
Apelação Cível Nº 5006647-04.2020.4.04.7201/SC
RELATORA Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
RELATÓRIO
Trata-se de Apelação interposta por P. D. M. e pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS contra a sentença que assim se pronunciou quanto ao pedido inicial ():
3. Dispositivo:
Diante do exposto, resolvo o mérito da presente demanda julgando PROCEDENTE o pedido de reconhecimento da especialidade nos períodos de 1º.03.1994 a 05.04.1999, 07.05.1999 a 24.09.2004 e 1º.10.2004 a 11.04.2019 (art. 487, I, do CPC).
Como consequência, condeno o INSS a conceder à parte autora o benefício de aposentadoria especial n. 188.242.728-6, com DIB em 11.04.2019. Ainda, condeno o demandado ao pagamento das parcelas vencidas desde a data do requerimento administrativo (11.04.2019), com correção monetária e juros de mora na forma explicitada na fundamentação.
Tendo em vista a decisão vinculante proferida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento do Tema Repetitivo n. 709, declarando a constitucionalidade do art. 57, §8º, da Lei n. 8.213/91, deve a parte autora afastar-se de qualquer atividade especial a partir do momento da efetiva implantação da aposentadoria especial concedida nesta sentença.
Condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência. Fixo os honorários advocatícios sucumbenciais para a etapa de conhecimento (art. 85, caput, do CPC) no percentual de 10%, incidentes sobre o que não exceder a 200 salários mínimos (§3º, I), e em 8% sobre o que ultrapassar esse limite (§3º, II, e §5º), sempre tendo como base de cálculo o valor da condenação do proveito econômico obtido, excluídas as parcelas vincendas posteriores à sentença ou, não sendo possível mensurá-lo, do valor atualizado da causa (§2º).
Sentença não sujeita à remessa necessária prevista no art. 496 do CPC, visto que a condenação ou o proveito econômico obtido na causa é inferior a 1.000 (um mil) salários mínimos (§3º, inciso I).
Considerando a isenção disposta no artigo 4º, incisos I e II, da Lei n. 9.289/96, não há imposição do pagamento das custas.
Por questão de economia processual e na hipótese de haver apelação(ões), verificada a tempestividade da apelação (art. 1003, §5º, c/c art. 183 do CPC), o apelado deverá ser intimado para, querendo, apresentar contrarrazões em 15 (quinze) dias (art. 1010, §1º, do CPC).
Apresentadas ou não as contrarrazões, remeta-se o feito à instância recursal.
Anote-se que não cabe a este juízo pronunciar-se sobre a admissibilidade da apelação (art. 1010, §3º, parte final), cujo recurso tem como regra geral o efeito suspensivo (art. 1012, caput).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Nas razões recursais (), a parte autora sustenta que: (i) para os períodos laborais de 01/03/1994 a 05/04/1999 e de 07/05/1999 a 24/09/2004, os Perfis Profissiográficos Previdenciários apresentados não informam o Certificado de Aprovação dos Equipamentos de Proteção Individual, o que desacredita a alegação de eficácia desses equipamentos; (ii) a mera menção genérica à existência de EPI eficaz no PPP é insuficiente para afastar a caracterização da atividade especial, especialmente diante da ausência do CA e da natureza do agente nocivo, a radiação ionizante, reconhecidamente cancerígena. Requer, portanto, que seja declarada nos autos a inexistência do Certificado de Aprovação nos PPPs dos períodos mencionados, mantido o reconhecimento dos períodos especiais independentemente do uso de EPI, concedida a aposentadoria especial apurada em 25 anos e 3 dias, reformada a sentença nos pontos contestados e condenado o recorrido ao pagamento de honorários advocatícios de segundo grau.
