúde do trabalhador.10. Mantido o reconhecimento da especialidade dos períodos, é mantido o direito à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição a partir da DER (29/10/2021).11. Os consectários da condenação (correção e juros) e a distribuição dos ônus sucumbenciais são mantidos conforme a sentença, que está em consonância com os parâmetros da Turma. A verba honorária devida pela Autarquia ao patrono da parte autora é majorada em 50% sobre o percentual mínimo da primeira faixa, nos termos do art. 85, § 11, do CPC. IV. DISPOSITIVO E TESE:12. Recurso desprovido.Tese de julgamento: 13. O reconhecimento da especialidade do tempo de serviço em atividades rurais de pecuária, com exposição a agentes biológicos e hidrocarbonetos aromáticos, é cabível, sendo o risco de contágio habitual e inerente à atividade, e a eficácia dos EPIs inócua para afastar a nocividade de agentes biológicos e cancerígenos. ___________Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 14; CPC, art. 85, § 11; CPC, art. 497; CPC, art. 1.046; Lei nº 3.807/1960; Lei nº 5.527/1968; Lei nº 8.212/1991, art. 22, inc. II, art. 30, inc. I, alíneas a e b; Lei nº 8.213/1991, arts. 57, 58, 124; Lei nº 9.032/1995; Lei nº 9.289/1996, art. 4º, I; Lei nº 9.528/1997; Lei nº 9.711/1998; Lei nº 9.732; EC nº 20/1998, art. 15; EC nº 113/2021, art. 3º; Decreto nº 53.831/1964; Decreto nº 72.771/1973; Decreto nº 83.080/1979; Decreto nº 2.172/1997; Decreto nº 3.048/1999; Decreto nº 4.882/2003; IN INSS 77/2015, arts. 246, 269, 279, § 6º; NR-06 do MTE; NR-15. Jurisprudência relevante citada: STF, RE 870.947/SE; STF, ARE 664335 (Tema 555), Rel. Min. Luiz Fux, j. 04.12.2014; STJ, AgRg no REsp 941885/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 04.08.2008; STJ, REsp 639066/RJ, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 07.11.2005; STJ, REsp Repetitivo nº 1.151.363, Rel. Min. Jorge Mussi; STJ, Tema 905; STJ, Tema 995; STJ, Tema 1090, j. 09.04.2025; TRF4, 5030475-79.2017.4.04.9999, Rel. Luciane Merlin Clève Kravetz, j. 26.10.2017; TRF4, 5040060-53.2015.4.04.0000, Rel. Amaury Chaves de Athayde, j. 24.08.2017; TRF4, AC 5004512-07.2011.4.04.7113, Rel. Taís Schilling Ferraz, j. 12.09.2017; TRF4, AGRESP 228832/SC, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 30.06.2003; TRF4, Recurso 5016061-95.2012.404.7107, Rel. João Batista Lazzari, j. 02.04.2013; TRF4, APELREEX 2008.70.01.006885-6, Rel. Ricardo Teixeira do Valle Pereira; TRF4, EINF 2005.72.10.000389-1, Rel. João Batista Pinto Silveira; TRF4, EINF 2004.71.00.028482-6/RS, Rel. Luís Alberto DAzevedo Aurvalle, j. 08.01.2010; TRF4, EIAC 2000.04.01.088061-6/RS, Rel. Fernando Quadros da Silva, j. 03.03.2004; TRF4, AC 2006.71.99.000709-7, Rel. Celso Kipper, j. 02.03.2007; TRF4, APELREEX 2008.71.08.001075-4, Rel. Guilherme Pinho Machado, j. 03.08.2009; TRF4, Súmula 106; TRF4, IRDR15/TRF4 (processo 5054341-77.2016.4.04.0000/SC); TRF4, Reclamação nº 5041695-54.2024.4.04.0000/RS, Rel. Paulo Afonso Brum Vaz; TNU, Tema 205 (PEDILEF 0500012-70.2015.4.04.8013/AL, j. 16.03.2020); TNU, Tema 211 (PEDILEF 0501219-30.2017.4.05.8500/SE, j. 17.12.2019); TRU4, AGRAVO - JEF Nº 5007338-13.2014.4.04.7206/SC, Rel. Flavia da Silva Xavier, j. 28.09.2018; TRU4, Incidente de Uniformização 5000582-56.2012.404.7109, Rel. João Batista Brito Ozório, j. 23.10.2012; TRU4, IUJEF 0004501-62.2010.404.7254, Rel. Ana Beatriz Vieira da Luz Palumbo, j. 16.03.2012; TRU4, IUJEF 5001394-71.2012.404.7118, Rel. Leonardo Castanho Mendes, j. 25.08.2015; JR/CRPS, Enunciado nº 15. * Documento gerado com auxílio de inteligência artificial, nos termos da Resolução n.º 615/2025 do Conselho Nacional de Justiça. (TRF 4ª Região, 6ª Turma, 5000330-61.2024.4.04.7132, Rel. FRANCISCO DONIZETE GOMES, julgado em 30/10/2025, DJEN DATA: 05/11/2025)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000330-61.2024.4.04.7132/RS

RELATOR Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

RELATÓRIO

O Instituto Nacional do Seguro Social - INSS interpôs recurso de apelação contra sentença que julgou o pedido formulado na inicial nos seguintes termos:

3. DISPOSITIVO:

Em face do exposto, JULGO PROCEDENTE EM PARTE o pedido para DECLARAR a ESPECIALIDADE do tempo de serviço laborado entre 01/06/2006 e 17/03/2008 e 09/01/2012 e 13/11/2019 DETERMINAR a sua averbação como pelo INSS como tempo especial convertido em tempo comum;

As partes são isentas de custas (art. 4, I, da Lei 9.289/96).

Em face da sucumbência recíproca, fixo os honorários em 10%, tendo por base de cálculo o valor das parcelas vencidas até a data da sentença, que representa a parcela do pedido acolhido (Súmulas 111 do STJ e 76 do TRF4), devendo cada parte arcar com metade do valor, observada eventual AJG.

Interposto recurso voluntário, intime-se a contraparte para apresentar contrarrazões no prazo legal e, após, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal.

Sem reexame necessário, em atenção à orientação do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (v.g., TRF4 5030475-79.2017.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relatora LUCIANE MERLIN CLÈVE KRAVETZ, juntado aos autos em 26/10/2017).

Transitada em julgado, reautue-se como Cumprimento de Sentença Contra a Fazenda Pública (arts. 534/535 do CPC).

Intime-se o INSS (CEAB) para comprovar o cumprimento do julgado, nos termos da súmula, no prazo normativo.

No silêncio, arquivem-se os autos.

Publicado e registrado eletronicamente. Intimem-se.


A continuidade da sentença se deu pelo julgamento dos embargos declaratórios opostos pela parte autora, que agregaram fundamentos à decisão com o seguinte teor:

(...)

Em relação aos períodos que o INSS reconheceu administrativamente e não foram computados no cálculo do tempo de contribuição apresentado na sentença, assiste arazão a parte autora, devendo ser sanada a omissão na sentença.

(...)

DISPOSITIVO

Em face do exposto, julgo PROCEDENTE EM PARTE o pedido para:

a) DECLARAR a ESPECIALIDADE do tempo de serviço laborado entre 01/06/2006 e 17/03/2008 e 09/01/2012 e 13/11/2019 DETERMINAR a sua averbação como pelo INSS como tempo especial convertido em tempo comum;

b) DETERMINAR a implantação da APOSENTADORIA MAIS VANTAJOSA, a partir da DER em 29/10/2021, com RMI a ser calculada pelo INSS;

c) CONDENAR o INSS ao pagamento das parcelas vencidas desde a DER, corrigidas nos seguintes termos:

Até 08/12/2021, a correção monetária, devida desde o vencimento das parcelas, deverá observar o INPC (Tema 905 do STJ), sendo que os juros de mora devem corresponder aos juros da poupança, a contar da citação (RE 870.947/SE, do STF).

A partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente (art. 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021).

Acaso tenha a parte autora, a partir data de início do benefício concedido/restabelecido, percebido benefício com ele inacumulável (artigo 124 da Lei 8.213/91), fica autorizado o desconto dos valores já recebidos em sede administrativa, observando-se os termos do julgamento proferido no IRDR 14 do TRF4.

Despesas com perícia técnica a serem integralmente ressarcidas pelo INSS, porquanto, deu causa ao ajuizamento da ação.

As partes são isentas de custas (art. 4, I, da Lei 9.289/96).

A sucumbência integral INSS.

Diante da sucumbência, condeno o INSS a arcar com honorários advocatícios de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa (artigo 85, §§ 2º e 3º, inciso I, do Novo Código de Processo Civil ).

Interposto recurso voluntário, intime-se a contraparte para apresentar contrarrazões no prazo legal e, após, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal.

Sem reexame necessário, em atenção à orientação do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (v.g., TRF4 5030475-79.2017.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relatora LUCIANE MERLIN CLÈVE KRAVETZ, juntado aos autos em 26/10/2017).

Transitada em julgado, reautue-se como Cumprimento de Sentença Contra a Fazenda Pública (arts. 534/535 do CPC).

Intime-se o INSS (CEAB) para comprovar o cumprimento do julgado, nos termos da súmula, no prazo normativo.

Publicado e registrado eletronicamente. Intimem-se.


O INSS recorreu buscando o afastamento do reconhecimento da especialidade de 01/06/2006 e 17/03/2008 e 09/01/2012 e 13/11/2019, visto que não restou provada submissão permanente a agentes biológicos de modo a justificar a contagem especial de tempo de contribuição.


Com contrarrazões ao recurso, vieram os autos a este Tribunal para julgamento.


 

VOTO

Legislação Aplicável

Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973.

Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.


