
Apelação Cível Nº 5017536-71.2021.4.04.7107/RS
RELATORA Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
RELATÓRIO
Trata-se de ação em que E. S. D. P. pretende a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência a contar do requerimento administrativo (DER: 01/02/2019), alegando ser portador de deficiência auditiva unilateral, além do reconhecimento da especialidade dos trabalhos desempenhados de 18/05/1983 a 24/05/1988, de 01/08/1988 a 16/12/1988, de 12/12/1989 a 26/01/1993, de 21/01/1997 a 12/09/1997, de 18/06/1998 a 01/03/1999, de 12/02/2001 a 11/05/2001, de 01/09/2001 a 04/06/2002, de 02/09/2002 a 12/11/2008, de 16/02/2009 a 20/10/2010, de 03/01/2011 a 04/05/2015, de 01/02/2016 a 01/03/2017 e de 03/04/2017 a 12/09/2018, com a condenação do INSS ao pagamento das prestações a contar da DER e acrescidas de juros e correção monetária. Sucessivamente, postulou a concessão de aposentadoria especial ou por tempo de contribuição convencional.
A sentença julgou parcialmente procedentes os pedidos para: a) reconhecer os períodos de 18/05/1983 a 24/05/1988, 01/08/1988 a 16/12/1988, 12/12/1989 a 26/01/1993, 21/01/1997 a 12/09/1997, 12/02/2001 a 11/05/2001, 19/11/2003 a 01/06/2005, 01/01/2008 a 12/11/2008, 16/02/2009 a 20/10/2010, 03/01/2011 a 04/05/2015, 01/02/2016 a 01/03/2017 e 03/04/2017 a 12/09/2018 como tempo de serviço especial, passível de conversão em tempo mediante a aplicação do fator 1,4; b) conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição a contar da DER, com incidência do fator previdenciário, uma vez que a pontuação totalizada pelo segurado é inferior a 96 pontos, com renda mensal inicial a ser calculada pelo INSS e data de início do pagamento no primeiro dia do mês da implantação do benefício; c) pagar ao autor, após o trânsito em julgado, a soma das prestações vencidas entre a data de início e a da implantação do benefício. Diante da sucumbência recíproca, a sentença condenou a parte autora e o INSS em honorários de 10% sobre o valor atualizado da condenação, compreendidas as parcelas vencidas até a data de sua prolação, suspendendo a exigibilidade da verba em relação à parte autora em razão da gratuidade de justiça.
Inconformado, o autor apelou, postulando, em preliminar, a anulação da sentença para que seja reaberta a instrução processual e renovada (ou complementada) a prova técnica, seja para atestar a sua condição de deficiente, seja para constatar a especialidade dos labores prestados de 18/06/1998 a 01/03/1999, de 01/09/2001 a 04/06/2002, de 02/09/2002 a 18/11/2003 e de 02/06/2005 a 31/12/2007. Acaso não acolhidas as preliminares, no mérito requereu seja fixada a data de 12/06/2008 como início da deficiência, sem prejuízo da baixa dos autos para nova avaliação biopsicossocial que estabeleça a data provável do início da deficiência se o juízo entender por não acolher a data apontada. Ainda no mérito, requereu sejam reconhecidos como especiais os interregnos de labor acima destacados a fim de que lhe seja concedida a aposentadoria da pessoa com deficiência nos termos da Lei Complementar 142/2013 ou, alternativamente, a aposentadoria especial com fundamento nos artigos 57 e 58 da Lei 8213/91. Ainda a título alternativo, postulou a aposentadoria por tempo de contribuição conforme o regramento previsto na Lei 13183/2015 e no artigo 29-C da Lei 8213/91. Finalmente, uma vez acolhidos um dos pedidos alternativos de concessão de benefício, pugnou pela condenação do INSS ao pagamento das prestações vencidas acrescidas dos consectários legais, bem como a suportar com exclusividade os ônus da sucumbência.
Foram apresentadas contrarrazões.
A parte autora requereu prioridade de tramitação (evento 2).
Certificou-se no processo a condição de idoso e de pessoa com deficiência do autor (evento 3).
É o relatório.
VOTO
Preliminares
Produção de prova pericial referente às atividades especiais
O apelante insurge-se contra o fato de a juíza singular, no evento 19, ter denegado a realização de prova pericial para apurar a especialidade das atividades discutidas no processo, ao fundamento de que os documentos juntados são suficientes para a apreciação desse pedido, destacando o recorrente, ainda, que não cabia agravo de tal decisão, razão por que formula a presente preliminar. Afirma que alguns agentes nocivos podem ter sido suprimidos ou omitidos pelos empregados nos formulários PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário, afinal é sabido que tais formulários são preenchidos unilateralmente pelos empregadores, sendo ademais "recorrente" a omissão de agentes nocivos. Por esse motivo defende a utilidade da prova pericial para a busca da verdade real, não podendo o segurado, hipossuficiente na relação com a Previdência Social, ter seu direito de defesa cerceado.
Compulsando os autos verifica-se que, além dos formulários PPP, foram juntados trechos de laudos técnicos das condições laborais após deferida a complementação da documentação apresentada, o que é suficiente para firmar convicção acerca da especialidade, ou não, dos trabalhos. Como se verá mais adiante, a partir de 01/01/2004 o PPP passou a ser documento indispensável para a análise das condições laborais, tanto que, quando devidamente preenchido, exime o segurado da apresentação do laudo técnico.
Havendo no processo formulários preenchidos conforme determinação legal, contendo a indicação dos profissionais que executaram as medições e avaliações dos agentes nocivos, além de outros dados essenciais à caracterização dos diversos ambientes de trabalho pelos quais passou o apelante, complementados, por sua vez, por laudos técnicos das empresas, não se faz necessária a produção de perícia judicial. Aliás, o retorno do processo à origem se justificaria se não houvesse documentação suficiente para esclarecer esta e outras questões essenciais ao julgamento, o que não é o caso desta demanda.
Em outras palavras, não configura cerceamento de defesa a decisão que indefere a realização de perícia judicial quando houver elementos suficientes ao convencimento do julgador.
Rejeita-se a preliminar.
Cerceamento de defesa no tocante à caracterização da deficiência
O recorrente considera ter havido cerceamento de defesa porque o juízo determinou a complementação dos laudos mas deixou de intimar os peritos em razão de problemas havidos na atualização dos dados durante o preenchimento das planilhas que integram os laudos eletrônicos. Postula, assim, a anulação da sentença para que a prova pericial seja complementada.
O juízo de fato percebeu a existência de problemas técnicos no preenchimento das avaliações da deficiência e por essa razão contatou a DTI/TRF4, suspendendo o processo. Expirado o prazo da suspensão sem que aparentemente os problemas tivessem sido resolvidos, a secretaria do juízo providenciou a correção da pontuação das avaliações e juntou aos autos a planilha do evento 63, na qual a sentença se baseou para julgar a questão. A propósito, colhe-se da sentença:
No caso, tendo em conta as respostas dos peritos nomeados pelo juízo, foram constatadas:
a) pelo perito médico (): 15 (quinze) atividades realizadas de forma adaptada, totalizando 3.725 pontos;
b) pela perita assistente social (): 15 (quinze) atividades realizadas de forma adaptada, totalizando 3.725 pontos.
Entretanto, em contato com a DTI do TRF da 4ª Região, soube-se da existência de problemas na atualização dos dados durante o preenchimento da planilha anexa ao laudo eletrônico, sobretudo quanto à pontuação ajustada.
Veja-se, a título de exemplo, que na perícia socioeconômica a expert atribuiu 75 pontos em quatro atividades do domínio comunicação, totalizando 400 pontos, contudo foram registrados 125 pontos ajustados.
Assim, a fim de corrigir o problema até a solução definitiva a ser dada pela DTI, foi acostada planilha conjugando os resultados das duas perícias com a aplicação do modelo Fuzzy (), quando verificou-se que o autor é portador de deficiência leve, porquanto alcançou 7.450 pontos.
De fato, conforme o critério legal, para que a deficiência seja considerada moderada, a pontuação total deve ser maior ou igual a 5.740 e menor ou igual a 6.354. Para deficiência leve, maior ou igual a 6.355 e menor ou igual a 7.584.
A parte autora impugnou os quadros anexos preenchidos pelos peritos afirmando que não estariam de acordo com o método Fuzzy e Índice de Funcionalidade Brasileiro (IFBr) (eventos 38 e 50).
As impugnações devem ser afastadas, na medida em que não há, nos autos, qualquer elemento para infirmar formalmente os laudos apresentados, no tocante à pontuação atribuída pelos peritos aos aspectos questionados.
Ademais, as inconsistências verificadas na pontuação ajustada do laudo preenchido pela assistente social, questionados pela parte autora, foram devidamente corrigidos na planilha elaborada pela Secretaria desta Vara Federal.
Portanto, deve ser mantida a conclusão pericial que estabeleceu ser o autor portador de deficiência leve.
Entretanto, considerando a data fixada pelo perito médico para o início da deficiência, em 25/11/2021, denota-se que tal marco não está abrangido pelo requerimento administrativo formulado em 01/02/2019.
Assim sendo, considerando que a data de início da deficiência é posterior à DER, o requerente não faz jus ao benefício da aposentadoria nos termos do art. 3°, inciso II, da Lei Complementar n° 142/2013.
Passo à análise do pedido sucessivo.
(...)
Apesar do equívoco na planilha da assistente social quanto à pontuação ajustada do domínio da comunicação, além da alteração para 100 pontos na pontuação ajustada em determinados itens aos quais havia sido atribuída pontuação 75, tais problemas foram corrigidos pelo próprio juízo, de forma a que a pontuação final considerada para aferição da deficiência fosse a correta. Nesse sentido, a sentença tomou em consideração a mesma pontuação vislumbrada pela parte apelante: 3725 pontos dados pela assistente social e pelo médico, cuja soma resulta em 7450 pontos, suficientes para a caracterização da dependência em grau leve.
Não há necessidade de complementar-se as perícias diante desses problemas técnicos ocorridos quando do preenchimento das planilhas, uma vez que contornados pelo próprio juízo de maneira a que a parte não fosse prejudicada. Aliás, pelo teor da impugnação apresentada no evento 50, a insurgência não vai além dessa questão da correção da pontuação; noutro dizer, não põe em dúvida os resultados dos exames em si.
Ora, se os exames periciais forneceram os elementos necessários ao deslinde da causa (apesar do erro na pontuação, prontamente corrigido), não há razão para que novas perícias sejam feitas, sendo certo que não será a simples discordância da parte com o resultado dos exames que motivará a renovação ou complementação da prova. Incide ao caso o artigo 370 do Código de Processo Civil, que franqueia ao julgador, inclusive de ofício, determinar a produção das provas necessárias ao julgamento de mérito, de modo que se o juiz entender que o processo está munido de suficientes elementos de convicção, pode dispensar a produção de outras provas.
Rejeita-se também a segunda preliminar.
Mérito
Não estando o feito sujeito a reexame necessário, a controvérsia no plano recursal restringe-se:
- ao direito à aposentadoria por tempo de contribuição na condição de pessoa deficiente, com o reconhecimento de que a deficiência teve início em 12/06/2008, ainda que mediante o retorno dos autos à origem para que nova avaliação biopsicossocial seja feita a fim de se estabelecer a data provável do início da deficiência;
- ao reconhecimento da especialidade dos períodos de 18/06/1998 a 01/03/1999, de 01/09/2001 a 04/06/2002, de 02/09/2002 a 18/11/2003 e de 02/06/2005 a 31/12/2007;
- ao direito à aposentadoria especial ou a aposentadoria por tempo de contribuição na condição de deficiente;
- aos honorários advocatícios, de modo que, reformada a sentença, sejam fixados em 20% sobre as parcelas vencidas até a prolação do acórdão.
Principia-se pela análise dos labores alegadamente prestados sob condições especiais.
Tempo de trabalho sob condições especiais
O reconhecimento da especialidade de determinada atividade é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STF, RE 174150-3, rel. Ministro Octávio Gallotti, DJU 18/08/2000).
Nesse sentido, aliás, é a orientação adotada pela 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (AR 3320, rel.ª Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 24/09/2008; EREsp 345554, rel. Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJU 08/03/2004; AGREsp 493458, 5ª Turma, rel. Ministro Gilson Dipp, DJU 23/06/2003; e REsp 491338, 6ª Turma, rel. Ministro Hamilton Carvalhido, DJU 23/06/2003), que passou a ter expressa previsão legislativa com a edição do Decreto 4827/2003, o qual alterou a redação do artigo 70, § 1º, do Decreto 3048/99.
