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DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. INDÚSTRIA CALÇADISTA. HIDROCARBONETOS. INFLAMÁVEIS. REAFIRMAÇÃO DA DER. ...

Data da publicação: 12/11/2025, 07:09:12

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. INDÚSTRIA CALÇADISTA. HIDROCARBONETOS. INFLAMÁVEIS. REAFIRMAÇÃO DA DER. PROVIMENTO DO RECURSO. 1. A lei em vigor quando da prestação dos serviços define a configuração do tempo como especial ou comum, o qual passa a integrar o patrimônio jurídico do trabalhador, como direito adquirido. 2. Até 28/04/1995 é admissível o reconhecimento da especialidade do trabalho por categoria profissional; a partir de 29/04/1995 é necessária a demonstração da efetiva exposição, de forma não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde, por qualquer meio de prova. A contar de 06/05/1997 a comprovação deve ser feita por formulário padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica. 3. Comprovado nos autos a exposição da parte autora a agentes nocivos, necessária a reforma da senteça. 4. A exposição a hidrocarbonetos aromáticos (óleos, graxas e combustíveis) em atividades de lavador de veículos e frentista caracteriza tempo especial, sendo a exposição qualitativa e o uso de EPI ineficaz para neutralizar o risco. 5. É possível a reafirmação da DER para o momento em que os requisitos para a concessão do benefício forem implementados, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias. 6. Apelação do autor provida. (TRF 4ª Região, Central Digital de Auxílio 2, 5000962-67.2021.4.04.7108, Rel. MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA, julgado em 04/11/2025, DJEN DATA: 05/11/2025)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5000962-67.2021.4.04.7108/RS

RELATOR Juiz Federal MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta pelo autor contra a sentença que, em ação previdenciária, julgou a lide, nos seguintes termos (evento 14, SENT1):

Ante o exposto, reconheço a ausência de interesse de agir, nos termos do art. 485, VI, do CPC, no que diz respeito à consideração de tempo de serviço mencionado em sede preliminar, e, no mérito, julgo parcialmente procedente o pedido, resolvendo o mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC, para determinar ao INSS que:

a) Reconheça os períodos trabalhados, conforme a respectiva qualificação, nos termos da fundamentação;

b) Converta o tempo de serviço especial em comum, mediante a multiplicação pelo fator de conversão 1;4

c) Averbe o acréscimo de 02 anos e 26 dias ao total já reconhecido administrativamente.

Considerando o estabelecido no art. 85, §§ 2º; 3º, I e § 4º do CPC, bem como que o proveito econômico desta demanda será inferior a 200 (duzentos) salários-mínimos, montante que se depreende da análise ao valor da causa, bem como a sucumbência de ambos os litigantes, condeno a parte autora e o INSS ao pagamento de honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da condenação, compreendidas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula nº 76 do Tribunal Regional Federal da 4º Região), a ser apurado quando da liquidação do julgado, vedada a compensação de tais rubricas. Suspendo, contudo, a exigibilidade dos valores devidos pelo demandante a título de ônus sucumbenciais, nos termos do art. 98, § 3º do CPC, face ao benefício da gratuidade da justiça.

O apelante alega, em síntese: (a) preliminarmente, o cerceamento de defesa, referindo que o pedido de produção de produção de provas foi ignorado pelo juízo; (b) no mérito, a necessidade de reforma da sentença para reconhecimento da atividade especial nos períodos de 08/09/1977 a 11/10/1978, 25/09/1979 a 18/01/1980, 14/07/1982 a 26/11/1986, 01/06/1987 a 15/06/1990, 01/04/1993 a 12/12/1995, 02/09/1996 a 04/11/1998 e 03/05/1999 a 31/05/2005; (c) reafirmação da DER (evento 27, APELAÇÃO1).

Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal. 

É o relatório.

 

VOTO

I- Cerceamento de defesa

Nas razões de apelação, a parte autora aduziu, preliminarmente, a ocorrência de cerceamento de defesa, postulando a anulação da sentença, com retorno dos autos à origem para reabertura da instrução processual.

