Teste grátis agora!
VoltarHome/Jurisprudência Previdenciária

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO RURAL. ALUNO-APRENDIZ. RECURSO DESPROVIDO. TRF4. 5002055-28.2022.4.04....

Data da publicação: 19/11/2025, 07:08:55

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO RURAL. ALUNO-APRENDIZ. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME: 1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido de aposentadoria por tempo de contribuição, negando o reconhecimento de tempo rural anterior aos 12 anos de idade e de períodos como aluno-aprendiz. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. Há duas questões em discussão: (i) a possibilidade de reconhecimento de tempo de serviço rural exercido antes dos 12 anos de idade; e (ii) a possibilidade de cômputo de períodos como aluno-aprendiz para fins previdenciários. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. A atividade rural infantil (antes dos 12 anos de idade), em regime de economia familiar, é excepcional e demanda efetiva demonstração de que o trabalho era indispensável à subsistência do grupo familiar, indo além de mero auxílio em atividades secundárias, nos termos do art. 11, inc. VII, § 1º, da Lei nº 8.213/1991. 4. No caso concreto, o pequeno tamanho do imóvel (7,35 alqueires), o grande grupo familiar (11 pessoas) e o fato de o autor estudar em um dos turnos demonstram que seus serviços, embora úteis, não eram essenciais ou vitais para a subsistência da família, não configurando a indispensabilidade exigida. 5. Para o cômputo de tempo como aluno-aprendiz em escola pública profissional, a Súmula 96 do TCU e a jurisprudência do STJ (REsp n.º 396.426/SE) e da TNU (Tema 216) exigem a comprovação de retribuição pecuniária (direta ou indireta) à conta do orçamento, a título de contraprestação por labor na execução de bens e serviços destinados a terceiros. 6. As certidões das instituições de ensino foram omissas quanto à execução de bens e serviços destinados a terceiros, e o depoimento do autor sobre a venda de excedente não supre a ausência de prova material ou testemunhal idônea de que as atividades práticas eram voltadas à geração de receita e não meramente pedagógicas. IV. DISPOSITIVO E TESE: 7. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. O reconhecimento de tempo de serviço rural exercido por menores de 12 anos, em regime de economia familiar, exige a comprovação de que o labor era indispensável à subsistência do grupo familiar, não bastando o mero auxílio em atividades secundárias. 2. Para o cômputo de tempo como aluno-aprendiz em escola pública profissional, é indispensável a comprovação de retribuição pecuniária (direta ou indireta) à conta do orçamento, a título de contraprestação por labor na execução de bens e serviços destinados a terceiros. ___________Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 485, inc. IV e VI, 487, inc. I, e 85, §§ 2º, 8º e 11; Lei nº 9.289/1996, art. 4º, inc. I; Lei nº 8.213/1991, arts. 11, inc. VII, § 1º, e 55, §§ 2º e 3º; Decreto nº 3.048/1999, art. 127, inc. V; Lei Complementar nº 11/1971, art. 3º, § 1º, alínea "b"; Decreto-Lei nº 4.073/1942; Decreto-Lei nº 8.590/1946; Lei nº 3.552/1959; Lei nº 6.226/1975; CF/1988, art. 40.Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 506.959/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, j. 10.11.2003; STJ, REsp n.º 1.321.493/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, 1ª Seção, j. 10.10.2012; STJ, Súmula 149; STJ, Súmula 577; STJ, AgRg no AREsp 320558/MT, j. 21.03.2017; TRF4, Súmula 73; TNU, PUIL 5008955-78.2018.4.04.7202, Rel. Juiz Federal Jairo da Silva Pinto, j. 23.06.2022 (Tema 219); TNU, Súmula 05; TRF4, AC 5019497-72.2019.4.04.9999, Rel. Márcio Antônio Rocha, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, j. 22.11.2021; TRF4, AC 5023746-32.2020.4.04.9999, Rel. Márcio Antônio Rocha, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, j. 22.02.2022; TNU, Súmula 34; TRF4, AC 5002542-30.2019.4.04.7003, Rel. Márcio Antônio Rocha, DÉCIMA TURMA, j. 10.12.2020; STF, RTJ 47/252; TCU, Súmula 96; STJ, REsp n.º 396.426/SE, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 6ª T., j. 02.09.2002; TCU, ACÓRDÃO N.º 4522/2010, Rel. Min. José Jorge, 1ª Câmara, j. 20.07.2010; TRF4, AC 5014520-83.2019.4.04.7009, Rel. Márcio Antônio Rocha, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, j. 29.06.2022; TNU, Tema 216. (TRF 4ª Região, 10ª Turma, 5002055-28.2022.4.04.7012, Rel. LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, julgado em 11/11/2025, DJEN DATA: 12/11/2025)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Avenida Anita Garibaldi, 888 - 6º andar, Gabinete do Des. Federal Penteado - Bairro: Cabral - CEP: 80540-901 - Fone: (41)3210-1774 - www.trf4.jus.br - Email: gpenteado@trf4.jus.br

Apelação Cível Nº 5002055-28.2022.4.04.7012/PR

RELATOR Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

RELATÓRIO

Trata-se de ação em que a parte autora objetiva a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de tempo urbano, como segurado especial e aluno-aprendiz.

Sentenciando, o MM. Juiz julgou o pedido, nos seguintes termos:

Diante do exposto, reconheço a falta de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido do processo no que se refere aos pedidos de reconhecimento de atividade especial dos períodos de 01/06/2012 a 30/06/2012, cuja contribuição foi recolhida abaixo do mínimo legal e, nos termos do art. 485, inciso IV, do CPC c/c Tema 629, do e. STJ, JULGO EXTINTO o processo sem resolução de mérito.

Outrossim, reconheço a falta de interesse processual do autor em relação ao reconhecimento e averbação do período de 21/12/1992 a 11/03/2003 e, quanto a esse pedido, JULGO EXTINTO o processo sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, inciso VI, do CPC.

Por outro lado, com fulcro no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão veiculada na petição inicial, para o fim de:

a) DECLARAR ter a parte autora laborado em atividade rural, como segurado especial, nos intervalos de 07/10/1971 a 07/03/1975, 21/12/1975 a 29/02/1976, 23/12/1976 a 06/03/1977, 31/12/1977 a 06/03/1978, 17/12/1978 a 06/03/1979, 15/12/1979 a 10/03/1980 e 14/12/1980 a 31/12/1980; a.1) CONDENAR o INSS a proceder a averbação dos referidos intervalos, podendo ser utilizado para todos os fins, inclusive benefício futuro, exceto carência;

b) DECLARAR ter o autor direito de computar como tempo de contribuição e carência os períodos relativos a GFIP's extemporâneas, de 01/01/2007 a 31/01/2007 e 01/07/2007 a 31/07/2007; b.1) CONDENAR o INSS a averbar tais intervalos nos seus respectivos termos;

c) DECLARAR o direito do autor em ter computado como tempo de contribuição e carência, o período recolhido como segurado facultativo, de 02/06/2021 a 30/11/2021; c.1) CONDENO o INSS a averbar esse intervalo, nos seus respectivos termos;

d) CONDENO o INSS, ainda, a inserir no CNIS do autor, no registro alusivo ao vínculo mantido com a Secretaria de Estado da Educação e do Esporte, o termo final do aludido contrato de trabalho como sendo 11/03/2005.

e) Diante da sucumbência recíproca e por considerar que o proveito econômico in casu é inestimável, CONDENO o réu ao pagamento dos honorários advocatícios aos ilustres Procuradores do autor, os quais, sopesados os critérios legais estabelecidos no art. 85, §§ 2º e 8º, fixo por apreciação equitativa em R$ 10.000,00 (dez mil reais). Da mesma forma, CONDENO o autor ao pagamento de honorários advocatícios ao procurador do INSS, os quais fixo, também por apreciação equitativa, em R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

Custas processuais pro rata, ficando o INSS isento do pagamento, por força do art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96.

