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Apelação Cível Nº 5000668-24.2021.4.04.7008/PR
RELATOR Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
RELATÓRIO
Trata-se de ação ajuizada contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, na qual a parte autora objetiva a concessão de aposentadoria especial (NB 189.087.113-0, DER 03/04/2020), mediante o reconhecimento da natureza especial, prejudicial à saúde ou à integridade física, de atividades laborais exercidas nos períodos de 01/06/1991 a 28/02/1993, de 01/04/1993 a 30/04/1993, de 19/05/1993 a 28/04/1995, de 29/04/1995 a 31/12/1996, de 01/01/1997 a 28/02/1999, de 01/04/1999 a 30/11/1999, de 01/02/2000 a 29/02/2000, de 01/07/2000 a 28/02/2003, de 01/06/2003 a 28/02/2006, de 01/04/2006 a 31/05/2006, de 01/07/2006 a 09/07/2008, de 01/12/2008 a 13/10/2009, de 01/05/2010 a 28/06/2011, de 01/09/2011 a 31/08/2014, de 10/12/2014 a 31/01/2017, de 01/06/2017 a 30/11/2017, de 01/01/2018 a 30/04/2018, de 01/06/2018 a 31/01/2019, de 01/03/2019 a 31/07/2019, de 01/11/2019 a 30/11/2019 e de 01/02/2020 a 31/03/2020, bem como dos períodos em gozo de auxílio-doença de 10/07/2008 a 24/11/2008, de 14/10/2009 a 23/04/2010, de 29/06/2011 a 24/08/2011 e de 01/09/2014 a 09/12/2014. Subsidiariamente, pede a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante a conversão de tempo especial em comum.
Sentenciando, na vigência do CPC/2015, o juízo a quo julgou procedente em parte a ação, in verbis:
Ante o exposto, julgo procedente em parte o pedido, nos termos do art. 487, I, do CPC, para condenar o INSS a:
a) averbar os períodos de 01/06/1991 a 28/02/1993, 01/04/1993 a 30/04/1993, 19/05/1993 a 28/02/1999, 01/04/1999 a 30/11/1999, 01/02/2000 a 29/02/2000, 01/07/2000 a 28/02/2003, 01/06/2003 a 18/11/2003 como ensejadores de aposentadoria especial, no âmbito do RGPS, após 25 anos de contribuição, bem como a convertê-lo em tempo comum com a utilização do fator 1,4;
b) conceder a aposentadoria por tempo de contribuição nº 189.087.113-0 com início na DER (03/04/2020);
c) pagar as prestações vencidas entre 03/04/2020 e o trânsito em julgado desta sentença, mediante requisição do juízo, sendo que cada uma dessas prestações deve ser acrescida de correção monetária e juros moratórios simples, com os índices e forma de cálculo explicitados na fundamentação. Após o trânsito em julgado, os valores devem ser pagos administrativamente com estrita observância dos índices de atualização monetária e juros moratórios aqui fixados.
Como houve sucumbência recíproca, cada parte arcará com as custas processuais e honorários sucumbenciais conforme a proporção de sua sucumbência, observada a isenção do INSS em relação às custas (art. 4º, I, da Lei 9.289/96) e vedada a compensação dos honorários (art. 85, §14, do CPC).
Assim, condeno o réu a pagar honorários que fixo em 4,3% (=10% x 43% - reconheceu-se cerca de XXX% do pedido) sobre o valor da condenação (item c), com lastro no art. 85, § 3º, I, do CPC, observada a súmula 111 do STJ.
Condeno o autor a pagar 57% do valor das custas processuais (art. 86 do CPC), além de honorários sucumbenciais, os quais arbitro em 5,7% (=10% x 57%) sobre o valor da condenação (item c), com lastro no art. 85, § 3º, I, do CPC, porém suspendo a exigibilidade dessas verbas em razão do benefício da gratuidade de justiça, nos termos do § 3º do artigo 98 do CPC.
Publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.
Sentença não sujeita a reexame necessário porque o proveito econômico obtido pelo autor não alcança, a toda evidência, o patamar de 1.000 salários mínimos.
Inconformadas, as partes interpuseram recursos de apelação.
Postula o INSS, em síntese, a impossibilidade de reconhecimento da atividade especial nos períodos de 05/03/1997 a 28/02/1999, 01/04/1999 a 30/11/1999, 01/02/2000 a 29/02/2000, 01/07/2000 a 28/02/2003 e 01/06/2003 a 18/11/2003, alegando que a exposição ao ruído não se deu de forma habitual e permanente acima do limite de tolerância, conforme Tema 1.083 do STJ e laudo pericial judicial, e que os demais agentes (frio, umidade, poeiras, periculosidade, calor, vibração) não foram comprovados de forma habitual e permanente ou acima dos limites de tolerância, ou não são ensejadores de aposentadoria especial.