No presente caso, o pedido de complementação de prova na forma requerida pela parte autora não foi infundado, uma vez que visava garantir a comprovação de seu direito. Todavia, considerando que o conjunto probatório é capaz de demonstrar de forma satisfatória as condições de trabalho vivenciadas pela parte autora junto às empresas em questão, afasto a preliminar aventada.

Importa destacar, outrossim, que o afastamento da alegação de cerceamento de defesa não pressupõe o automático reconhecimento da especialidade do período requerido. O retorno dos autos à origem, quando cabível, justifica-se pela ausência nos autos de documentação suficiente para esclarecer as condições de trabalho vivenciadas pela parte autora. Existindo tal documentação, de que são exemplos os formulários e laudos, não há falar em cerceamento de defesa. Entretanto, se a documentação trazida a exame não corroborar o quanto alegado pela parte autora em relação a determinado período alegadamente laborado sob condições especiais, haverá, na verdade, situação de contrariedade e inconformismo com o resultado alcançado, e não propriamente cerceamento do direito de defesa.

 

II - Análise do Mérito

A sentença recorrida deixou de reconhecer o tempo especial, nos seguintes termos e períodos (evento 14, SENT1): 

Período: 08/09/77 a 11/10/78
Empresa: Calçados Francinos S/A
Fundamento: (a) ausência de formulário  DIRBEN-8030/DSS-8030 preenchido pelo sindicato com base em informações constantes da CTPS do(a) autor(a); (b) cargo de serviços gerais, conforme anotação na CTPS, o que impede a utilização de laudo pericial similar ou, ainda, a realização de prova técnica.

Nas situações em que a CTPS descreve a função desempenhada pela parte como serviços gerais de oficina, não há como valer-se de laudo similar ou da realização de perícia técnica para aferir a especialidade, pois a imprecisão acerca das atividades efetivamente desempenhadas não permite definir, com a necessária segurança, se havia, e por quanto tempo durante o dia, contato com agentes nocivos ou exposição a ruído. Da mesma forma, a prova testemunhal não se presta ao fim pretendido, pois, para além de a função de serviços gerais de oficina, por sua natureza, indicar, prima facie, a ausência de vinculação a uma ou outra atividade dentro da empresa, não há, no mais das vezes, como emprestar suficiente credibilidade a depoimentos prestados por testemunhas que, normalmente, por terem trabalhado nas mesmas funções (ou em funções semelhantes), possuem interesse no resultado da demanda.

Período: 25/09/79 a 18/01/80
Empresa: Indústria de Calçados Schiling Ltda.
Fundamento: (a) ausência de formulário DIRBEN-8030/DSS-8030 preenchido pelo sindicato com base em informações constantes da CTPS do(a) autor(a); (b) cargo de serviços gerais, conforme anotação na CTPS, o que impede a utilização de laudo pericial similar ou, ainda, a realização de prova técnica.

Nas situações em que a CTPS descreve a função desempenhada pela parte como serviços gerais, não há como valer-se de laudo similar ou da realização de perícia técnica para aferir a especialidade, pois a imprecisão acerca das atividades efetivamente desempenhadas não permite definir, com a necessária segurança, se havia, e por quanto tempo durante o dia, contato com agentes nocivos ou exposição a ruído. Da mesma forma, a prova testemunhal não se presta ao fim pretendido, pois, para além de a função de serviços gerais, por sua natureza, indicar, prima facie, a ausência de vinculação a uma ou outra atividade dentro da empresa, não há, no mais das vezes, como emprestar suficiente credibilidade a depoimentos prestados por testemunhas que, normalmente, por terem trabalhado nas mesmas funções (ou em funções semelhantes), possuem interesse no resultado da demanda.