O cumprimento da presente sentença estará sujeito ao seu trânsito em julgado. Tornando-se definitiva esta decisão o INSS deverá proceder as averbações a que foi condenado.

Sentença não sujeita ao reexame necessário (art. 496, I, CPC/2015), mormente porque não abrange pagamento de quaisquer valores e ainda que se considerasse o valor dado à causa (R$ 95.127,72), é muito inferior ao máximo legal.

(...)

Apela o autor, defendendo o reconhecimento do período rural anterior aos 12 anos de idade (07/10/1967 a 06/10/1971). Afirma que o conjunto probatório demonstra o efetivo desempenho do labor rurícola pelo recorrente antes dos 12 anos. Ainda, pleiteia o reconhecimento dos períodos de 08/03/1975 a 20/12/1975, 01/03/1976 a 22/12/1976 e 07/03/1977 a 30/12/1977 (Escola Estadual Técnica Agrícola Desidério Finamor), bem como de 07/03/1978 a 16/12/1978, 07/03/1979 a 14/12/1979 e 11/03/1980 a 13/12/1980 (Colégio Agrícola de Concórdia) em que foi aluno-aprendiz. Alega que o elemento essencial à caracterização do tempo de serviço como aluno-aprendiz não é a percepção de vantagem direta ou indireta, mas a efetiva execução do ofício para o qual recebia instrução, mediante encomendas de terceiros. No depoimento pessoal, ressaltou "que essas Escolas Técnicas produziam muito para vender a terceiros como, por exemplo, porcos, milho, soja, feijão, galinha; que eram os alunos que cuidavam das granjas de galinhas e porcos; que a renda obtida com a venda desses produtos era destinada para os próprios colégios". Assim, requer o cômputo de tais períodos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição. Caso necessário, pretende a reafirmação da DER.

Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

 

CONSIDERAÇÕES GERAIS - TEMPO DE SERVIÇO RURAL

O aproveitamento do tempo de atividade rural exercido até 31/10/1991, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência, está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, §2º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/99.

Outrossim, o cômputo do tempo de serviço rural exercido no período anterior à Lei n.º 8.213/91, em regime de economia familiar e sem o recolhimento das contribuições, aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da lei previdenciária (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10/11/2003).

A comprovação do exercício do trabalho rural pode ser feita mediante a apresentação de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, quando necessária ao preenchimento de lacunas - não sendo esta admitida, exclusivamente, nos termos do art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91, bem como da Súmula nº 149 do STJ e do REsp nº 1.321.493/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, j. 10/10/2012, DJe 19/12/2012 (recurso representativo da controvérsia).

Importa, ainda, salientar os seguintes aspectos: (a) o rol de documentos constantes no art. 106 da Lei de Benefícios, os quais seriam aptos à comprovação do exercício da atividade rural, é apenas exemplificativo; (b) não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, sendo suficientes documentos que, juntamente com a prova oral, possibilitem juízo conclusivo quanto ao período de labor rural exercido (AREsp 327.119/PB, j. em 02/06/2015, DJe 18/06/2015); (c) certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora (REsp n.º 1.321.493-PR, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos); (d) É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório (Súmula 577/STJ (DJe 27/06/2016); (e) a prova material juntada aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o período posterior à data do documento, desde que corroborado por prova testemunhal (AgRg no AREsp 320558/MT, j. em 21/03/2017, DJe 30/03/2017); e (f) é admitido, como início de prova material, nos termos da Súmula 73 deste Tribunal, documentos de terceiros, membros do grupo parental.

CASO CONCRETO

Atividade rural:

Em relação ao período rural anterior aos 12 anos de idade, adoto os próprios fundamentos da sentença como razões para decidir:

A parte autora pretende o reconhecimento e averbação de tempo de serviço rural dos períodos intercalados com tempo em que foi aluno-aprendiz, quais sejam, de 07/10/1967 (8 anos de idade) a 07/03/1975, 21/12/1975 a 29/02/1976, 23/12/1976 a 06/03/1977, 31/12/1977 a 06/03/1978, 17/12/1978 a 06/03/1979, 15/12/1979 a 10/03/1980 e 14/12/1980 a 31/12/1980, na condição de segurado especial, cujas atividades teriam sido desenvolvidas na região do município de São José do Ouro/RS.

De acordo com a orientação jurisprudencial, "é possível o cômputo do tempo de serviço rural exercido por pessoa com idade inferior a 12 (doze) anos na época da prestação do labor campesino" (PUIL 5008955-78.2018.4.04.7202, Rel. Juiz Federal Jairo da Silva Pinto, j. 23/06/2022 - Representativo de Controvérsia - Tema 219).

É importante destacar que a Súmula 05 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, admite que "A prestação de serviço rural por menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser reconhecida para fins previdenciários", sendo que no caso dos autos a parte autora completou 12 (doze) anos de idade em 07/10/1971.

Não se nega que em períodos pretéritos era comum que crianças acompanhassem seus pais na lavoura, notadamente no regime de economia familiar, muito em virtude da impossibilidade de deixá-las sozinhas em casa quando ambos tinham atividades a serem exercidas na propriedade. Contudo, pela pouca idade, os relatados serviços a que a criança era encarregada limitavam-se a atividades periféricas, de auxílio mínimo, prescindíveis à conclusão do serviço pelos genitores. No dizer do e. Desembargador Federal Márcio Antônio Rocha (AC 5019497-72.2019.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator para Acórdão MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 22/11/2021), o acompanhamento do filho menor no trabalho rural dos pais se dava muitas vezes "...como parte da relação pais/filhos, na qual se inclui outros objetivos legítimos como de cuidado, companheirismo, transferência de valores familiares, sociais e de trabalho...".

É o que ocorre de forma semelhante com as crianças residentes na zona urbana em relação ao trabalho de casa. Não é incomum que no transcurso do desenvolvimento as crianças recebam tarefas progressivamente mais complexas relacionadas aos afazeres do lar. Tal atividade, contudo, não se confunde com o trabalho reconhecido para fins previdenciários, não se equiparando a um trabalhador doméstico.

A rigor, em situações normais, as atividades eventualmente exercidas por crianças em auxílio aos pais possuem um viés familiar inclusivo, ligado à educação dos filhos e o ensino de uma competência compatível com a idade.

Não se nega que existem situações excepcionais, em que de fato há evidências de exploração do trabalho infantil, cujos pais devem ser responsabilizados criminalmente.

Tais situações, porém e como referido, são excepcionais e por isso devem ser efetivamente comprovadas nos autos, não sendo possível aplicar a presunção do labor rurícola desde os 07, 08, 09 ou até mesmo 10 anos de idade tal como ocorre em relação ao trabalho do adolescente a partir dos 12 anos, quando biologicamente já possui condições mínimas de prestar auxílio produtivo ao trabalho dos pais.

Há de se ressaltar, que nos termos do art. 11, inc. VII, § 1º, da Lei 8.213/91, o regime de economia familiar, intrínseco à qualidade de segurado especial, exige que o labor rural seja indispensável ou minimamente relevante para a subsistência do grupo familiar.

Em julgamento mais recente também pela e. Turma Regional Suplementar do Paraná do TRF da 4° Região, em que foi relator o mesmo e. Desembargador Federal Márcio Antônio Rocha, além de repetir e reafirmar o argumento transcrito anteriormente, extrai-se a seguinte fundamentação que corrobora a impossibilidade de reconhecimento da atividade rural antes dos 12 anos"...Repisa-se aqui que não se desconhece a possibilidade excepcional de se reconhecer a existência de labor rural anterior aos 12 anos de idade quando há indubitável prova material da ocorrência do trabalho e da sua indispensabilidade, como é o caso, p. ex., de registro hígido em CTPS...". (AC 5023746-32.2020.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 22/02/2022).

Ocorre que para comprovação da condição de trabalhador rural, em sentido próximo ao atual segurado especial, a Lei Complementar nº 11/71, exigia o exercício de trabalho rural, individualmente ou em regime de economia familiar, assim entendido aquele em que o trabalho dos membros da família fosse indispensável à própria subsistência e seja exercido em condições de mútua dependência e colaboração (art. 3º, § 1º, alínea "b").