Feita essa consideração e tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, necessário inicialmente definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:
a) no período de trabalho até 28/04/1995, quando vigente a Lei 3807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (artigos 57 e 58), é possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído, frio e calor (STJ, AgRg no REsp 941885, 5ª Turma, rel. Ministro Jorge Mussi, DJe 04/08/2008; STJ, REsp 639066, 5ª Turma, rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJU 07/11/2005), em que necessária a mensuração de seus níveis por meio de perícia técnica, carreada aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a nocividade ou não desses agentes;
b) a partir de 29/04/1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção daquelas a que se refere a Lei 5527/68, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13/10/1996, dia anterior à publicação da Medida Provisória 1523, que revogou expressamente a lei em questão - de modo que, no interregno compreendido entre 29/04/1995 (ou 14/10/1996) e 05/03/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei 9032/95 no artigo 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva de exposição de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído, frio e calor, conforme visto acima;
c) a partir de 06/03/1997, data da entrada em vigor do Decreto 2172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da Lei de Benefícios pela Medida Provisória 1523/96 (convertida na Lei 9528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica;
d) a partir de 01/01/2004, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) passou a ser documento indispensável para a análise do período cuja especialidade for postulada (artigo 148 da Instrução Normativa 99-INSS, publicada no DOU de 10/12/2003). Tal documento substituiu os antigos formulários (SB-40, DSS-8030 ou DIRBEN-8030) e, desde que devidamente preenchido, inclusive com a indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, exime a parte da apresentação do laudo técnico em juízo.
Para fins de enquadramento das categorias profissionais, devem ser considerados os Decretos 53831/64 (Quadro Anexo - 2ª parte), 72771/73 (Quadro II do Anexo) e 83080/79 (Anexo II) até 28/04/1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos 53831/64 (Quadro Anexo - 1ª parte), 72771/73 (Quadro I do Anexo) e 83080/79 (Anexo I) até 05/03/1997, e os Decretos 2172/97 (Anexo IV) e 3048/99 a partir de 06/03/1997, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto 4882/2003.
Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível também a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP 228832, rel. Ministro Hamilton Carvalhido, 6ª Turma, DJU 30/06/2003).
Frise-se que em 03/12/1998 foi publicada a Medida Provisória 1729, convertida na Lei 9732/98, que deu nova redação ao § 1º do artigo 58 da Lei 8213/91, passando a incluir a expressão "nos termos da legislação trabalhista", tornando possível a aplicação dos critérios dispostos na Norma Regulamentadora 15 (NR-15) do Ministério do Trabalho e Emprego ao âmbito previdenciário. Assim, conceitos de "limites de tolerância", "concentração", "natureza" e "tempo de exposição ao agente", dispostos na referida norma, é que devem reger a caracterização da natureza da atividade, para fins previdenciários.
Por fim, destaque-se a tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Tema 534 no sentido de que "as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991)" (REsp 1306113, rel. Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, DJe 07/03/2013).
Intermitência
A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8213/91, não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, devendo ser interpretada no sentido de que tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual, ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho, e em muitas delas a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível (TRF4, EINF 0003929-54.2008.404.7003, rel. Des. Federal Néfi Cordeiro, 3ª Seção, D.E. 24/10/2011; TRF4, EINF 2007.71.00.046688-7, 3ª Seção, rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07/11/2011).
Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (TRF4, EINF 2005.72.10.000389-1, 3ª Seção, rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 18/05/2011; TRF4, EINF 2008.71.99.002246-0, 3ª Seção, rel. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 08/01/2010).
Na esteira de diversos precedentes deste tribunal, a exigência de comprovação da exposição habitual e permanente do segurado a agentes nocivos para fins de caracterização da especialidade de suas atividades foi introduzida pela Lei 9032/95, razão pela qual, para períodos anteriores a 28/04/1995, a questão perde relevância (AC 5003543-77.2020.4.04.7112, 5ª Turma, rel. Des. Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior, j. em 27/08/2024; AC 5002196-59.2022.4.04.7008, 10ª Turma, rel.ª Des.ª Federal Cláudia Cristina Cristofani, j. em 05/03/2024; AC 5025544-44.2010.4.04.7100, 6ª Turma, rel.ª Des.ª Federal Taís Schilling Ferraz, julgado em 17/05/2023).
Em relação aos intervalos posteriores a 28/04/1995, a habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8213/91, com a redação dada pela Lei 9032/95, não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, devendo ser interpretada no sentido de que tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual, ocasional.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. RUÍDO. EXPOSIÇÃO INTERMITENTE. ENQUADRAMENTO ATÉ 28/04/1995. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REAFIRMAÇÃO DA DER. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. 1. Comprovada a exposição a níveis de ruído superiores aos limites de tolerância previstos nos decretos regulamentadores, há que ser reconhecida a especialidade da atividade. 2. A partir de 29/04/1995, com as alterações introduzidas pela Lei 9.032/1995 no art. 57 da Lei de Benefícios, passou a ser necessária a demonstração efetiva da exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física. (...) (TRF4, AC 5016394-06.2019.4.04.7009, 11ª Turma, Relator Herlon Schveitzer Tristão, j. em 23/10/2024)
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. ATIVIDADE ESPECIAL. MOTORISTAS E COBRADORES DE ÔNIBUS, MOTORISTAS E AJUDANTES DE CAMINHÃO. IAC TRF4 N.° 5. POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DA PENOSIDADE APÓS A EXTINÇÃO DA PREVISÃO LEGAL DE ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL PELA LEI 9.032/1995. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TUTELA ESPECÍFICA. 1. Apresentada a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho, o respectivo tempo de serviço especial deve ser reconhecido. 2. Havendo laudo de perícia judicial nos autos dando conta do não fornecimento de Equipamentos de Proteção Individual, ou de que, embora tivessem sido fornecidos, não foram eficazes em virtude da ausência de comprovação de sua efetiva e correta utilização, não há que se falar em afastamento da nocividade dos agentes agressivos presentes nas atividades prestadas pela parte autora. 3. O requisito da comprovação pelo segurado do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, atualmente constante no § 3º do art. 57 da Lei 8.213/1991, foi introduzido pela Lei 9.032/1995, não sendo exigido para o reconhecimento da especialidade dos períodos anteriores à sua vigência. Para os períodos a partir de 29/04/1995 a interpretação que se dá à habitualidade e à permanência não pressupõe a exposição contínua do trabalhador aos agentes nocivos durante toda a jornada de trabalho, devendo ser considerada especial a atividade quando tal exposição é ínsita ao seu desenvolvimento e integrada à rotina de trabalho do segurado. (...) (TRF4, AC 5067089-60.2011.4.04.7100, 6ª Turma, rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, juntado aos autos em 30/09/2022)
Ademais, é possível o reconhecimento da especialidade da atividade mesmo que não se saiba a quantidade exata de tempo de exposição ao agente insalubre, sendo necessária, apenas, a demonstração de que o segurado estava sujeito, diuturnamente, a condições prejudiciais à sua saúde (TRF4, AC 5011416-14.2018.4.04.7108, 5ª Turma, rel. Des. Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior, j. em 17/06/2025).
Uso de equipamento de proteção
A Medida Provisória 1729/98 (posteriormente convertida na Lei 9732/98) alterou o § 2º do artigo 58 da Lei 8213/91, determinando que o laudo técnico contenha: i) informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância, e ii) recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo. Por esse motivo, em relação à atividade exercida no período anterior a 03/12/1998 (data da publicação da referida MP) a utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador. O próprio INSS já adotou esse entendimento na Instrução Normativa 45/2010 (artigo 238, § 6º), mantido na Instrução Normativa 77/2015 (artigo 268, inciso III).
Em período posterior a 03/12/1998, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Agravo em Recurso Extraordinário (ARE) 664335, com repercussão geral reconhecida (Tema 555), fixou, em 04/12/2014, a seguinte tese:
I - O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial;
II - Na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
Segundo o precedente vinculante, caso comprovada a real efetividade dos equipamentos de proteção, neutralizando a nocividade do(s) agente(s), resta descaracterizado o labor em condições especiais, exceto quanto ao agente nocivo ruído, pois, quanto a este, o STF entendeu que os equipamentos protetores do aparelho auditivo são insuficientes para neutralizar os efeitos deletérios das ondas sonoras que penetram no corpo por outras vias.
Posteriormente, a matéria também foi objeto de exame por este Tribunal Regional Federal no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas 5054341-77.2016.4.04.0000/SC (IRDR Tema 15), no qual foi fixada a seguinte tese: "A mera juntada do PPP referindo a eficácia do EPI não elide o direito do interessado em produzir prova em sentido contrário". O IRDR confirmou o entendimento do STF e relacionou situações nas quais a utilização de EPI eficaz não descaracteriza o labor especial, a saber: 1) em períodos anteriores a 03/12/1998; 2) quando há enquadramento legal pela categoria profissional; 3) em relação aos agentes nocivos ruído, biológicos, cancerígenos (por exemplo, asbestos e benzeno), periculosos (p. ex., eletricidade). Em embargos de declaração, o rol taxativo foi ampliado para acrescentar os seguintes agentes: calor, radiações ionizantes e trabalhos sob condições hiperbáricas e sob ar comprimido.
Mais recentemente, o Superior Tribunal de Justiça, ao analisar a questão submetida ao Tema 1090, concluiu por fixar as seguintes teses jurídicas (REsp 2080584, 2082072 e 2116343, rel.ª Ministra Maria Thereza de Assis Moura, 1ª Seção, j. em 09/04/2025, publicado aos 22/04/2025):
I - A informação no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) sobre a existência de equipamento de proteção individual (EPI) descaracteriza, em princípio, o tempo especial, ressalvadas as hipóteses excepcionais nas quais, mesmo diante da comprovada proteção, o direito à contagem especial é reconhecido.
II - Incumbe ao autor da ação previdenciária o ônus de comprovar: (i) a ausência de adequação ao risco da atividade; (ii) a inexistência ou irregularidade do certificado de conformidade; (iii) o descumprimento das normas de manutenção, substituição e higienização; (iv) a ausência ou insuficiência de orientação e treinamento sobre o uso adequado, guarda e conservação; ou (v) qualquer outro motivo capaz de conduzir à conclusão da ineficácia do EPI.
III - Se a valoração da prova concluir pela presença de divergência ou de dúvida sobre a real eficácia do EPI, a conclusão deverá ser favorável ao autor.
Como se vê, o precedente vinculante resguarda as hipóteses excepcionais em que, mesmo diante do uso de EPI eficaz devidamente comprovado, o direito à contagem especial é reconhecido.
Ademais, a ministra relatora ressaltou que "há casos em que a discussão sobre o uso do EPI eficaz é inócua, porque não teria o condão de descaracterizar o tempo especial", referindo, nesse ponto, o Tema 555 do STF e as hipóteses arroladas pelo TRF4 no julgamento do IRDR Tema 15.
Por fim, importante mencionar que, à exceção das hipóteses excepcionadas, para que haja a descaracterização do tempo especial pela anotação de uso do EPI eficaz no PPP é necessário que referido formulário esteja regularmente preenchido, mediante a indicação da resposta "S" no campo próprio, bem como o registro do respectivo Certificado de Aprovação - CA no Ministério do Trabalho e Emprego (TRF4, AC 5001462-07.2019.4.04.7205, 9ª Turma, Rel.ª Juíza Federal Gabriela Pietsch Serafin, j. em 15/12/2023; TRF4, AC 5005810-85.2021.4.04.7209, 9ª Turma, rel. Des. Federal Celso Kipper, j. em 10/10/2023). Logo, se o PPP apresentar a informação de uso de EPI sem certificado de aprovação válido, tal não será suficiente para elidir a especialidade, pois suscitará dúvida acerca da real eficácia do equipamento de proteção, dúvida que deve ser solvida em prol do segurado, a teor do que preconiza o Tema 1090 do STJ (TRF4, AC 5009209-94.2017.4.04.7102, 11ª Turma, rel.ª para acórdão Juíza Federal Ana Raquel Pinto de Lima, j. em 13/05/2025).
Agentes químicos
Em 03/12/1998 foi publicada a Medida Provisória 1729, convertida na Lei 9732/98, que deu nova redação ao § 1º do artigo 58 da Lei 8213/91, passando a incluir a expressão "nos termos da legislação trabalhista", tornando possível a aplicação dos critérios dispostos na Norma Regulamentadora 15 (NR-15) do Ministério do Trabalho e Emprego ao âmbito previdenciário. Também o Decreto 3265/99, de 29/11/1999, modificou o item 1.0.0 do Anexo IV do Decreto 3048/99, passando a prever que o agente químico é nocivo quando apresenta "nível de concentração superior aos limites de tolerância estabelecidos”.