Recebimento do recurso

Importa referir que a apelação deve ser recebida, por ser própria, regular e tempestiva.


Delimitação da demanda

Considerando que não há remessa oficial, no caso em exame, a controvérsia fica limitada à análise dos períodos de atividade especial reconhecidos na sentença e do benefício de aposentadoria concedido.


Estando presentes os requisitos de admissibilidade do processo e não havendo vícios a serem saneados, passo ao exame do mérito da causa.


Atividades exercidas em condições especiais

O reconhecimento da especialidade obedece à disciplina legal vigente à época em que a atividade foi exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a vigência de certa legislação, o segurado adquire o direito à contagem na forma estabelecida, bem como à comprovação das condições de trabalho como então exigido, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.

Feitas estas observações e tendo em vista a sucessão de leis que trataram a matéria diversamente, é necessário definir qual deve ser aplicada ao caso concreto, ou seja, qual se encontrava em vigor no momento em que a atividade foi prestada pelo segurado, levando em consideração a seguinte evolução legislativa do tema:

Até 28 de abril de 1995, quando esteve vigente a Lei 3.807/1960 (LOPS) e suas alterações e, posteriormente, a Lei 8.213/1991 (LBPS), em sua redação original (artigos 57 e 58), era possível o reconhecimento da especialidade do trabalho mediante a comprovação do exercício de atividade prevista como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou, ainda, quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído e calor (STJ, AgRg no REsp 941885/SP, Quinta Turma, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe 4/8/2008; e STJ, REsp 639066/RJ, Quinta Turma, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ 7/11/2005), quando então se fazia indispensável a mensuração de seus níveis por meio de perícia técnica, documentada nos autos ou informada em formulário emitido pela empresa, a fim de verificar a nocividade dos agentes envolvidos;

A partir de 29 de abril de 1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção das atividades a que se refere a Lei 5.527/1968, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13/10/1996, data imediatamente anterior à publicação da Medida Provisória 1.523, de 14/10/1996, que a revogou expressamente - de modo que, para o intervalo compreendido entre 29/4/1995 (ou 14/10/1996) e 5/3/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei 9.032/1995 no artigo 57 da LBPS, torna-se necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima;

A partir de 6 de março de 1997, data da entrada em vigor do Decreto 2.172/1997, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da LBPS pela Medida Provisória 1.523/1996 (convertida na Lei 9.528/1997), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.

A respeito da possibilidade de conversão do tempo especial em comum, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial Repetitivo nº 1.151.363, do qual foi Relator o Ministro Jorge Mussi, decidiu que "permanece a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais para comum após 1998", pois a partir da última reedição da MP 1.663, parcialmente convertida na Lei 9.711/1998, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o §5º do artigo 57 da Lei 8.213/1991.

Assim, considerando que o artigo 57, §5º, da Lei 8.213/1991 não foi revogado, nem expressa, nem tacitamente, pela Lei 9.711/1998 e que, por disposição constitucional (artigo 15 da EC 20 de 15/12/1998), permanecem em vigor os artigos 57 e 58 da Lei de Benefícios até que a lei complementar a que se refere o artigo 201, §1º, da Constituição Federal, seja publicada, é possível a conversão de tempo de serviço especial em comum inclusive após 28/05/1998.

Observo, ainda, quanto ao enquadramento das categorias profissionais, que devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 2ª parte), 72.771/1973 (Quadro II do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo II) até 28/4/1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 1ª parte), 72.771/1973 (Quadro I do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo I) até 5/3/1997, e os Decretos 2.172/1997 (Anexo IV) e 3.048/1999 a partir de 6/3/1997, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto 4.882/2003. Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre é possível, também, a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30/6/2003).


Com essas observações avanço para a análise detalhada dos fatos.


CASO CONCRETO                     


Por estar em  consonância com o entendimento desta Relatoria, quanto às questões deduzidas, a sentença deve ser mantida, por seus próprios fundamentos, os quais transcrevo adotando como razões de decidir, in verbis:


Vínculo 1

JANUARIO DE AZEVEDO FERNANDES NETO

Período

01/06/2006 a 31/08/2008

Cargo

Trabalhador da pecuária polivalente

 

CTPS

Evento 1, PROCADM3, Página 12 - CBO 623110 - saída 17/03/2008

DSS/DIRBEN 8030

 

PPP

Evento 1, PROCADM3, Página 32/33 - Riscos: Butox, dectomax, bactérias, fungos, parasitas e protozoários - SEM Resp. Téc. Repres. Emp. OK

Laudo Técnico

 

Laudo Similar 

Evento 9, LAUDO1, Página 1/75

Baixa da empresa matriz

 

JA/Audiência/Declarações

 

Outros

 

CONCLUSÃO: 

Nos termos da prova documental, o segurado atuou como trabalhador rural da pecuária.

A Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região pacificou entendimento de que, no período anterior ao advento da Lei nº 8.213/91, à vista da separação de regimes previdenciários entre trabalhadores urbanos e rurais, "somente fazia jus ao reconhecimento de tempo especial o empregado que prestava exclusivamente serviços de natureza rural à empresa agroindustrial ou agrocomercial, porquanto estava vinculado a regime contributivo estrito." (TRF4 5040060-53.2015.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator AMAURY CHAVES DE ATHAYDE, juntado aos autos em 24/08/2017). Em se tratando de empregado rural de pessoa física, não há possibilidade de reconhecimento da especialidade no período anterior à unificação dos regimes, uma vez que se tratava de tempo de serviço não contributivo.

Ressalto, ainda, trechos do voto da Relatora, Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, quando do julgamento da AC 5004512-07.2011.4.04.7113, pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

"Conclusão: o conjunto probatório demonstra que o demandante foi empregado rural do Sr. Antônio Rosseti, tendo exercido atividades diversas, como manutenção de parreiral, cuidado de animais e cultivo de cereais. Não constam dos autos documentação apta a comprovar a sujeição a agentes nocivos. Registro, ainda, que é inviável o reconhecimento da especialidade por enquadramento por categoria profissional. Consigno que, antes da Constituição Federal de 1988, havia expressa distinção entre os trabalhadores urbanos e rurais para efeitos previdenciários, e não existia sequer a possibilidade de o trabalhador rural contribuir para um regime previdenciário. A exceção que se fazia era quanto ao empregado de empresa agroindustrial ou agrocomercial que, embora prestando exclusivamente serviço de natureza rural, era considerado segurado da Previdência Social Urbana (art. 6º, § 4º, CLPS/84). Todavia, analisando o caso dos autos, verifico que se trata de trabalhador ligado a empregador pessoa física e as funções exercidas não se enquadram no conceito previsto no código 2.2.1 do Anexo ao Decreto nº 53.831/64, devendo ser mantida a sentença no ponto." (TRF4 5004512-07.2011.4.04.7113, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 12/09/2017)

Assim, para a atividade rural desenvolvida pelo autor antes de 25/07/1991 (data da publicação da lei 8.213/91), já que não comprovado o exercício desta em complexos agroindustriais ou agrocomerciais, mas sim perante pessoas físicas ou pessoa jurídica sem comprovação de que se trate das hipóteses acima, não há enquadramento legal a amparar a pretensão posta na inicial de cômputo de tempo de serviço especial para aposentadoria por tempo de contribuição.

Portanto, fica afastada a especialidade dos períodos anteriores a 25/07/1991.

Após a edição da Lei 8.213/91, tendo havido a unificação dos regimes, altera-se totalmente a lógica do sistema, tendo de ser considerada a atividade, independentemente de sua natureza urbana ou rural.

Considerando que a atividade de trabalhador rural está prevista dentre aquelas que possuem enquadramento pelo simples exercício da atividade, com base no item 2.2.1 (trabalhadores na agropecuária) do Decreto 53.831/64, é possível o enquadramento ficto por categoria profissional até 28/04/1995.

Consoante o entendimento firmado pela TRU4, é possível o enquadramento de atividade laborativa como especial, exercida até a vigência da Lei 9.032/95, pela categoria profissional de "trabalhadores na agropecuária", prevista no código 2.2.1 do quadro anexo ao Decreto 53.831/64, ainda que não haja o trabalho na agricultura e na pecuária simultaneamente, mas apenas uma dessas atividades. AGRAVO - JEF Nº 5007338-13.2014.4.04.7206/SC. Relatora Flavia da Silva Xavier. Decisão em 28/09/2018. TRU4ª Região.

Neste sentido, inclusive, o enunciado nº 15 da JR/CRPS:

Para os efeitos de reconhecimento de tempo especial, o enquadramento do tempo de atividade do trabalhador rural, segurado empregado, sob o código 2.2.1 do Quadro anexo ao Decreto nº 53.831/64, é possível quando o regime de vinculação for o da Previdência Social Urbana, e não o da Previdência Rural (PRORURAL), para os períodos anteriores à unificação de ambos os regimes pela Lei nº 8.213/91, e aplica-se ao tempo de atividade rural exercido até 28/04/95, independentemente de ter sido prestado exclusivamente na lavoura ou na pecuária.

I - Até a edição da Lei nº 8.213, de 24/07/91, é possível o enquadramento como especial do labor prestado na agricultura (cód 2.2.1 do Decreto nº 53.831/64) desde que o trabalhador estivesse vinculado ao setor rural da agroindústria e a respectiva empresa necessariamente inscrita no extinto Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários - IAPI.

II - Após a Lei nº 8.213/91 e até a Lei 9.032/95, admite-se o reconhecimento como especial o trabalho exercido pelo empregado rural na agropecuária, agricultura ou pecuária.

Não se desconhece o entendimento firmado pelo STJ no PUIL 452, todavia, refere-se aos trabalhadores em lavoura de cana-de-açucar, não se aplicando ao caso dos autos.