Período: 14/07/82 a 26/11/86

Empresa: Auto Serviço Lindolfo 

Provas: CTPS, perfil profissiográfico previdenciário 

Agente nocivo: ruído de 80 dB(A)

Fundamento: 

formulário DSS-8030/PPP apresenta irregularidades que lhe retiram o fundamento, pois foi preenchido pelo representante legal da empresa em 14/08/2013, todavia, de acordo com a informação contida no site da Secretaria da Fazenda do Estado do Rio Grande do Sul, a empresa está com atividades encerradas desde 28/02/2001 . De outro lado, consta anotação de serviços gerais na CTPS do autor, o que impede a utilização de laudo similar.

Períodos:

01/06/87 a 15/06/9001/04/93 a 12/12/9502/09/96 a 04/11/9803/05/99 a 31/05/2005

Empresa: Eloy Martins ME

Provas: CTPS e perfil profissiográfico previdenciário 

Agente nocivo: ruído de 80 dB(A)

Fundamento:

formulário DSS-8030/PPP apresenta irregularidades que lhe retiram o fundamento, pois foi preenchido pelo sócio da empresa em 28/11/2013 , todavia, de acordo com a informação contida no site da Secretaria da Fazenda do Estado do Rio Grande do Sul, a empresa está com atividades encerradas desde 27/06/2008. De outro lado, consta anotação de serviços serviços gerais na CTPS do autor, o que impede a utilização de laudo.

 

- Períodos de 08/09/1977 a 11/10/1978 e 25/09/1979 a 18/01/1980

O segurado laborou junto às empresas Calçados Francinos e Indústria de Calçados Schiling Ldta, exercendo as funções de Serviços Gerais de Oficina e Serviços Gerias, conforme anotações em sua CTPS (evento 1, CTPS5).

Os PPPs juntados para os períodos foram preenchidos pelo Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias de Calçados de Campo Bom, sob alegação do encerramento das atividades das empresas e desconhecimento do paradeiro de seus representantes (evento 1, PPP6).

Ainda, o autor acostou aos autos laudo de empresa similar, situada na mesma cidade da empresa em que trabalhou (evento 1, LAUDO11).

A sentença merece reparo, haja vista a possibilidade de reconhecimento da especialidade das funções desempenhadas pelo autor como trabalhador da indústria calçadista.

Trabalhadores em indústria calçadista. É de conhecimento amplo que, no setor industrial voltado à produção de calçados, os trabalhadores são frequentemente registrados com denominações genéricas, como auxiliar, ajudante, atendente ou serviços gerais. Contudo, não raras vezes, as tarefas por eles desempenhadas se inserem diretamente nas etapas produtivas do calçado, exigindo atuação manual e contínua nas linhas de montagem e finalização, em ambiente fabril.

Outro ponto que merece atenção é o fato de que a utilização de adesivos é elemento constante nesse tipo de indústria, sendo imprescindível ao processo de confecção dos produtos. Historicamente, tais substâncias adesivas eram compostas por solventes derivados de hidrocarbonetos, que liberavam vapores prejudiciais à saúde dos empregados, expondo-os a riscos significativos em razão da inalação contínua de agentes químicos voláteis.

Embora o uso de colas e adesivos permaneça uma prática corrente, verifica-se, a partir de análises técnicas recentes realizadas em diferentes processos judiciais, que a formulação atual dessas substâncias passou por modificações relevantes. A composição química utilizada nos tempos mais recentes, de modo geral, apresenta índices de toxicidade inferiores aos limites de tolerância previstos nas normas regulamentadoras, não configurando, por si só, fator suficiente para a caracterização da atividade como especial.

Cabe esclarecer, ainda, que o fato de não existir previsão normativa específica para o enquadramento da função exercida por trabalhadores da indústria calçadista não impede, por si só, o reconhecimento do exercício de atividade especial. Tal reconhecimento não se dá com base na categoria profissional, mas sim em razão de uma interpretação consolidada ao longo dos anos, construída a partir da análise de provas técnicas reiteradamente produzidas em processos judiciais semelhantes. Tais provas evidenciam que, em muitos estabelecimentos do setor, o ambiente de trabalho apresenta configuração fabril única, sem barreiras físicas eficazes entre as distintas etapas da produção, de modo que o empregado permanece exposto de forma habitual e permanente a agentes químicos.