Assim, mesmo que a jurisprudência aceite o reconhecimento do trabalho rural desde a infância, para tanto deve ficar comprovado que as atividades desenvolvidas pelas crianças e adolescentes dentro do grupo familiar iam além de um mero auxílio nas atividades cotidianas, apenas em meio período, mas que elas exerciam um trabalho indispensável e de dependência em relação aos demais membros da família, como exige a lei previdenciária.

Desta forma, o reconhecimento de atividade rural infantil, trata-se de situação excepcional que demanda efetiva demonstração do trabalho e, mesmo com as restrições físicas intrínsecas a infância, que aquele seria indispensável a subsistência do grupo familiar, não sendo suficiente para seu enquadramento previdenciário o mero auxílio em atividades secundárias por restrito período.

Superada essa questão, como início de prova material contemporâneo ao período que objetiva reconhecimento (Súmula 34 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais) apresentou, na via administrativa, os seguintes documentos, ficando claro desde logo que poderá ser relacionado apenas um documento por ano e aqueles cujas datas estejam fora do(s) intervalo(s) acima fixado(s) não serão listados e nem considerados como prova, exceto os comprovantes de posse ou propriedade de imóveis rurais onde o trabalho tenha se desenvolvido como, por exemplo, contratos de compra e venda, escrituras públicas, transcrições e matrículas imobiliárias, os quais muitas vezes são muito anteriores ao intervalo cujo reconhecimento e averbação pretende:

a) autodeclaração do segurado especial, datada de 16/11/2021, da qual consta exercício de atividade rural de 07/10/1967 a 31/12/1980, na situação de regime de economia familiar e condição de parceiro com o pai, na propriedade denominada Santo Expedito, localizada no município de São José do Ouro/RS, com área total de 17,8 hectares (7,35 alqueires), cujo grupo familiar era composto pelos pais (Fortunato João Dambrós e Ceícilia Tomielo) e os irmãos Antônio Dambrós e Zeli Dambrós (evento 1, PROCADM28, telas 86/88);

b) certidão do INCRA informando que o imóvel descrito na letra "a" permaneceu cadastrado em nome do pai do autor no período de 1966 a 1992 (evento 1, PROCADM28, tela 90);

c) contribuição sindical recolhida pelo seu pai em favor do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de São José do Ouro, na qual ele foi classificado como trabalhador rural em regime de economia familiar, referente exercício de 1968 (evento 1, PROCADM29, tela 1);

d) contribuição sindical rural feita pelo pai do autor referente exercício de 1971, alusiva ao imóvel descrito na letra "a" (evento 1, PROCADM29, tela 2);

e) duplicata emitida pelo pai do autor em 13/05/1971, em favor da S/A Cachoierense de Fertilizantes, com vencimento para 15/01/1972 (evento 1, PROCADM29, tela 3);

f) correspondência datada de 21/07/1971, expedida pelo Ministério da Agricultura ao pai do autor, informando sobre a campanha nacional contra a Febre Aftosa (evento 1, PROCADM29, tela 4);

g) declaração de rendimentos do pai do autor, referente exercício 1975, ano-base 1974, informando como endereço o distrito de Santo Expedito, município de São José do Ouro, como grupo familiar os pais e os irmãos Zeli e Fátima, além do próprio autor, declarando como bens o imóvel descrito na letra "a" (evento 1, PROCADM29, tela 5);

h) correspondência sem data, expedida pelo Ministério da Agricultura ao pai do autor, informando sobre a campanha nacional contra a Febre Aftosa que realizar-se-ia nos meses de janeiro, maio e setembro de 1974 (evento 1, PROCADM29, tela 6);

i) comprovante de quitação de dívida expedido pela Cooperativa Agrícola Mista Lagoense Ltda., em nome do pai do autor, datado de 06/11/1975, contendo informação de endereço no local denominado Santo Expedito (evento 1, PROCADM29, tela 4, tela 7);

j) atestado de pobreza fornecido em nome do pai do autor, datado de 02/02/1976, informando como local de residência a Encruzilhada da Vitória, Santo Expedito, São José do Ouro (evento 1, PROCADM29, tela 8);

k) certificado de inscrição no cadastro rural expedido em nome do pai do autor, referente competência 01/1976, informando como residência o local de Santo Expedito (evento 1, PROCADM29, tela 9);

l) declaração para cadastro de imóvel rural firmada pelo pai do autor, datada de 14/04/1978, informando residência no Distrito de Santo Expedito (evento 1, PROCADM29, telas 10/13);

m) recibo expedido pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de São José do Ouro em nome do pai do autor, datado de 14/10/1980, referente pagamento de taxa de expediente (evento 1, PROCADM29, tela 14);

n) carteirinha do Funrural expedida em favor do pai do autor, datada de 17/06/1981 (evento 1, PROCADM29, telas 15/16).

Na fase judicial, no decorrer da tramitação processual o autor juntou:

o) seu histórico escolar, fornecido pela Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Santo Expedito do Sul/RS, informando que de 1966 a 1968 e nos anos de 1970 e 1972 o autor estudou na Escola Rural Cristiano Kern, em São José do Ouro (evento 19, HIST_ESC4);

p) documentação escolar do autor, referente ano de 1973, da qual extraem-se as seguintes informações: que estudou na Unidade de Ensino Escola Rural Cristiano Kern; endereço residencial na Seção Kern, município de São José do Ouro; pai qualificado como agricultor; tipo de tarefa que executa: trabalho de roça; responsabilidade na manutenção da família: nenhuma (evento 19, HIST_ESC5, telas 1/4).

Anoto que a CTPS do autor foi expedida em 09/01/1981, em local não determinado, com primeiro registro em 16/02/1987, na função de Professor - LC, junto à Secretaria de Estado da Educação do Paraná (evento 1, PROCADM29, telas 23/24, págs. 6 e 12 da carteira de trabalho)

A prova material deve ser analisada dentro do contexto sócio econômico em que estão insertos os trabalhadores rurais: pessoas simples, de pouca ou nenhuma instrução, que trabalham grande parte da vida no campo. Assim, não se há de exigir deles vasta prova documental, sendo que os documentos apresentados em nome de terceiros (pai, filho, marido, esposa, irmão) são hábeis à comprovação do trabalho rural desenvolvido pelos outros membros do grupo familiar (Súmula 73 do e. TRF 4ª Região).