Não é razoável reconhecer a especialidade somente se desenvolvida a atividade agrícola e pecuária de forma simultânea e desconsiderar quando desenvolvida apenas uma delas ou então com predominância sobre a outra, porquanto, desenvolvida a mesma atividade (agricultura ou pecuária).

Outrossim, é pacífico na jurisprudência do STJ o entendimento de que as atividades profissionais descritas naquela relação são apenas exemplificativas e a experiência de inúmeros processos que tramitam por esta Vara Federal revela que a atividade de "serviços gerais de lavoura" ou "serviços gerais de pecuária" é atividade manifestamente penosa, que exigem do trabalhador o desempenho de atividade física intensa durante toda a jornada de trabalho, com exposição a inúmeros agentes manifestamente nocivos.

Além disso, deve-se atentar ao fato de que a anotação da CTPS segue a prática trabalhista local e da época da prestação laboral. Assim, é comum que a mesma atividade desenvolvida em uma época tenha a nomenclatura anotada de forma diferente em contratos de trabalho superveniente, inclusive, para o mesmo empregador. É comum, em vínculos mais antigos, a anotação apenas da atividade de "serviços gerais rural", "trabalhador rural", "trabalhador de lavoura de arroz" enquanto nos períodos nos mais atuais a anotação da função de "trabalhador agropecuário polivalente", tratando-se sempre da mesma atividade rural desenvolvida em lavoura de arroz ou estabelecimento de pecuária.

Portanto, o período deve ser considerado como tempo de serviço especial, seja pelo enquadramento no código 2.2.1, seja pelo exercício de atividade manifestamente penosa.

Já em relação ao período posterior a 28/04/1995, como referido anteriormente, o que determina a contagem do tempo como especial é o fato de o trabalhador ter exercido qualquer atividade profissional, independentemente da categoria, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, pela efetiva exposição (exposição real) a algum agente físico, químico ou biológico, ou combinação destes, constantes de relação definida pelo Poder Executivo.

Neste ponto, o laudo similar anexado aos autos no evento 9 corrobora a especialidade para as atividades descritas no PPP anexado no processo administrativo, considerando o seguinte:

(...)

Anexo XIV - Agentes Biológicos - Trabalhos e operações em contato permanente com pacientes, animais ou com material infecto-contagiante, em estábulos e cavalariças. Ao manter contato com fezes, urina e demais secreções dos animais.

A especialidade emerge do risco constante de contaminação por agentes biológicos, indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço.

No caso dos autos, em sua atividade de manejo de bovinos, o segurado mantinha contato habitual com fezes, urina, secreções, sangue, além de outros, potencialmente transmissores de agentes nocivos biológicos.

Ao contrário do que costumeiramente alega o réu, a exposição a agentes nocivos biológicos no exercício das atividades, sejam elas qual forem, autoriza o reconhecimento da especialidade, não estando restrito tal reconhecimento aos segurados que trabalhem apenas em área de isolamento hospitalar.

Neste sentido, o julgamento do Tema 205 pela TNU (PEDILEF 0500012-70.2015.4.04.8013/AL, 16/03/2020):

a) para reconhecimento da natureza especial de tempo laborado em exposição a agentes biológicos não é necessário o desenvolvimento de uma das atividades arroladas nos Decretos de regência, sendo referido rol meramente exemplificativo;

b) entretanto, é necessária a comprovação em concreto do risco de exposição a microorganismos ou parasitas infectocontagiosos, ou ainda suas toxinas, em medida denotativa de que o risco de contaminação em seu ambiente de trabalho era superior ao risco em geral, devendo, ainda, ser avaliado, de acordo com a profissiografia, se tal exposição tem um caráter indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, independentemente de tempo mínimo de exposição durante a jornada (Tema 211/TNU).

Ainda que a efetiva exposição a agentes biológicos pudesse não ocorrer durante todas as horas da jornada de trabalho (permanência), o fato é que o risco de contágio é habitual e inerente às atividades desempenhadas - para o qual basta um único contato com o agente infeccioso - e, consequentemente, há o risco permanente de prejuízo à saúde do trabalhador, o que por certo caracteriza a especialidade do labor, não podendo ser exigido tempo mínimo de exposição.

Neste sentido, o julgamento do Tema 211 pela TNU (PEDILEF 0501219-30.2017.4.05.8500/SE, publicado em 17/12/2019):

Para aplicação do artigo 57, §3.º, da Lei n.º 8.213/91 a agentes biológicos, exige-se a probabilidade da exposição ocupacional, avaliando-se, de acordo com a profissiografia, o seu caráter indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, independente de tempo mínimo de exposição durante a jornada.

Observe-se que a exposição ao risco de contaminação deve ser habitual (durante todos os dias) e indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, ou seja, inerente ao exercício da atividade.

A especialidade por agentes biológicos decorre de seu risco potencial, sendo desnecessária a exposição do empregado de modo permanente (durante toda a jornada de trabalho) (TRU da 4ª Região, Incidente de Uniformização 5000582-56.2012.404.7109, Relator Juiz Federal João Batista Brito Ozório, Publicado no D.E. em 23.10.2012). 

Conforme bem explanado por Marina Vasques Duarte (in Direito Previdenciário, Verbo Jurídico, 2004, 3.ª ed. p. 167), "a especialidade do trabalho com exposição a agentes patológicos não existe em virtude do desgaste que o agente nocivo provocaria à integridade do profissional, mas, sim, em virtude do risco dessa exposição. O que se sugere seja verificado na hipótese é a permanência do risco, não da exposição em si, mesmo porque o fundamento da aposentadoria especial e do reconhecimento da especialidade do labor é a possibilidade de prejuízo à saúde do trabalhador e não o prejuízo em si".

Com efeito, não se deve entender por permanência a exposição do trabalhador aos agentes biológicos durante toda a sua jornada de trabalho, bastando a existência do risco de forma habitual e indissociável do exercício de suas funções, como entende a TRU:

1. O entendimento desta Turma, com relação à configuração da atividade especial, por contato com agente biológico é no sentido de que "para o enquadramento do tempo de serviço como especial após o início da vigência da Lei nº 9032/95, não é necessário que a exposição a agentes biológicos ocorra durante a integralidade da jornada de trabalho do segurado, bastando, nesse caso, que haja efetivo e constante risco de contaminação e de prejuízo à saúde do trabalhador, satisfazendo, assim, os conceitos de habitualidade e permanência, analisados à luz das particularidades do labor desempenhado" (IUJEF 0004501-62.2010.404.7254, Relatora p/ Acórdão Ana Beatriz Vieira da Luz Palumbo, D.E. 16/03/2012).

2. Incidente da parte autora conhecido e provido. (IUJEF 5001394-71.2012.404.7118, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relator Leonardo Castanho Mendes, juntado aos autos em 25/08/2015)".

Quanto à utilização de EPIs, estes não afastam o reconhecimento da especialidade em face da submissão a agentes biológicos, conquanto não ser possível a constatação da eficácia deste na atenuação do agente nocivo, consoante já reconhecido no item 3.1.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017:

"3.1.5 Tecnologia de Proteção

Observar se consta nas demonstrações ambientais informação sobre EPC, a partir de 14.10.1996 e sobre EPI a partir de 3.12.1998 para cumprimento de exigência legal previdenciária.

No entanto, como não há constatação de eficácia de EPI na atenuação desse agente, deve-se reconhecer o período como especial mesmo que conste tal informação, se cumpridas as demais exigências."

Assim, verifica-se que a parte autora, em decorrência de sua atividade laboral, estava exposta a elevado risco de contaminação biológica nociva à saúde, o que autoriza o reconhecimento da especialidade do período de 01/06/2006 a 17/03/2008, com base no código 1.3.1 do Decreto 53.831/64 e 3.0.1 do Decreto 2.172/97.

 

 

Vínculo 2

IVANE FINGER MESSINA

CNAE 0151-2/01 Criação de bovinos para corte

Período

09/01/2012 a 30/11/2024

Cargo

Trabalhador agropecuário em geral

 

CTPS

Evento 1, PROCADM3, Página 13 - sem data de saída - CBO 6210-05

DSS/DIRBEN 8030

 

PPP

Evento 1, PROCADM3, Página 30/31 - emitido em 10/04/2021 - Riscos: Hidrocarbonetos (álcalis cáusticos, gasolina, diesel, óleos, graxas e lubrificantes; Bactérias, parasitas, fungos, vírus e microorganismos no trato com animais e suas fezes - Resp. Téc. e Repres. OK

Laudo Técnico

 

Laudo Similar 

Evento 9, LAUDO1, Página 1/75

Baixa da empresa matriz

 

JA/Audiência/Declarações

 

Outros

 

CONCLUSÃO: 

Nos termos da prova documental, o segurado atuou como trabalhador rural da pecuária.

A Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região pacificou entendimento de que, no período anterior ao advento da Lei nº 8.213/91, à vista da separação de regimes previdenciários entre trabalhadores urbanos e rurais, "somente fazia jus ao reconhecimento de tempo especial o empregado que prestava exclusivamente serviços de natureza rural à empresa agroindustrial ou agrocomercial, porquanto estava vinculado a regime contributivo estrito." (TRF4 5040060-53.2015.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator AMAURY CHAVES DE ATHAYDE, juntado aos autos em 24/08/2017). Em se tratando de empregado rural de pessoa física, não há possibilidade de reconhecimento da especialidade no período anterior à unificação dos regimes, uma vez que se tratava de tempo de serviço não contributivo.