O INSS (), por sua vez, em razões recursais alega que: (i) deve ser afastada a especialidade dos períodos de 01/03/1994 a 05/04/1999, 07/05/1999 a 24/09/2004 e 01/10/2004 a 11/04/2019, uma vez que a utilização de equipamento de proteção individual eficaz, com certificado de aprovação e atestada no Perfil Profissiográfico Previdenciário, neutralizou a nocividade dos agentes químicos, afastando a especialidade da atividade, em violação aos princípios do devido processo legal, livre convencimento motivado, legalidade, isonomia, ampla defesa, divisão de poderes, prévia fonte de custeio e equilíbrio financeiro e atuarial; (ii) para o agente radiação ionizante, é necessária a comprovação quantitativa de que a exposição superou os limites legais de tolerância, o que não ocorreu nos autos; (iii) o reconhecimento da especialidade para os agentes cancerígenos, para os períodos anteriores a 8 de outubro de 2014, também carece de amparo legal, pois a análise qualitativa somente se aplica a partir dessa data para substâncias específicas; (iv) o magistrado, ao conceder o benefício sem o atendimento dos requisitos legais, atuou como legislador positivo, violando a separação de poderes. Requer, portanto, a reforma da decisão para julgar improcedente o pedido da parte autora.
Com as contrarrazões ( e ), vieram os autos para esta Corte.
É o relatório.
VOTO
I - Interesse recursal
A parte autora requer seja declarada nos autos a inexistência do Certificado de Aprovação dos EPIs nos PPPs dos períodos de 01/03/1994 a 05/04/1999, 07/05/1999 a 24/09/2004 e 01/10/2004 a 11/04/2019.
Contudo, o juízo a quo reconheceu a especialidade dos referidos períodos em vista da exposição habitual e permanente a radiações não-ionizantes, agente diante do qual o EPI é ineficaz em elidir a nocividade à saúde humana, de sorte que ausente interesse recursal da parte autora.
Veja-se o que dispôs a sentença:
O TRF4 vem decidindo o que segue em relação aos agentes cancerígenos e à radiação ionizante:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. SENTENÇA ANTERIOR AO CPC DE 2015. CABIMENTO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL COMO SEGURADO ESPECIAL. CONTRADIÇÕES. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTE NOCIVO RUÍDO. COMPROVAÇÃO - REQUISITOS LEGAIS. REPETITIVO DO STJ. TEMA 546. AGENTES QUÍMICOS. CONVERSÃO DE TEMPO COMUM EM ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS APÓS A LEI 9.032/95. CONVERSÃO VEDADA. APOSENTADORIA ESPECIAL. REQUISITOS ATENDIDOS. EFEITOS FINANCEIROS DA CONDENAÇÃO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. SUSPENSÃO DO PRAZO. CONSECTÁRIOS LEGAIS DA CONDENAÇÃO. RE Nº 870.947/SE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. EFEITO SUSPENSIVO. INDEFINIÇÃO. DIFERIMENTO PARA A FASE DE CUMPRIMENTO. CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. IMPLANTAÇÃO IMEDIATA.
[…]
6. O uso de EPI eficaz, apto a afastar a especialidade do tempo, somente pode ser aplicado a partir de 2-6-1998, tendo em conta que no período anterior vigente a orientação contida na Ordem de Serviço do INSS/DSS nº 564/97, cujo item 12.2.5. estabelecia que o uso do Equipamento de Proteção Individual - EPI não descaracteriza o enquadramento da atividade sujeita a agentes agressivos à saúde ou à integridade física.
[…]
9. Nos termos do IRDR (Tema 15), esta Corte fixou o entendimento de que: a) quando o LTCAT e o PPP informam não ser eficaz o EPI, há a especialidade do período de atividade; b) quando a empresa informa no PPP a existência de EPI e sua eficácia, obrigatoriamente deverá ser oficiado ao empregador para fornecimento dos registros sobre o fornecimento do EPI e, apresentada a prova, deverá ser determinada a realização de prova pericial; e c) a utilização de EPI não afasta a especialidade do labor, pois é presumida a sua ineficácia: i) em períodos anteriores a 3-12-1998; ii) quando há enquadramento da categoria profissional; iii) em relação aos seguintes agentes nocivos: ruído, agentes biológicos, agentes cancerígenos (como asbestos e benzeno), agentes periculosos (como eletricidade), calor, radiações ionizantes e trabalhos sob condições hiperbáricas, trabalhos sob ar comprimido.
[…]
(TRF4 5002033-39.2014.4.04.7015, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MARCELO MALUCELLI, juntado aos autos em 17/09/2019).