Em 08/08/2023 realizou-se audiência (evento 86, TERMOAUD1) na qual foi tomado o depoimento do autor e inquiridas 3 testemunhas (Ilide Salete Baggio dos Santos, Adélio Tomielo e Ademir Fortuna). Nessa oportunidade ele informou que: "...começou a trabalhar na roça por volta dos seus 7 ou 8 anos de idade, no município de São José do Ouro/RS, em propriedade pertencente aos seus pais, que tinha 17 hectares; essa era a única propriedade da família e era explorada diretamente por seus membros; sua família era composta pelo autor, seus pais e oito irmãos; que o autor era o filho do meio dentre os irmãos; trabalhavam nessa propriedade todos os membros da família, sendo que nenhum tinha outra atividade que não fosse a rural; à medida que os irmãos foram ficando mais velhos foram saindo de casa; que não arrendavam terras de terceiros; que viviam do que era produzido nessa propriedade; que não tinham renda de outra atividade; que exploravam a propriedade cultivando mandioca, batata, feijão, arroz, milho, parreira de uva; que também criavam animais para o consumo da família como porcos, galinhas e gado de leite; que costumavam vender o excesso de produção, especialmente milho ou porcos; que os serviços na propriedade eram feitos de forma manual, com ajuda de animais (cavalos de tração), já que não tinham maquinários agrícolas; que não tinham empregados e nem contratavam mão-de-obra de terceiros; que nas colheitas costumavam trocar dias de serviço com vizinhos, por meio de mutirões; que enquanto trabalhava no meio rural frequentava a Escola Cristiano Kern, notadamente no ensino primário e supletivo, tendo estudado no período de dia; que quando estudava mesmo assim ajudava na propriedade no contra-turno; que suas atribuições consistiam em cuidar da horta, tratar das galinhas, dos porcos; que se não fizesse aqui que lhe era determinado, algum outro membro da família fazia um esforço maior e fazia; que eventualmente trabalhava fora do horário para cumprir eventual tarefa não realizada quando devia ser feita; que trabalhou na roça até quando se formou em agronomia, porque seus pais moravam no local, em até 1985/1986, mas no dia a dia mesmo trabalhou até 1980, quando tinha 21 anos de idade; que frequentou a Escola Estadual Técnica Agrícola Desidério Finamor, em Lagoa Vermelha/RS de 1975/1977 a depois o Instituto Federal Catarinense - Campus de Concórdia/SC de 1978/1980; que nas férias dessas escolas ia para a casa dos pais e nesses períodos ajudava nos serviços da propriedade; que essas Escolas Técnicas produziam muito para vender a terceiros como, por exemplo, porcos, milho, soja, feijão, galinha; que eram os alunos que cuidavam das granjas de galinhas e porcos; que a renda obtida com a venda desses produtos era destinada para os próprios colégios; que o autor nunca recebeu nenhum valor em dinheiro pelos serviços prestados nesses Escolas Técnicas; que davam graças a Deus de não precisar pagar, já que tratavam-se de colégios públicos; que não pagava mensalidades; que em ambas era regime de internato, inclusive finais de semana; em Lagoa Vermelha saía nos finais de semana, já que ficava no mesmo município aonde os pais moravam; em Santa Catarina já era mais difícil, só quando conseguia carona. (...): enquanto estudou no colégio primário, tinha atribuições como ajudar dos porcos, embora não fossem muitos, cuidar das galinhas e horta; que gostava desse tipo de serviço; que também ajudava em outras coisas da propriedade."

primeira testemunha relatou que: "...conhece o autor desde criança, já que moravam perto, no município de Santo Expedito, que pertencia a São José do Ouro/RS; que eram vizinho de propriedade, tendo uma distância de cerca de 500 metros de uma casa na outra; que a família do autor tinha uma propriedade de 17 a 20 hectares; que a família era composta pelo autor, seus pais e 8 irmãos; que era a família que explorava a propriedade, cultivando mandioquinha, feijão, soja, milho; que eles também criavam animais para consumo como porcos, galinhas, gado de corte e de leite, para o gasto da família; que não arrendavam terras para terceiros; que nenhum membro da família exercia outra atividade que não fosse a rural; que nenhum membro da família exercia atividade na cidade; que eles viviam do que era produzido na propriedade; que não tinham empregados; que  a família dava conta dos serviços; que não tinham maquinário agrícola, apenas trilhadeira para debulhar milho e soja; que já presenciou o autor fazendo os seguintes serviços na propriedade lavrava com junta de boia, puxava milho com a carroça com junta de boi; que em casa ajudavam em tudo, cortar lenha, faziam vinho, vinagre, todos ajudavam "parelho"; que mesmo estudando o autor ajudava nos serviços da propriedade no contra-turno; que o autor saiu primeiro do local, quando tinha 25 anos aproximadamente; que tem conhecimento que o autor estudava em Escola Técnica em Lagoa Vermelha e que nas férias ajudava na propriedade; que sempre morou com o pai e a mãe ele ia para a casa dos pais e ajudava nos serviços da propriedade; que quando vinha das férias no Colégio em Concórdia/SC, também ajudava direto na propriedade; que a depoente não viu mais o autor trabalhando na roça a partir dos seus 25 anos de idade (do autor); que ao sair da região em que eram vizinhos, o autor e sua família foram para Caxias do Sul/RS. (...): que o autor iniciou o trabalho na roça com cerca de 8 anos de idade; que na época o serviço era feito normalmente, lavrava, carpia, limpava na mão, na enxada."

segunda testemunha, por sua vez, referiu que: "...conhece o autor desde muito pequeno, já que moravam perto um da casa do outro, no município de São José do Ouro/RS; que a família do autor tinha uma propriedade de cerca de 17 hectares; que a família era composta pelo autor, seus pais e 8 irmãos; que era a família que explorava a propriedade, cultivando trigo, milho, feijão, arroz, batata-doce, parreiral de uvas e seu pai fazia vinho; que eles também criavam animais para consumo como porcos, galinhas, gado de leite e junta de bois para o serviço; que não arrendavam terras de terceiros; que nenhum membro da família exercia outra atividade que não fosse a rural; que somente depois que cresceram e saíram para estudar que foram para outra atividade; que até os 18 anos era tudo na roça; que eles viviam do que era produzido na propriedade; que não tinham empregados; que costumavam trocar dias de serviço com vizinhos; que não tinham maquinário agrícola; que já presenciou o autor fazendo os seguintes serviços na propriedade: capinar na roça, cuidar dos porcos, iam limpar o parreiral e preparar para poda e vários outros serviços; que o autor estudava no período do dia até a quinta série e à tarde ia para a roça; que estudou durante 2 anos à noite e depois foi para a Escola Agrícola, com 15/16 anos e quando vinha nas férias, ajudava nos serviços da propriedade; que os pais do autor saíram da localidade por volta de 1995; que o autor ficou até os 18 anos no colégio em Lagoa Vermelha e depois em Concórdia e vinha nas férias e ajudava na propriedade; que depois ele foi para o Rio de Janeiro, onde foi fazer Agronomia e Ciências Agrícolas e a partir daí trabalhava apenas nas férias e depois ficou mais difícil; que o autor saiu para estudar no Rio de Janeiro quando tinha cerca de 21 anos; que o depoente morou na região até o ano de 1999. (...): que o autor começou a trabalhar com 8 anos; que nessa idade já estava na roça; que nessa época ele capinava, limpava o parreiral, ajudava a tratar os porcos, ajudava a tirar leite."

terceira testemunha, por fim, reportou que: "...conheceu o autor na infância, já que estudavam no mesmo colégio, sendo vizinhos de terras, no município de São José do Ouro, atualmente Santo Expedito do Sul/RS; que eles tinham plantação de milho, feijão, soja, parreira de uvas, arroz, vacas de leite para o gasto, junta de boia para lavrar; que a propriedade tinha cerca de 17/18 hectares de terras; que viviam do que era produzido nessa propriedade, não tendo outra fonte de renda; que o autor trabalhou até 1975 ou 1976 nessa propriedade, tendo ido para Lagoa Vermelha, estudar no Colégio Agrícola; que nos finais de semana ia para o sítio e ajudava os pais na propriedade; que na segunda de manhã pegava o ônibus e ia de volta para a Escola; que depois de Lagoa Vermelha ele foi estudar em Concórdia; que corrigindo, informa que foi estudar em Chapecó/SC; que quando o autor passou a estudar em Chapecó/SC o depoente foi para Caxias do Sul e não acompanhou mais as atividades do autor na propriedade dos pais."

Neste passo, é importante lembrar que a prova da atividade rural se faz mediante razoável princípio de prova material corroborado por prova testemunhal idônea, sendo incabível prova eminentemente testemunhal, conforme a lei (art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91) e a jurisprudência (Súmula nº 149, do STJ).

Veja-se que o autor pretende reconhecer como atividade rural tempo ligeiramente superior a 8,5 anos (de 07/10/1967 (8 anos de idade) a 07/03/1975, 21/12/1975 a 29/02/1976, 23/12/1976 a 06/03/1977, 31/12/1977 a 06/03/1978, 17/12/1978 a 06/03/1979, 15/12/1979 a 10/03/1980 e 14/12/1980 a 31/12/1980), tendo juntado documentos válidos para praticamente todos os períodos, exceto para os anos de 1969, 1977 e 1979. Essa documentação deve ser considerada razoável princípio de prova material.