Ressalto, ainda, trechos do voto da Relatora, Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, quando do julgamento da AC 5004512-07.2011.4.04.7113, pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

"Conclusão: o conjunto probatório demonstra que o demandante foi empregado rural do Sr. Antônio Rosseti, tendo exercido atividades diversas, como manutenção de parreiral, cuidado de animais e cultivo de cereais. Não constam dos autos documentação apta a comprovar a sujeição a agentes nocivos. Registro, ainda, que é inviável o reconhecimento da especialidade por enquadramento por categoria profissional. Consigno que, antes da Constituição Federal de 1988, havia expressa distinção entre os trabalhadores urbanos e rurais para efeitos previdenciários, e não existia sequer a possibilidade de o trabalhador rural contribuir para um regime previdenciário. A exceção que se fazia era quanto ao empregado de empresa agroindustrial ou agrocomercial que, embora prestando exclusivamente serviço de natureza rural, era considerado segurado da Previdência Social Urbana (art. 6º, § 4º, CLPS/84). Todavia, analisando o caso dos autos, verifico que se trata de trabalhador ligado a empregador pessoa física e as funções exercidas não se enquadram no conceito previsto no código 2.2.1 do Anexo ao Decreto nº 53.831/64, devendo ser mantida a sentença no ponto." (TRF4 5004512-07.2011.4.04.7113, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 12/09/2017)

Assim, para a atividade rural desenvolvida pelo autor antes de 25/07/1991 (data da publicação da lei 8.213/91), já que não comprovado o exercício desta em complexos agroindustriais ou agrocomerciais, mas sim perante pessoas físicas ou pessoa jurídica sem comprovação de que se trate das hipóteses acima, não há enquadramento legal a amparar a pretensão posta na inicial de cômputo de tempo de serviço especial para aposentadoria por tempo de contribuição.

Portanto, fica afastada a especialidade dos períodos anteriores a 25/07/1991.

Após a edição da Lei 8.213/91, tendo havido a unificação dos regimes, altera-se totalmente a lógica do sistema, tendo de ser considerada a atividade, independentemente de sua natureza urbana ou rural.

Considerando que a atividade de trabalhador rural está prevista dentre aquelas que possuem enquadramento pelo simples exercício da atividade, com base no item 2.2.1 (trabalhadores na agropecuária) do Decreto 53.831/64, é possível o enquadramento ficto por categoria profissional até 28/04/1995.

Consoante o entendimento firmado pela TRU4, é possível o enquadramento de atividade laborativa como especial, exercida até a vigência da Lei 9.032/95, pela categoria profissional de "trabalhadores na agropecuária", prevista no código 2.2.1 do quadro anexo ao Decreto 53.831/64, ainda que não haja o trabalho na agricultura e na pecuária simultaneamente, mas apenas uma dessas atividades. AGRAVO - JEF Nº 5007338-13.2014.4.04.7206/SC. Relatora Flavia da Silva Xavier. Decisão em 28/09/2018. TRU4ª Região.

Neste sentido, inclusive, o enunciado nº 15 da JR/CRPS:

Para os efeitos de reconhecimento de tempo especial, o enquadramento do tempo de atividade do trabalhador rural, segurado empregado, sob o código 2.2.1 do Quadro anexo ao Decreto nº 53.831/64, é possível quando o regime de vinculação for o da Previdência Social Urbana, e não o da Previdência Rural (PRORURAL), para os períodos anteriores à unificação de ambos os regimes pela Lei nº 8.213/91, e aplica-se ao tempo de atividade rural exercido até 28/04/95, independentemente de ter sido prestado exclusivamente na lavoura ou na pecuária.

I - Até a edição da Lei nº 8.213, de 24/07/91, é possível o enquadramento como especial do labor prestado na agricultura (cód 2.2.1 do Decreto nº 53.831/64) desde que o trabalhador estivesse vinculado ao setor rural da agroindústria e a respectiva empresa necessariamente inscrita no extinto Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários - IAPI.

II - Após a Lei nº 8.213/91 e até a Lei 9.032/95, admite-se o reconhecimento como especial o trabalho exercido pelo empregado rural na agropecuária, agricultura ou pecuária.

Não se desconhece o entendimento firmado pelo STJ no PUIL 452, todavia, refere-se aos trabalhadores em lavoura de cana-de-açucar, não se aplicando ao caso dos autos.

Não é razoável reconhecer a especialidade somente se desenvolvida a atividade agrícola e pecuária de forma simultânea e desconsiderar quando desenvolvida apenas uma delas ou então com predominância sobre a outra, porquanto, desenvolvida a mesma atividade (agricultura ou pecuária).

Outrossim, é pacífico na jurisprudência do STJ o entendimento de que as atividades profissionais descritas naquela relação são apenas exemplificativas e a experiência de inúmeros processos que tramitam por esta Vara Federal revela que a atividade de "serviços gerais de lavoura" ou "serviços gerais de pecuária" é atividade manifestamente penosa, que exigem do trabalhador o desempenho de atividade física intensa durante toda a jornada de trabalho, com exposição a inúmeros agentes manifestamente nocivos.

Além disso, deve-se atentar ao fato de que a anotação da CTPS segue a prática trabalhista local e da época da prestação laboral. Assim, é comum que a mesma atividade desenvolvida em uma época tenha a nomenclatura anotada de forma diferente em contratos de trabalho superveniente, inclusive, para o mesmo empregador. É comum, em vínculos mais antigos, a anotação apenas da atividade de "serviços gerais rural", "trabalhador rural", "trabalhador de lavoura de arroz" enquanto nos períodos nos mais atuais a anotação da função de "trabalhador agropecuário polivalente", tratando-se sempre da mesma atividade rural desenvolvida em lavoura de arroz ou estabelecimento de pecuária.

Portanto, o período deve ser considerado como tempo de serviço especial, seja pelo enquadramento no código 2.2.1, seja pelo exercício de atividade manifestamente penosa.

Já em relação ao período posterior a 28/04/1995, como referido anteriormente, o que determina a contagem do tempo como especial é o fato de o trabalhador ter exercido qualquer atividade profissional, independentemente da categoria, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, pela efetiva exposição (exposição real) a algum agente físico, químico ou biológico, ou combinação destes, constantes de relação definida pelo Poder Executivo.

Neste ponto, o laudo similar anexado aos autos no evento 9 corrobora a especialidade para as atividades descritas no PPP anexado no processo administrativo, considerando o seguinte:

(...)

Anexo XIV - Agentes Biológicos - Trabalhos e operações em contato permanente com pacientes, animais ou com material infecto-contagiante, em estábulos e cavalariças. Ao manter contato com fezes, urina e demais secreções dos animais.

A especialidade emerge do risco constante de contaminação por agentes biológicos, indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço.

No caso dos autos, em sua atividade de manejo de bovinos, o segurado mantinha contato habitual com fezes, urina, secreções, sangue, além de outros, potencialmente transmissores de agentes nocivos biológicos.

Ao contrário do que costumeiramente alega o réu, a exposição a agentes nocivos biológicos no exercício das atividades, sejam elas qual forem, autoriza o reconhecimento da especialidade, não estando restrito tal reconhecimento aos segurados que trabalhem apenas em área de isolamento hospitalar.

Neste sentido, o julgamento do Tema 205 pela TNU (PEDILEF 0500012-70.2015.4.04.8013/AL, 16/03/2020):

a) para reconhecimento da natureza especial de tempo laborado em exposição a agentes biológicos não é necessário o desenvolvimento de uma das atividades arroladas nos Decretos de regência, sendo referido rol meramente exemplificativo;

b) entretanto, é necessária a comprovação em concreto do risco de exposição a microorganismos ou parasitas infectocontagiosos, ou ainda suas toxinas, em medida denotativa de que o risco de contaminação em seu ambiente de trabalho era superior ao risco em geral, devendo, ainda, ser avaliado, de acordo com a profissiografia, se tal exposição tem um caráter indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, independentemente de tempo mínimo de exposição durante a jornada (Tema 211/TNU).

Ainda que a efetiva exposição a agentes biológicos pudesse não ocorrer durante todas as horas da jornada de trabalho (permanência), o fato é que o risco de contágio é habitual e inerente às atividades desempenhadas - para o qual basta um único contato com o agente infeccioso - e, consequentemente, há o risco permanente de prejuízo à saúde do trabalhador, o que por certo caracteriza a especialidade do labor, não podendo ser exigido tempo mínimo de exposição.

Neste sentido, o julgamento do Tema 211 pela TNU (PEDILEF 0501219-30.2017.4.05.8500/SE, publicado em 17/12/2019):

Para aplicação do artigo 57, §3.º, da Lei n.º 8.213/91 a agentes biológicos, exige-se a probabilidade da exposição ocupacional, avaliando-se, de acordo com a profissiografia, o seu caráter indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, independente de tempo mínimo de exposição durante a jornada.

Observe-se que a exposição ao risco de contaminação deve ser habitual (durante todos os dias) e indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, ou seja, inerente ao exercício da atividade.

A especialidade por agentes biológicos decorre de seu risco potencial, sendo desnecessária a exposição do empregado de modo permanente (durante toda a jornada de trabalho) (TRU da 4ª Região, Incidente de Uniformização 5000582-56.2012.404.7109, Relator Juiz Federal João Batista Brito Ozório, Publicado no D.E. em 23.10.2012). 

Conforme bem explanado por Marina Vasques Duarte (in Direito Previdenciário, Verbo Jurídico, 2004, 3.ª ed. p. 167), "a especialidade do trabalho com exposição a agentes patológicos não existe em virtude do desgaste que o agente nocivo provocaria à integridade do profissional, mas, sim, em virtude do risco dessa exposição. O que se sugere seja verificado na hipótese é a permanência do risco, não da exposição em si, mesmo porque o fundamento da aposentadoria especial e do reconhecimento da especialidade do labor é a possibilidade de prejuízo à saúde do trabalhador e não o prejuízo em si".