Defende a parte autora, em síntese, o reconhecimento da especialidade dos períodos de 01/06/2003 a 28/02/2006, de 01/04/2006 a 31/05/2006, de 01/07/2006 a 09/07/2008, de 01/12/2008 a 13/10/2009, de 01/05/2010 a 28/06/2011, de 01/09/2011 a 31/08/2014, de 10/12/2014 a 31/01/2017, de 01/06/2017 a 30/11/2017, de 01/01/2018 a 30/04/2018, de 01/06/2018 a 31/01/2019, de 01/03/2019 a 31/07/2019, de 01/11/2019 a 30/11/2019 e de 01/02/2020 a 31/03/2020, que não foram reconhecidos pela sentença, em razão da exposição a agentes químicos (monóxido de carbono, dióxido de carbono, fósforo, acetona, metilisobutil cetona, metil etil cetona, 2-butóxietanol, ciclohexano, benzeno, tolueno, etilbenzeno, cumeno, xileno, acetato de etila, n-hexano, acetato de 2-butóxietila, ciclohexanona, diacetona álcool, etanol, n-heptano, álcool isobutílico, 2-propanol, álcool n-butílico), ruído, poeiras, gases, vapores, frio, umidade e periculosidade (GLP), consideradas as atividades de estivador e arrumador - na qualidade de trabalhador avulso - no Porto de Paranaguá, no Estado do Paraná. bem como a possibilidade de cômputo como tempo especial dos períodos de auxílio-doença de 10/07/2008 a 24/11/2008, de 14/10/2009 a 23/04/2010, de 29/06/2011 a 24/08/2011 e de 01/09/2014 a 09/12/2014, e a reafirmação da DER.
Oportunizadas contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
MÉRITO
A controvérsia no plano recursal restringe-se:
- ao reconhecimento do exercício de atividade especial no(s) período(s) de 05/03/1997 a 28/02/1999, 01/04/1999 a 30/11/1999, 01/02/2000 a 29/02/2000, 01/07/2000 a 28/02/2003 e 01/06/2003 a 18/11/2003, 01/06/2003 a 28/02/2006, de 01/04/2006 a 31/05/2006, de 01/07/2006 a 09/07/2008, de 01/12/2008 a 13/10/2009, de 01/05/2010 a 28/06/2011, de 01/09/2011 a 31/08/2014, de 10/12/2014 a 31/01/2017, de 01/06/2017 a 30/11/2017, de 01/01/2018 a 30/04/2018, de 01/06/2018 a 31/01/2019, de 01/03/2019 a 31/07/2019, de 01/11/2019 a 30/11/2019 e de 01/02/2020 a 31/03/2020;
- à possibilidade do reconhecimento do tempo especial em relação ao período de 10/07/2008 a 24/11/2008, de 14/10/2009 a 23/04/2010, de 29/06/2011 a 24/08/2011 e de 01/09/2014 a 09/12/2014, em que o segurado estivera em gozo de benefício de auxílio-doença;
- à consequente concessão de aposentadoria especial.
TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL
Inicialmente, ressalte-se que deve ser observada, para fins de reconhecimento da especialidade, a lei em vigor à época em que exercida a atividade, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador.
Assim, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o considere como especial, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova mais restritiva. Esse, inclusive, é o entendimento da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (AGREsp nº 493.458/RS, 5ª Turma, Rel. Ministro Gilson Dipp, DJU de 23/06/2003; e REsp nº 491.338/RS, 6ª Turma, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, DJU de 23/06/2003), a qual passou a ter previsão legislativa expressa com a edição do Decreto nº 4.827/03, que inseriu o § 1º no art. 70 do Decreto nº 3.048/99.
Feita essa consideração e tendo em vista a sucessão de leis que disciplinam a matéria, necessário, preliminarmente, verificar qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, que se encontrava vigente na data em que exercida a atividade que se pretende ver reconhecida a especialidade.