Pois bem, nos termos do exposto acima, entendo que a exposição da segurada à radiação ionizante, agente comprovadamente carcinogênico para humanos, permite o reconhecimento da especialidade nos períodos de 1º.03.1994 a 05.04.1999, 07.05.1999 a 24.09.2004 e 1º.10.2004 a 11.04.2019, pelos códigos n. 1.1.4 do quadro a que se refere o art. 2º do Decreto n. 53.831/64 e n. 1.1.3 do Anexo I do Decreto n. 83.080/79, ainda que tenha o trabalhador utilizado EPIs.
De qualquer maneira, cumpre obtemperar que assiste razão à parte autora na tese quanto à ausência de comprovação da eficácia do EPI quando não há registro em PPP do Certificado de Aprovação.
No entanto, não há interesse recursal em apelação que pretenda exclusivamente a ampliação de fundamentos referentes a períodos especiais já reconhecidos em sentença, tendo em vista que apenas a parte dispositiva da decisão é apta a produzir coisa julgada material, nos termos do artigo 504 do CPC.
II - Análise do Mérito
A controvérsia recursal cinge-se ao reconhecimento das condições especiais da atividade laboral da parte autora.
A sentença de origem não reconheceu a especialidade, fundamentando que:
II ? Caso concreto
A demandante pretende ver reconhecida a especialidade das atividades desenvolvidas nos períodos de 1º.03.1994 a 05.04.1999, 07.05.1999 a 24.09.2004 e 1º.10.2004 a 11.04.2019, nos quais exerceu o cargo de técnico em RX, nos setores de radiologia e tomografia, nos empregadores "Instituto de Pesquisas Neurológicas de Joinville" e "Centro de Tomografia Joinville Ltda.", exposta à radiação ionizante, como fazem prova os perfis profissiográfico previdenciário apresentados no evento 01, PROCADM5, fls. 04-05, 06-07 e 08-10.
Os laudos técnicos de condições ambientais elaborados pelas empresas empregadoras em outubro de 2006 e junho de 2016 (LAUDO2, evento 12 e LAUDO2, evento 31) corroboram as informações constantes dos formulários, notadamente acerca da exposição habitual do técnico em RX/radiologia à radiação ionizante.
Não obstante os PPPs apresentados indicarem que os EPIs utilizados neutralizam os efeitos prejudiciais da exposição à radiação ionizante, entendo que há que se reconhecer a especialidade independentemente daquela utilização. Explico.
O §4º art. 68 do Decreto n. 3.048/99, com a redação que lhe conferiu o Decreto n. 8.123/2013, dispõe que a presença de agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos no ambiente de trabalho será suficiente para a comprovação da efetiva exposição do trabalhador.
Art. 68. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, considerados para fins de concessão de aposentadoria especial, consta do Anexo IV.
§4º. A presença no ambiente de trabalho, com possibilidade de exposição a ser apurada na forma dos §§2o e 3o, de agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos em humanos, listados pelo Ministério do Trabalho e Emprego, será suficiente para a comprovação de efetiva exposição do trabalhador.
Referida lista de agentes cancerígenos foi publicada como anexo da Portaria Interministerial MTE/MS/MPS n. 9, de 07.10.2014, no qual consta a descrição de agentes em três grupos distinto, a saber:
Grupo 1 - agentes confirmados como cancerígenos para humanos;
Grupo 2 - agentes provavelmente carcinogênicos para humanos;
Grupo 3 - agentes possivelmente carcinogênicos para humanos;
A radiação X encontra-se descrita no grupo 1.
O TRF4 vem decidindo o que segue em relação aos agentes cancerígenos e à radiação ionizante:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. SENTENÇA ANTERIOR AO CPC DE 2015. CABIMENTO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL COMO SEGURADO ESPECIAL. CONTRADIÇÕES. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTE NOCIVO RUÍDO. COMPROVAÇÃO - REQUISITOS LEGAIS. REPETITIVO DO STJ. TEMA 546. AGENTES QUÍMICOS. CONVERSÃO DE TEMPO COMUM EM ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS APÓS A LEI 9.032/95. CONVERSÃO VEDADA. APOSENTADORIA ESPECIAL. REQUISITOS ATENDIDOS. EFEITOS FINANCEIROS DA CONDENAÇÃO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. SUSPENSÃO DO PRAZO. CONSECTÁRIOS LEGAIS DA CONDENAÇÃO. RE Nº 870.947/SE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. EFEITO SUSPENSIVO. INDEFINIÇÃO. DIFERIMENTO PARA A FASE DE CUMPRIMENTO. CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. IMPLANTAÇÃO IMEDIATA.