Com efeito, não se deve entender por permanência a exposição do trabalhador aos agentes biológicos durante toda a sua jornada de trabalho, bastando a existência do risco de forma habitual e indissociável do exercício de suas funções, como entende a TRU:

1. O entendimento desta Turma, com relação à configuração da atividade especial, por contato com agente biológico é no sentido de que "para o enquadramento do tempo de serviço como especial após o início da vigência da Lei nº 9032/95, não é necessário que a exposição a agentes biológicos ocorra durante a integralidade da jornada de trabalho do segurado, bastando, nesse caso, que haja efetivo e constante risco de contaminação e de prejuízo à saúde do trabalhador, satisfazendo, assim, os conceitos de habitualidade e permanência, analisados à luz das particularidades do labor desempenhado" (IUJEF 0004501-62.2010.404.7254, Relatora p/ Acórdão Ana Beatriz Vieira da Luz Palumbo, D.E. 16/03/2012).

2. Incidente da parte autora conhecido e provido. (IUJEF 5001394-71.2012.404.7118, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relator Leonardo Castanho Mendes, juntado aos autos em 25/08/2015)".

Quanto à utilização de EPIs, estes não afastam o reconhecimento da especialidade em face da submissão a agentes biológicos, conquanto não ser possível a constatação da eficácia deste na atenuação do agente nocivo, consoante já reconhecido no item 3.1.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017:

"3.1.5 Tecnologia de Proteção

Observar se consta nas demonstrações ambientais informação sobre EPC, a partir de 14.10.1996 e sobre EPI a partir de 3.12.1998 para cumprimento de exigência legal previdenciária.

No entanto, como não há constatação de eficácia de EPI na atenuação desse agente, deve-se reconhecer o período como especial mesmo que conste tal informação, se cumpridas as demais exigências."

Assim, verifica-se que a parte autora, em decorrência de sua atividade laboral, estava exposta a elevado risco de contaminação biológica nociva à saúde, o que autoriza o reconhecimento da especialidade do período de 09/01/2012 a 13/11/2019, com base no código 1.3.1 do Decreto 53.831/64 e 3.0.1 do Decreto 2.172/97.


Em atenção ao recurso apresentado pela Autarquia, cumpre tecer algumas observações acerca do tempo especial reconhecido na sentença e dos agentes nocivos que embasaram o enquadramento:


Enquadramento pela categoria profissional

A aposentadoria especial, destinada aos segurados expostos a agentes nocivos à saúde, foi instituída pela Lei 3.807/1960 (LOPS) e, desde então, sofreu diversas modificações ao longo do tempo.

As atividades com exposição a agentes nocivos exercidas entre a publicação da Lei 3.807/1960 (LOPS) e da Lei 9.032/1995 possuíam presunção absoluta de nocividade, ocorrendo o enquadramento das categorias profissionais previstas nos anexos dos Decretos 53.831/1964 e  83.080/1979.

O enquadramento por categoria profissional configurava um reconhecimento presumido das atividades exercidas pelo trabalhador, exposto às atividades perigosas, insalubres ou penosas.

Este instituto jurídico, embasado nos decretos 53.831/1964 e 83.090/1979, foi revogado pela a Lei 9.32/1995 que extinguiu a parametrização automática das profissões, exigindo – a partir de 29/04/1995 - documentos como Laudo Pericial do Ambiente do Trabalho, SB-40, DSS-8030, Dirben 8030 e futuramente o conhecido Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP). A Instrução Normativa 77/2015 explica detalhadamente a premissa mencionada:

Art. 246 da IN 77/2015. A concessão de aposentadoria especial, uma vez cumprida a carência exigida, dependerá de caracterização da atividade exercida em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período de quinze, vinte ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme o caso, podendo ser enquadrado nesta condição:

I- por categoria profissional até 28 de abril de 1995, véspera da publicação da Lei nº 9.032, de 28 de abril de 1995, conforme critérios disciplinados nos arts. 269 a 275 desta IN; e ou

Art. 269 da IN 77/2015. Para enquadramento de atividade exercida em condição especial por categoria profissional o segurado deverá comprovar o exercício de função ou atividade profissional até 28 de abril de 1995, véspera da publicação da Lei nº 9.032, de 1995, arroladas nos seguintes anexos legais:

I - quadro anexo ao Decreto nº 53.831, de 1964, a partir do código 2.0.0 (Ocupações);

e II - Anexo II do Decreto nº 83.080, de 1979.

Assim, com a publicação da Lei nº 9.032/1995, em 29/04/1995, a presunção absoluta de nocividade deixou de existir, exigindo-se a comprovação da efetiva exposição a agentes nocivos físicos, químicos ou biológicos para fins de aposentadoria especial ou de conversão de tempo especial em comum.

Agentes químicos e hidrocarbonetos aromáticos

Em relação aos agentes químicos, a Turma Regional de Uniformização da 4ª Região firmou o entendimento de que a exposição qualitativa a tais agentes pode ser reconhecida somente até 2/12/1998. Nesse sentido: Recurso 5016061-95.2012.404.7107, TRU4, Relator para o acórdão Dr. João Batista Lazzari, D.E. 2/4/2013. Isso porque, a partir da publicação da Medida Provisória 1.729, de 3/12/1998, convertida na Lei 9.732, as disposições trabalhistas concernentes à caracterização de atividade ou operações insalubres, consagradas na NR-15, com os respectivos conceitos de “limites de tolerância”, “concentração”, “natureza” e “tempo de exposição ao agente”, é que devem reger a caracterização da natureza da atividade, para fins previdenciários.

Desse modo, até 2/12/1998, a atividade pode ser enquadrada como especial pela simples avaliação qualitativa da exposição aos agentes químicos. A partir de 3/12/1998, devem ser observados os limites constantes da NR-15, que regula as atividades e operações insalubres no âmbito trabalhista.

Entretanto, há que se atentar para as particularidades da própria regulamentação no tocante às diversas substâncias. Por exemplo, a NR-15 dispõe que são consideradas atividades ou operações insalubres aquelas listadas no Anexo 13, sendo que a caracterização de insalubridade das atividades mencionadas nesse Anexo não exige a superação de níveis de concentração, de modo que, no que se refere às atividades que envolvem os agentes ali previstos, a avaliação da nocividade das atividades/operações continua sendo qualitativa. É o caso, por exemplo, de funções em contato com hidrocarbonetos aromáticos, solventes, óleos minerais, parafina e outras substâncias reconhecidamente cancerígenas, motivo pelo qual, mesmo após 3/12/1998, sua mera presença aferida de forma qualitativa (não quantitativa) permite o enquadramento do período como especial, na hipótese de exposição habitual e permanente.

Especificamente em relação aos hidrocarbonetos importa referir que podem ser aromáticos e alifáticos, sendo que o elemento base para a classe dos hidrocarbonetos aromáticos é o benzeno, uma vez que  todos os aromáticos possuem pelo menos um anel benzênico. É uma substância usada como solvente (de iodo, enxofre, graxas, ceras, etc.) e matéria-prima básica na produção de muitos compostos orgânicos importantes tais como fenol, anilina, trinitrotolueno, plásticos, gasolina, borracha sintética, colas, tintas, corantes, lubrificantes, detergentes, explosivos, napalm, pesticidas, entre outros. 

É um composto tóxico, cuja exposição tem graves efeitos na saúde. O Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos (US Department of Health and Human Services, DHHS) classifica o benzeno como um cancerígeno humano porque a exposição prolongada ao benzeno pode provocar leucemia, um tipo de câncer do sangue para os órgãos hematopoiéticos, potencialmente fatal em indivíduos suscetíveis. Em particular, a leucemia mieloide aguda ou leucemia não linfocítica, aguda não são contestadas como sendo causadas pelo benzeno. O benzeno também é largamente conhecido por atingir fígado, rins, pulmões, coração e cérebro, podendo causar, inclusive, quebra da cadeia de DNA, provocando danos cromossômicos e, via de consequência, diversos tipos de câncer. 

Desse modo, por se tratar de substância comprovadamente cancerígena, os hidrocarbonetos aromáticos, dispensam a apresentação de análise quantitativa.

Agentes Biológicos

Em relação ao período anterior à Lei 9.032, de 28 de abril de 1995, as atividades listadas no Decreto 53.831/1964 e no Decreto 83.080/1979 prescindem da comprovação de efetiva exposição a agentes nocivos, a qual era legalmente presumida.

Para o período posterior é necessária a comprovação da efetiva exposição a agentes nocivos, sendo bastante o contato permanente com doentes ou materiais infecto-contagiantes (código 1.3.4 do Decreto 83.080/1979).

Já a partir de 5/3/1997, conforme o disposto no Decreto 2.172/1997, código 3.0.1, "a", para caracterização da atividade especial nessa atividade é necessário o trabalho em estabelecimento de saúde em contato permanente com pacientes portadores de doenças infecto-contagiosas ou com manuseio de materiais contaminados.

No entanto, para os profissionais da área da saúde o risco de contágio por agentes biológicos pode ser entendido como inerente às atividades de todos os que, no desempenho de suas funções diuturnas, mantenham contato com pacientes ou materiais por eles utilizados, mesmo que não se possa dizer que todos os pacientes sejam portadores de doença infecto contagiosa, ou que o contato com esse tipo de paciente seja permanente.

Desde que não fique caracterizada a eventualidade da exposição aos agentes biológicos pelo exercício das atividades em grande parte em locais em que ela não ocorra, não se deve considerar a intermitência da exposição como fator de exclusão do enquadramento da atividade especial naqueles casos em que não se possa quantificar exatamente o tempo da exposição durante a jornada de trabalho, mas desde que as atividades do trabalhador não possam ser dissociadas do contato permanente com pacientes ou materiais contaminados, pois nesses casos o risco é permanente, já que os pacientes são potenciais portadores dessas doenças.