Verifica-se, assim, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema:
a) até 28/04/1995, quando vigente a Lei nº 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e, posteriormente, a Lei n° 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial; ou, ainda, quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído e calor, que exigem a mensuração de seus níveis por meio de perícia técnica, trazida aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a existência ou não de nocividade (STJ, AgRg no REsp n. 941885/SP, 5ª Turma, Rel. Ministro Jorge Mussi, DJe de 04/08/2008; e STJ, REsp n. 639066/RJ, Quinta Turma, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ de 07/11/2005);
b) a partir de 29/04/1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção daquelas a que se refere a Lei n° 5.527/68, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13/10/1996, dia anterior à publicação da Medida Provisória nº 1.523, de 14/10/1996, que revogou expressamente a Lei em questão - de modo que, no interregno compreendido entre 29/04/1995 (ou 14/10/1996) e 05/03/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n° 9.032/95 no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, como já salientado; e
c) a partir de 06/03/1997, data da entrada em vigor do Decreto nº 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Medida Provisória nº 1.523/96 (convertida na Lei nº 9.528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos, por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
Saliente-se, ainda, que é admitida a conversão de tempo especial em comum após maio de 1998, consoante entendimento firmado pelo STJ, em decisão no âmbito de recurso repetitivo (REsp n.º 1.151.363/MG, Tema 422, Rel. Min. Jorge Mussi, Terceira Seção, julgado em 23/03/2011, DJe 05/04/2011).
Ademais, na forma do disposto no art. 25, § 2º, da EC nº 103/19, será reconhecida a conversão de tempo especial em comum, na forma prevista na Lei nº 8.213/91, ao segurado do Regime Geral de Previdência Social que comprovar tempo de efetivo exercício de atividade sujeita a condições especiais que efetivamente prejudiquem a saúde, cumprido até a data de entrada em vigor da referida Emenda Constitucional, vedada a conversão para o tempo cumprido após esta data.
Por fim, observo que, quanto ao enquadramento das categorias profissionais, devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo - 2ª parte), nº 72.771/73 (Quadro II do Anexo) e nº 83.080/79 (Anexo II) até 28/04/1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas.
Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo - 1ª parte), nº 72.771/73 (Quadro I do Anexo) e nº 83.080/79 (Anexo I) até 05/03/1997, e os Decretos nº 2.172/97 (Anexo IV) e nº 3.048/99 a partir de 06/03/1997, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto nº 4.882/03.
Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível, também, a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula nº 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGREsp n° 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, 6ª Turma, DJU de 30/06/2003).
AGENTE NOCIVO RUÍDO - TEMA 694/STJ
Especificamente quanto ao agente nocivo ruído, a comprovação da especialidade da atividade laboral pressupõe a existência de parecer técnico atestando a exposição do segurado a níveis de pressão sonora acima dos limites de tolerância.
Referidos limites foram estabelecidos, sucessivamente, no Quadro Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, o Anexo IV do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, e o Anexo IV do Decreto nº 3.048, de 06/05/1999, alterado pelo Decreto nº 4.882, de 18/11/2003, os quais consideram insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 80, 85 e 90 decibéis, de acordo com os Códigos 1.1.6, 1.1.5 e 2.0.1.
Quanto ao período anterior a 05/03/1997, consoante pacífica jurisprudência nesta Corte, são aplicáveis concomitantemente, para fins de enquadramento, os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79 até 05/03/1997, data imediatamente anterior à publicação do Decreto nº 2.172/97. Desse modo, até então, é considerada nociva à saúde a atividade sujeita a ruído superior a 80 decibéis, conforme previsão mais benéfica do Decreto nº 53.831/64.
Com a edição do Decreto nº 2.172/97, em 06/03/1997, o nível de tolerância ao ruído, considerado salubre, passou para até 90 decibéis. Posteriormente, o Decreto nº 4.882/03, de 19/11/2003, estabeleceu o referido limite em 85 decibéis (exposição a Níveis de Exposição Normalizados - NEN - média ponderada).
Em face da controvérsia existente acerca da possibilidade de aplicação retroativa do Decreto nº 4.882/03, na medida em que mais benéfico ao segurado, em 14/05/2014, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp nº 1.398.260-PR, em sede de Recurso Especial Repetitivo (Tema 694), firmou entendimento sobre a matéria, nos seguintes termos, com grifo no original, in verbis:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. TEMPO ESPECIAL. RUÍDO. LIMITE DE 90DB NO PERÍODO DE 6.3.1997 A 18.11.2003. DECRETO 4.882/2003. LIMITE DE 85 DB. RETROAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE À ÉPOCA DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.
Controvérsia submetida ao rito do art. 543-C do CPC
1. Está pacificado no STJ o entendimento de que a lei que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação do labor. Nessa mesma linha: REsp 1.151.363/MG, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011; REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 19.12.2012, ambos julgados sob o regime do art. 543-C do CPC.
2. O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC). Precedentes do STJ.
(...)
Portanto, deve-se adotar os seguintes níveis de exposição a ruído para fins de reconhecimento do tempo de atividade especial: superior a 80 dB(A) até 05/03/1997; superior a 90 dB(A) de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB(A) a partir de 19/11/2003.
EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL - EPI
A utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 03 de dezembro de 1998, data da publicação da MP 1.729/12/1998, convertida na Lei nº 9.732, de 11/12/1998, que alterou o § 2º do artigo 58 da Lei nº 8.213/91, determinando que o laudo técnico contenha informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo. Esse entendimento, inclusive, foi adotado pelo INSS nas Instruções Normativas nºs 45/2010 e 128/2022.
Tema 555/STF:
A partir de dezembro de 1998, quanto à possibilidade de desconfiguração da natureza especial da atividade em decorrência de EPIs, o STF ao julgar o ARE 664.335/SC - submetido ao regime de repercussão geral (Tema 555), Relator Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 04/12/2014 e publicado em 12/02/2015 -, fixou duas teses:
1) "o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial"; e
2) "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
Ressalte-se que para afastar o caráter especial das atividades desenvolvidas pelo segurado é necessária uma efetiva demonstração da elisão das consequências nocivas, além de prova da fiscalização do empregador sobre o uso permanente dos dispositivos protetores da saúde do obreiro durante toda a jornada de trabalho.
IRDR 15/TRF4:
O IRDR 15 do TRF4 surgiu no âmbito da 4ª Região com o objetivo de uniformizar o entendimento sobre a prova da eficácia do EPI e o afastamento do tempo especial após a decisão do STF no Tema 555.
A tese no IRDR 15 fixou entendimento no sentido de que a "mera juntada do PPP referindo a eficácia do EPI não elide o direito do interessado em produzir prova em sentido contrário" e que o ônus da prova para comprovar a eficácia do uso do EPI continua sendo do INSS.
A tese central firmada pelo TRF4 no IRDR 15 estabeleceu que:
a) a simples anotação positiva ("S" - sim) nos campos específicos do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), indicando o uso de EPI eficaz, não é condição suficiente, por si só, para considerar o EPI eficaz e afastar a aposentadoria especial;
b) o segurado deve ter a oportunidade de discutir e produzir prova em sentido contrário à informação constante no PPP sobre a eficácia do EPI;
c) o julgado listou situações específicas onde a eficácia do EPI poderia ser desafiada, indicando que as demais situações deveriam ser resolvidas com perícia judicial;
d) nos casos em que a empresa estiver desativada ou não mais existir, o ônus de comprovar a eficácia do uso do EPI continua sendo do INSS;
e) as considerações do voto-condutor apontam para a obrigatoriedade de o juiz determinar a realização da perícia em certas circunstâncias; e
f) o julgado alinhou a exceção já reconhecida pelo STF para o ruído (Tema 555) a outras hipóteses onde a especialidade poderia ser reconhecida mesmo com a informação de EPI eficaz, como para: agentes biológicos, agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos, periculosidade, calor, radiações ionizantes e a condições hiperbáricas.
Tema 1.090/STJ:
Mais recentemente, em 04/2025, o Superior Tribunal de Justiça, julgando o Tema 1.090, fixou as seguintes teses:
"I - A informação no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) sobre a existência de equipamento de proteção individual (EPI) descaracteriza, em princípio, o tempo especial, ressalvadas as hipóteses excepcionais nas quais, mesmo diante da comprovada proteção, o direito à contagem especial é reconhecido.
II - Incumbe ao autor da ação previdenciária o ônus de comprovar: (i) a ausência de adequação ao risco da atividade; (ii) a inexistência ou irregularidade do certificado de conformidade; (iii) o descumprimento das normas de manutenção, substituição e higienização; (iv) a ausência ou insuficiência de orientação e treinamento sobre o uso adequado, guarda e conservação; ou (v) qualquer outro motivo capaz de conduzir à conclusão da ineficácia do EPI.
III - Se a valoração da prova concluir pela presença de divergência ou de dúvida sobre a real eficácia do EPI, a conclusão deverá ser favorável ao autor."
Ressalto que, considerada a superveniente adequação da matéria jurídica afetada para julgamento no sobredito recurso especial repetitivo, com restrição às matérias previamente delimitadas, e a tese definitiva firmada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, deve ser observado o entendimento vinculante por ela não superado, firmado no IRDR do TRF4 (Tema 15), acerca das hipóteses excepcionais em que, em virtude da natureza do agente nocivo, a utilização de EPIs é despicienda.
Nessa perspectiva, o Tema 1.090/STJ - embora importe na superação parcial do que foi decidido no IRDR 15/TRF4 quanto à distribuição do ônus da prova da eficácia do EPI - não afasta o entendimento consolidado no julgamento do sobredito IRDR, o qual firmou compreensão de que desimporta a análise da eficácia do uso de EPIs na exposição do(a) segurado(a) a agentes biológicos, a agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos, à periculosidade, ao calor, a radiações ionizantes e a condições hiperbáricas.