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6. O uso de EPI eficaz, apto a afastar a especialidade do tempo, somente pode ser aplicado a partir de 2-6-1998, tendo em conta que no período anterior vigente a orientação contida na Ordem de Serviço do INSS/DSS nº 564/97, cujo item 12.2.5. estabelecia que o uso do Equipamento de Proteção Individual - EPI não descaracteriza o enquadramento da atividade sujeita a agentes agressivos à saúde ou à integridade física.
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9. Nos termos do IRDR (Tema 15), esta Corte fixou o entendimento de que: a) quando o LTCAT e o PPP informam não ser eficaz o EPI, há a especialidade do período de atividade; b) quando a empresa informa no PPP a existência de EPI e sua eficácia, obrigatoriamente deverá ser oficiado ao empregador para fornecimento dos registros sobre o fornecimento do EPI e, apresentada a prova, deverá ser determinada a realização de prova pericial; e c) a utilização de EPI não afasta a especialidade do labor, pois é presumida a sua ineficácia: i) em períodos anteriores a 3-12-1998; ii) quando há enquadramento da categoria profissional; iii) em relação aos seguintes agentes nocivos: ruído, agentes biológicos, agentes cancerígenos (como asbestos e benzeno), agentes periculosos (como eletricidade), calor, radiações ionizantes e trabalhos sob condições hiperbáricas, trabalhos sob ar comprimido.
[?]
(TRF4 5002033-39.2014.4.04.7015, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MARCELO MALUCELLI, juntado aos autos em 17/09/2019).
Pois bem, nos termos do exposto acima, entendo que a exposição da segurada à radiação ionizante, agente comprovadamente carcinogênico para humanos, permite o reconhecimento da especialidade nos períodos de 1º.03.1994 a 05.04.1999, 07.05.1999 a 24.09.2004 e 1º.10.2004 a 11.04.2019, pelos códigos n. 1.1.4 do quadro a que se refere o art. 2º do Decreto n. 53.831/64 e n. 1.1.3 do Anexo I do Decreto n. 83.080/79, ainda que tenha o trabalhador utilizado EPIs.
A decisão do juízo a quo não merece reparos. A análise probatória foi precisa e a conclusão está em plena consonância com a jurisprudência consolidada nesta Corte.
A orientação desta Corte Federal está assim sedimentada quanto ao reconhecimento do tempo especial diante da categoria profissional até 28/04/1995 e pela exposição ao(s) agente(s) nocivo(s):
CATEGORIA PROFISSIONAL
TÉCNICOS DE RAIO-X (RADIOLOGIA) - Enquadramento por Categoria Profissional (até 28.04.1995): A atividade de técnico em raio-x, ou similar, é reconhecida como especial por enquadramento na categoria profissional, conforme item 2.1.3 do Decreto nº 83.080/79.
RADIAÇÕES IONIZANTES
As atividades com exposição a radiações ionizantes são consideradas nocivas quando o trabalhador está sujeito a radiações para fins industriais, diagnósticos e terapêuticos. Análise Qualitativa e EPI: Para radiações ionizantes, que integram a Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos (LINACH), a mera presença no ambiente de trabalho (avaliação qualitativa) com possibilidade de exposição é suficiente. A utilização de EPI é presumidamente ineficaz e irrelevante para o reconhecimento da especialidade (TRF4, IRDR Tema 15). (TRF4, AC 5000364-10.2021.4.04.7013, 10ª Turma, Relator para Acórdão LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, julgado em 12/08/2025).
EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL (EPI),
Em relação à atividade exercida no período anterior a 03/12/1998 (data da publicação da MP nº 1.729/98), a utilização de EPI é irrelevante para caracterização da especialidade, porquanto, antes dessa data, não havia exigência legal de comprovação do fornecimento e uso de EPIs para essa finalidade.
Em período posterior a 03/12/1998, o Supremo Tribunal Federal (Tema 555) fixou que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde. Se o EPI for efetivamente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional para reconhecimento da especialidade. Contudo, em relação ao ruído, a declaração de eficácia do EPI no PPP não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
O TRF4 (IRDR Tema 15) complementou esse entendimento, listando situações em que a eficácia do EPI é presumidamente ineficaz (períodos anteriores a 03/12/1998, enquadramento por categoria profissional, agentes biológicos, agentes cancerígenos e periculosidade).