Portanto, o reconhecimento da especialidade não deve ficar restrito aos segurados que trabalham de modo permanente com pacientes portadores de doenças infecto-contagiosas, segregados em áreas ou ambulatórios específicos, e aos que manuseiam exclusivamente materiais contaminados proveniente dessas áreas, como entende a Autarquia (artigo 244, parágrafo único, da IN 45/2010).

Neste contexto, destaco que as Turmas de Direito Previdenciário do e. TRF4 vem decidindo que "a exposição a agentes biológicos não precisa ser permanente para caracterizar a insalubridade do labor, sendo possível a conversão do tempo de serviço especial, diante do risco de contágio sempre presente." (TRF4, APELREEX 2008.70.01.006885-6, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão Ricardo Teixeira do Valle Pereira).

A Terceira Seção do TRF da 4ª Região decidiu que "a exposição de forma intermitente aos agentes biológicos não descaracteriza o risco de contágio, uma vez que o perigo existe tanto para aquele que está exposto de forma contínua como para aquele que, durante a jornada, ainda que não de forma permanente, tem contato com tais agentes". (TRF4, EINF 2005.72.10.000389-1, Terceira Seção, Relator João Batista Pinto Silveira).

Assim, no caso de exposição a agentes biológicos, entendo pela possibilidade de enquadramento mesmo que o trabalhador execute suas atividades em locais insalubres durante apenas parte de sua jornada de trabalho, porque não há como mensurar o prejuízo causado pelos agentes insalutíferos à sua saúde, uma vez que basta o contato de forma eventual para que haja risco real de contração de doenças.


Habitualidade e permanência da exposição a agentes nocivos

Para a caracterização da especialidade, não se exige exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, sendo suficiente que o trabalhador, em cada dia de trabalho, esteja exposto a agentes nocivos em período razoável da jornada, salvo exceções (periculosidade, por exemplo). Habitualidade e permanência hábeis para os fins visados pela norma - que é protetiva - devem ser analisadas à luz do serviço desenvolvido pelo trabalhador, cujo desempenho, não descontínuo ou eventual, exponha sua saúde à prejudicialidade das condições físicas, químicas, biológicas ou associadas que degradam o meio ambiente do trabalho. Nesse sentido: EINF 2004.71.00.028482-6/RS, Relator Desembargador Federal Luís Alberto DAzevedo Aurvalle, D.E. 8/1/2010 e EIAC 2000.04.01.088061-6/RS, Relator Desembargador Federal Fernando Quadros da Silva, DJU 3/3/2004.

Observo ainda, que muitas vezes a solução para a busca da melhor resposta às condições de trabalho, com a presença ou não de agentes nocivos, é a constatação dessas condições em estabelecimento de atividade semelhante àquele onde laborou originariamente o segurado, no qual poderá estar presente os mesmos agentes nocivos, o que permitirá um juízo conclusivo a respeito. Logo, não há óbice na utilização de laudo pericial elaborado em uma empresa, para comprovar a especialidade do labor em outra do mesmo ramo e no exercício de função semelhante. Neste sentido, é a jurisprudência dominante deste Tribunal: AC 2006.71.99.000709-7, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, DJU 2/3/2007 e APELREEX 2008.71.08.001075-4, Relator Juiz Federal Guilherme Pinho Machado, D.E. 3/8/2009. Ademais, a Súmula 106 deste TRF assim estabelece: Quando não é possível a realização de perícia técnica no local de trabalho do segurado, admite-se a produção desta prova em empresa similar, a fim de aferir a exposição aos agentes nocivos e comprovar a especialidade do labor.

Ademais, não prospera o argumento de que o laudo, por não ser contemporâneo ao exercício das atividades, não serviria para a comprovação da especialidade da atividade. Isso porque, se em data posterior ao labor despendido, foi constatada a presença de agentes nocivos, mesmo com as inovações tecnológicas e de medicina e segurança do trabalho que advieram com o passar do tempo, reputa-se que, à época do labor, a agressão dos agentes era igual, ou até maior, dada a escassez de recursos materiais existentes para atenuar sua nocividade e a evolução dos equipamentos utilizados no desempenho das tarefas.

Utilização de equipamentos de proteção individual (EPI)

Quanto à utilização de equipamentos de proteção individual (EPI), destaco que a partir de 3/12/1998, de acordo com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo - ARE 664335, submetido ao regime de repercussão geral (Tema 555), Relator Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 4/12/2014 e publicado em 12/2/2015, o uso de equipamentos de proteção individual somente descaracterizaria a atividade em condições especiais se comprovada, no caso concreto, a real efetividade, suficiente para afastar completamente a relação nociva a que o empregado se submete.

No caso sob análise, ainda que alguns documentos façam referência ao uso de equipamentos de proteção, não ficou demonstrado o efetivo fornecimento pela empresa, a intensidade de proteção proporcionada ao trabalhador, o treinamento e uso efetivo do equipamento durante toda a jornada de trabalho e a respectiva fiscalização pelo empregador. 

Além disso, para que se pudesse presumir a neutralização do agente agressivo, seriam necessárias provas concretas da qualidade técnica do equipamento, descrição de seu funcionamento e efetiva medição do quantum que os artefatos podem elidir - ou se realmente podem neutralizar - o que não ocorreu no caso em apreço. Qualquer referência à neutralização do agente agressivo por meio de equipamento de proteção, para ser considerada, deve ser palpável e concreta e não feita de maneira genérica. É indispensável que se comprove, pelo uso da tecnologia e mediante demonstração razoável, que o equipamento neutraliza o agente, se efetivamente é permanentemente utilizado e desde que período; do contrário, não pode ser afastado o enquadramento da atividade como sujeita a agentes nocivos.

Ademais, observo que este Tribunal, no julgamento do processo 5054341-77.2016.4.04.0000/SC, recebido como recurso representativo da controvérsia, fixou a seguinte tese, relativamente ao Tema IRDR15/TRF4: A mera juntada do PPP referindo a eficácia do EPI não elide o direito do interessado em produzir prova em sentido contrário.

Nesse mesmo julgamento foram fixadas, também, as situações que dispensam a análise referente à utilização de EPIs, cabendo o reconhecimento do tempo de serviço especial ainda que o formulário PPP da empresa indique a adoção de EPI eficaz:

a) Períodos anteriores a 3 de dezembro de 1998: pela ausência de exigência de controle de fornecimento e uso de EPI em período anterior a essa data, conforme se observa da IN INSS 77/2015 -Art. 279, § 6º: Somente será considerada a adoção de Equipamento de Proteção Individual - EPI em demonstrações ambientais emitidas a partir de 3 de dezembro de 1998, data da publicação da MP nº 1.729, de 2 de dezembro de 1998, convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998, e desde que comprovadamente elimine ou neutralize a nocividade e seja respeitado o disposto na NR-06 do MTE, havendo ainda necessidade de que seja assegurada e devidamente registrada pela empresa, no PPP, a observância: (...)"

b) Pela reconhecida ineficácia do EPI:

b.1) Enquadramento por categoria profissional: devido a presunção da nocividade (ex. TRF/4 5004577-85.2014.4.04.7116/RS, 6ª Turma, Relator Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, em 13/9/2017)

b.2) Ruído: Repercussão Geral 555 (ARE 664335 / SC)

b.3) Agentes Biológicos: Item 3.1.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017.

b.4) Agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos: Memorando-Circular Conjunto n° 2/DIRSAT/DIRBEN/INSS/2015: Exemplos: Asbesto (amianto): Item 1.9.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017; Benzeno: Item 1.9.3 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017.

b.5) Periculosidade: Tratando-se de periculosidade, tal qual a eletricidade e vigilante, não se cogita de afastamento da especialidade pelo uso de EPI. (ex. Apelação/Remessa Necessária 5004281-23.2014.4.04.7000/PR, Relator Ézio Teixeira, 19/4/2017)

Além dessas hipóteses, o voto-complementar proferido pelo eminente Desembargador Federal Jorge Antônio Maurique em continuidade ao mesmo julgamento (processo nº 5054341-77.2016.4.04.0000/SC) acrescentou mais três exceções, ao rol taxativo previsto no IRDR-Tema 15, nas quais, igualmente, é cabível o reconhecimento do tempo de serviço especial ainda que o formulário fornecido pela empresa indique a adoção de EPI eficaz, quais sejam: calor, radiações ionizantes e trabalhos em condições hiperbáricas.

Quanto ao recolhimento das contribuições estabelecidas nos artigos 57, §§ 6º e 7º da Lei 8.213/1991 e artigo 22, inciso II, da Lei 8.212/1991, cabe ao empregador efetuá-lo, conforme dispõe o artigo 30, inciso I, alíneas a e b, da Lei 8.212/1991:

Artigo 30: A arrecadação e o recolhimento das contribuições ou de outras importâncias devidas à Seguridade Social obedecem às seguintes normas:

I - a empresa é obrigada a:

a) arrecadar as contribuições dos segurados empregados e trabalhadores avulsos a seu serviço, descontando-as da respectiva remuneração;

b) recolher os valores arrecadados na forma da alínea a deste inciso, a contribuição a que se refere o inciso IV do art. 22 desta Lei, assim como as contribuições a seu cargo incidentes sobre as remunerações pagas, devidas ou creditadas, a qualquer título, aos segurados empregados, trabalhadores avulsos e contribuintes individuais a seu serviço até o dia 20 (vinte) do mês subsequente ao da competência; (...)

Tema repetitivo 1090 STJ

Importante referir ainda, no que diz respeito à informação constante do formulário PPP atestando a eficácia do equipamento de proteção individual (EPI), que o STJ, na data de 09/04/2025, aprovou, por unamidade, as seguintes teses no tema repetitivo 1090:

I - A informação no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) sobre a existência de equipamento de proteção individual (EPI) descaracteriza, em princípio, o tempo especial, ressalvadas as hipóteses excepcionais nas quais, mesmo diante da comprovada proteção, o direito à contagem especial é reconhecido.