Importa salientar que a efetividade de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) passou a ser considerada, para fins previdenciários, apenas a partir de 3 de dezembro de 1998, em decorrência da alteração legislativa introduzida pela Medida Provisória nº 1.729/1998, posteriormente convertida na Lei nº 9.732/1998.

Dessa forma, estando comprovado o exercício de atividades na indústria calçadista em período anterior a tal marco legal, e diante da ausência de elementos técnicos que afastem a exposição nociva aos agentes químicos então utilizados, entendo ser possível o reconhecimento do tempo de serviço como especial, independentemente da apresentação de formulários padrão, desde que não haja prova pericial em sentido contrário.

Assim, dou provimento ao apelo do autor para reconhecer a atividade especial nos períodos de 08/09/1977 a 11/10/1978 e 25/09/1979 a 18/01/1980.

 

- Período de 14/07/1982 a 26/11/1986

O segurado trabalhou na empresa Abastecedora Combustíveis Cairú, no cargo de Serviços Gerais, conforme anotação em sua CTPS (evento 1, CTPS5).

Apresentou PPP emitido em 14/08/2013 (evento 1, PPP7), cuja profissiografia descreve funções relacionadas a atribuições de lavador de veículos e de frentista, conforme segue:

O PPP apresentado possui carimbo da empresa, nome e assinatura de sua representante legal, bem como a observação de que "as anotações na Carteira referente função do funcionário é de serviços gerais, porque não tinham uma função específica, faziam todas as funções. NESTA ÉPOCA A EMPRESA NÃO POSSUÍA NENHUM TIPO DE LAUDO", conforme segue:

A sentença não reconheceu tal documento como meio de prova, referindo que foi preenchido pelo representante legal da empresa em 14/08/2013, todavia, de acordo com a informação contida no site da Secretaria da Fazenda do Estado do Rio Grande do Sul, a empresa está com atividades encerradas desde 28/02/2001 (evento 14, SENT1).

Note-se que o autor refere-se, quanto ao período, que a empresa em que exerceu suas atividades é a Auto Serviço Lindolfo Collor. Da mesma forma, tal denominação consta no PPP juntado. Contudo, na CTPS, a denominação existente é Abastecedora Combustíveis Cairú, com assinatura do empregador Jorge Strassbuger.

A emitente do PPP juntado aos autos para o período chama-se Marcia Luisa Strassburger Wahlbrink

Em consulta, verifica-se que o motivo da baixa da Abastecedora Combustíveis Cairu foi a incorporação, conforme segue:

Assim, considerando os elementos de prova disponíveis, há indícios de que a Abastecedora Combustíveis Cairú foi absorvida por outra empresa, sendo à incorporadora a quem o segurado, possivelmente, recorreu para emissão de seu PPP. Portanto, considero verossímil a comprovação do labor especial a partir das atividades e fatores de risco descritos no PPP, o qual apresenta exposição a graxa e a combustíveis.

Óleos, graxas e hidrocarbonetos. A exposição a hidrocarbonetos aromáticos, como óleos e graxas de origem mineral, é qualitativa, pois se trata de agentes químicos reconhecidamente cancerígenos, conforme a Portaria Interministerial nº 9/2014 e o Anexo 13 da NR-15. A utilização de EPI, ainda que atenue a exposição, não é capaz de neutralizar completamente o risco, conforme decidido pelo TRF4 no IRDR Tema 15. (TRF4, AC 5071483-41.2019.4.04.7000, 10ª Turma , Relatora para Acórdão CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI , julgado em 05/08/2025