Por fim, o STJ no Tema 1.090 estabeleceu que a informação sobre o uso de EPI no PPP descaracteriza, em princípio, a contagem de tempo especial para aposentadoria, salvo em casos excepcionais, nos quais a proteção do EPI não seja eficaz. Em caso de contestação judicial, o ônus da prova sobre a ineficácia do EPI recai sobre o segurado, que deve comprovar sua inadequação, irregularidade ou descumprimento das normas de uso e manutenção do EPI. No entanto, se a prova gerar dúvidas sobre a eficácia do EPI, a decisão deve ser favorável ao trabalhador.
INTERMITÊNCIA
A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física (referidas no artigo 57, § 3º, da Lei n° 8.213/91) não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual ou ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível (EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24-10-2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. 7-11-2011).
Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (EINF n° 2005.72.10.000389-1, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 18-5-2011; EINF n° 2008.71.99.002246-0, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 8-1-2010).
ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO ADICIONAL COMO ÓBICE AO RECONHECIMENTO DA ATIVIDADE ESPECIAL. INEXISTÊNCIA DE CORRELAÇÃO COM O PRINCÍPIO DA PRECEDÊNCIA DO CUSTEIO (CF/88, ART. 195, § 5º)
O argumento do INSS não prospera, porquanto inadequado aferir a existência de um direito previdenciário a partir do modo como formalizada a obrigação fiscal por parte da empresa empregadora. Se os elementos de prova contidos nos autos demonstram a natureza especial da atividade laboral desenvolvida pelo segurado, o reconhecimento de seu direito não é prejudicado por eventual erro na informação da atividade na GFIP ou pela ausência de recolhimento da contribuição adicional por parte da empresa empregadora.
O que importa é que a atividade seja, na realidade, especial. Nesse caso, abre-se ao Fisco, diante de tal identificação, a adoção das providências relativas à arrecadação das contribuições que entender devidas. O raciocínio é análogo às situações de trabalho informal pelo segurado empregado (sem anotação em carteira ou sem recolhimento das contribuições previdenciárias). A constatação de eventual discrepância entre a realidade e o fiel cumprimento das obrigações fiscais poderá constituir um ponto de partida para os procedimentos de arrecadação fiscal e imposição de penalidades correspondentes.
De outro lado, é inadequada a compreensão que condiciona o reconhecimento da atividade especial às hipóteses que fazem incidir previsão normativa específica de recolhimento de contribuição adicional (art. 57, §§ 6º e 7º, da Lei nº 8.213/91). E a ausência de contribuição específica não guarda relação alguma com o princípio da precedência do custeio (CF/88, art. 195, §5º).
Quanto ao ponto, a contribuição adicional apenas foi instituída pela Lei 9.732/98, quase quatro décadas após a instituição da aposentadoria especial pela Lei 3.807/60. Além disso, as empresas submetidas ao regime simplificado de tributação (SIMPLES), como se sabe, não estão sujeitas ao recolhimento da contribuição adicional e essa condição não propicia sequer cogitação de que seus empregados não façam jus à proteção previdenciária diferenciada ou de que a concessão de aposentadoria especial a eles violaria o princípio constitucional da precedência do custeio. Prestigia-se, neste ponto, a realidade e a necessidade da proteção ao trabalhador, de modo que a suposta omissão ou inércia do legislador, quanto à necessidade de uma contribuição específica, não implica a conclusão de que a proteção social estaria a violar o princípio da precedência do custeio.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO URBANO. CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO COMUM EM TEMPO ESPECIAL. IMPOSSIBILIDADE. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. INFORMAÇÕES PRESTADAS EM GFIP. IRRELEVÂNCIA. PRECEDÊNCIA DA FONTE DE CUSTEIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. CONCESSÃO. (...). 5. Para fins de reconhecimento da especialidade da atividade, é irrelevante que a empresa não tenha informado, em GFIP, o caráter especial da atividade exercida pelo autor, bem como que não tenha recolhido a respectiva contribuição adicional. (...) (TRF4 5031012-27.2012.4.04.7000, 10ª Turma, Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, 02.10.2018)
Pelos fundamentos expostos na sentença, que adoto como razões de decidir, e em conformidade com a jurisprudência desta Corte, é de ser mantido o reconhecimento da especialidade do labor no(s) período(s) controvertido(s).