Assim, até 02/12/1998, a exposição aos riscos ocupacionais gerados por agentes químicos dá ensejo ao reconhecimento da especialidade, sendo desnecessária análise quantitativa de concentração ou intensidade no ambiente de trabalho. A partir de 03/12/1998, e tratando-se de agentes químicos previstos no Anexo 11 da NR-15, que regula atividades e operações insalubres no âmbito trabalhista, o reconhecimento da especialidade deve observar, via de regra, os limites quantitativos constantes do referido Anexo.
No caso de exposição a agentes nocivos com absorção cutânea (conforme indicação constante na coluna "absorção também p/ pele" do Quadro nº 1 da "Tabela de Limites de Tolerância" constante no Anexo 11 da NR-15), não há necessidade de observação dos limites lá previstos, nos termos da própria normativa.
Para os agentes químicos previstos no Anexo 13 e 13-A da NR-15, admite-se o reconhecimento da atividade especial independentemente de análise quantitativa (concentração, intensidade, etc.), sendo suficiente, para tanto, a análise qualitativa. É o caso, por exemplo, de funções realizadas em contato com hidrocarbonetos aromáticos, solventes, óleos minerais, parafina e outras substâncias reconhecidamente cancerígenas, motivo pelo qual, mesmo após 03/12/1998, sua mera presença, aferida de forma qualitativa no ambiente de labor, permite o enquadramento do período como especial.
Nesse sentido:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. REAFIRMAÇÃO DA DER. RECONHECIMENTO DA ESPECIALIDADE DO TEMPO IMEDIATAMENTE POSTERIOR AO JÁ RECONHECIDO NA AÇÃO ORIGINÁRIA. CONTINUIDADE DAS MESMAS ATIVIDADES. ADMISSÃO DO PPP JUNTADO NA AÇÃO RESCISÓRIA COMO PROVA DA ESPECIALIDADE. CONCESSÃO DA APOSENTADORIA ESPECIAL MEDIANTE REAFIRMAÇÃO DA DER. (...) 4. Segundo a Norma Regulamentadora nº 15 (NR-15), do Ministério do Trabalho (aplicável somente a partir de 03/12/1998), o agente químico é nocivo quando apresenta nível de concentração superior aos limites de tolerância estabelecidos. Apenas os agentes químicos arrolados no Anexo 13 da NR 15 dispensam a análise quantitativa da exposição. 5. Reconhecida a especialidade do período em razão da exposição a ruído. Realizado novo cálculo do tempo de contribuição, constata-se o preenchimento dos requisitos para concessão da aposentadoria especial mediante reafirmação da DER. Embargos de declaração parcialmente acolhidos, com efeitos infringentes. (TRF4, AR 5036566-39.2022.4.04.0000, 3ª Seção, rel.ª Juíza Federal Flávia da Silva Xavier, j. em 24/10/2024)]
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. ATIVIDADE ESPECIAL. AVALIADOR DE PENHOR DA CEF. O ácido clorídrico está previsto no Anexo 11 da NR 15 do MTE e, a partir de 02/12/1998, a submissão ao agente químico somente permite o cômputo do tempo de serviço como especial quando sua concentração for aferida em, no mínimo, 4 ppm. Os avaliadores de penhor também entram em contato com o ácido nítrico, na manipulação de água forte e água régia, descrito no Anexo 13 da NR 15 e com relação ao qual os riscos ocupacionais gerados não requerem a análise quantitativa de sua concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho. Ainda, não se pode olvidar que os limites de tolerância estabelecidos pelo Anexo 11 da NR 15 para os agentes químicos são válidos para absorção apenas por via respiratória, desconsiderados potenciais efeitos nocivos à saúde (queimaduras) pelo contato com a pele e com os olhos. (TRF4, EI 5009536-30.2012.4.04.7000, 3ª Seção, Relator para Acórdão PAULO AFONSO BRUM VAZ, julgado em 30/06/2016)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RUÍDO. AGENTES QUÍMICOS. FREQUÊNCIA DA EXPOSIÇÃO. ANÁLISE QUANTITATIVA. ANÁLISE QUALITATIVA. HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS. EPI (TEMA15). POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. CONCESSÃO. TUTELA ESPECÍFICA. (...) 7. Os agentes nocivos listados no Anexo 13, da NR-15 dispensam análise quantitativa mesmo após 03/12/1998, de modo que sua mera presença, aferida de forma qualitativa no ambiente de labor, permite o enquadramento do período como especial. 8. Para os agentes arrolados no Anexo 11 da NR-15, a avaliação da nocividade à saúde pressupõe aferição do limite de tolerância, ou seja, a forma de avaliação dos agentes nocivos, nesse caso, deve seguir critério quantitativo. (...) (TRF4, AC 5060867-07.2019.4.04.7000, 11ª Turma, rel.ª para acórdão Juíza Federal Marina Vasques Duarte, j. em 11/06/2025)
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. RUÍDO. AGENTES QUÍMICOS. RECONHECIMENTO. CONVERSÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS IMPLEMENTADOS. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. (...) 6. A partir de 03/12/1998 e tratando-se de agentes químicos previstos no Anexo nº 11 da NR-15, que regula atividades e operações insalubres no âmbito trabalhista, o reconhecimento da especialidade deve observar os limites quantitativos constantes do referido Anexo, à exceção de casos especiais (como agentes com absorção cutânea, cujos limites não são aplicáveis nos termos da própria normativa, e agentes reconhecidamente cancerígenos). Para os períodos anteriores, bem como para os agentes químicos previstos no Anexo nº 13 da NR-15, admite-se o reconhecimento da atividade especial independentemente de análise quantitativa (concentração, intensidade, etc.), sendo suficiente, para tanto, a análise qualitativa (exposição aos agentes nocivos presentes no ambiente de trabalho). 7. Consectários legais fixados nos termos do decidido pelo STF (Tema 810) e pelo STJ (Tema 905). A partir de 09/12/2021, deve ser observada para fins de atualização monetária e juros de mora, de acordo com art. 3º da EC 113/2021, o índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente. (TRF4, AC 5020961-40.2020.4.04.7108, 5ª Turma, rel. para acórdão Des. Federal Alexandre Gonçalves Lippel, j. em 03/06/2025)
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. HIDROCARBONETOS: NOCIVIDADE. EXPOSIÇÃO A AGENTES QUÍMICOS. LAUDO TÉCNICO EXTEMPORÂNEO. PROVA EMPRESTADA. RUÍDO. LIMITES DE TOLERÂNCIA. EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições especiais são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente foi prestada, passando a constituir direito adquirido do trabalhador. 2. A ausência de expressa referência em decreto regulamentar a hidrocarbonetos não equivale a que tenha desconsiderado, como agentes nocivos, diversos compostos químicos que podem ser assim qualificados. 3. Para os agentes nocivos químicos previstos no Anexo 13 da Norma Regulamentadora - NR 15, entre os quais os hidrocarbonetos e outros compostos tóxicos de carbono, é desnecessária a avaliação quantitativa. (...) (TRF4, AC 5021939-12.2023.4.04.7108, 5ª Turma, rel. para acórdão Des. Federal Osni Cardoso Filho, j. em 20/05/2025)
De acordo com o artigo 68, § 4º, do Decreto 3048/99, com a redação dada pelo Decreto 8123/2013, tratando-se de agentes químicos cancerígenos, o reconhecimento da especialidade independe do limites quantitativos:
Art. 68. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, considerados para fins de concessão de aposentadoria especial, consta do Anexo IV.
(...)
§ 4º. A presença no ambiente de trabalho, com possibilidade de exposição a ser apurada na forma dos §§ 2º e 3º, de agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos em humanos, listados pelo Ministério do Trabalho e Emprego, será suficiente para a comprovação de efetiva exposição do trabalhador. (Redação dada pelo Decreto nº 8.123, de 2013)
Por meio de publicação da Portaria Interministerial MTE/MS/MPS 9, em 08/10/2014, foi definida a Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos - LINACH, como referência para formulação de políticas públicas, onde constam três grupos de agentes: Grupo 1 - reconhecidamente carcinogênicos para humanos; Grupo 2A - provavelmente carcinogênicos para humanos e; Grupo 2B - possivelmente carcinogênicos para humanos.
Agentes como benzeno, asbesto/amianto, cádmio, cromo, formol/formaldeído, poeira de sílica livre cristalizada, óleos minerais (não tratados ou pouco tratados) e tricloroetileno integram o Grupo 1 (agentes confirmados como cancerígenos para humanos) do Anexo da Portaria Interministerial MPS/MTE/MS 9, de 2014, encontrando-se registrados no Chemical Abstracts Service (CAS).
É possível o cômputo do tempo como especial, inclusive, em época pretérita à alteração do artigo 68, § 4º, do Decreto 3048/99 e à edição da Portaria Interministerial MTE/MS/MPS 09/2014, tendo em vista que a carcinogenicidade do agente sempre existiu, o que autoriza o reconhecimento da atividade especial antes mesmo da referida Portaria.
Portanto, admite-se o reconhecimento da atividade especial independentemente de análise quantitativa (concentração, intensidade etc.), sendo suficiente, para tanto, a análise qualitativa dos agentes químicos (i) em relação aos períodos anteriores a 03/12/1998; (ii) a partir de 03/12/1998, para os agentes químicos previstos no Anexo 13 e 13-A da NR-15; e (iii) para os agentes químicos reconhecidamente cancerígenos.
Hidrocarbonetos
O Decreto 53831/64 (código 1.2.11) reconhecia o direito à aposentadoria especial aos 25 anos de serviço quando o trabalhador tivesse contato com derivados tóxicos do carbono, como hidrocarbonetos, citando as seguintes substâncias: cloreto de metila, tetracloreto de carbono, tricloroetileno, clorofórmio, bromureto de metila, nitro benzeno, gasolina, alcoóis, acetona, acetatos, pentano, metano, hexano, sulfureto de carbono etc.
O Decreto 83080/79, por sua vez, estabeleceu o enquadramento específico dos "hidrocarbonetos e outros compostos de carbono" como agentes nocivos, no código 1.2.10 de seu Anexo I, referindo as seguintes substâncias: benzol, toluol, xilol (benzeno, tolueno, xileno), inseticidas clorados derivados de hidrocarbonetos, solventes para tintas, lacas e vernizes, contendo benzol, toluol e xilol, entre outras.
Os Decretos 2172/97 e 3048/99 deixaram de contar com previsão específica da concessão de aposentadoria especial em razão do contato com "hidrocarbonetos". Contudo, seus derivados são arrolados no item 13 do Anexo II, como causador de doenças profissionais ou do trabalho. Ademais, o Anexo 13 da Norma Regulamentadora 15 descreve a manipulação de óleos minerais e o emprego de hidrocarbonetos aromáticos como atividades insalubres.
Apesar da ausência de previsão regulamentar específica, pacificou-se o entendimento segundo o qual, mesmo após 06/03/1997, é possível o reconhecimento da especialidade do labor exercido com exposição a hidrocarbonetos:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS PREENCHIDOS. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. CONVERSÃO. POSSIBILIDADE. 1. Até a edição do Decreto nº 3.265, que alterou a redação do código 1.0.0 do Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, o que determinava a especialidade da atividade era a simples presença, no ambiente de trabalho, dos agentes químicos relacionados nos decretos regulamentadores. Desse modo, antes de 30 de novembro de 1999, data da publicação do Decreto nº 3.265, não se exige a especificação da composição química do produto. 2. A manipulação de óleos e graxas, desde que devidamente comprovada, autoriza o enquadramento da atividade como insalubre. É possível, mesmo após o advento do Decreto n° 2.172/97, o reconhecimento da especialidade do labor exercido com exposição a hidrocarbonetos aromáticos. Precedentes. 3. Quanto aos agentes químicos descritos no anexo 13 da NR 15 do MTE, é suficiente a avaliação qualitativa de risco, sem que se cogite de limite de tolerância, independentemente da época da prestação do serviço, se anterior ou posterior a 02/12/1998, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial. 4. O STF assentou que a nocividade do labor é neutralizada pelo uso eficaz de EPIs/EPCs. Porém, o simples fornecimento pelo empregador de cremes de proteção para mãos não exclui a hipótese de exposição do trabalhador aos agentes químicos nocivos à saúde. É preciso que, no caso concreto, estejam demonstradas a existência de controle e periodicidade do fornecimento dos equipamentos, sua real eficácia na neutralização da insalubridade ou, ainda, que o respectivo uso era, de fato, obrigatório e continuamente fiscalizado pelo empregador. 5. É possível a reafirmação da DER, em sede judicial, nas hipóteses em que o segurado implementa todas as condições para a concessão do benefício após a conclusão do processo administrativo, admitindo-se cômputo do tempo de contribuição, inclusive quanto ao período posterior ao ajuizamento da ação, tendo como limite a data do julgamento da apelação ou remessa necessária no segundo grau de jurisdição, desde que observado o contraditório. (TRF4, ApRemNec 5003439-66.2012.4.04.7209, 9ª Turma, rel. para acórdão Paulo Afonso Brum Vaz , julgado em 11/09/2020)
Na verdade, considerando que os hidrocarbonetos abrangem uma ampla gama de substâncias químicas derivadas de carbono, a ausência de menção à expressão “hidrocarbonetos” em decreto regulamentar não significa que a norma tenha deixado de encampar, como agentes nocivos, diversos compostos químicos que podem ser assim qualificados.