No que se refere à prova testemunhal, ela há de ser considerada idônea, à medida que as informações colhidas são coerentes entre si e com aquelas prestadas pelo autor. Tendo a terceira testemunha afirmado que o autor foi estudar em Chapecó, este é o único ponto discordante com aquilo que as demais se referiram, já que efetivamente ele não foi para essa cidade, mas para Concórdia. Contudo, esse é um detalhe que não prejudica o conjunto probatório, haja vista que todo o restando do conteúdo é favorável, uma vez que se reportaram ao local em que o autor morava e trabalhava, a quem pertencia a propriedade, a composição do grupo familiar, os serviços realizados, os produtos cultivados e o início e o fim das atividades do autor no meio rural.

Entretanto, a atividade rural anterior aos 12 anos não deve ser reconhecida para fins previdenciários, eis que ela não se mostra, na hipótese dos autos, como imprescindível. Veja-se que além do imóvel no qual o autor e sua família trabalhavam ser pequeno (7,35 alqueires), o grupo era composto por 11 pessoas (pais e 9 irmãos) e ele estudava num dos turnos durante o dia, numa demonstração clara que seus serviços, embora úteis, não se mostravam essenciais. Se assim o fossem, certamente não teria podido estudar, mas dedicaria-se exclusivamente ao trabalho no campo. Não que isso fosse desejável. Trata-se apenas de um raciocínio para constatar que o trabalho do autor, ainda que - como de qualquer outra pessoa - pudesse ser útil, ele não era vital a ponto de ser reconhecido para fins previdenciários. Veja-se que o ponto central do reconhecimento da atividade rural dos menores de 12 anos é que ela seja indispensável para o desenvolvimento socioeconômico do grupo e que efetivamente representasse um importante elo na denominada mútua dependência e colaboração, uma das mais importantes características do regime de economia familiar conceituado no §1º, do art. 11, da Lei 8.213/91. Não vislumbro essa marca de essencialidade dos seus serviços rurais executados pelo autor, motivo pelo qual não me parece razoável reconhecê-lo.

(...)

Aluno - aprendiz:

No ponto, a sentença decidiu:

Nos períodos de 08/03/1975 a 20/12/1975, 01/03/1976 a 22/12/1976, 07/03/1977 a 30/12/1977, 07/03/1978 a 16/12/1978, 07/03/1979 a 14/12/1979 e 11/03/1980 a 13/12/1980o autor alega ter sido aluno-aprendiz da Escola Estadual Técnica Agrícola Desidério Finamor (até 30/12/1977) e do Colégio Agrícola de Concórdia (a partir de 07/03/1978.

Inicialmente, verifica-se que na certidão de tempo escolar fornecida pelo Instituto Federal Catarinense (alusivo ao tempo de estudos no Colégio Agrícola de Concórdia), há informação de recesso nos períodos de 22/07/1978 a 06/08/1978, 21/07/1979 a 05/08/1979 e 26/07/1980 a 10/08/1980. Já na certidão de aluno-aprendiz da Escola Estadual Técnica Agrícola Desidério Finamor, embora não estejam especificadas as férias/recesso, os períodos de estudos não são contínuos, havendo intervalos nos finais/começos de cada ano (evento 23, OUT3 e evento 48, OUT3).

Desta forma, caso eventualmente sejam reconhecidos os períodos em questão, em algum momento deverão ser deduzidos os intervalos relativos às férias (do início e do meio do ano) porque neles, por óbvio, o autor não frequentou estudo profissionalizante.

Neste sentido, veja-se decisão do e. TRF4, cuja ementa segue transcrita apenas na parte que interessa ao tema:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS. TEMPO URBANO E RURAL. ALUNO-APRENDIZ. LEGITIMIDADE. TEMPO LÍQUIDO. REAFIRMAÇÃO DA DER. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.   (...). Comprovado o período laboral como aluno-aprendizdeve ser computado o tempo líquido constante da certidão, descontando-se os períodos de férias escolares. (...). (AC 5002542-30.2019.4.04.7003, DÉCIMA TURMA, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 10/12/2020). (destaquei).

Cabe observar, desde logo, que o aluno-aprendiz diverge, em essência, da categoria do empregado-aprendiz.

O primeiro aprende trabalhando em Escola Técnica Federal/Estadual, mantida pelo Governo, durante todo o curso, recebendo ou não pecúnia à Conta do Orçamento e salário indireto representado pela alimentação, vestuário, atendimento médico-odontológico e pousada e, o segundo, já na qualidade de empregado, tem sua condição de aprendiz dirigida a uma proficiência pessoal no interesse de seu empregador, por esse sustentado, com todos os direitos que as leis trabalhistas e previdenciárias lhe garantem e além do mais, neste caso, o curso está inserido dentro do expediente de trabalho com duração limitada.

A situação do aluno-aprendiz iniciou-se com o Decreto nº 13.064, de 12 de junho de 1.918,  o qual determinava que o produto dos artefatos que saíam das oficinas e das obras e consertos realizados pelas Escolas Técnicas de Aprendizes-Artífices, constituiriam renda da escola, e do valor arrecadado, 10% seriam distribuídos por todos os alunos-aprendizes.

Posteriormente surge o Decreto-lei n.º 4.073/42, de 30 de janeiro de 1942, Lei Orgânica do Ensino Industrial, que estabeleceu as bases de organização e de regime do ensino industrial, para as escolas profissionalizantes, mantidas pelos empregadores, e para as Escolas Técnicas Federais mantidas pelo MEC, em suma pelo Orçamento da União, e que é o ramo de ensino, de grau secundário, destinado à preparação profissional dos trabalhadores da indústria e das atividades artesanais, e ainda dos trabalhadores dos transportes, das comunicações e da pesca.

Cabe observar que o Decreto-Lei 4.073/42 em seu art. 59, dispunha que as escolas industriais e técnicas poderiam ser mantidas e administradas: a) sob a responsabilidade da União (federais); b) pelos Estados ou pelo Distrito Federal, autorizadas pelo Governo Federal (equiparadas); e, c) pelos Municípios ou por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito privado, autorizadas pelo Governo Federal (reconhecidas).

Já o Decreto-Lei 8.590/46 (art. 1º) autorizou as escolas técnicas e as escolas industriais do Ministério da Educação e Saúde executar, a título de trabalhos práticos escolares, encomendas de repartições públicas ou de particulares. A renda resultante dos serviços executados deveria ser incorporada à receita da União, e poderiam tomar parte na execução dessas encomendas os alunos das séries mais adiantadas e os ex-alunos (art. 4º). Em seu art. 5º, estabeleceu que o orçamento da despesa consignaria anualmente o percentual de 40% sobre o total da receita bruta arrecadada no ano anterior e resultante dos serviços executados, devendo ser destinados cinco oitavos dessa dotação para o custeio da mão-de-obra dos alunos e ex-alunos, remuneração essa que não poderia exceder a 25% do preço de cada artefato. O restante da mesma dotação seria entregue às Caixas Escolares.

Da legislação até aqui mencionada, é possível concluir que os alunos-aprendizes eram remunerados em certas situações e essa despesa era prevista e consignada em dotação orçamentária própria, que, por sua vez, integrava o Orçamento Geral da União.

O Decreto nº 31.546, de 06/10/1952 estabeleceu o conceito de contrato individual de trabalho (art. 1º).

Já a Lei nº 3.552/59, regulamentada pelo Decreto nº 47.038/59, conferiu aos estabelecimentos de ensino industrial personalidade jurídica própria, bem como autonomia didática, técnica, administrativa e financeira, mantendo a autorização para os trabalhos práticos efetuados na forma acima descrita.

O Decreto nº 47.038/59, que aprovou o regulamento do ensino industrial, não constitui qualquer óbice à contagem, para fins de aposentadoria, do tempo de frequência nos cursos de aprendizagem.

Assim, para a contagem com fins de aposentadoria do tempo em questão a única exigência, em se tratando especificamente de estabelecimento público - que veio a ser consolidada pela jurisprudência do Egrégio STF (v. RTJ 47/252) - é a de que haja vínculo empregatício e retribuição pecuniária à conta dos cofres públicos.

