
Apelação Cível Nº 5002848-90.2024.4.04.7110/RS
RELATORA Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
RELATÓRIO
Trata-se de ação proposta em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, postulando
a concessão do benefício de auxílio por incapacidade temporária ou aposentadoria por incapacidade permanente, desde a Data de Entrada do Requerimento na via administrativa (DER), em 28/04/2017.
Foi juntado o laudo pericial (evento 11). Laudo complementar acostado no evento 24.
Sobreveio sentença (evento 29, SENT1) que julgou improcedente o pedido formulado na inicial, nos seguintes termos:
DISPOSITIVO
Em face do exposto, julgo improcedente o pedido, resolvendo o mérito forte no art. 487, I, do CPC.
Defiro o pedido de assistência judiciária gratuita.
Quanto a custas e honorários: (1) em se tratando de JEF, isentas as partes (art. 55 da Lei n.º 9.099/1995 c/c art. 1.º da Lei n.º 10.259/2001); (2) em se tratando de procedimento comum, vencida a parte autora, resta condenada ao pagamento de custas e honorários advocatícios na ordem de 10% sobre o valor da causa; a exigibilidade de ambas as verbas fica suspensa em razão da AJG.
Fica a parte autora dispensada do ressarcimento dos honorários periciais adiantados à conta da verba orçamentária da Justiça Federal (artigo 12, parágrafo 1º, da Lei nº 10.259/2001), salvo na hipótese de sobrevir mudança em sua situação econômico-financeira que lhe permita saldá-los, nos termos do artigo 98, parágrafos 2º e 3º do CPC/2015.
Havendo recurso(s), intime(m)-se a(s) parte(s) contrária(s) para apresentação de contrarrazões, no prazo legal, remetendo-se o feito ao órgão recursal competente.
Certificado o trânsito em julgado da ação e não remanescendo quaisquer providências a serem adotadas, arquivem-se os autos
Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.
Apelou a parte autora (evento 35), sustentando que o laudo pericial não levou em consideração a complexidade do quadro psiquiátrico que a acomete, bem como seu contexto social e ocupacional. Pediu seja considerada a prova indiciária e afirmou preencher todos os requisitos legais para a concessão do benefício pleiteado. Requereu a reforma do julgado, com a procedência do pedido, ou, alternativamente, a anulação da sentença e o retorno dos autos à origem, para realização de nova perícia.
Oportunizadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relato.
VOTO
Juízo de Admissibilidade
A apelação preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Restrição da controvérsia
Não estando o feito submetido ao reexame necessário, a controvérsia no plano recursal restringe-se à incapacidade laboral da parte autora.
Do cerceamento de defesa
O autor sustenta ter havido cerceamento do seu direito de defesa, uma vez que foi proferida sentença de improcedência da ação sem a devida análise do pedido de intimação do expert para responder aos quesitos complementares. Requer a nulidade da perícia e a realização de novo laudo por outro expert.
O direito à ampla defesa e ao contraditório é amparado pelo art. 5º, inciso LV da Constituição Federal, sendo nula qualquer decisão que ao contraditório não for submetida.
Caracteriza-se o cerceamento de defesa, quando se cria obstáculo ao litigante, impedindo, então, que este pratique atos que lhe resguardem os interesses na lide, o que não se verifica no caso concreto. As alegações apresentadas pela autora foram objeto de análise na sentença (ev. 29), tendo sido expressamente analisadas na fundamentação e não acolhidas, conforme excerto abaixo transcrito:
Os argumentos expendidos na impugnação não repousam em prova suficiente que possa levar à desconsideração das conclusões periciais. Efetivamente, salvo hipótese em que haja flagrante contrariedade entre o laudo judicial e o quadro clínico do(a) segurado(a), aferíveis no conjunto probatório, o simples fato de haver divergência entre os documentos médicos apresentados pela parte e a conclusão do perito não importa, por si só, na conclusão de a prescrição do médico assistente da parte deva ter maior peso. No caso concreto, não há elementos que permitam a desconstrução da avaliação pericial.
De se destacar que nos termos do art. 370, parágrafo único, do CPC, compete ao juiz da causa determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito, afastando as diligências que entender inúteis ou meramente protelatórias.
Não merece guarida, portanto, a preliminar.
Benefícios por incapacidade laboral
A concessão de benefícios por incapacidade laboral está prevista nos artigos 42 e 59 da Lei nº 8.213/91, verbis:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.