Além disso, os Decretos 2172/97 e 3048/99 contemplam no item 1.0.19 de seu Anexo IV a possibilidade de reconhecimento da especialidade pela exposição a "Outras Substâncias Químicas".
Nesse aspecto, vale destacar a tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Tema 534, no sentido de que “as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991)”. Aliás, a Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos já dispunha que “Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento”.
Ressalte-se que a exposição a tintas, esmaltes, vernizes, colas, adesivos e solventes que contêm hidrocarbonetos aromáticos enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial (TRF4, AC 5001146-90.2021.4.04.7215, 9ª Turma, rel. para acórdão Celso Kipper, j. em 14/05/2025; TRF4, AC 5010734-59.2018.4.04.7108, 11ª Turma, rel. para acórdão Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus, julgado em 09/02/2024).
Também os óleos e graxas de origem mineral são agentes químicos nocivos à saúde, enquadrados na subespécie “Hidrocarbonetos e Outros Compostos de Carbono”, de modo que permitem o reconhecimento do labor especial (TRF4, AC 5004027-59.2023.4.04.9999, 5ª Turma, rel. para acórdão Hermes Siedler da Conceição Júnior, j. em 20/05/2025; TRF4, AC 5006422-58.2022.4.04.9999, 9ª Turma, rel. para acórdão Sebastião Ogê Muniz, j. em 14/05/2025). Aliás, já decidiu o STJ que “os óleos minerais são agentes químicos nocivos à saúde, enquadrados na subespécie Hidrocarbonetos e Outros Compostos de Carbono, independente de especificação sobre qual o tipo de óleo” (AgInt no AREsp 1204070/MG, 2ª Turma, rel. Ministro Francisco Falcão, j. em 08/05/2018).
A jurisprudência deste Corte Regional "reconhece a especialidade do labor exercido com exposição a hidrocarbonetos aromáticos, óleos minerais, radiações não ionizantes e fumos metálicos, mesmo diante de menções genéricas, desde que o contexto e a prova indiquem a presença dos agentes nocivos e a habitualidade da exposição" (AC 5015405-55.2023.4.04.7107, 5ª Turma, rel. para acórdão Ézio Teixeira, j. em 08/07/2025).
Saliente-se que “Os riscos ocupacionais gerados pelos hidrocarbonetos aromáticos não demandam, em regra, análise quantitativa de concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, sendo suficiente a avaliação qualitativa (art. 278, §1º, I da IN 77/2015), pois se trata de grupo de agentes nocivos relacionados no Anexo 13 da NR-15, aprovada pela Portaria 3.214/1978 do Ministério do Trabalho e Emprego” (TRF4, AC 5004611-75.2018.4.04.7001, 11ª Turma, rel.ª para acórdão Juíza Federal Marina Vasques Duarte, j. em 11/06/2025).
Ademais, a 3ª Seção deste tribunal reconheceu que a exposição habitual e permanente a hidrocarbonetos aromáticos enseja o reconhecimento da especialidade do labor independentemente de avaliação quantitativa ou do uso de EPC ou EPI eficaz, em virtude do caráter cancerígeno do agente agressor. Confira-se:
PREVIDENCIÁRIO. RECLAMAÇÃO. ARGUMENTO DE AFRONTA À TESE FIRMADA NO IRDR 15/TRF4. EPI. INEFICAZ. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. AGENTE QUÍMICO CANCERÍGENO. HIDROCARBONETO AROMÁTICO. PROCEDÊNCIA. 1. Reclamação fundamentada na irrelevância, para fins de neutralização da nocividade do trabalho, da utilização de EPIs, em se tratando de agente nocivo reconhecidamente cancerígeno. 2. A tese fixada no julgamento do IRDR 15/TRF4 não excluiu o segurado contribuinte individual. A distinção a ser feita não diz respeito a quem possui a responsabilidade (ou não) pelo uso de EPI, mas aos agentes nocivos aos quais está exposto o obreiro. Não é razoável desconsiderar a informação de EPI eficaz para o empregado e não para o contribuinte individual, quando o que está em jogo é a incerteza sobre a eficácia frente a agentes agressivos para os quais não se conhece. 3. Embora o segurado contribuinte individual que exerce atividade nociva figure como o único responsável pelo resguardo de sua integridade física, recaindo sobre ele o ônus de se preservar dos efeitos deletérios do trabalho, mediante efetivo emprego de EPIs, a aplicação de cremes de proteção para mãos não exclui a hipótese de exposição do trabalhador aos agentes químicos agressivos à saúde, pois são equipamentos destinados apenas à proteção das mãos e dos braços, promovendo exclusivamente a proteção cutânea, enquanto o contato com hidrocarbonetos aromáticos acarreta danos ao organismo que extrapolam as patologias cutâneas. Idêntico raciocínio se aplica aos óculos de proteção e ao guarda-pó. 4. Os hidrocarbonetos aromáticos são compostos orgânicos considerados tóxicos, que possuem um ou mais anéis benzênicos ou núcleos aromáticos. O Ministério do Trabalho e Emprego editou a Portaria Interministerial nº 9, publicando a Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos, sendo que, no Grupo 1 - Agentes confirmados como carcinogênicos para humanos, está arrolado o agente químico benzeno (descrito no código 1.0.3 do Anexo IV do Decreto nº 3.048/99 e registrado na LINACH com CAS sob o código 000071-43-2), o que já basta para a comprovação da efetiva exposição do empregado. 5. Conforme se extrai da leitura conjugada do art. 68, § 4º, do Decreto 3.048/99 e do art. 284, parágrafo único, da IN/INSS 77/2015, os riscos ocupacionais gerados pelos agentes cancerígenos constantes no Grupo I da LINHAC, estabelecida pela Portaria Interministerial n° 09/2014, não requerem a análise quantitativa de sua concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa, tampouco importando a adoção de EPI ou EPC, uma vez que os mesmos não são suficientes para elidir a exposição a esses agentes, conforme parecer técnico da FUNDACENTRO, de 13 de julho de 2010 e alteração do § 4° do art. 68 do Decreto nº 3.048, de 1999. 6. Reclamação julgada procedente. (TRF4 5036135-68.2023.4.04.0000, rel. para acórdão Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, juntado aos autos em 30/06/2024)
Ainda em relação ao uso de EPC ou EPI eficaz, vale frisar que embora o contato nocivo com este tipo de agente químico ocorra através da pele e dos olhos, ele também afeta as vias respiratórias do trabalhador, de modo que cremes de proteção, óculos de proteção e guarda-pós são insuficientes para elidir sua nocividade. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. RAZÕES RECURSAIS DISSOCIADAS DOS FUNDAMENTOS SENTENCIAIS. NÃO CONHECIMENTO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE RECURSAL. OCORRÊNCIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO ESPECIAL. HIDROCARBONETO ALIFÁTICO. EPI. NEUTRALIZAÇÃO. CREME DE PROTEÇÃO. INSUFICIÊNCIA. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. 1. Com fulcro no permissivo do art. 932, inciso III, do CPC, não se conhece do recurso no(s) ponto(s) que apresenta razões genéricas e/ou dissociadas dos fundamentos sentenciais, por violação ao princípio da dialeticidade recursal. Precedentes. 2. Os hidrocarbonetos alifáticos atualmente possuem previsão no item XIII, do anexo II, do Decreto nº 3.048/99. 3. No julgamento do Tema 555, o STF assentou que a nocividade do labor pode ser neutralizada pelo uso eficaz de EPI. Não obstante, esta Corte possui entendimento no sentido de que a utilização de cremes de proteção, devidamente aprovados pelo Ministério do Trabalho e Emprego, não possui o condão de neutralizar a ação dos agentes nocivos a que estava exposto o autor. Com efeito, tais cremes são conhecidos como "luvas invisíveis" e são utilizados por não ocasionarem perda de tato ou movimentação dos trabalhadores. Exatamente em decorrência de tais características, torna-se impossível ao trabalhador a avaliação do nível de proteção a que está sujeito, considerando-se o desgaste natural da camada protetora proporcionada por tais cremes em virtude do manuseio de equipamentos, ferramentas, da fricção das mãos com objetos e roupas e mesmo do suor, aspectos ínsitos à prestação laboral. Torna-se, destarte, praticamente impossível a manutenção de uma camada protetiva contínua e homogênea. Assim, inviável a afirmação de que a utilização apenas de cremes de proteção, ainda que de forma adequada, possui o condão de neutralizar a ação de agentes nocivos químicos. 4. Não é demais dizer que os cremes de proteção são equipamentos destinados apenas à proteção das mãos e dos braços (proteção tópica), enquanto o contato com hidrocarbonetos aromáticos e alifáticos acarreta danos ao organismo que extrapolam as patologias cutâneas, notadamente pela possibilidade de serem absorvidos também pelas vias respiratórias. Idêntico raciocínio se aplica aos óculos de proteção e ao guarda-pó. 5. Assim, considerando que na espécie fora fornecido apenas creme de proteção, não restou devidamente demonstrada a neutralização da nocividade do agente químico. 6. Somando-se os períodos laborados em condições nocivas reconhecidos em juízo com o lapso temporal averbado na esfera administrativa, verifica-se que a parte autora conta com tempo suficiente para a obtenção da aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o acréscimo do tempo de trabalho convertido pelo fator de multiplicação 1,4, para o segurado homem, ou 1,2, para a segurada mulher. (TRF4, AC 5016106-07.2022.4.04.9999, 9ª Turma, rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, juntado aos autos em 21/09/2023)
Vale mencionar que, conquanto os hidrocarbonetos alifáticos não sejam um agente químico classificado como carcinogênico (não possuem benzeno em sua cadeia carbônica), a exposição a este agente pode dar ensejo ao reconhecimento do tempo de serviço como especial (TRF4, AC 5024126-61.2021.4.04.7205, 9ª Turma, rel. Des. Federal Sebastião Ogê Muniz, j. em 14/05/2025; TRF4, AC 5004049-87.2019.4.04.7015, 10ª Turma, rel.ª Cláudia Cristina Cristofani, j. em 19/04/2022).
Portanto, "O reconhecimento da atividade especial por exposição a agentes químicos (fumos metálicos e hidrocarbonetos aromáticos) dispensa a análise quantitativa, bastando a comprovação da exposição habitual e permanente, ainda que com menções genéricas, conforme a legislação e jurisprudência aplicáveis" (TRF4, AC 5009978-34.2023.4.04.9999, 5ª Turma, rel. para acórdão Des. Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior, j. em 17/06/2025).