Não é qualquer período como aluno-aprendiz em escolas técnicas que pode ser computado para efeitos previdenciários. Para saber se é possível o cômputo do período estudado nesse tipo de instituição para fins previdenciários, deve-se verificar, em cada caso, se o aluno poderia ser qualificado como empregado ou servidor público.

O Tribunal de Contas da União, em 21/03/1980, editou a Súmula 96, que assim dispôs sobre a matéria:

"Conta-se, para todos os efeitos, como tempo de serviço público, o período de trabalho prestado, na qualidade de aluno-aprendiz, em escola profissional, desde que haja vínculo empregatício e retribuição pecuniária à conta do orçamento". (destaquei).

É certo que o TCU manifestou-se posteriormente no sentido de que por retribuição pecuniária poder-se-ia entender o fornecimento de fardamento, alimentação, material escolar e parcela da renda auferida com a execução das encomendas para terceiros, tese esta que foi avalizada pelo STJ no RESP. nº 396.426/SE (6ª T., Rel. Min. FERNANDO GONÇALVES, DJU 02.09.2002) e que serviu de fundamento para o art. 106, II, "c", da Instrução Normativa INSS/DC nº 78/2002, regra mantida até hoje pela revogada Instrução Normativa INSS/PRES nº 128/2022. Nunca se deixou de exigir, de qualquer forma, algum recebimento em pecúnia por parte do aluno, tanto que o art. 135, inciso III dessa IN continuou condicionando o reconhecimento do tempo "...desde que tenha havido retribuição pecuniária à conta do orçamento respectivo do Ente Federativo, ainda que fornecida de maneira indireta ao aluno...".

Não se trata, portanto, de criar nova categoria de segurado, mas de verificar, pelas características da relação mantida entre o aluno e a escola pública profissional se ele poderia realmente ser qualificado como servidor público. Em caso afirmativo, há efeitos previdenciários tanto nos regimes próprios (CF, art. 40), quanto no Regime Geral da Previdência Social, em razão da possibilidade de contagem recíproca.

Nesse sentido, manifestou-se o Tribunal de Contas da União:

SUMÁRIO: PEDIDO DE REEXAME. PESSOAL. APOSENTADORIA. CÔMPUTO IRREGULAR DE TEMPO DE ALUNO-APRENDIZ. ILEGALIDADE. CONHECIMENTO. NEGATIVA DE PROVIMENTO. COMUNICAÇÃO.

É ilegal o cômputo de tempo de aluno-aprendiz com fundamento em certidão de tempo de serviço que não esteja baseada em documentos que comprovem o labor do então estudante na execução de encomendas recebidas pela escola, com menção expressa ao período trabalhado e à remuneração percebida, em atendimento aos requisitos estabelecidos no Acórdão 2.024/2005 - Plenário e na Súmula da Jurisprudência do TCU n.º 96.

É válido transcrever trecho do voto, proferido pelo Relator Ministro José Jorge:

"(...) As razões de mérito de cada uma das impugnações foram devidamente explanadas nos autos, desde a manifestação da unidade técnica (fls. 58/59, v.p.) passando pelo Relatório e Voto condutores do Acórdão n.º 189/2008-TCU-1ª Câmara (fls. 62/66, v.p.), tendo-se feito referência à modificação do entendimento esposado na Súmula n.º 96 pelo disposto no Acórdão n.º 2.024/2005-TCU- Plenário, de cujas observações destacaram-se os seguintes pontos: 1) a remuneração dos alunos deve ter sido à conta de dotação orçamentária; 2) a simples percepção de auxilio financeiro ou em bens não é condição suficiente para caracterizar a condição de aluno-aprendiz, uma vez que pode resultar da concessão de bolsas de estudo ou subsídios diversos concedidos a alunos; 3) nas certidões emitidas devem-se considerar apenas os períodos nos quais os alunos efetivamente laboraram, ou seja, indevido o cômputo do período de férias escolares; 4) não se admite a existência de aluno-aprendiz para as séries iniciais anteriormente à edição da Lei n.º 3.552/59, a teor do art. 4º do Decreto-lei n.º 8.590/46.

(...).

Releva considerar que as deliberações judiciais colacionadas pelas recorrentes tomaram como pressupostos, não só a questão da verba remuneratória dos alunos-aprendizes, mas também a efetiva participação dos referidos alunos nos procedimentos desenvolvidos nas respectivas escolas visando ao atendimento de encomendas feitas por terceiros, o que, em última instância configurava atividade laboral desses estudantes. Afinal de contas, tempo de serviço e atividade laboral sempre andam juntos. Não se pode negar.

10. Por todas essas considerações, pode-se, seguramente, afirmar que o entendimento do Tribunal de Contas da União não diverge do veiculado no Poder Judiciário sobre essa matéria. Apenas, como mister se faz observar, cada caso, respeitada sua peculiaridade, deve ser considerado individualmente. Certamente, situações de fato existem às quais este TCU atribui legalidade ao cômputo do tempo de aluno-aprendiz para os fins de aposentadoria, o que não é o caso dos presentes autos, visto que nenhuma das recorrentes logrou comprovar ter, efetivamente, participado de atividade de produção de encomendas ou de procedimento semelhante. (ACÓRDÃO N.º 4522/2010 - TCU - 1ª Câmara, Processo n.º TC 011.491/2007-2, Relator Min. José Jorge, Ata n° 25/2010 - 1ª Câmara, Data da Sessão: 20/7/2010 - Ordinária). (destaquei).

Decerto, as decisões do Tribunal de Contas da União não possuem efeito vinculante em Juízo. Entretanto, a citação não é gratuita, uma vez que as diversas correntes jurisprudenciais sobre o tema partem de interpretações acerca dessas manifestações do TCU.

Fico com aqueles que consideram indispensável, para a caracterização de relação jurídica de prestação de serviço, a prova de que havia algum tipo de retribuição em pecúnia, ainda que através de parte dos fundos obtidos com a alienação da produção rural, artesanal ou industrial, eis que não pode ser considerado servidor público aquele que recebe exclusivamente remuneração indireta (alimentação, roupas etc.).

O custeio das atividades da escola com dotações orçamentárias próprias, consignadas no orçamento do ente público que a mantém, não possui relevância jurídica quanto ao ponto, por ser inerente a qualquer forma de ensino público e gratuito.

O fato dos alunos produzirem algo cuja alienação reverte em favor da escola, por sua vez, não os transforma ipso facto em servidores desta. A produção, no caso, é também algo indissociável do ensino profissionalizante, que busca ensinar a técnica de se produzir alimentos, máquinas etc. Como se sabe, técnicas não se ensinam apenas na teoria; requerem o contato direto com o trabalho para que sejam bem aprendidas. É claro que se algo precisa ser produzido, eventual excesso deve ser vendido e é natural que o produto dessa venda seja incorporado ao patrimônio da fazenda pública que custeia o aprendizado do aluno. Isso não faz deste um servidor público, já que o enfoque principal continua sendo o seu aprendizado. Não se pode vislumbrar numa situação assim o vínculo empregatício exigido pela Súmula nº 96, do TCU.

No caso concreto a parte autora pretende a averbação dos períodos 08/03/1975 a 20/12/1975, 01/03/1976 a 22/12/1976, 07/03/1977 a 30/12/1977, 07/03/1978 a 16/12/1978, 07/03/1979 a 14/12/1979 e 11/03/1980 a 13/12/1980, em que alega ter exercido atividade como aluno-aprendiz. Como prova juntou certidões fornecidas pelas instituições de ensino que frequentou (evento 23, OUT3 - Escola Estadual Técnica Agrícola Desidério Finamor e evento 48, OUT3 - Instituto Federal Catarinense - Campus Concórdia).

Consoante a jurisprudência do STJ, o aluno-aprendiz é aquele estudante de escola pública profissional ou de ensino federal (escola técnica federal) que, por ter recebido remuneração, mesmo que de forma indireta, à conta do orçamento público, tem direito à averbação do período correspondente como tempo de serviço, o qual deverá ser computado na aposentadoria previdenciária, a teor do disposto na Lei 6.226/75 - seja na vigência do Decreto-Lei 4.073/42, seja após a Lei 3.552/59.