II - Incumbe ao autor da ação previdenciária o ônus de comprovar: (i) a ausência de adequação ao risco da atividade; (ii) a inexistência ou irregularidade do certificado de conformidade; (iii) o descumprimento das normas de manutenção, substituição e higienização; (iv) a ausência ou insuficiência de orientação e treinamento sobre o uso adequado, guarda e conservação; ou (v) qualquer outro motivo capaz de conduzir à conclusão da ineficácia do EPI.

III - Se a valoração da prova concluir pela presença de divergência ou de dúvida sobre a real eficácia do EPI, a conclusão deverá ser favorável ao autor.

De todo modo, entendo que permanecem as excludentes previstas no Tema IRDR15/TRF4, anteriormente referidas.

Acrescento, que se estiver comprovado o trabalho em condições especiais, a mera ausência do código ou o preenchimento equivocado do campo GFIP no formulário não obsta o reconhecimento da especialidade do período, pois o INSS possui os meios necessários para sanar eventual irregularidade constatada na empresa, não podendo o segurado ser penalizado por falha do empregador. 

Nesse sentido, inclusive, transcrevo trecho do voto-vista proferido pelo Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz, na Reclamação nº 5041695-54.2024.4.04.0000/RS, julgada pela 3ª Seção deste Tribunal, in verbis

(...) Dito isso, não vislumbro diferenças entre o acórdão relativo ao IRDR-15 e o acórdão relativo ao  tema repetitivo nº 1.090 e, a meu ver, comprovada a exposição ao agente químico hidrocarbonetos aromáticos, pela manipulação de compostos orgânicos que possuem um ou mais anéis benzênicos ou núcleos aromáticos, é irrelevante o uso de EPIs pelo obreiro. O benzeno é agente reconhecidamente cancerígeno, cuja nocividade não é elidida pela utilização de equipamentos de proteção.

Assim, incorrendo o acórdão em hipótese de não aplicação da tese jurídica firmada no julgamento do IRDR 15/TRF4 (CPC, art. 988, § 4º), ratificada pelo STJ no Tema 1.090/STJ especificamente quanto às hipóteses em que a produção de prova da eficácia do uso de EPI é irrelevante (exposição a agente reconhecidamente cancerígeno), a fim de preservar a competência do Tribunal e garantir a autoridade de suas decisões, deverá a autoridade reclamada proceder a novo julgamento do caso, analisando a possibilidade de cômputo de tempo especial nos intervalos (...)

Assim, no caso em exame, o eventual emprego desses acessórios não é suficiente para descaracterizar a especialidade do tempo de serviço requerido.


Valoração probatória e saúde ocupacional

Importante destacar que, nos casos de divergência entre formulário, laudo da empresa e perícia judicial, quando estamos diante de situações de incerteza científica relacionada aos efeitos nocivos do meio ambiente do trabalho na saúde humana, recomenda-se uma solução judicial acautelatória, de maneira a proteger o fundamental bem da vida que se encontra em discussão, o direito à saúde, que se relaciona, no presente caso, com a contagem diferenciada do tempo de serviço e saída antecipada do trabalhador, mediante concessão de aposentadoria especial ou aposentadoria por tempo de contribuição, com cômputo de tempo especial.

Logo, a consequência dessa premissa é a de que, uma vez identificada situação de divergência nas conclusões periciais, retratadas por laudos técnicos ambientais e formulários, impõe-se, com fundamento no princípio da precaução, acolher a conclusão da asserção mais protetiva à saúde do obreiro.


Feitas estas observações, concluo que deve ser mantida a sentença e improvida a apelação do INSS quanto ao reconhecimento da especialidade das atividades exercidas nos períodos de 01/06/2006 e 17/03/2008 e 09/01/2012 e 13/11/2019.


Direito à concessão do benefício de aposentadoria

Mantido integralmente o reconhecimento da especialidade dos períodos deferidos na sentença, deve igualmente ser mantido o direito, nela reconhecido, à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a contar da DER (29/10/2021).


Direito ao Melhor Benefício

Reconhecido o direito à concessão da aposentadoria desde a DER, desde logo fica assegurada à parte autora a opção de, na fase de cumprimento da sentença, apontar data posterior em que preencha os requisitos para o mesmo benefício, porém com renda mensal mais vantajosa. Para tanto, poderão ser considerados períodos contributivos que constem no CNIS e acerca dois quais não exista controvérsia no que diz respeito à possibilidade do seu cômputo na concessão do benefício pretendido.

Ademais, ao realizar tal opção, a parte autora submete-se ao que decidiu o Superior Tribunal de Justiça no Tema 995, relativamente ao início dos efeitos financeiros e aos juros de mora, a saber: 

a) reafirmação da DER durante o processo administrativo: efeitos financeiros a partir da implementação dos requisitos e os juros de mora a partir da citação; 

b) implementação dos requisitos entre o final do processo administrativo e o ajuizamento da ação: efeitos financeiros a partir da propositura da demanda e juros de mora a partir da citação; e 

c) implementação dos requisitos após o ajuizamento da ação: efeitos financeiros a partir da implementação dos requisitos; juros de mora apenas se o INSS não implantar o benefício no prazo de 45 dias da intimação da respectiva decisão, contados a partir desse termo final.

Honorários sucumbenciais preservarão o que foi estabelecido na sentença/acórdão, apenas com adequação da base de cálculo, que passará a adotar as parcelas vencidas a partir da DER reafirmada, já que persiste a sucumbência do INSS.

A prévia implantação da aposentadoria por força da tutela antecipada, mediante consideração de outra data de início do benefício, também poderá ser objeto de ajuste na fase de cumprimento da sentença. 

Alerto a parte autora que, sendo o direito ao melhor benefício decorrente da incidência da legislação própria, dos normativos do INSS e da jurisprudência consolidada, não se fazem necessários embargos declaratórios para a definição da data exata de reafirmação da DER. A interposição de recurso com tal propósito poderá ensejar a condenação do embargante ao pagamento de multa, nos termos do artigo 1.026, § 2º, do CPC.


Consectários da condenação. Correção e juros.

Emenda Constitucional nº 136/2025

A recente Emenda Constitucional nº 136/2025, em vigor desde 10/09/2025, alterou o artigo 3º da EC 113/2021, cujo âmbito de aplicação foi restringido à atualização monetária e juros dos Precatórios e RPVs. Mais importante, a modificação promovida pela EC 136/25 suprimiu do ordenamento jurídico a regra que definia o índice de correção monetária e juros de mora aplicável nas condenações da Fazenda Pública Federal (SELIC).

Diante do vácuo legal, torna-se necessário definir os índices aplicáveis a partir de 09/09/2025.

O Supremo Tribunal Federal, inicialmente no julgamento das ADINs 4357 e nº 4425, e posteriormente do Tema 810 de Repercussão Geral, julgou inconstitucional o índice de correção monetária (TR), mas reafirmou a validade do índice de juros (poupança) previsto nessa lei.

Assim, no período entre 29/06/2009 e 08/12/2021, interstício entre a entrada em vigor da Lei nº 11.960 e da EC 113, aplicavam-se os juros de poupança.

O artigo 3º da EC 113/2021, ao substituir o índice de juros e correção monetária nas condenações da Fazenda Pública, revogou a parte ainda em vigor do artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97 (juros). Diante disso, e da vedação em nosso ordenamento jurídico à repristinação sem determinação legal expressa, inviável resgatar a aplicação dos juros de poupança.

Sem a âncora normativa vigente, e excluída a possibilidade de repristinação do índice anterior, resta a regra geral em matéria de juros, insculpida no artigo 406 do Código Civil que determina a aplicação da SELIC, deduzida a atualização monetária, feita pelo IPCA, nos termos do artigo 389, parágrafo único do Código Civil.

Importante observar o ajuizamento da ação direta de inconstitucionalidade questionando o teor da EC nº 136/25 (ADIn 7873, Relator Ministro Luiz Fux), ressalva-se que a definição final dos índices deve ser reservada para a fase de cumprimento de sentença.

Desse modo, a incidência dos consectários legais é de ser adequada de ofício aos fatores acima indicados a partir de 09/09/2025, porquanto é matéria de ordem pública, podendo ser tratada pelo Tribunal sem necessidade de prévia provocação da parte


Honorários advocatícios e custas processuais

Mantida a distribuição dos ônus sucumbenciais na forma proclamada na sentença.

Uma vez que a sentença foi proferida após 18/3/2016 (data da vigência do NCPC), aplica-se a majoração prevista no artigo 85, § 11, desse diploma, observando-se os ditames dos §§ 2º a 6º quanto aos critérios e limites estabelecidos. Assim, majoro a verba honorária devida pela Autarquia ao patrono da parte autora em 50% sobre o percentual mínimo da primeira faixa (artigo 85, §3º, inciso I, do NCPC).


Cumprimento imediato do acórdão

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no artigo 497, caput, do Código de Processo Civil, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, a contar da competência da publicação do acórdão.

Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.

Em homenagem aos princípios da celeridade e da economia processual, tendo em vista que o INSS vem opondo embargos de declaração sempre que determinada a implantação imediata do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação dos artigos 128 e 475-O, I, do CPC/1973, e 37 da CF/1988, impende esclarecer que não se configura a negativa de vigência a tais dispositivos legais e constitucionais. Isso porque, em primeiro lugar, não se está tratando de antecipação ex officio de atos executórios, mas, sim, de efetivo cumprimento de obrigação de fazer decorrente da própria natureza condenatória e mandamental do provimento judicial; em segundo lugar, não se pode, nem mesmo em tese, cogitar de ofensa ao princípio da moralidade administrativa, uma vez que se trata de concessão de benefício previdenciário determinada por autoridade judicial competente.