Enquadramento Legal Hidrocarbonetos Código 1.2.11 (tóxicos orgânicos - operações executadas com derivados tóxicos do carbono) do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64; Código 1.2.10 (hidrocarbonetos e outros compostos do carbono) do Anexo I do Decreto nº 83.080/79; Código 1.0.3 (benzeno e seus compostos tóxicos) dos Anexos IV dos Decretos nº 2.172/97 e nº 3.048/99; Código 1.0.17 (petróleo, xisto betuminoso, gás natural e seus derivados) dos Anexos IV dos Decretos nº 2.172/97 e nº 3.048/99; Código 1.0.19 (outras substâncias químicas) dos Anexos IV dos Decretos nº 2.172/97 e nº 3.048/99. |
Ruído
Especificamente quanto ao agente nocivo ruído, o Quadro Anexo do Decreto 53831, de 25/03/1964, o Quadro I do Decreto 72771, de 06/09/1973, o Anexo I do Decreto 83080, de 24/01/1979, o Anexo IV do Decreto 2172, de 05/03/1997, e o Anexo IV do Decreto 3048, de 06/05/1999, alterado pelo Decreto 4882, de 18/11/2003, consideram insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 80, 85 e 90 decibéis, de acordo com os Códigos 1.1.6, 1.1.5, 2.0.1 e 2.0.1, nos termos abaixo:
Período Trabalhado | Enquadramento | Limites de Tolerância |
Até 05-03-1997 | 1. Anexo do Decreto 53831/64; 2. Quadro I do Decreto 72771/73 e Anexo I do Decreto 83080/79. | 1. Superior a 80 dB; 2. Superior a 90 dB. |
De 06-03-1997 a 06-05-1999 | Anexo IV do Decreto 2172/97. | Superior a 90 dB. |
De 07-05-1999 a 18-11-2003 | Anexo IV do Decreto 3048/99, na redação original. | Superior a 90 dB. |
A partir de 19-11-2003 | Anexo IV do Decreto 3048/99 com a alteração introduzida pelo Decreto 4882/2003. | Superior a 85 dB. |
Cabe esclarecer que os Decretos 53831/64 e 83080/79 tiveram vigência concomitante até a edição do Decreto 2172/97, que revogou de forma expressa o fundamento de validade da legislação então vigente. Dessa forma, até 05/03/1997 é considerada nociva à saúde a atividade sujeita a ruídos superiores a 80 decibéis, conforme previsão mais benéfica do Decreto 53831/64.
O Decreto 4882/2003, posteriormente, reduziu o limite de tolerância ao agente físico ruído para 85 decibéis.
Embora a redução posterior do nível de ruído admissível como prejudicial à salubridade tecnicamente faça presumir ser ainda mais gravosa a situação prévia (a evolução das máquinas e das condições de trabalho tendem a melhorar as condições de trabalho), o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1398260/PR (Tema 694), decidiu que a especialidade em razão da exposição ao agente nocivo ruído é regida pela legislação vigente à época da prestação do serviço, sendo impossível a aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003.
Dessa forma, considera-se "especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis até a edição do Decreto 2.172/1997. Após essa data, o nível de ruído considerado prejudicial é o superior a 90 decibéis. Com a entrada em vigor do Decreto 4.882, em 18.11.2003, o limite de tolerância ao agente físico ruído foi reduzido para 85 decibéis" (STJ, REsp. 1333511, rel. Ministro Castro Meira; REsp. 1381498, rel. Ministro Mauro Campbell).
Assim, o limite de tolerância para ruído é:
- de 80 dB(A) até 05/03/1997;
- de 90 dB(A) de 06/03/1997 a 18/11/2003; e
- de 85 dB(A) a partir de 19/11/2003.
Saliente-se que a legislação previdenciária exige, para caracterizar a especialidade do labor, a exposição a ruído em nível superior aos limites previstos nos decretos, não sendo possível o enquadramento quando se trata de exposição a ruído exato de 80, 90 ou 85 decibéis, conforme a época.
Quanto à metodologia de medição do ruído, para os casos em que há indicação de exposição à pressão sonora variável, o Superior Tribunal de Justiça, ao decidir o Tema 1083, em 25/11/2021, sob a sistemática dos recursos repetitivos (REsp 1886795 e REsp 1890010), fixou a seguinte tese:
O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço.
O acórdão foi assim ementado:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA ESPECIAL. AGENTE NOCIVO RUÍDO. NÍVEL DE INTENSIDADE VARIÁVEL. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. METODOLOGIA DO NÍVEL DE EXPOSIÇÃO NORMALIZADO - NEN. REGRA. CRITÉRIO DO NÍVEL MÁXIMO DE RUÍDO (PICO DE RUÍDO). AUSÊNCIA DO NEN. ADOÇÃO. 1. A Lei de Benefícios da Previdência Social, em seu art. 57, § 3º, disciplina que a aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência, ao segurado que comprovar tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo fixado em lei, sendo certo que a exigência legal de habitualidade e permanência não pressupõe a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. 2. A questão central objeto deste recurso versa acerca da possibilidade de reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, considerando-se apenas o nível máximo aferido (critério "pico de ruído"), a média aritmética simples ou o Nível de Exposição Normalizado (NEN). 3. A Lei n. 8.213/1991, no § 1º do art. 58, estabelece que a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita por formulário com base em Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho - LTCAT nos termos da legislação trabalhista. 4. A partir do Decreto n. 4.882/2003, é que se tornou exigível, no LTCAT e no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), a referência ao critério Nível de Exposição Normalizado - NEN (também chamado de média ponderada) em nível superior à pressão sonora de 85 dB, a fim de permitir que a atividade seja computada como especial. 5. Para os períodos de tempo de serviço especial anteriores à edição do referido Decreto, que alterou o Regulamento da Previdência Social, não há que se requerer a demonstração do NEN, visto que a comprovação do tempo de serviço especial deve observar o regramento legal em vigor por ocasião do desempenho das atividades. 6. Descabe aferir a especialidade do labor mediante adoção do cálculo pela média aritmética simples dos diferentes níveis de pressão sonora, pois esse critério não leva em consideração o tempo de exposição ao agente nocivo durante a jornada de trabalho. 7. Se a atividade especial somente for reconhecida na via judicial, e não houver indicação do NEN no PPP, ou no LTCAT, caberá ao julgador solver a controvérsia com base na perícia técnica realizada em juízo, conforme disposto no art. 369 do CPC/2015 e na jurisprudência pátria, consolidada na Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos, observado o critério do pico de ruído. 8. Para os fins do art. 1.039, CPC/2015, firma-se a seguinte tese: "O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço." 9. In casu, o acórdão do Tribunal de origem manteve a sentença que concedeu ao segurado a aposentadoria especial, consignando ser possível o reconhecimento do labor especial por exposição a ruído variável baseado nos picos de maior intensidade, quando não houver informação da média de ruído apurada segundo a metodologia da FUNDACENTRO, motivo pelo qual merece ser mantido. 10. Recurso da autarquia desprovido. (REsp 1886795/RS, 1ª Seção, Rel. Ministro Gurgel de Faria, DJe 25/11/2021)
Assim, conforme o precedente vinculante: i) a informação acerca do Nível de Exposição Normalizado - NEN (média ponderada) é exigível apenas para períodos posteriores a 18/11/2003, data da publicação do Decreto 4882 (itens 4 e 5); (ii) descabe aferir a especialidade do labor mediante adoção de cálculo pela média aritmética simples dos diferentes níveis de pressão sonora, de modo que, inexistindo indicação do NEN no PPP ou no LTCAT, cabe ao julgador solver a controvérsia com base na perícia técnica realizada em juízo, observando-se o critério do pico de ruído (itens 6 e 7).
A partir daí, infere-se que, também para os períodos anteriores ao Decreto 4882/2003, não havendo no laudo técnico informação sobre a média ponderada dos níveis de pressão sonora, deve-se utilizar o critério dos picos de ruído.
Enquadramento Legal: Ruído Código 1.1.6 (superior a 80 decibéis) do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64; Código 2.0.1 (superior a 90 decibéis) do Anexo IV do Decreto nº 2.172/1997; Código 2.0.1 (superior a 90 decibéis) do Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, na redação original; Código 2.0.1 (superior a 85 decibéis) do Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, com a alteração introduzida pelo Decreto nº 4.882/2003. |
Aferição do ruído pelos critérios da Fundacentro (NHO 01)
O Decreto 4882/2003 trouxe nova redação ao § 11 do artigo 68 do Decreto 3048/99 (atual § 12), dispondo que as avaliações ambientais deverão considerar a classificação dos agentes nocivos e limites de tolerância estabelecidos pela norma trabalhista, indicando a metodologia e os procedimentos estabelecidos pela Norma de Higiene Ocupacional da Fundacentro, que passou a adotar o critério denominado Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ao acrescentar o § 12 ao artigo 68 do Decreto 3048/99, o Decreto 8123/2013 ressaltou que "Nas avaliações ambientais deverão ser considerados, além do disposto no Anexo IV, a metodologia e os procedimentos de avaliação estabelecidos pela Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho - FUNDACENTRO".
Quanto ao ponto, a Norma de Higiene Ocupacional nº 1 (NHO 01) da Fundacentro dispõe que a avaliação da exposição ocupacional ao ruído contínuo ou intermitente deverá ser feita por meio da determinação da dose diária de ruído ou do nível de exposição, parâmetros representativos da exposição diária do trabalhador.
Quando tal metodologia constar no processo, deve ser observada para enquadramento da atividade como especial. A ausência de apuração por tal método, entretanto, não impossibilita o reconhecimento da especialidade do labor, por não ser do segurado a responsabilidade pela observância da sistemática recomendada pela NHO 01, bastando que a exposição esteja embasada em estudo técnico realizado por profissional habilitado para tanto.
Nesse sentido, precedentes deste tribunal:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. RUÍDO. METODOLOGIA NHO-01 DA FUNDACENTRO. TEMA 1.083 DO STJ. PICOS DE RUÍDO. LIMITES DE TOLERÂNCIA. EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. (...) 3. O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço (Tema 1.083 do Superior Tribunal de Justiça). 4. A ausência de indicação, no PPP ou no laudo pericial, da metodologia empregada na verificação da exposição do trabalhador ao agente agressivo ruído, ou a utilização de metodologia diversa daquela indicada na NHO 01 da FUNDACENTRO, não impede o reconhecimento do exercício da atividade especial pela exposição a esse agente, devendo, nesse caso, a análise ser realizada de acordo com o critério de aferição apresentado no processo. (TRF4, AC 5015086-63.2018.4.04.7107, 5ª Turma, rel. Des. Federal Osni Cardoso Filho, juntado aos autos em 23/07/2022)
PREVIDENCIÁRIO. LABOR EXERCIDO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. DIREITO ADQUIRIDO. RUÍDO. METODOLOGIA DE AFERIÇÃO. FRIO. PERÍODO EM GOZO DE BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. APOSENTADORIA ESPECIAL. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. DER. AFASTAMENTO DA ATIVIDADE. TEMA 709 STF. IMPLANTAÇÃO. (...) 3. Considera-se especial a atividade desenvolvida com exposição a ruído superior a 80 dB até 05/03/1997; superior a 90 dB entre 06/03/1997 a 18/11/2003 e superior a 85 dB a partir de 19/11/2003 (REsp 1.398.260). Persiste a condição especial do labor, mesmo com a redução do ruído aos limites de tolerância pelo uso de EPI. 4. Conforme a Norma de Higiene Ocupacional nº 1 (NHO 01), da FUNDACENTRO, o ruído deve ser calculado mediante uma média ponderada (Nível de Exposição Normalizado - NEN). Em se tratando de níveis variáveis de ruído, deve-se adotar o critério do "pico de ruído", afastando-se o cálculo pela média aritmética simples, por não representar com segurança o grau de exposição ao agente nocivo durante a jornada de trabalho (Tema 1.083 do STJ). (...) (TRF4, AC 5012615-79.2015.4.04.7107, 5ª Turma, rel. Des. Federal Roger Raupp Rios, juntado aos autos em 14/09/2022)
Vale mencionar, ainda, que o Conselho de Recursos da Previdência Social - CRPS, conforme seu Enunciado nº 13, já alterado pela Resolução 33/2021 de seu Pleno, admite a informação do ruído aferido mediante as técnicas de "dosimetria" ou "áudio dosimetria" (grifado):
ENUNCIADO Nº 13
Atendidas as demais condições legais, considera-se especial, no âmbito do RGPS, a atividade exercida com exposição a ruído superior a 80 decibéis até 05/03/97, superior a 90 decibéis desta data até 18/11/2003, e superior a 85 decibéis a partir de então.
I – Os níveis de ruído devem ser medidos, observado o disposto na Norma Regulamentadora n. 15 (NR-15), anexos 1 e 2, com aparelho medidor de nível de pressão sonora, operando nos circuitos de compensação – dB (A) para ruído contínuo ou intermitente e dB (C) ou dB (linear) para ruído de impacto.
II – Até 31 de dezembro de 2003, para a aferição de ruído contínuo ou intermitente, é obrigatória a utilização das metodologias contidas na NR-15, devendo ser aceitos ou o nível de pressão sonora pontual ou a média de ruído, podendo ser informado decibelímetro, dosímetro ou medição pontual no campo “Técnica Utilizada” do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP).