No caso dos autos, a certidão expedida pela Escola Desidério Finamor (evento 23, OUT3) informa que "...Olivio Dambos foi aluno da Escola Estadual Técnica Agrícola Desidério Finamor (...), frequentando as aulas teóricas e prática, nos turno da manhã e tarde, em regime de internato, em contrapartida o aluno desempenhava serviços didáticos e pedagógicos, na execução das atividades práticas pertinentes ao Curso Técnico em Agropecuária, sem qualquer remuneração, recebendo alimentação e moradia e em contrapartida participou da produção de gêneros alimentícios de origem vegetal e animal, para consumo próprio, que serviram também para a complementação da alimentação diária oferecida aos alunos..."

A certidão do Instituto Federal Catarinense - Campus de Concórdia (evento 48, OUT3), por sua vez, certificou que "...O aluno a que se refere este documento, frequentou as aulas teóricas e participou das atividades práticas de laboratório e agropecuária, integrantes do currículo escolar, sendo a alimentação, calçados, vestuário, atendimento médico, odontológico e pousada, adquiridos com verbas provenientes do Orçamento da União. (...), o IFC não emitirá, em qualquer hipótese, a Certidão de Tempo de Contribuição para alunos egressos, visto que não há registros de vinculação de seus ex-alunos ao Regime Próprio de Previdência Social, ao Regime Geral de Previdência Social ou a qualquer outro regime de Previdência Social...".

Em audiência (evento 86, TERMOAUD1), sobre eventuais recebimentos, o autor informou que "...essas Escolas Técnicas produziam muito para vender a terceiros como, por exemplo, porcos, milho, soja, feijão, galinha; que eram os alunos que cuidavam das granjas de galinhas e porcos; que a renda obtida com a venda desses produtos era destinada para os próprios colégios; que o autor nunca recebeu nenhum valor em dinheiro pelos serviços prestados nesses Escolas Técnicas; que davam graças a Deus de não precisar pagar, já que tratavam-se de colégios públicos; que não pagava mensalidades; que em ambas era regime de internato, inclusive finais de semana...". (destaquei).

Portanto, o próprio autor não reconhece a existência de pagamentos, nem por meio de pecúnia nem, tampouco, por outro tipo de benesse, embora tivesse afirmado que as Escolas vendiam o excedente de produção. Não há notícias, também, de que o produto dessas vendas fosse repartido entre os alunos, o que já é o bastante para não permitir a contagem do período como tempo de contribuição.

O recebimento de alimentação, moradia, calçados, vestuário, atendimento médico e odontológico, por si só, não autoriza reconhecer tempo de serviço nos moldes pretendido, já que se tratam de recompensas recebidas pelos alunos cujo custo entrava na dotação orçamentária global da União.

De todo modo, as Escolas nas quais o autor estudou eram mantidas pelos orçamentos de um ente público e, independentemente de ser o Estado do Rio Grande do Sul ou a União o responsável pela sua manutenção, o fato concreto é que não havia recebimento de dinheiro (salário) pelos alunos, o que - reitera-se - é o bastante para não permitir a contagem dos períodos como tempo de contribuição.

O fornecimento de alojamento, alimentação etc. para os alunos internos era inerente ao regime adotado nas Escolas frequentadas pelo autor, até em benefício dele próprio e dos demais alunos que moravam em localidades diversas daquela onde era a sua sede. Logo, tais benesses não podem ser consideradas salários em espécie, mas apenas o atendimento de uma necessidade para tornar viável a frequência ao curso e a formação do aluno, notadamente daqueles que moravam fora.

Não há nos autos elementos que pudessem apontar caracterização de uma relação de emprego ou prestação de serviço público durante o período em que o autor estudou nos reportados estabelecimentos de ensino, de forma a autorizar a contagem de tempo de contribuição para obtenção de benefício previdenciário.

Colhe-se do atual entendimento do e. TRF4, a seguinte lição, exarada na ementa a seguir transcrita apenas na parte que interessa:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. AVISO PRÉVIO INDENIZADO. NÃO INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ALUNO-APRENDIZ. ESCOLA TÉCNICA ESTADUAL. LEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. EXISTÊNCIA DE RETRIBUIÇÃO ESTATAL. AVERBAÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. PERÍODOS E NÍVEIS DE EXPOSIÇÃO. PROVA. USO DE EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL (EPI). EFICÁCIA. DESCONSIDERAÇÃO. ENTENDIMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AGENTES QUÍMICOS. RECONHECIMENTO. CONVERSÃO. 1. (...). 3. Nos termos da Súmula 96 do Tribunal de Contas da União, conta-se para todos os efeitos, como tempo de serviço público, o período de trabalho prestado na qualidade de aluno-aprendiz em Escola Pública Profissional, desde que comprovada a retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de alimentação, fardamento, material escolar e parcela de renda auferida com a execução de encomendas para terceiros.  4. (...). (TRF4, AC 5014520-83.2019.4.04.7009, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 29/06/2022). (destaquei).

Na hipótese vertente, não restaram comprovados os requisitos necessários para cômputo do tempo como de serviço para fins previdenciários. Ao contrário. A prova contida nos autos, notadamente as certidões fornecidas pelas instituições nas quais estudou, são suficientes para demonstrar que não recebia qualquer espécie de remuneração. Mais do que isso, o próprio depoimento do autor é firme nesse aspecto.

Por último, com todo respeito àqueles que entendem de forma diferente da decisão aqui adotada, parece haver um certo excesso na interpretação que defere a averbação do tempo de serviço como aluno-aprendiz porque - a rigor e na essência - a frequência ao curso técnico tinha por objetivo precípuo apenas a formação profissional, teórica e prática, não sendo razoável pleitear esse tempo para fins de aposentadoria. Veja-se, inclusive, que no caso do autor, o curso técnico certamente foi muito importante na sua formação profissional, tanto que, ao que parece, ele tornou-se referência na sua área de atuação alcançando, inclusive, o título de Doutor. Há um certo exagero em exigir do Estado educação pública, gratuita e de qualidade e, ainda, que esse tempo de estudos seja computado como tempo de serviço com objetivos previdenciários.

Relembrando que ainda que fosse comprovado o recebimento de vencimentos auferidos com a execução de encomendas a terceiros e, com isso, de alguma fosse o caso de se reconhecer algum período como tempo de contribuição, deveriam ser deduzidos os períodos de férias escolares.

Assim, entendo que o autor não faz jus à pretendida averbação.

(...)

Verifica-se que a sentença de primeiro grau negou o reconhecimento do período de aluno-aprendiz sob o argumento de que seria indispensável a prova de retribuição em pecúnia (direta ou indireta via fundos de alienação), desqualificando o recebimento de alimentação, moradia, etc., como inerente ao ensino público e gratuito.

Entretanto, embora o resultado da sentença coincida com o entendimento desta Turma, a fundamentação jurídica empregada na instância inicial merece ressalvas.

Para o reconhecimento do tempo de serviço como aluno-aprendiz, a TNU exige a comprovação simultânea dos seguintes critérios (Tema 216 da TNU):

(i) retribuição consubstanciada em prestação pecuniária ou em auxílios materiais; (ii) à conta do Orçamento; (iii) a título de contraprestação por labor; (iv) na execução de bens e serviços destinados a terceiros.

Assim, o entendimento é de que a remuneração pecuniária pode ser suprida pela retribuição indireta (alimentação, pousada, vestuário, etc.), desde que comprovadamente fornecida à conta de dotação orçamentária do Ente Federativo.

Contudo, a comprovação da origem orçamentária e da remuneração indireta não é suficiente. Exige-se que a atividade do aluno tenha tido finalidade econômica, mediante a execução de encomendas para terceiros ou produção de bens cuja alienação revertesse em receita para o orçamento público que custeava sua manutenção. Além disso, a remuneração (direta ou indireta) deve ser a contrapartida desse labor produtivo.