Inflamáveis. Atividades que submetem o trabalhador a riscos acentuados em virtude da exposição a inflamáveis são consideradas perigosas. O rol de atividades perigosas é exemplificativo (STJ Tema 534 - REsp 1306113/SC). Exposição Não Ocasional/Intermitente: Inexiste necessidade de exposição durante toda a jornada de trabalho, pois o desempenho de funções em áreas de armazenamento ou manuseio de substâncias inflamáveis denota risco potencial sempre presente, inerente à própria atividade (TRF4). Transporte de Inflamáveis: A atividade de transporte de substâncias inflamáveis também pode ser enquadrada como especial em razão da periculosidade inerente (item 16.6 da NR-16 do Ministério do Trabalho e Emprego). EPI e Periculosidade: Para periculosidade (eletricidade, vigilante, inflamáveis), não se cogita de afastamento da especialidade pelo uso de EPI (TRF4, IRDR Tema 15).(TRF4, AC 5013313-71.2022.4.04.7000, 10ª Turma , Relator para Acórdão LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO , julgado em 05/08/2025)

Assim, dou provimento ao apelo para reconhecimento do tempo especial no período de 14/07/1982 a 26/11/1986.

 

Períodos de 01/06/1987 a 15/06/1990, 01/04/1993 a 12/12/1995, 02/09/1996 a 04/11/1998 e 03/05/1999 a 31/05/2005, 14/07/1982 a 26/11/1986, 

O segurado trabalhou junto à empresa  Eloy Martins ME, no cargo de Serviços Gerais, conforme anotações em sua CTPS (evento 1, CTPS5).

Juntou PPP emitido em 12/09/2016 e firmado pelo representante legal da empresa, no qual consta descrição da atividade laboral de lavagem, lubrificação e higienização interna de veículos. Quanto à exposição a fatores de risco, constam os seguintes agentes: solvente e óleo lubrificante (evento 1, PPP9).

A sentença não reconheceu os períodos, referindo que o PPP foi preenchido em data posterior ao encerramento das atividades da empresa.

Ainda, com intuito de comprovar o labor especial, o autor juntou PPRA e LTCT da empresa Auto Serviço Lindolfo Collor Ltda, no qual consta, para o cargo de lavador, a exposição aos seguintes agentes:

A sentença merece reparo, no ponto.

Da análise dos documentos juntados, apesar da notória dificuldade de produção de provas para períodos mais antigos, entendo que é fidedigna a informação de que o autor laborou nas atividades descritas em seu PPP e exposto a hidrocarbonetos provenientes de lubrificantes veiculares.

Óleos, graxas e hidrocarbonetos. A exposição a hidrocarbonetos aromáticos, como óleos e graxas de origem mineral, é qualitativa, pois se trata de agentes químicos reconhecidamente cancerígenos, conforme a Portaria Interministerial nº 9/2014 e o Anexo 13 da NR-15. A utilização de EPI, ainda que atenue a exposição, não é capaz de neutralizar completamente o risco, conforme decidido pelo TRF4 no IRDR Tema 15. (TRF4, AC 5071483-41.2019.4.04.7000, 10ª Turma , Relatora para Acórdão CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI , julgado em 05/08/2025.

Assim, dou provimento ao apelo para reconhecer o tempo especial nos períodos de 01/06/1987 a 15/06/1990, 01/04/1993 a 12/12/1995, 02/09/1996 a 04/11/1998 e de 03/05/1999 a 31/05/2005.

Conclusão. Provimento total da apelação para reconhecimento do labor especial nos períodos de 08/09/1977 a 11/10/1978, 25/09/1979 a 18/01/1980, 01/06/1987 a 15/06/1990, 01/04/1993 a 12/12/1995, 02/09/1996 a 04/11/1998 e 03/05/1999 a 31/05/2005, 14/07/1982 a 26/11/1986.

 

Da soma do tempo para obtenção do benefício

A implementação dos requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição deverá ser verificada pelo juízo de origem através da liquidação do julgado. Em caso de implantação do benefício, deverá ser observada a hipótese de cálculo que for mais vantajosa ao autor, dentre as que resultarem possíveis.