Da soma do tempo para obtenção do benefício.
A implementação dos requisitos para a concessão/revisão da aposentadoria por tempo de contribuição/especial deverá ser verificada pelo juízo de origem através da liquidação do julgado. Em caso de implantação do benefício, deverá ser observada a hipótese de cálculo que for mais vantajosa ao autor, dentre as que resultarem possíveis.
Na hipótese de concessão de aposentadoria especial / revisão de espécie para fins de concessão de aposentadoria especial, deverá ser observada a tese jurídica fixada pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 709.
Benefícios inacumuláveis.
Fica desde logo autorizado o desconto integral, sobre as parcelas vencidas, dos valores eventualmente recebidos, a contar da DIB, a título de benefício inacumulável, nos termos do art. 124 da Lei nº 8.213/1991 e à luz da vedação ao enriquecimento sem causa.
Consectários, Honorários e Prequestionamento
Consectários Legais Os consectários legais devem ser fixados, quanto aos juros, nos termos do que definido pelo STF no julgamento do Tema 1170. No que tange à correção monetária, até 08/12/2021, deve ser aplicado o INPC (Lei 11.430/06). A partir de 09/12/2021, incidirá a taxa SELIC, para todos os fins (correção, juros e compensação da mora), conforme o art. 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021.
Honorários Advocatícios Recursais Tendo em vista o desprovimento do recurso do INSS, majoro os honorários de sucumbência em 20% (vinte por cento), sobre o valor fixado na sentença, em observância ao disposto no artigo 85, § 11, do Código de Processo Civil.
Prequestionamento Para fins de acesso às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as questões e os dispositivos legais invocados pelas partes, nos termos dos artigos 1.022 e 1.025 do CPC, evitando-se a oposição de embargos de declaração com propósito de prequestionamento.
Dispositivo
Voto por não conhecer a apelação da parte autora e negar provimento à apelação do INSS.
Documento eletrônico assinado por ANA RAQUEL PINTO DE LIMA, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005418486v8 e do código CRC c096a216.
Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): ANA RAQUEL PINTO DE LIMAData e Hora: 29/10/2025, às 14:45:17
Conferência de autenticidade emitida em 05/11/2025 04:09:29.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Apelação Cível Nº 5006647-04.2020.4.04.7201/SC
RELATORA Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA ESPECIAL. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. RADIAÇÃO IONIZANTE. INEFICÁCIA DO EPI. RECURSO DA PARTE AUTORA NÃO CONHECIDO. RECURSO DO INSS DESPROVIDO.
1. Apelações interpostas pela parte autora e pelo INSS contra sentença que reconheceu a especialidade de períodos laborais (01.03.1994 a 05.04.1999, 07.05.1999 a 24.09.2004 e 01.10.2004 a 11.04.2019) para concessão de aposentadoria especial, com DIB em 11.04.2019, e determinou o afastamento de atividades especiais após a implantação do benefício, conforme o Tema 709 do STF.
2. Há quatro questões em discussão: (i) a eficácia dos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) para afastar a especialidade da atividade, especialmente na ausência de Certificado de Aprovação (CA) e diante da exposição a radiações ionizantes; (ii) a necessidade de comprovação quantitativa da exposição à radiação ionizante para reconhecimento da especialidade; (iii) a aplicabilidade da análise qualitativa para agentes cancerígenos em períodos anteriores a 08.10.2014; e (iv) a correlação entre a ausência de contribuição adicional e o princípio da precedência do custeio para o reconhecimento da atividade especial.
3. O recurso da parte autora não foi conhecido por ausência de interesse recursal, pois a sentença já havia reconhecido a especialidade dos períodos em questão devido à exposição a radiações ionizantes, agente para o qual o EPI é ineficaz. Não obstante, o tribunal reconheceu a validade da tese da parte autora sobre a ausência de comprovação da eficácia do EPI quando não há registro do Certificado de Aprovação no PPP.