Os benefícios de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença foram tratados pela Emenda Constitucional n.º 103/2019, que instituiu a Reforma da Previdência, como aposentadoria por incapacidade permanente e auxílio por incapacidade temporária, respectivamente. A nova nomenclatura já foi inserida nos artigos 43 e 71 do Regulamento da Previdência Social (Decreto n.º 3.048/99), com a redação dada pelo Decreto n.º 10.410/00.
Da leitura dos artigos acima transcritos, infere-se que são requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a) qualidade de segurado do requerente; b) cumprimento da carência de 12 contribuições, quando necessária; c) incapacidade permanente e insuscetível de reabilitação profissional para o exercício de qualquer atividade laboral (aposentadoria); ou d) incapacidade temporária para o exercício da atividade exercida (auxílio).
Assim, conforme o disposto no art. 59 da Lei n.º 8.213/91, o benefício por incapacidade temporária (auxílio-doença) é devido ao segurado que, havendo cumprido o período de carência, salvo as exceções legalmente previstas, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
A aposentadoria por incapacidade permanente (aposentadoria por invalidez), por sua vez, será concedida ao segurado que, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, sendo-lhe paga enquanto permanecer nessa condição, nos termos do art. 42 da Lei de Benefícios da Previdência Social.
A lei de regência estabelece que a carência exigida para a obtenção desses benefícios é de 12 (doze) contribuições mensais (art. 25, I), salvo nos casos legalmente previstos.
Registra-se que a doença preexistente à filiação ao Regime Geral de Previdência não ensejará a percepção dos benefícios, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença.
Registra-se também que os benefícios de incapacidade são fungíveis, sendo facultado ao julgador (e, diga-se, à Administração), conforme a espécie de incapacidade constatada, conceder um deles, ainda que o pedido tenha sido limitado ao outro. Dessa forma, o deferimento do benefício nesses moldes não configura julgamento ultra ou extra petita.
Acresça, ainda, que o caráter da incapacidade, a privar o segurado do exercício de todo e qualquer trabalho, deve ser avaliado conforme as circunstâncias do caso concreto, uma vez que não se pode olvidar que existem fatores que influenciam na possibilidade de reabilitação do segurado para atividade diversa da exercida, v.g., faixa etária, grau de escolaridade, qualificação profissional.
Caso Concreto
A sentença julgou improcedenteo pedido entendendo que a parte autora não demonstroua incapacidade laborativa para as suas atividades habituais.
Em relação à qualidade de segurado e à carência, inexiste controvérsia, razão pela qual passo ao exame da questão referente à incapacidade.
Nos laudos periciais produzidos judicialmente (eventos 11 e 24), o(a) expert concluiu que a parte autora, embora portadora de Personalidade histriônica (CID F60.4) e Transtorno afetivo bipolar (CID F31), não está incapacitada para o exercício de sua atividade laboral, não fazendo jus ao benefício de auxílio por incapacidade temporária.
Cumpre salientar que a prova se direciona ao magistrado, ao qual incumbe aferir da suficiência do material probatório produzido para a entrega da prestação jurisdicional. Com efeito, o julgador, via de regra, firma sua convicção com base no laudo do expert, embora não esteja jungido à sua literalidade, sendo-lhe facultada ampla e livre avaliação da prova.
O laudo judicial é completo, coerente e não apresenta contradições formais, tendo se prestado ao fim ao qual se destina, que é o de fornecer ao juízo a quo os subsídios de ordem médico/clínica para a formação da convicção jurídica. O quadro apresentado pela parte autora foi descrito de forma satisfatória e clara, demonstrando que foi considerado o seu histórico, bem como realizado o exame físico.
Vale destacar que o perito judicial é profissional de confiança do juízo, que tem por compromisso examinar a parte com imparcialidade. A mera discordância da parte quanto às conclusões periciais, quando os quesitos foram satisfatoriamente respondidos, não tem poder de descaracterizar a prova.
Além disso, os documentos médicos anexados ao feito restaram considerados pelo perito na realização do laudo judicial e não foram suficientes para alterar a conclusão do expert, nem a convicção do julgador.
Logo, não merece acolhida o recurso da parte autora, impondo-se a manutenção da sentença.