Na hipótese de concessão de aposentadoria especial / revisão de espécie para fins de concessão de aposentadoria especial, deverá ser observada a tese jurídica fixada pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 709.

 

Benefícios inacumuláveis.

Fica desde logo autorizado o desconto integral, sobre as parcelas vencidas, dos valores eventualmente recebidos, a contar da DIB, a título de benefício inacumulável, nos termos do art. 124 da Lei nº 8.213/1991 e à luz da vedação ao enriquecimento sem causa.

 

Reafirmação da DER

A matéria não comporta maiores digressões, visto que o STJ, em sede recurso repetitivo (Tema 995/STJ), fixou a seguinte tese:

É possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir.

No tocante aos efeitos financeiros:

a) reafirmação da DER durante o processo administrativo: efeitos financeiros a partir da implementação dos requisitos e os juros de mora a partir da citação;

b) implementação dos requisitos entre o final do processo administrativo e o ajuizamento da ação: efeitos financeiros e juros de mora a partir da citação;

c) implementados os requisitos após o ajuizamento da ação: efeitos financeiros a partir da implementação dos requisitos; juros de mora apenas se o INSS não implantar o benefício no prazo de 45 dias da intimação da respectiva decisão, contados a partir desse termo final.

Assim, viável a reafirmação da DER por ocasião da liquidação do julgado, cumprindo à parte autora, em sede de cumprimento de sentença, indicar a data para a qual pretende ver reafirmada a DER de seu benefício de aposentadoria, acompanhada de planilha de contagem de tempo de serviço/contribuição e comprovação da existência de contribuições vertidas após a DER, observada a data desta Sessão de Julgamento como limite para fins de reafirmação.

Registro que somente os recolhimentos sem pendências administrativas podem ser considerados para tal finalidade.

 

III - Consectários, Honorários e Prequestionamento

Consectários. Nas condenações impostas à Fazenda Pública em ações judiciais de natureza previdenciária ou assistencial, as parcelas vencidas, consubstanciadas em obrigação de pagar, sujeitam-se à correção monetária, devida desde o vencimento de cada prestação, e à incidência de juros de mora, a contar da citação, observando-se os seguintes critérios [STF, Temas nºs 810 e 1.170 da Repercussão Geral, e STJ, Tema Repetitivo nº 905]:

[i] a partir da entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009 (07/2009): (a) correção monetária: (a.1) com base na variação do INPC, para benefícios previdenciários; ou (a.2) pelo IPCA-E, em se tratando de benefício de natureza assistencial; e (b) juros de mora: (b.1) 0,5% a.m., entre 07/2009 e 04/2012, de forma simples; e (b.2) a partir de 05/2012, à taxa aplicável à caderneta de poupança, capitalizados de forma simples, observadas as variações estabelecidas no art. 12, II, da Lei nº 8.177/1991, com as alterações promovidas pela Lei nº 12.703/2012; e

[ii] a partir de 12/2021, com o advento do art. 3º da EC nº 113/2021, para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da Taxa SELIC, acumulado mensalmente.

Há de se observar que a Taxa SELIC engloba juros e correção monetária, e, por isso, é incabível sua cumulação com qualquer outro índice. Assim, ao se aplicar a SELIC a título de atualização monetária, tem-se, concomitantemente, a compensação da mora [v.g., STJ, AgRg nos EDcl no AgRg no AREsp 573.927/DF, 4ª Turma, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, DJe 24/04/2018] - o que, de resto, está expresso no art. 3º da EC nº 113/2021.

Em conclusão, a partir de 12/2021, sobre o valor da condenação, incidirá exclusivamente a Taxa SELIC, com o que resta atendida a atualização monetária do principal, devida desde o vencimento de cada prestação, e estarão contemplados os juros de mora.

 

Honorários recursais. Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do CPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do CPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).