III – A partir de 1º de janeiro de 2004, para a aferição de ruído contínuo ou intermitente, é obrigatória a utilização da técnica/metodologia contida na Norma de Higiene Ocupacional 01 (NHO – 01) da FUNDACENTRO ou na NR-15, que reflitam a medição de exposição durante toda a jornada de trabalho, vedada e medição pontual, devendo constar no PPP o nível de ruído em Nível de Exposição Normalizado – NEN ou a técnica/metodologia “dosimetria” ou “áudio dosimetria”.
IV – Em caso de omissão ou dúvida quanto à indicação da técnica/metodologia utilizada para aferição da exposição nociva ao agente ruído, o PPP não deve ser admitido como prova da especialidade, devendo ser apresentado o respectivo Laudo Técnico das Condições Ambientais do Trabalho (LTCAT) ou solicitada inspeção no ambiente de trabalho, para fins de verificar a técnica utilizada na medição.
Ademais, em face da superveniência da tese fixada no julgamento do Tema 1083 pelo Superior Tribunal de Justiça, os critérios a serem utilizados são os estabelecidos no referido precedente vinculante, o qual, repise-se, dispõe que: "O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço.
Anote-se, por fim, que a simples menção ao uso de EPI eficaz nos PPPs não descaracteriza a especialidade do labor, conforme fundamentado acima.
No caso concreto, os períodos controvertidos em grau de recurso são os seguintes:
Período: | De 18/06/1998 a 01/03/1999. |
Empresa: | Semeato S/A Indústria e Comércio. |
Função/Atividades: | Furador e torneiro mecânico. |
Agentes Nocivos: | Hidrocarbonetos (óleos e graxas minerais). |
Enquadramento Legal: | Código 1.2.10 do Anexo I/II do Decreto 83080/79. |
Provas: | PPP (evento 1, PROCADM18, p. 13) |
Conclusão: | Restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição ao(s) agente(s) nocivo(s) indicado(s) no período indicado. |
Período: | De 01/09/2001 a 04/06/2002. |
Empresa: | MHP Indústria e Assistência de Máquinas Ltda. |
Função/Atividades: | Torneiro mecânico. |
Agentes Nocivos: | Hidrocarbonetos (óleos, graxas, querosene e fumos metálicos). |
Enquadramento Legal: | Código 1.2.10 do Anexo I/II do Decreto 83080/79. |
Provas: | PPP (evento 1, PROCADM12 e PPP22). |
Conclusão: | Restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição ao(s) agente(s) nocivo(s) indicado(s) no período indicado. |
Períodos: | De 02/09/2002 a 18/11/2003 e de 02/06/2005 a 31/12/2007. |
Empresa: | DHP Indústria e Comércio Ltda. |
Função/Atividades: | Torneiro mecânico. |
Agentes Nocivos: | Ruído de 89,4 dB (para o segundo período) e hidrocarbonetos (óleos e graxas minerais). |
Enquadramento Legal: | Código 2.0.1 (superior a 85 decibéis) do Anexo IV do Decreto nº 3048/99, com a alteração introduzida pelo Decreto nº 4882/2003, e código 1.0.19 (outras substâncias químicas) dos Anexos IV dos Decretos n. 2172/97 e 3048/99. |
Provas: | PPP (evento 1, PROCADM9, p. 47; PROCADM10, p. 1; PROCADM13, p. 5, evento 1, PROCADM14, p. 71; evento 1, PPP22, p. 6); laudo pericial (evento 1, LAUDO35); |
Conclusão: | Restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição ao(s) agente(s) nocivo(s) indicado(s) nos períodos indicados. |
Aposentadoria especial
O INSS reconheceu como tempo de serviço especial os períodos de 25/08/1981 a 05/11/1982, 04/07/1988 a 03/08/1988 (que coincide em parte com o período de 01/08/1988 em diante, reconhecido na sentença) e 19/01/1994 a 28/09/1994 (evento 1, PROCADM20, pp. 61-66).
Em juízo foram reconhecidos, além dos períodos de 18/05/1983 a 24/05/1988, de 01/08/1988 a 16/12/1988, de 12/12/1989 a 26/01/1993, de 21/01/1997 a 12/09/1997, de 12/02/2001 a 11/05/2001, de 19/11/2003 a 01/06/2005, de 01/01/2008 a 12/11/2008, de 16/02/2009 a 20/10/2010, de 03/01/2011 a 04/05/2015, de 01/02/2016 a 01/03/2017 e de 03/04/2017 a 12/09/2018 (averbados por força da sentença), os interregnos de 18/06/1998 a 01/03/1999, de 01/09/2001 a 04/06/2002, de 02/09/2002 a 18/11/2003 e de 02/06/2005 a 31/12/2007 (reconhecidos neste acórdão).
Somando-se os intervalos em questão, chega-se a 27 anos, 7 meses e 7 dias de labor sob condições especiais, suficientes para a obtenção do benefício previsto no artigo 57 da Lei 8213/91.
Anote-se que ao tempo da DER (01/02/2019) não era exigível o cumprimento do requisito etário (60 anos de idade quando se tratar de atividade especial de 25 anos de contribuição), previsto na redação atual do artigo 64, inciso III, do Decreto 3048/99, cuja redação lhe foi dada pelo Decreto 10410, de 30 de junho de 2020.
A carência foi cumprida (383 contribuições computadas até a DER).
Aposentadoria da pessoa com deficiência
A aposentadoria por tempo de contribuição ou idade à pessoa com deficiência encontra previsão na Constituição Federal de 1988, na redação dada ao § 1º do artigo 201 pela Emenda Constitucional 47/2005:
Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
(...)
§ 1º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005).
A Lei Complementar 142/2013, com o objetivo de regulamentar o dispositivo constitucional, estabeleceu os critérios para concessão do benefício, nos seguintes termos:
Art. 2o Para o reconhecimento do direito à aposentadoria de que trata esta Lei Complementar, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Art. 3o É assegurada a concessão de aposentadoria pelo RGPS ao segurado com deficiência, observadas as seguintes condições:
I - aos 25 (vinte e cinco) anos de tempo de contribuição, se homem, e 20 (vinte) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência grave;
II - aos 29 (vinte e nove) anos de tempo de contribuição, se homem, e 24 (vinte e quatro) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência moderada;
III - aos 33 (trinta e três) anos de tempo de contribuição, se homem, e 28 (vinte e oito) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência leve; ou
IV - aos 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, independentemente do grau de deficiência, desde que cumprido tempo mínimo de contribuição de 15 (quinze) anos e comprovada a existência de deficiência durante igual período.
Parágrafo único. Regulamento do Poder Executivo definirá as deficiências grave, moderada e leve para os fins desta Lei Complementar.
Art. 4o A avaliação da deficiência será médica e funcional, nos termos do Regulamento.
Art. 5o O grau de deficiência será atestado por perícia própria do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, por meio de instrumentos desenvolvidos para esse fim.
Para regulamentar o grau de deficiência, foi editado o Decreto 8145/2013 - que alterou o Decreto 3048/99 - estabelecendo, em seu artigo 70-D, que a perícia para aferição do grau de deficiência deveria ser realizada nos termos de "ato conjunto do Ministro de Estado Chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, dos Ministros de Estado da Previdência Social, da Fazenda, do Planejamento, Orçamento e Gestão e do Advogado-Geral da União".
O ato conjunto de que trata o artigo 70-D do Decreto 3048/99 foi editado pela Portaria Interministerial AGU/MPS/MF/SEDH/MP 01, de 27/01/2014, a qual estabeleceu que a avaliação funcional deve ser realizada com base no conceito de funcionalidade disposto na Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde - CIF da Organização Mundial de Saúde, e mediante aplicação do índice de Funcionalidade Brasileiro Aplicado para Fins de Aposentadoria - IFBrA (parágrafo primeiro do artigo 2º) e a partir de 10/03/2020 o IFBrM, com a resolução nº 1/2020 do Conade, como previsto no Decreto 10177/2019.
Nesse passo, destacam-se os seguintes requisitos para o preenchimento da aposentadoria por tempo de contribuição do segurado com deficiência:
a) carência de 180 contribuições mensais;
b) qualidade de segurado do Regime Geral da Previdência Social;
c) ser portador de deficiência nos termos do artigo 3º da Lei Complementar 142/2013;
d) ter contribuído 25 anos, se homem, e 20 anos, se mulher, sendo a deficiência grave; 29 anos, se homem, e 24 anos, se mulher, sendo a deficiência moderada; e 33 anos, se homem, e 28 anos, se mulher, sendo a deficiência leve.
Acaso a deficiência avaliada e reconhecida não esteja presente na íntegra do período de contribuição necessário, há possibilidade de conversão de tempo comum/especial em tempo de trabalho na condição de pessoa com deficiência, e vice-versa, a fim de que se verifique o implemento das condições para a concessão da aposentadoria especial ou comum, obedecidos os critérios do artigo 70-E do Decreto 3048/1999:
Art. 70-E. Para o segurado que, após a filiação ao RGPS, tornar-se pessoa com deficiência, ou tiver seu grau alterado, os parâmetros mencionados nos incisos I, II e III do caput do art. 70-B serão proporcionalmente ajustados e os respectivos períodos serão somados após conversão, conforme as tabelas abaixo, considerando o grau de deficiência preponderante, observado o disposto no art. 70-A:
MULHER | ||||
TEMPO A CONVERTER | MULTIPLICADORES | |||
Para 20 | Para 24 | Para 28 | Para 30 | |
De 20 anos | 1,00 | 1,20 | 1,40 | 1,50 |
De 24 anos | 0,83 | 1,00 | 1,17 | 1,25 |
De 28 anos | 0,71 | 0,86 | 1,00 | 1,07 |
De 30 anos | 0,67 | 0,80 | 0,93 | 1,00 |
HOMEM | ||||
TEMPO A CONVERTER | MULTIPLICADORES | |||
Para 25 | Para 29 | Para 33 | Para 35 | |
De 25 anos | 1,00 | 1,16 | 1,32 | 1,40 |
De 29 anos | 0,86 | 1,00 | 1,14 | 1,21 |
De 33 anos | 0,76 | 0,88 | 1,00 | 1,06 |
De 35 anos | 0,71 | 0,83 | 0,94 | 1,00 |
§ 1° O grau de deficiência preponderante será aquele em que o segurado cumpriu maior tempo de contribuição, antes da conversão, e servirá como parâmetro para definir o tempo mínimo necessário para a aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência e para a conversão.
§ 2° Quando o segurado contribuiu alternadamente na condição de pessoa sem deficiência e com deficiência, os respectivos períodos poderão ser somados, após aplicação da conversão de que trata o caput.
Verifica-se, assim, que uma vez comprovada a deficiência, é necessário o estabelecimento de sua data de início, a fim de viabilizar o aproveitamento de eventuais períodos anteriores mediante a multiplicação pelo fator de conversão adequado.
Há a situação em que concomitantes o período de deficiência e o exercício de atividade que enseja o reconhecimento de tempo especial. Nos termos da LC 142/2013, a redução do tempo de contribuição decorrente de sua aplicação não pode ser acumulada, no que pertine ao mesmo período contributivo, com a redução assegurada aos casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física do trabalhador (artigo 10).
Todavia, se de um lado o Decreto 3048/1999, em seu artigo 70-F, confirma a impossibilidade de acumulação, de outro garante a conversão do tempo de contribuição cumprido em condições especiais, inclusive da pessoa com deficiência e para fins da aposentadoria especial em comento, se isso for mais favorável ao segurado, nos termos da tabela constante no § 1º:
MULHER | |||||
TEMPO A CONVERTER | MULTIPLICADORES | ||||
Para 15 | Para 20 | Para 24 | Para 25 | Para 28 | |
De 15 anos | 1,00 | 1,33 | 1,60 | 1,67 | 1,87 |
De 20 anos | 0,75 | 1,00 | 1,20 | 1,25 | 1,40 |
De 24 anos | 0,63 | 0,83 | 1,00 | 1,04 | 1,17 |
De 25 anos | 0,60 | 0,80 | 0,96 | 1,00 | 1,12 |
De 28 anos | 0,54 | 0,71 | 0,86 | 0,89 | 1,00 |
HOMEM | |||||
TEMPO A CONVERTER | MULTIPLICADORES | ||||
Para 15 | Para 20 | Para 25 | Para 29 | Para 33 | |
De 15 anos | 1,00 | 1,33 | 1,67 | 1,93 | 2,20 |
De 20 anos | 0,75 | 1,00 | 1,25 | 1,45 | 1,65 |
De 25 anos | 0,60 | 0,80 | 1,00 | 1,16 | 1,32 |
De 29 anos | 0,52 | 0,69 | 0,86 | 1,00 | 1,14 |
De 33 anos | 0,45 | 0,61 | 0,76 | 0,88 | 1,00 |
Em síntese, o segurado do RGPS que ostentar a condição de deficiente na data da entrada do requerimento administrativo ou na data da implementação das condições previstas na Lei Complementar 142/2013 e que comprovar o atendimento dos requisitos e condições nela previstos faz jus à concessão da aposentadoria diferenciada.