4. A exposição à radiação ionizante, agente comprovadamente carcinogênico para humanos e listado no Grupo 1 da Portaria Interministerial MTE/MS/MPS nº 9/2014, permite o reconhecimento da especialidade nos períodos, mesmo com o uso de EPIs.5. O §4º do art. 68 do Decreto nº 3.048/1999, com a redação do Decreto nº 8.123/2013, estabelece que a presença de agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos no ambiente de trabalho é suficiente para a comprovação da efetiva exposição do trabalhador.6. A jurisprudência do TRF4 (IRDR Tema 15) firmou entendimento de que a utilização de EPI não afasta a especialidade do labor em relação a agentes cancerígenos e radiações ionizantes, sendo presumida a sua ineficácia.7. O reconhecimento de um direito previdenciário não é prejudicado por eventual erro na informação da atividade na GFIP ou pela ausência de recolhimento da contribuição adicional por parte da empresa empregadora, sendo irrelevante para a especialidade da atividade, conforme o art. 195, § 5º, da CF/1988.
8. Apelação da parte autora não conhecida. Apelação do INSS desprovida.
Tese de julgamento: 9. A exposição a radiações ionizantes, agente reconhecidamente cancerígeno, permite o reconhecimento da atividade especial independentemente da utilização de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), sendo presumida a ineficácia destes.
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Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 195, § 5º; EC nº 113/2021, art. 3º; Lei nº 3.807/1960; Lei nº 8.213/1991, arts. 57, § 3º, § 6º, § 7º, § 8º, 124; Lei nº 9.289/1996, art. 4º, inc. I e II; Lei nº 9.732/1998; Lei nº 11.430/2006; CPC, arts. 85, *caput*, § 2º, § 3º, inc. I e II, § 5º, § 11, 183, 487, inc. I, 496, § 3º, inc. I, 1.003, § 5º, 1.010, § 1º e § 3º, 1.012, *caput*, 1.022, 1.025; Decreto nº 53.831/1964, art. 2º, item 1.1.4; Decreto nº 83.080/1979, Anexo I, item 1.1.3, item 2.1.3; Decreto nº 3.048/1999, art. 68, § 4º; Decreto nº 8.123/2013; Portaria Interministerial MTE/MS/MPS nº 9/2014; Ordem de Serviço INSS/DSS nº 564/1997, item 12.2.5.
Jurisprudência relevante citada: STF, Tema 555; STF, Tema 709; STF, Tema 1170; STJ, Tema 546; STJ, Tema 1.090; TRF4, IRDR Tema 15; TRF4, AC 5000364-10.2021.4.04.7013, 10ª Turma, Rel. Luiz Fernando Wowk Penteado, j. 12.08.2025; TRF4, 5002033-39.2014.4.04.7015, Turma Regional Suplementar do PR, Rel. Marcelo Malucelli, j. 17.09.2019; TRF4, 5031012-27.2012.4.04.7000, 10ª Turma, Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, j. 02.10.2018; TRF4, EINF nº 0003929-54.2008.404.7003, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24.10.2011; TRF4, EINF nº 2007.71.00.046688-7, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07.11.2011; TRF4, EINF nº 2005.72.10.000389-1, 3ª Seção, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 18.05.2011; TRF4, EINF nº 2008.71.99.002246-0, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 08.01.2010.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Central Digital de Auxílio 1 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, não conhecer a apelação da parte autora e negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 27 de outubro de 2025.
Documento eletrônico assinado por ANA RAQUEL PINTO DE LIMA, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005418487v5 e do código CRC cd8ba808.
Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): ANA RAQUEL PINTO DE LIMAData e Hora: 29/10/2025, às 14:45:17
Conferência de autenticidade emitida em 05/11/2025 04:09:29.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 20/10/2025 A 27/10/2025
Apelação Cível Nº 5006647-04.2020.4.04.7201/SC
RELATORA Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
PRESIDENTE Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 20/10/2025, às 00:00, a 27/10/2025, às 16:00, na sequência 64, disponibilizada no DE de 09/10/2025.
Certifico que a Central Digital de Auxílio 1, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A CENTRAL DIGITAL DE AUXÍLIO 1 DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NÃO CONHECER A APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
RELATORA DO ACÓRDÃO Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
Votante Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
Votante Juíza Federal ALINE LAZZARON
Votante Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
MÁRCIA CRISTINA ABBUD
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 05/11/2025 04:09:29.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas