
Apelação Cível Nº 5003446-19.2025.4.04.7107/RS
RELATORA Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
RELATÓRIO
Trata-se de ação proposta em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, postulando a concessão do benefício de auxílio por incapacidade temporária ou aposentadoria por incapacidade permanente, desde a Data de Entrada do Requerimento na via administrativa (DER), em 25/08/2021 (NB 6362261317).
Foi juntado o laudo pericial (evento 15).
Sobreveio sentença (evento 25, SENT1) que julgou improcedente o pedido formulado na inicial, nos seguintes termos:
Em face do exposto, julgo improcedente o pedido, resolvendo o mérito forte no art. 487, I, do CPC.
Defiro o benefício da Justiça Gratuita.
Sem honorários dada a ausência de citação.
Custas pela parte autora, ficando a cobrança suspensa em razão da gratuidade da justiça ou, sendo o caso, dispensadas quando incabíveis na espécie (artigo 54 da Lei n.º 9.099/1995 c/c artigo 1º da Lei n.º 10.259/2001).
Na hipótese de interposição de recurso, cite-se a parte ré para apresentar contrarrazões, e, após, remetam-se os autos ao órgão recursal. Suscitada em contrarrazões questão resolvida na fase de conhecimento, intime-se o recorrente para, querendo, manifestar-se a respeito.
Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.
Com o trânsito em julgado, dê-se baixa e arquivem-se os autos.
Apelou a parte autora (evento 34), sustentando que o laudo pericial não tem consonância com a documentação médica acostada ao feito. Aduziu estar em tratamento desde 2004 em virtude de problemas ortopédicos/traumatológicos, sofrendo diariamente com dores agudas e persistentes nas costas. Referiu que o perito em nenhum momento mencionou a patologia gástrica - hepatite viral crônica tipo C (CID B18.2), que pode agravar o quadro funcional de um paciente que também apresenta problemas ortopédicos e traumatológicos. Pediu a realização de nova perícia médica para a correta avaliação da condição de saúde da apelante, por entender ter ocorrido cerceamento de defesa. Teceu considerações acerca do princípio in dubio pro misero. Pontuou que devem ser consideradas suas condições socioeconômicas na análise do pedido. Requereu a reforma do julgado, com a procedência do pedido ou, alternativamente, a anulação da senteça por cerceamento de defesa.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relato.
VOTO
Juízo de Admissibilidade
A(s) apelação(ões) preenche(m) os requisitos legais de admissibilidade.
Da preliminar - cerceamento de defesa
A parte autora sustenta, preliminarmente, ter havido cerceamento do seu direito de defesa em razão de o juiz ter baseado a sentença em laudo incompleto. Refere que o laudo é superficial, e que o perito manifestou-se apenas acerca dos problemas ortopédicos, deixando de analisar outras moléstias de que está acometida.
Observa-se que no laudo administrativo (ev. 2 desta AC, fl. 47) referente ao pedido de concessão de benefício NB 6362261317, além dos problemas ortopédicos, foi referido que a autora é portadora de hepatite viral crônica tipo C (CID B18.2), conforme excerto que reproduzo abaixo:

Todavia, na perícia judicial, realizada por médico ortopedista, nada constou sobre outras patologias que acometem a autora.
O atestado médico juntado pela parte autora, no evento 01 (ATESTMED8), sugere o afastamento das atividades laborativas em razão do conjunto de doenças ortopédica e hepática/viral.
Assim, tendo em conta que a patologia hepática/viral foi levada a conhecimento do INSS, considero que o laudo judicial foi incompleto, havendo dúvida quanto à incapacidade laborativa da parte autora diante do conjunto probatório, de modo que resta configurado o cerceamento de defesa.
Sobre a possibilidade de reabertura da instrução com a necessidade de realização de nova perícia diante de laudo pericial incompleto, este TRF4 já decidiu:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. PERÍCIA JUDICIAL INCOMPLETA. DOENÇA NÃO ANALISADA NO LAUDO PERICIAL. SENTENÇA ANULADA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO. REALIZAÇÃO DE PERÍCIA COM ESPECIALISTA. EXCEPCIONALIDADE. 1. O laudo médico pericial judicial analisou, tão-somente, a existência de eventual incapacidade em relação à doença ortopédica. Deixou, por outro lado, de analisar a eventual existência de incapacidade relativamente às doenças psiquiátrica, cardiológica e outras comorbidades, as quais foram objeto de requerimento e análise administrativos. 2. Havendo dúvida quanto à incapacidade laborativa da parte autora, diante do conjunto probatório, e tendo a sentença baseado-se em laudo judicial incompleto, é de ser dado provimento ao recurso, a fim de ser anulada a sentença, em razão de cerceamento de defesa, para que seja reaberta a instrução com a realização de outra perícia judicial. 3. Embora o entendimento majoritário deste Tribunal seja pela dispensa de médico especialista, tenho que o caso é peculiar e comporta a exceção à regra para que seja realizada perícia médica judicial com especialista na área de psiquiatria. Isto porque quando a perícia judicial não cumpre os pressupostos mínimos de idoneidade da prova técnica, ela é produzida, na verdade, de maneira a furtar do magistrado o poder de decisão (TRF4, AC 5001637-77.2019.4.04.7212, NONA TURMA, Relator JAIRO GILBERTO SCHAFER, juntado aos autos em 22/08/2022). 4. Sentença anulada para que seja reaberta a instrução com a realização de perícia judicial com médico especialista em psiquiatria e cardiologia e, posteriormente, seja proferida nova decisão. (TRF4, AC 5002655-46.2021.4.04.9999, 11ª Turma , Relator ANA CRISTINA FERRO BLASI , julgado em 28/06/2024)
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA E/OU APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. CERCEAMENTO DE DEFESA. PERÍCIA JUDICIAL INCOMPLETA. SENTENÇA ANULADA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO. Havendo dúvida quanto à incapacidade laborativa da parte autora, diante do conjunto probatório, e tendo a sentença baseado-se em laudo judicial incompleto, é de ser dado provimento ao recurso, a fim de ser anulada a sentença, em razão de cerceamento de defesa, para que seja reaberta a instrução com a realização de outras perícias judiciais. (TRF4, AC 5002655-17.2019.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 08/08/2019)
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA OU APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PERÍCIA INCOMPLETA. PROVA PERICIAL POR ESPECIALISTA. SENTENÇA ANULADA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO. Havendo dúvida quanto à incapacidade laborativa da parte autora, diante do conjunto probatório, e tendo a sentença baseado-se em laudo judicial incompleto e que não foi realizado por especialista, é de ser dado provimento ao recurso, a fim de ser anulada a sentença, em razão de cerceamento de defesa, para que seja reaberta a instrução com a realização de perícias judiciais por oncologista ou mastologista. (TRF4, AC 5010578-94.2019.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, juntado aos autos em 28/06/2019)
Embora o entendimento majoritário deste Tribunal seja pela dispensa de médico especialista, entendo que a hipótese dos autos é peculiar e comporta a exceção à regra para que seja realizada perícia médica judicial com especialista na área de hepatologia.
Portanto, acolho a preliminar suscitada pela parte autora para reconhecer o cerceamento de defesa e anular a sentença, devendo os autos retornar à origem para a reabertura da instrução processual e realização de perícias com especialista em hepatologia, e regular prosseguimento do feito.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora para anular a sentença, determinando o retorno dos autos à origem para complementação da instrução.
Documento eletrônico assinado por VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005385396v12 e do código CRC 902a782a.
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Apelação Cível Nº 5003446-19.2025.4.04.7107/RS
RELATORA Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. PERÍCIA JUDICIAL INCOMPLETA. SENTENÇA ANULADA.
I. CASO EM EXAME:
1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedente o pedido de concessão de auxílio por incapacidade temporária ou aposentadoria por incapacidade permanente, sob o fundamento de que o laudo pericial judicial foi incompleto, não analisando todas as patologias da autora.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO:
2. A questão em discussão consiste em saber se houve cerceamento de defesa em razão de o laudo pericial judicial ter sido incompleto, deixando de analisar patologia relevante para a avaliação da incapacidade laborativa da parte autora.
III. RAZÕES DE DECIDIR:
3. O laudo pericial judicial foi considerado incompleto, pois, embora o laudo administrativo e atestado médico da autora indicassem a existência de hepatite viral crônica tipo C (CID B18.2) em conjunto com problemas ortopédicos, a perícia judicial, realizada por ortopedista, não analisou a patologia hepática/viral.4. A omissão na análise de todas as patologias relevantes gerou dúvida quanto à incapacidade laborativa da autora, configurando cerceamento de defesa.5. A jurisprudência do TRF4 corrobora a necessidade de anulação da sentença e reabertura da instrução processual para a realização de nova perícia com especialista, quando o laudo pericial judicial se mostra incompleto e impede a correta avaliação da incapacidade.6. A peculiaridade do caso, com a coexistência de patologias ortopédicas e hepáticas/virais, justifica a realização de perícia com especialista em hepatologia para uma avaliação completa da condição de saúde da segurada.
IV. DISPOSITIVO E TESE:
7. Recurso provido para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem para complementação da instrução processual.Tese de julgamento: 8. A sentença deve ser anulada por cerceamento de defesa quando o laudo pericial judicial for incompleto, deixando de analisar patologias relevantes que podem influenciar a incapacidade laborativa do segurado, especialmente quando há indícios dessas patologias em outros documentos médicos, sendo necessária a reabertura da instrução para nova perícia com especialista.
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Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 487, inc. I; Lei nº 9.099/1995, art. 54; Lei nº 10.259/2001, art. 1º.
Jurisprudência relevante citada: TRF4, AC 5001637-77.2019.4.04.7212, Rel. Jairo Gilberto Schafer, 9ª Turma, j. 22.08.2022; TRF4, AC 5002655-46.2021.4.04.9999, Rel. Ana Cristina Ferro Blasi, 11ª Turma, j. 28.06.2024; TRF4, AC 5002655-17.2019.4.04.9999, Rel. João Batista Pinto Silveira, 6ª Turma, j. 08.08.2019; TRF4, AC 5010578-94.2019.4.04.9999, Rel. Gisele Lemke, 5ª Turma, j. 28.06.2019.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora para anular a sentença, determinando o retorno dos autos à origem para complementação da instrução, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de outubro de 2025.
Documento eletrônico assinado por VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005385397v5 e do código CRC df2757be.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 17/10/2025 A 24/10/2025
Apelação Cível Nº 5003446-19.2025.4.04.7107/RS
RELATORA Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
PRESIDENTE Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
PROCURADOR(A) VITOR HUGO GOMES DA CUNHA
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 17/10/2025, às 00:00, a 24/10/2025, às 16:00, na sequência 1569, disponibilizada no DE de 08/10/2025.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARA ANULAR A SENTENÇA, DETERMINANDO O RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA COMPLEMENTAÇÃO DA INSTRUÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Votante Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Votante Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
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Identificações de pessoas físicas foram ocultadas