Caso a parte autora não tenha interesse na implantação do benefício acima determinada, deverá informar nos autos, no prazo de 5 dias.


Conclusão

1) Manter a sentença quanto:

-  ao reconhecimento da especialidade das atividades exercidas nos períodos de 01/06/2006 e 17/03/2008 e 09/01/2012 e 13/11/2019;

- à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a contar da DER (29/10/2021).

2) Negar provimento à apelação da Autarquia.

3) De ofício:

- adequar os consectários legais. 


Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.




Documento eletrônico assinado por ALTAIR ANTONIO GREGORIO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005399393v5 e do código CRC 8fcbad90.

Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): ALTAIR ANTONIO GREGORIOData e Hora: 05/11/2025, às 13:38:56

 


 

5000330-61.2024.4.04.7132
40005399393 .V5


Conferência de autenticidade emitida em 12/11/2025 04:08:54.



Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000330-61.2024.4.04.7132/RS

RELATOR Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

EMENTA

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A AGENTES BIOLÓGICOS E QUÍMICOS. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECURSO DESPROVIDO.

I. CASO EM EXAME:

1. Apelação cível interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) contra sentença que reconheceu a especialidade de períodos de trabalho e concedeu aposentadoria por tempo de contribuição, determinando a averbação do tempo especial convertido em comum e a implantação do benefício mais vantajoso a partir da DER (29/10/2021).

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO:

2. Há duas questões em discussão: (i) a possibilidade de afastamento do reconhecimento da especialidade dos períodos de 01/06/2006 a 17/03/2008 e 09/01/2012 a 13/11/2019; (ii) a possibilidade de afastamento da concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.

III. RAZÕES DE DECIDIR:

3. A especialidade do tempo de serviço é reconhecida conforme a legislação vigente à época da atividade, integrando o direito adquirido do trabalhador, sendo possível a conversão de tempo especial em comum mesmo após 1998, conforme o REsp Repetitivo nº 1.151.363 do STJ.4. Para o período de 01/06/2006 a 17/03/2008, a atividade de trabalhador da pecuária polivalente foi comprovada por PPP e laudo similar, indicando exposição a agentes biológicos (Butox, dectomax, bactérias, fungos, parasitas e protozoários), o que autoriza o reconhecimento da especialidade com base nos Decretos 53.831/1964 (código 1.3.1) e 2.172/1997 (código 3.0.1).5. Para o período de 09/01/2012 a 13/11/2019, a atividade de trabalhador agropecuário em geral foi comprovada por PPP e laudo similar, indicando exposição a hidrocarbonetos (álcalis cáusticos, gasolina, diesel, óleos, graxas e lubrificantes) e agentes biológicos (bactérias, parasitas, fungos, vírus e microrganismos no trato com animais e suas fezes), o que autoriza o reconhecimento da especialidade com base nos Decretos 53.831/1964 (código 1.3.1) e 2.172/1997 (código 3.0.1).6. A exposição a agentes biológicos não exige que a atividade esteja arrolada nos decretos, sendo o rol meramente exemplificativo, e o risco de contágio é habitual e inerente às atividades desempenhadas na pecuária, bastando um único contato com o agente infeccioso, conforme Temas 205 e 211 da TNU e jurisprudência da TRU4.7. A utilização de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) não afasta o reconhecimento da especialidade para agentes biológicos, pois não há constatação de eficácia na atenuação do agente nocivo, conforme o Manual da Aposentadoria Especial do INSS (2017, item 3.1.5).8. A exposição a hidrocarbonetos aromáticos, por serem substâncias reconhecidamente cancerígenas, dispensa a análise quantitativa e o uso de EPIs não elide a nocividade, conforme o IRDR15/TRF4 e o Tema 1090/STJ.9. Em situações de incerteza científica sobre os efeitos nocivos do ambiente de trabalho, o princípio da precaução impõe a adoção da solução mais protetiva à saúde do trabalhador.10. Mantido o reconhecimento da especialidade dos períodos, é mantido o direito à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição a partir da DER (29/10/2021).11. Os consectários da condenação (correção e juros) e a distribuição dos ônus sucumbenciais são mantidos conforme a sentença, que está em consonância com os parâmetros da Turma. A verba honorária devida pela Autarquia ao patrono da parte autora é majorada em 50% sobre o percentual mínimo da primeira faixa, nos termos do art. 85, § 11, do CPC.

IV. DISPOSITIVO E TESE:

12. Recurso desprovido.Tese de julgamento: 13. O reconhecimento da especialidade do tempo de serviço em atividades rurais de pecuária, com exposição a agentes biológicos e hidrocarbonetos aromáticos, é cabível, sendo o risco de contágio habitual e inerente à atividade, e a eficácia dos EPIs inócua para afastar a nocividade de agentes biológicos e cancerígenos.

___________

Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 14; CPC, art. 85, § 11; CPC, art. 497; CPC, art. 1.046; Lei nº 3.807/1960; Lei nº 5.527/1968; Lei nº 8.212/1991, art. 22, inc. II, art. 30, inc. I, alíneas a e b; Lei nº 8.213/1991, arts. 57, 58, 124; Lei nº 9.032/1995; Lei nº 9.289/1996, art. 4º, I; Lei nº 9.528/1997; Lei nº 9.711/1998; Lei nº 9.732; EC nº 20/1998, art. 15; EC nº 113/2021, art. 3º; Decreto nº 53.831/1964; Decreto nº 72.771/1973; Decreto nº 83.080/1979; Decreto nº 2.172/1997; Decreto nº 3.048/1999; Decreto nº 4.882/2003; IN INSS 77/2015, arts. 246, 269, 279, § 6º; NR-06 do MTE; NR-15.

Jurisprudência relevante citada: STF, RE 870.947/SE; STF, ARE 664335 (Tema 555), Rel. Min. Luiz Fux, j. 04.12.2014; STJ, AgRg no REsp 941885/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 04.08.2008; STJ, REsp 639066/RJ, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 07.11.2005; STJ, REsp Repetitivo nº 1.151.363, Rel. Min. Jorge Mussi; STJ, Tema 905; STJ, Tema 995; STJ, Tema 1090, j. 09.04.2025; TRF4, 5030475-79.2017.4.04.9999, Rel. Luciane Merlin Clève Kravetz, j. 26.10.2017; TRF4, 5040060-53.2015.4.04.0000, Rel. Amaury Chaves de Athayde, j. 24.08.2017; TRF4, AC 5004512-07.2011.4.04.7113, Rel. Taís Schilling Ferraz, j. 12.09.2017; TRF4, AGRESP 228832/SC, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 30.06.2003; TRF4, Recurso 5016061-95.2012.404.7107, Rel. João Batista Lazzari, j. 02.04.2013; TRF4, APELREEX 2008.70.01.006885-6, Rel. Ricardo Teixeira do Valle Pereira; TRF4, EINF 2005.72.10.000389-1, Rel. João Batista Pinto Silveira; TRF4, EINF 2004.71.00.028482-6/RS, Rel. Luís Alberto DAzevedo Aurvalle, j. 08.01.2010; TRF4, EIAC 2000.04.01.088061-6/RS, Rel. Fernando Quadros da Silva, j. 03.03.2004; TRF4, AC 2006.71.99.000709-7, Rel. Celso Kipper, j. 02.03.2007; TRF4, APELREEX 2008.71.08.001075-4, Rel. Guilherme Pinho Machado, j. 03.08.2009; TRF4, Súmula 106; TRF4, IRDR15/TRF4 (processo 5054341-77.2016.4.04.0000/SC); TRF4, Reclamação nº 5041695-54.2024.4.04.0000/RS, Rel. Paulo Afonso Brum Vaz; TNU, Tema 205 (PEDILEF 0500012-70.2015.4.04.8013/AL, j. 16.03.2020); TNU, Tema 211 (PEDILEF 0501219-30.2017.4.05.8500/SE, j. 17.12.2019); TRU4, AGRAVO - JEF Nº 5007338-13.2014.4.04.7206/SC, Rel. Flavia da Silva Xavier, j. 28.09.2018; TRU4, Incidente de Uniformização 5000582-56.2012.404.7109, Rel. João Batista Brito Ozório, j. 23.10.2012; TRU4, IUJEF 0004501-62.2010.404.7254, Rel. Ana Beatriz Vieira da Luz Palumbo, j. 16.03.2012; TRU4, IUJEF 5001394-71.2012.404.7118, Rel. Leonardo Castanho Mendes, j. 25.08.2015; JR/CRPS, Enunciado nº 15.

* Documento gerado com auxílio de inteligência artificial, nos termos da  Resolução n.º 615/2025 do Conselho Nacional de Justiça.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 30 de outubro de 2025.




Documento eletrônico assinado por ALTAIR ANTONIO GREGORIO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005399394v5 e do código CRC 817b9795.

Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): ALTAIR ANTONIO GREGORIOData e Hora: 05/11/2025, às 13:38:56

 


 

5000330-61.2024.4.04.7132
40005399394 .V5


Conferência de autenticidade emitida em 12/11/2025 04:08:54.



Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 23/10/2025 A 30/10/2025

Apelação Cível Nº 5000330-61.2024.4.04.7132/RS

RELATOR Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

PRESIDENTE Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PROCURADOR(A) CAROLINA DA SILVEIRA MEDEIROS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 23/10/2025, às 00:00, a 30/10/2025, às 16:00, na sequência 842, disponibilizada no DE de 14/10/2025.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

Votante Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

Votante Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA

Votante Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES

Secretário



Conferência de autenticidade emitida em 12/11/2025 04:08:54.



Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

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