Honorários Advocatícios
No que concerne à majoração recursal, ressalte-se que, consoante entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, é cabível quando se trata de "recurso não conhecido integralmente ou desprovido, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente" (STJ, AgInt. nos EREsp. 1539725/DF, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, 2ª S., DJe 19.10.2017), o que foi reafirmado no Tema 1.059/STJ:
A majoração dos honorários de sucumbência prevista no art. 85, § 11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente. Não se aplica o art. 85, § 11, do CPC em caso de provimento total ou parcial do recurso, ainda que mínima a alteração do resultado do julgamento e limitada a consectários da condenação.
Assim, levando-se em conta o trabalho adicional do procurador na fase recursal, a verba honorária fica majorada em 20% sobre o percentual anteriormente fixado, forte no §11 do art. 85 do CPC/2015.
A exigibilidade dessa verba resta suspensa por litigar a autora ao abrigo da gratuidade da justiça.
Custas e Despesas Processuais
Custas pela parte autora, suspensa a exigibilidade do pagamento, em face da gratuidade de justiça, nos termos do artigo 98, § 3º, do CPC.
Prequestionamento
O enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal e a análise da legislação aplicável são suficientes para prequestionar, às instâncias superiores, os dispositivos que as fundamentam. Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração para esse exclusivo fim, o que evidenciaria finalidade de procrastinação do recurso, passível, inclusive, de cominação de multa, nos termos do art. 1.026, §2º, do CPC.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da parte autora, nos termos da fundamentação.
Documento eletrônico assinado por VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005418254v3 e do código CRC 7b31d04e.
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Apelação Cível Nº 5002848-90.2024.4.04.7110/RS
RELATORA Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. INCAPACIDADE LABORAL NÃO COMPROVADA. RECURSO DESPROVIDO.
I. CASO EM EXAME:
1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedente o pedido de concessão de auxílio por incapacidade temporária ou aposentadoria por incapacidade permanente. A parte autora alega cerceamento de defesa e insuficiência do laudo pericial, requerendo a reforma da sentença ou a anulação para nova perícia.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO:
2. Há duas questões em discussão: (i) a ocorrência de cerceamento de defesa pela não análise de quesitos complementares; (ii) a comprovação da incapacidade laboral da parte autora para a concessão do benefício previdenciário.
III. RAZÕES DE DECIDIR:
3. Não houve cerceamento de defesa, pois as alegações da autora foram analisadas e não acolhidas na sentença. A simples divergência entre os documentos médicos da parte e a conclusão do perito não descaracteriza a prova, e compete ao juiz determinar as provas necessárias, conforme o art. 370, p.u., do CPC.4. A incapacidade laboral não foi comprovada, uma vez que os laudos periciais judiciais (eventos 11 e 24) concluíram que a parte autora, embora portadora de Personalidade histriônica (CID F60.4) e Transtorno afetivo bipolar (CID F31), não está incapacitada para o exercício de sua atividade laboral.5. O laudo judicial é completo, coerente e não apresenta contradições formais, tendo sido considerado o histórico da autora e realizado o exame físico. O perito judicial é profissional de confiança do juízo, e a mera discordância da parte quanto às conclusões periciais não descaracteriza a prova.6. A verba honorária foi majorada em 20% sobre o percentual anteriormente fixado, com base no art. 85, § 11, do CPC, e no Tema 1.059/STJ, que prevê a majoração quando o recurso é integralmente desprovido. A exigibilidade da verba resta suspensa por litigar a autora ao abrigo da gratuidade da justiça.
IV. DISPOSITIVO E TESE:
7. Recurso desprovido.Tese de julgamento: 8. A mera discordância da parte com o laudo pericial judicial, quando este é completo, coerente e elaborado por perito de confiança do juízo, não configura cerceamento de defesa nem descaracteriza a prova da ausência de incapacidade laboral para fins de concessão de benefício previdenciário.
___________
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, inc. LV; CPC, art. 370, p.u., e art. 85, § 11; Lei nº 8.213/1991, arts. 42 e 59.
Jurisprudência relevante citada: STJ, Tema 1.059/STJ.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à Apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 10 de novembro de 2025.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 03/11/2025 A 10/11/2025
Apelação Cível Nº 5002848-90.2024.4.04.7110/RS
RELATORA Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
PRESIDENTE Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
PROCURADOR(A) CARMEM ELISA HESSEL
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 03/11/2025, às 00:00, a 10/11/2025, às 16:00, na sequência 655, disponibilizada no DE de 23/10/2025.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATORA DO ACÓRDÃO Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Votante Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Votante Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
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