Deixo de aplicar a regra do art. 85, §11, do CPC. Isso porque os honorários advocatícios recursais previstos pela nova sistemática do artigo 85, § 11 do Código de Processo Civil de 2015 decorrem não apenas do trabalho adicional posterior à sentença, mas, igualmente, da própria sucumbência da parte em seu pleito recursal. Com efeito, a majoração da verba honorária é estabelecida no intuito de desestimular a interposição de recurso manifestamente improcedente interposto pela parte sucumbente na ação.

Logo, no caso, não tendo havido recurso da parte sucumbente, o percentual da verba honorária deve ser mantida no patamar estipulado pelo juízo de origem, consoante precedente deste Colegiado:

PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. TERMO FINAL. HONORÁRIOS RECURSAIS. [...] 2. Não tendo havido recurso da parte sucumbente, incabível a majoração dos honorários advocatícios prevista no art. 85, §11, do CPC. (TRF4, AC 5026720-13.2018.4.04.9999, 9ª TURMA, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 11/10/2019)

 

Prequestionamento. O enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal é suficiente para efeito de prequestionamento dos dispositivos que as fundamentam junto às instâncias superiores, sendo desnecessária a oposição de embargos de declaração para tal finalidade.

 

Dispositivo

Voto por dar total provimento à apelação do autor.




Documento eletrônico assinado por MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005384609v65 e do código CRC 4fb19a1a.

Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRAData e Hora: 05/11/2025, às 15:41:19

 


 

5000962-67.2021.4.04.7108
40005384609 .V65


Conferência de autenticidade emitida em 12/11/2025 04:09:05.



Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5000962-67.2021.4.04.7108/RS

RELATOR Juiz Federal MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA

EMENTA

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. INDÚSTRIA CALÇADISTA. HIDROCARBONETOS. INFLAMÁVEIS. REAFIRMAÇÃO DA DER. PROVIMENTO DO RECURSO.

 

1. A lei em vigor quando da prestação dos serviços define a configuração do tempo como especial ou comum, o qual passa a integrar o patrimônio jurídico do trabalhador, como direito adquirido.

2. Até 28/04/1995 é admissível o reconhecimento da especialidade do trabalho por categoria profissional; a partir de 29/04/1995 é necessária a demonstração da efetiva exposição, de forma não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde, por qualquer meio de prova. A contar de 06/05/1997 a comprovação deve ser feita por formulário padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica.

3. Comprovado nos autos a exposição da parte autora a agentes nocivos, necessária a reforma da senteça.

4. A exposição a hidrocarbonetos aromáticos (óleos, graxas e combustíveis) em atividades de lavador de veículos e frentista caracteriza tempo especial, sendo a exposição qualitativa e o uso de EPI ineficaz para neutralizar o risco.

5. É possível a reafirmação da DER para o momento em que os requisitos para a concessão do benefício forem implementados, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias.

6. Apelação do autor provida. 

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Central Digital de Auxílio 2 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar total provimento à apelação do autor, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 04 de novembro de 2025.




Documento eletrônico assinado por MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005388709v8 e do código CRC c4953a5a.

Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRAData e Hora: 05/11/2025, às 15:41:16

 


 

5000962-67.2021.4.04.7108
40005388709 .V8


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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO PRESENCIAL DE 04/11/2025

Apelação/Remessa Necessária Nº 5000962-67.2021.4.04.7108/RS

RELATOR Juiz Federal MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA

PRESIDENTE Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS

PROCURADOR(A) JOÃO GUALBERTO GARCEZ RAMOS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Presencial do dia 04/11/2025, na sequência 406, disponibilizada no DE de 22/10/2025.

Certifico que a Central Digital de Auxílio 2, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A CENTRAL DIGITAL DE AUXÍLIO 2 DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR TOTAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO AUTOR.

RELATOR DO ACÓRDÃO Juiz Federal MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA

Votante Juiz Federal MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA

Votante Juíza Federal DIENYFFER BRUM DE MORAES FONTES

Votante Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS

MÁRCIA CRISTINA ABBUD

Secretária



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