Por fim, quanto à renda do benefício, o cálculo deve observar ao disposto nos artigos 8º e 9º, inciso I, da Lei Complementar 142/2013:
Art. 8º A renda mensal da aposentadoria devida ao segurado com deficiência será calculada aplicando-se sobre o salário de benefício, apurado em conformidade com o disposto no art. 29 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, os seguintes percentuais:
I - 100% (cem por cento), no caso da aposentadoria de que tratam os incisos I, II e III do art. 3º; ou
II - 70% (setenta por cento) mais 1% (um por cento) do salário de benefício por grupo de 12 (doze) contribuições mensais até o máximo de 30% (trinta por cento), no caso de aposentadoria por idade.
Art. 9º Aplicam-se à pessoa com deficiência de que trata esta Lei Complementar:
I - o fator previdenciário nas aposentadorias, se resultar em renda mensal de valor mais elevado;
(...)
No caso concreto, o laudo médico (evento 30) aferiu que o apelante padece de perda de audição bilateral neuro-sensorial (CID H903) e fixou a data da deficiência em 25/11/2021, atribuindo-lhe pontuação de 3725.
A assistente social exarou laudo semelhante. Após visitar o recorrente em sua residência e examiná-lo, atribuiu-lhe pontuação idêntica, porém retroagiu a deficiência a 2008 (evento 44).
Somando-se as pontuações atribuídas pelos auxiliares do juízo, chega-se a 7450 pontos, o que caracteriza deficiência em grau leve.
Contudo, a juíza de primeiro grau deixou de conceder o benefício da Lei Complementar 142/2013 porque considerou que a deficiência teve início em 25/11/2021, é dizer, depois da DER (01/02/2019).
Sobre esse tópico, o apelante controverte. Sustenta que a perda auditiva começou em 2008 em razão da submissão a elevados níveis de pressão sonora, conforme exame de audiometria acostado aos autos, sendo a doença fator que reduz sua capacidade de interação na sociedade, impedindo-o de relacionar-se de forma equivalente a de uma pessoa sem deficiência.
Disse o recorrente:
Não há motivos para o Juízo de 1° grau considerar como início da deficiência a data de 25/11/2021, visto que há exames audiométricos anteriores (12/06/2008, 04/05/2015 e 15/10/2018) que informam ocorrência de perda auditiva, o recorrente somente realizou nova audiometria e consulta com otorrinolaringologista (Evento 7, ATESTMED5, Página 1/2), para cumprir a decisão judicial, não havendo razão fática para considerar como início da deficiência do autor a data do último atestado e exame audiométrico.
O laudo do evento 30 de fato tomou em consideração o atestado de 25/11/2021, o qual foi emitido porque o juízo, no despacho de recebimento da inicial, determinou a emenda da peça a fim de que a parte autora indicasse o grau da deficiência e delimitasse expressamente seus termos inicial e final, comprovando documentalmente suas alegações (evento 3).
De forma a cumprir a decisão, a parte agendou novo exame de audiometria e providenciou a juntada do atestado do evento 7 (ATESTMED5), o qual refere a deficiência a partir de tal data. A avaliação audiológica que o acompanha concluiu: "perda auditiva neurossensorial de grau moderado a partir de 3 khz em ambas as orelhas".
Pois bem.
A audiometria de 2008 refere perda auditiva neurossensorial leve, isolada em 4 khz, em ambos os ouvidos (evento 1, PROCADM16, p. 42).
Em 2015 o apelante submeteu-se a nova audiometria e a conclusão foi a mesma: perda auditiva neurossensorial leve, sendo de 4 e 6 khz no ouvido direito (evento 1, PROCADM16, p. 44).
Três anos depois, em 2018, o quadro havia se agravado: constatou-se perda leve neurossensorial no ouvido direito, porém moderada no esquerdo (evento 1, PROCADM16, p. 45).
Todos esses exames integraram o processo administrativo.
Significa que antes da DER o apelante padecia de perda auditiva neurossensorial, que se agravara de leve a moderada.
É razoável supor que a deficiência seja anterior à data acolhida pela magistrada de origem, já que em 2018 a perda auditiva era moderada no ouvido esquerdo e três anos depois moderada em ambos os ouvidos, a indicar um processo de agravamento do quadro, capaz de impor limitações ao recorrente, como somente entender a fala se proferida em voz alta e não distinguir todos os ruídos do dia-a-dia. Mesmo se considerarmos apenas o ouvido direito, cuja perda em 2018 ainda era leve, percebe-se uma queda nos gráficos das audiometrias a ponto de, naquele ano, a capacidade do órgão estar na fronteira que separa a perda auditiva leve da moderada.
Assim, embora não haja elementos de prova que permitam fixar a deficiência em 2008, como requer a parte e o fez a assistente social, pelo menos a 15/10/2018 este juízo entende ser possível retroagi-la, com respaldo justamente no exame feito na Alpha Fonoaudiologia em tal data, que demonstra que o quadro vinha se agravando, tanto que, em 2021, quando o demandante submeteu-se a novo exame para cumprir a determinação judicial, a perda auditiva vinha progredindo a ponto de, nessa ocasião, o médico considerá-lo deficiente.
Nesse contexto, fixa-se como data provável do início da deficiência o dia 15/10/2018, data que, como visto, é anterior ao dia em que requerido o benefício.
Se o tempo de labor na condição de deficiente (de 15/10/2018 a 01/02/2019) é insuficiente para a concessão do benefício na "forma pura", é dizer, nos exatos moldes do artigo 3º, inciso III, da Lei Complementar 142/2013, viável a conversão do tempo de serviço comum/especial em tempo de trabalho na condição de pessoa com deficiência a fim de que se verifique o implemento das condições para a obtenção do benefício conforme os critérios do prefalado artigo 70-F do Decreto 3048/99.
Considerando-se os períodos de deficiência, além dos períodos especiais e comuns, tem-se o seguinte cenário na DER (01/02/2019):
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA
| Data de Nascimento | 15/09/1964 |
|---|---|
| Sexo | Masculino |
| DER | 01/02/2019 |
DEFICIÊNCIA PREPONDERANTE
| Início | Fim | Grau | Duração |
| 15/10/2018 | Até a presente data | Leve | - |
| Tempo de deficiência até a DER: 3 meses e 17 dias | |||
| Deficiência preponderante: Leve | |||
CONTAGEM DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO (CONVERTIDO PARA A DEFICIÊNCIA PREPONDERANTE)
Nº | Nome/Anotações | Início | Fim | Deficiência | Multiplicador aplicado | Tempo (anos, meses e dias) | |
1 | - | 02/10/1978 | 04/03/1979 | Sem deficiência | 1 (tempo comum) | 00 05 03 | |
2 | - | 07/11/1979 | 07/11/1979 | Sem deficiência | 1 | 00 00 01 | |
3 | - | 25/08/1981 | 05/11/1982 | Sem deficiência | 1,32 (tempo especial) | 01 06 29
| |
4 | - | 27/04/1983 | 12/05/1983 | Sem deficiência | 1 | 00 00 16 | |
5 | - | 18/05/1983 | 24/05/1988 | Sem deficiência | 1,32 | 06 07 15 | |
6 | - | 04/07/1988 | 31/07/1988 | Sem deficiência | 1,32 | 00 01 07 | |
7 | - | 01/08/1988 | 16/12/1988 | Sem deficiência | 1,32 | 00 06 00
| |
8 | - | 02/01/1989 | 30/11/1989 | Sem deficiência | 1 | 00 10 29 | |
9 | - | 12/12/1989 | 26/01/1993 | Sem deficiência | 1,32 | 04 01 15 | |
10 | - | 19/01/1994 | 28/09/1994 | Sem deficiência | 1,32 | 00 11 00 | |
11 | - | 21/01/1997 | 12/09/1997 | Sem deficiência | 1,32 | 00 10 06 | |
12 | - | 18/06/1998 | 01/03/1999 | Sem deficiência | 1,32 | 00 11 05 | |
13 | - | 06/09/1999 | 08/01/2000 | Sem deficiência | 1 | 00 04 03
| |
14 | - | 10/01/2000 | 31/05/2000 | Sem deficiência | 1 | 00 04 22 | |
15 | - | 02/01/2001 | 31/01/2001 | Sem deficiência | 1 | 00 01 00 | |
16 | - | 12/02/2001 | 11/05/2001 | Sem deficiência | 1,32 | 00 03 29 | |
17 | - | 01/06/2001 | 30/07/2001 | Sem deficiência | 1 | 00 02 00 | |
18 | - | 01/09/2001 | 04/06/2002 | Sem deficiência | 1,32 | 01 00 02 | |
19 | - | 02/09/2002 | 18/11/2003 | Sem deficiência | 1,32 | 01 07 07 | |
20 | - | 19/11/2003 | 01/06/2005 | Sem deficiência | 1,32 | 02 00 10
| |
21 | - | 02/06/2005 | 31/12/2007 | Sem deficiência | 1,32 | 03 04 28 | |
22 | - | 01/01/2008 | 12/11/2008 | Sem deficiência | 1,32 | 01 01 22
| |
23 | - | 16/02/2009 | 20/10/2010 | Sem deficiência | 1,32 | 02 02 19 | |
24 | - | 03/01/2011 | 04/05/2015 | Sem deficiência | 1,32 | 05 08 22 | |
25 | - | 01/02/2016 | 01/03/2017 | Sem deficiência | 1,32 | 01 05 06 | |
26 | - | 03/04/2017 | 12/09/2018 | Sem deficiência | 1,32 | 01 10 26 | |
27 | - | 13/09/2018 | 14/10/2018 | Sem deficiência | 1 | 00 01 02 | |
28 | - | 15/10/2018 | 01/02/2019 | Leve | 1 | 00 03 17
| |
| TOTAL | 39 anos, 02 meses e 11 dias | ||||||
| |||||||
Em 01/02/2019 (DER), o segurado tem direito à aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência conforme o artigo 3º da Lei Complementar 142/2013, porque cumpriu o tempo mínimo de 33 anos de contribuição exigido pelo inciso III para a deficiência preponderante leve, conforme se vê na tabela acima.
Portanto, reconhecido o direito às aposentadorias especial e na condição de deficiente desde a DER, além da aposentadoria por tempo de contribuição comum reconhecida na sentença, faculta-se ao segurado optar pelo benefício mais vantajoso a teor do artigo 70-G do Decreto 3048/99.
Passa-se aos consectários da condenação.
Correção monetária e juros de mora
De início, importa esclarecer que a correção monetária e os juros de mora, sendo consectários da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados até mesmo de ofício. Assim, sua alteração não implica falar em reformatio in pejus.
Em 03/10/2019, o STF concluiu o julgamento dos Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário 870947 (Tema 810), em regime de repercussão geral, rejeitando-os e não modulando os efeitos do julgamento proferido em 20/09/2017.
Com isso, ficou mantido o seguinte entendimento:
1. No tocante às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios idênticos aos juros aplicados à caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/1997 com a redação dada pela Lei 11.960/2009.
2. O artigo 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei 11.960/2009, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina, devendo incidir o IPCA-E, considerado mais adequado para recompor a perda do poder de compra.
Após o julgamento definitivo do Tema 810 pelo Supremo Tribunal Federal, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema 905, tratou acerca dos índices aplicáveis a depender da natureza da condenação. Quanto às condenações judiciais de natureza previdenciária, os critérios de juros e correção monetária ficaram assim definidos:
As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).
Logo, a correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada da seguinte forma:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91) até o advento da EC 113/2021.
Os juros de mora, por sua vez, incidentes desde a citação (súmula 204 do STJ), de forma simples (não capitalizada), devem observar os seguintes índices e períodos:
- 1% ao mês até 29/06/2009;
- a partir de 30/06/2009, haverá a incidência uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009) até o advento da EC 113/2021.
Importante referir que para os benefícios de natureza assistencial o índice aplicável a partir de 04/2006 é o IPCA-E, e não o INPC.
A partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deve ser observada a redação dada ao artigo 3º da EC 113/2021, a qual estabelece que, nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente:
Art. 3º Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente.