Ocorre que o conjunto probatório produzido nos autos, ao ser analisado, demonstra-se insuficiente para a averbação de qualquer dos períodos pleiteados. As certidões juntadas (evento 48) são omissas em relação à execução de bens e serviços destinados a terceiros. 

O depoimento do autor, que mencionou a venda de excedente, não pode, isoladamente, suprir a ausência de prova material ou testemunhal idônea para confirmar que as atividades práticas não eram meramente pedagógicas, mas sim voltadas à geração de receita.

Ainda, a certidão de tempo de contribuição juntada em sede recursal (evento 3), embora demonstre que a administração pública reconheceu o tempo de colega, não possui eficácia probatória para o direito aqui discutido e não vincula o Poder Judiciário. Cada caso deve ser analisado individualmente. O ato administrativo não foi objeto de análise judicial e não goza de presunção de legalidade.

Dessa forma, diante das razões acima, a sentença deve ser mantida.

HONORÁRIOS RECURSAIS

Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do CPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do CPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).

Aplica-se, portanto, em razão da atuação do advogado da Autarquia Previdenciária em sede de apelação, o comando do §11 do referido artigo, que determina a majoração dos honorários fixados anteriormente, pelo trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º e os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º do art. 85.

Confirmada a sentença no mérito, majoro a verba honorária, elevando-a em 50%, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do CPC.

CONCLUSÃO

Apelação do autor improvida, nos termos da fundamentação.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.




Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005437772v22 e do código CRC d4085e3b.

Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADOData e Hora: 12/11/2025, às 18:38:21

 


 

5002055-28.2022.4.04.7012
40005437772 .V22


Conferência de autenticidade emitida em 19/11/2025 04:08:53.



Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Avenida Anita Garibaldi, 888 - 6º andar, Gabinete do Des. Federal Penteado - Bairro: Cabral - CEP: 80540-901 - Fone: (41)3210-1774 - www.trf4.jus.br - Email: gpenteado@trf4.jus.br

Apelação Cível Nº 5002055-28.2022.4.04.7012/PR

RELATOR Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

EMENTA

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO RURAL. ALUNO-APRENDIZ. RECURSO DESPROVIDO.

I. CASO EM EXAME:

1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido de aposentadoria por tempo de contribuição, negando o reconhecimento de tempo rural anterior aos 12 anos de idade e de períodos como aluno-aprendiz.

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO:

2. Há duas questões em discussão: (i) a possibilidade de reconhecimento de tempo de serviço rural exercido antes dos 12 anos de idade; e (ii) a possibilidade de cômputo de períodos como aluno-aprendiz para fins previdenciários.

III. RAZÕES DE DECIDIR:

3. A atividade rural infantil (antes dos 12 anos de idade), em regime de economia familiar, é excepcional e demanda efetiva demonstração de que o trabalho era indispensável à subsistência do grupo familiar, indo além de mero auxílio em atividades secundárias, nos termos do art. 11, inc. VII, § 1º, da Lei nº 8.213/1991.

4. No caso concreto, o pequeno tamanho do imóvel (7,35 alqueires), o grande grupo familiar (11 pessoas) e o fato de o autor estudar em um dos turnos demonstram que seus serviços, embora úteis, não eram essenciais ou vitais para a subsistência da família, não configurando a indispensabilidade exigida.

5. Para o cômputo de tempo como aluno-aprendiz em escola pública profissional, a Súmula 96 do TCU e a jurisprudência do STJ (REsp n.º 396.426/SE) e da TNU (Tema 216) exigem a comprovação de retribuição pecuniária (direta ou indireta) à conta do orçamento, a título de contraprestação por labor na execução de bens e serviços destinados a terceiros.

6. As certidões das instituições de ensino foram omissas quanto à execução de bens e serviços destinados a terceiros, e o depoimento do autor sobre a venda de excedente não supre a ausência de prova material ou testemunhal idônea de que as atividades práticas eram voltadas à geração de receita e não meramente pedagógicas.

IV. DISPOSITIVO E TESE:

7. Recurso desprovido.

Tese de julgamento: 1. O reconhecimento de tempo de serviço rural exercido por menores de 12 anos, em regime de economia familiar, exige a comprovação de que o labor era indispensável à subsistência do grupo familiar, não bastando o mero auxílio em atividades secundárias. 2. Para o cômputo de tempo como aluno-aprendiz em escola pública profissional, é indispensável a comprovação de retribuição pecuniária (direta ou indireta) à conta do orçamento, a título de contraprestação por labor na execução de bens e serviços destinados a terceiros.

___________

Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 485, inc. IV e VI, 487, inc. I, e 85, §§ 2º, 8º e 11; Lei nº 9.289/1996, art. 4º, inc. I; Lei nº 8.213/1991, arts. 11, inc. VII, § 1º, e 55, §§ 2º e 3º; Decreto nº 3.048/1999, art. 127, inc. V; Lei Complementar nº 11/1971, art. 3º, § 1º, alínea "b"; Decreto-Lei nº 4.073/1942; Decreto-Lei nº 8.590/1946; Lei nº 3.552/1959; Lei nº 6.226/1975; CF/1988, art. 40.

Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 506.959/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, j. 10.11.2003; STJ, REsp n.º 1.321.493/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, 1ª Seção, j. 10.10.2012; STJ, Súmula 149; STJ, Súmula 577; STJ, AgRg no AREsp 320558/MT, j. 21.03.2017; TRF4, Súmula 73; TNU, PUIL 5008955-78.2018.4.04.7202, Rel. Juiz Federal Jairo da Silva Pinto, j. 23.06.2022 (Tema 219); TNU, Súmula 05; TRF4, AC 5019497-72.2019.4.04.9999, Rel. Márcio Antônio Rocha, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, j. 22.11.2021; TRF4, AC 5023746-32.2020.4.04.9999, Rel. Márcio Antônio Rocha, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, j. 22.02.2022; TNU, Súmula 34; TRF4, AC 5002542-30.2019.4.04.7003, Rel. Márcio Antônio Rocha, DÉCIMA TURMA, j. 10.12.2020; STF, RTJ 47/252; TCU, Súmula 96; STJ, REsp n.º 396.426/SE, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 6ª T., j. 02.09.2002; TCU, ACÓRDÃO N.º 4522/2010, Rel. Min. José Jorge, 1ª Câmara, j. 20.07.2010; TRF4, AC 5014520-83.2019.4.04.7009, Rel. Márcio Antônio Rocha, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, j. 29.06.2022; TNU, Tema 216.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 11 de novembro de 2025.




Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005437773v5 e do código CRC 62848ae9.

Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADOData e Hora: 12/11/2025, às 18:38:21

 


 

5002055-28.2022.4.04.7012
40005437773 .V5


Conferência de autenticidade emitida em 19/11/2025 04:08:53.



Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 28/10/2025 A 04/11/2025

Apelação Cível Nº 5002055-28.2022.4.04.7012/PR

RELATOR Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

PRESIDENTE Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

PROCURADOR(A) ANDREA FALCÃO DE MORAES

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 28/10/2025, às 00:00, a 04/11/2025, às 16:00, na sequência 118, disponibilizada no DE de 17/10/2025.

Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

RETIRADO DE PAUTA.

SUZANA ROESSING

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 19/11/2025 04:08:53.



Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO PRESENCIAL DE 11/11/2025

Apelação Cível Nº 5002055-28.2022.4.04.7012/PR

RELATOR Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

PRESIDENTE Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

PROCURADOR(A) ORLANDO MARTELLO JUNIOR

SUSTENTAÇÃO ORAL POR VIDEOCONFERÊNCIA DENISE VIEIRA DE CASTRO por O. D.

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Presencial do dia 11/11/2025, na sequência 9, disponibilizada no DE de 30/10/2025.

Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante Juiz Federal LEONARDO CASTANHO MENDES

Votante Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

SUZANA ROESSING

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 19/11/2025 04:08:53.



Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

O Prev já ajudou mais de 140 mil advogados em todo o Brasil.Faça cálculos ilimitados e utilize quantas petições quiser!

Teste grátis agora!