Por fim, não se cogita de violação aos Temas 810/STF e 905/STJ em razão da aplicação da SELIC, porquanto o julgamento da questão pelo tribunais superiores não impede a alteração pelo poder constituinte derivado, cujo poder de reforma está limitado materialmente apenas às hipóteses previstas no artigo 60, § 4º, da Constituição Federal.
Nesse cenário, provê-se o recurso do INSS para afastar a capitalização dos juros determinada na sentença.
Custas e despesas processuais
O INSS é isento de custas quando litigante na Justiça Federal (artigo 4º, inciso I, da Lei 9289/96).
Honorários advocatícios
Recorreu a parte autora quanto aos honorários a fim de que, reformada a sentença, tenham como base o percentual máximo de cada faixa de valor informada no artigo 85 do Código de Processo Civil, ou ao menos o percentual mínimo de 10% para cada faixa, sobre o montante total da condenação.
Em ações previdenciárias, os honorários advocatícios devem ser arbitrados em percentual sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência (súmulas 76 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região e 111 do Superior Tribunal de Justiça). Importa destacar que, de acordo com a tese firmada no Tema 1105 do STJ, com acórdão publicado em 27/03/2023, “continua eficaz e aplicável o conteúdo da Súmula 111/STJ (com a redação modificada em 2006), mesmo após a vigência do CPC/2015, no que tange à fixação de honorários advocatícios”.
O artigo 86, parágrafo único, do CPC estabelece: "Se um litigante sucumbir em parte mínima do pedido, o outro responderá, por inteiro, pelas despesas e pelos honorários". Na hipótese, com a reforma da sentença, após o quê a parte autora obteve o reconhecimento ao direito a todas as espécies de benefício postuladas, de maneira que o processo atingiu plenamente suas finalidades.
Ainda que assim não fosse, a jurisprudência deste Tribunal entende que, havendo concessão de benefício independentemente do reconhecimento de todos os períodos postulados, a sucumbência da parte deve ser considerada mínima. Confira-se:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SUCUMBÊNCIA MÍNIMA. Havendo concessão de benefício, resta configurada a sucumbência mínima da parte autora, devendo o INSS arcar integralmente com os honorários advocatícios. (AC 5005293-61.2022.4.04.7107, rel. para acórdão Des. Federal Alexandre Gonçalves Lippel, j. em 17/06/2025)
PREVIDENCIÁRIO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. RUÍDO. RECONHECIMENTO. CONVERSÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. (...) 6. Havendo concessão de benefício aposentadoria por tempo de contribuição, resta configurada a sucumbência mínima da parte autora, devendo o INSS arcar integralmente com os honorários advocatícios. (AC 5005900-97.2020.4.04.7122, rel. para acórdão Des. Federal Alexandre Gonçalves Lippel, j. em 17/06/2025)
Dessa forma, dá-se provimento ao recurso da parte autora no ponto para condenar o INSS ao pagamento dos honorários advocatícios nos percentuais mínimos previstos em cada faixa do artigo 85, § 3º, do Código de Processo Civil, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença de parcial procedência, nos termos das súmulas 76 do TRF4 e 111 do STJ, e as variáveis do artigo 85, § 2º, incisos I a IV, do Código de Processo Civil.
No que concerne à majoração recursal, ressalte-se que, consoante entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, é cabível quando se trata de "recurso não conhecido integralmente ou desprovido, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente" (STJ, AgInt nos EREsp 1539725, rel. Ministro Antônio Carlos Ferreira, 2ª Seção, DJe 19/10/2017), o que foi reafirmado no Tema 1059/STJ:
A majoração dos honorários de sucumbência prevista no art. 85, § 11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente. Não se aplica o art. 85, § 11, do CPC em caso de provimento total ou parcial do recurso, ainda que mínima a alteração do resultado do julgamento e limitada a consectários da condenação.
Contudo, havendo provimento do recurso, ainda que parcial, descabe a majoração.
Prequestionamento
O enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal e a análise da legislação aplicável são suficientes para prequestionar, às instâncias superiores, os dispositivos que as fundamentam. Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração para esse exclusivo fim, o que evidenciaria finalidade de procrastinação do recurso, passível, inclusive, de cominação de multa, nos termos do artigo 1026, § 2º, do Código de Processo Civil.
Dispositivo
ANTE O EXPOSTO, voto por dar parcial provimento à apelação da parte autora para reconhecer a especialidade dos labores desenvolvidos de 18/06/1998 a 01/03/1999, de 01/09/2001 a 04/06/2002, de 02/09/2002 a 18/11/2003 e de 02/06/2005 a 31/12/2007, reconhecer-lhe o direito à aposentadoria especial e por tempo de contribuição na condição de deficiente a contar da DER (01/02/2019), facultando-lhe a opção pelo benefício mais vantajoso, bem como para condenar o INSS a suportar exclusivamente as despesas processuais e os honorários advocatícios.
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Apelação Cível Nº 5017536-71.2021.4.04.7107/RS
RELATORA Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. APOSENTADORIA ESPECIAL. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. PARCIAL PROVIMENTO.
I. CASO EM EXAME:
1. Ação de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência, com pedido de reconhecimento de períodos de trabalho especial e, sucessivamente, aposentadoria especial ou por tempo de contribuição convencional. A sentença julgou parcialmente procedentes os pedidos, reconhecendo alguns períodos como especiais e concedendo aposentadoria por tempo de contribuição comum. O autor apelou buscando a anulação da sentença para reabertura da instrução processual, retroação da data de início da deficiência, reconhecimento de períodos adicionais como especiais e concessão de aposentadoria da pessoa com deficiência ou aposentadoria especial.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO:
2. Há cinco questões em discussão: (i) a necessidade de reabertura da instrução processual para nova prova pericial sobre a deficiência e a especialidade de alguns períodos de trabalho; (ii) a data de início da deficiência do autor; (iii) o reconhecimento da especialidade de períodos de trabalho adicionais; (iv) o direito à aposentadoria da pessoa com deficiência ou aposentadoria especial; e (v) a distribuição dos ônus sucumbenciais.
III. RAZÕES DE DECIDIR:
3. As preliminares de cerceamento de defesa foram rejeitadas. Os formulários PPP e laudos técnicos já apresentados são suficientes para a análise da especialidade das atividades, e os problemas técnicos na planilha de avaliação da deficiência foram corrigidos pelo próprio juízo, garantindo a correta pontuação e caracterização da deficiência leve, tornando desnecessária a produção de novas provas, conforme o artigo 370 do CPC.4. Foram reconhecidos como tempo de serviço especial os períodos de 18/06/1998 a 01/03/1999, de 01/09/2001 a 04/06/2002, de 02/09/2002 a 18/11/2003 e de 02/06/2005 a 31/12/2007, devido à exposição a hidrocarbonetos (óleos, graxas, querosene, fumos metálicos) e ruído (89,4 dB), com base nos Decretos 83080/79, 2172/97, 3048/99 e 4882/2003, e na jurisprudência do STJ (Temas 534 e 1083) e do TRF4 (IRDR Tema 15), que admitem a avaliação qualitativa para hidrocarbonetos e a metodologia de medição de ruído (NEN ou pico), bem como a ineficácia de EPIs para certos agentes.5. O autor tem direito à aposentadoria especial, pois a soma dos períodos de trabalho em condições especiais, incluindo os reconhecidos neste acórdão, totaliza 27 anos, 7 meses e 7 dias, superando o mínimo de 25 anos exigido pelo artigo 57 da Lei 8213/91. O requisito etário não era aplicável na DER (01/02/2019), e a carência foi devidamente cumprida.6. O autor também faz jus à aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência. A deficiência auditiva neurossensorial foi classificada como leve (7450 pontos), e sua data de início foi fixada em 15/10/2018, anterior à DER (01/02/2019), com base em exames audiométricos que indicavam agravamento progressivo do quadro. Com a conversão dos períodos de trabalho comum e especial para a condição de deficiente leve, o autor totaliza 39 anos, 2 meses e 11 dias de contribuição na DER, superando os 33 anos exigidos pelo artigo 3º, inciso III, da Lei Complementar 142/2013.7. A correção monetária das parcelas vencidas será pelo IGP-DI (05/96 a 03/2006) e INPC (04/2006 até EC 113/2021). Os juros de mora incidirão a 1% ao mês (até 29/06/2009) e, a partir de 30/06/2009, pelos índices da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97) até a EC 113/2021. A partir de 09/12/2021, aplica-se a taxa Selic (art. 3º da EC 113/2021). A capitalização dos juros determinada na sentença foi afastada.8. O INSS foi condenado a suportar exclusivamente os honorários advocatícios, em razão da sucumbência mínima do autor, conforme o art. 86, parágrafo único, do CPC. Os honorários serão calculados nos percentuais mínimos do art. 85, § 3º, do CPC, sobre as parcelas vencidas até a data da sentença, em consonância com as Súmulas 76 do TRF4 e 111 do STJ, e o Tema 1105 do STJ. Não houve majoração recursal, pois o recurso foi parcialmente provido (Tema 1059 do STJ). O INSS é isento de custas na Justiça Federal (art. 4º, I, da Lei 9289/96).
IV. DISPOSITIVO E TESE:
9. Recurso parcialmente provido.Tese de julgamento: 10. É possível o reconhecimento da aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência e da aposentadoria especial, mediante a conversão de tempo comum/especial e a retroação da data de início da deficiência com base em exames anteriores, quando comprovada a exposição a agentes nocivos e a progressão da condição de saúde.
___________
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 201, § 1º; CPC, arts. 85, § 2º, § 3º, 86, p.u., 370; Lei nº 8.213/1991, arts. 57, 58; Lei nº 9.494/1997, art. 1º-F; Lei Complementar nº 142/2013, art. 3º, III; Emenda Constitucional nº 113/2021, art. 3º; Decreto nº 3.048/1999, art. 70-E; Decreto nº 4.882/2003.
Jurisprudência relevante citada: STF, AgR no ARE 664.335 (Tema 555), j. 04.12.2014; STF, ED no RE 870.947 (Tema 810), j. 03.10.2019; STJ, REsp 1.306.113 (Tema 534), Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 07.03.2013; STJ, REsp 1.398.260/PR (Tema 694); STJ, REsp 1.886.795 (Tema 1083), Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 25.11.2021; STJ, REsp 2.080.584 (Tema 1090), Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 09.04.2025; STJ, AgInt no AREsp 1.204.070/MG, Rel. Min. Francisco Falcão, j. 08.05.2018; STJ, Tema 905; STJ, Tema 1059; STJ, Tema 1105; STJ, Súmula 111; TRF4, IRDR 5054341-77.2016.4.04.0000/SC (Tema 15); TRF4, Súmula 76.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora para reconhecer a especialidade dos labores desenvolvidos de 18/06/1998 a 01/03/1999, de 01/09/2001 a 04/06/2002, de 02/09/2002 a 18/11/2003 e de 02/06/2005 a 31/12/2007, reconhecer-lhe o direito à aposentadoria especial e por tempo de contribuição na condição de deficiente a contar da DER (01/02/2019), facultando-lhe a opção pelo benefício mais vantajoso, bem como para condenar o INSS a suportar exclusivamente as despesas processuais e os honorários advocatícios, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de outubro de 2025.
Documento eletrônico assinado por VÂNIA HACK DE ALMEIDA, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005312749v4 e do código CRC d8e4228e.
Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): VÂNIA HACK DE ALMEIDAData e Hora: 27/10/2025, às 15:22:53
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Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 17/10/2025 A 24/10/2025
Apelação Cível Nº 5017536-71.2021.4.04.7107/RS
RELATORA Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
PRESIDENTE Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
PROCURADOR(A) VITOR HUGO GOMES DA CUNHA
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 17/10/2025, às 00:00, a 24/10/2025, às 16:00, na sequência 1042, disponibilizada no DE de 08/10/2025.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARA RECONHECER A ESPECIALIDADE DOS LABORES DESENVOLVIDOS DE 18/06/1998 A 01/03/1999, DE 01/09/2001 A 04/06/2002, DE 02/09/2002 A 18/11/2003 E DE 02/06/2005 A 31/12/2007, RECONHECER-LHE O DIREITO À APOSENTADORIA ESPECIAL E POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO NA CONDIÇÃO DE DEFICIENTE A CONTAR DA DER (01/02/2019), FACULTANDO-LHE A OPÇÃO PELO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO, BEM COMO PARA CONDENAR O INSS A SUPORTAR EXCLUSIVAMENTE AS DESPESAS PROCESSUAIS E OS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
RELATORA DO ACÓRDÃO Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Votante Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Votante Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
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