Por óbvio, ademais, o Tema 1.090/STJ nada interfere ou altera a convicção estabelecida no julgamento do Tema 555/STF nesse tocante.
INTERMITÊNCIA NA EXPOSIÇÃO AOS AGENTES NOCIVOS
A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física, referidas no artigo 57, § 3º, da Lei nº 8.213/91, não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, mas sim que tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades do trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de caráter eventual. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho. Nesse sentido vem decidindo esta Corte (EINF nº 2007.71.00.046688-7, 3ª Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 07/11/2011; EINF nº 0004963-29.2010.4.04.9999, 3ª Seção, Relatora Vivian Josete Pantaleão Caminha, D.E. 12/03/2013; EINF n° 0031711-50.2005.4.04.7000, 3ª Seção, Relator Luiz Carlos de Castro Lugon, D.E. 08/08/2013) e também o Superior Tribunal de Justiça (Tema 1.083).
Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (TRF4, EINF nº 2005.72.10.000389-1, 3ª Seção, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 18/05/2011; TRF4, EINF 2008.71.99.002246-0, 3ª Seção, Relator Luís Alberto D´Azevedo Aurvalle, D.E. 08/01/2010).
EXAME DO TEMPO ESPECIAL NO CASO CONCRETO
Passo à análise dos períodos controvertidos nesta ação, nos quais o autor laborou na condição de trabalhador avulso, desenvolvendo suas atividades no Porto de Paranaguá.
As atividades desenvolvidas pelo autor – e a respectiva documentação – foram assim retratadas na sentença:
O PPP emitido pelo Sindicato dos Estivadores de Paranaguá e Pontal do Paraná prova o exercício da atividade de estivador, categoria profissional que enseja o enquadramento da atividade até a edição da Lei 9.032/95, conforme previsão nos códigos 2.5.6 do Decreto 53.831/64 e 2.4.5 do anexo II do Decreto 83.080/79 (). Logo, os períodos de atividade até 28/04/1995 devem ser reconhecidos como ensejadores de aposentadoria especial.
Quanto aos períodos subsequentes, o perfil profissiográfico previdenciário (PPP) emitido pelo sindicato, referente à atividade desenvolvida até 31/12/2003, aponta exposição a ruído com intensidade de 87,7 dB(A), bem como a calor de 28,7 IBUTG ().
Já o laudo técnico produzido em 1996 para o mesmo sindicato aponta ruído entre 86 e 96 decibéis, o que foi verificado em quatro diferentes navios (frigorífico, de carga geral, de contêineres e roll-on roll-off) aportados em Paranaguá (). Na parte conclusiva desse documento consta que as atividades desempenhadas pelos estivadores são insalubres devido a ruído, poeira, gases e vapores.
De outro lado, o formulário DSS-8030 emitido pelo OGMO, referente à atividade de estivador desenvolvida de 01/04/1996 a 31/12/2003, aponta exposição aos seguintes agentes: poeiras vegetais e minerais (não especificadas), umidade em casos de chuvas, frio de -10º C e ruído variando de 77 a 101 dB(A), de forma contínua e permanente nas fainas correlatas aos agentes nocivos ().
Os dados constantes nesse formulário são corroborados pelo laudo técnico produzido em 2001 de acordo com a NR-15, por engenheiro do trabalho, a pedido do OGMO-PR (). O estudo faz referência às intensidades de ruído aferidas em cada um dos navios que costumeiramente aportam em Paranaguá, concluindo que estão compreendidas entre 77 e 101 decibéis, bem como que essa exposição se dá de forma habitual e permanente. Note-se que a divergência na intensidade de ruído se deve ao tipo de navio e ao local da embarcação em que se realiza o trabalho (entrada, porão, guindaste, rechego, vigia). Além disso, esse laudo aponta a sujeição do trabalhador portuário a poeiras vegetais e minerais (não especificadas), umidade em caso de chuvas e frio de 10ºC negativos. Veja-se a parte conclusiva desse capítulo relativo aos estivadores (fl. 16 do laudo):

Embora o trabalho dos portuários avulsos já estivesse sob a gestão do OGMO, em 2003 foi produzido laudo técnico por iniciativa do Sindicato dos Estivadores dos Portos do Paraná, o qual conclui que a atividade é insalubre, nos termos da NR-15, em razão do ruído superior a 85 decibéis, com exposição habitual e permanente, além de poeiras minerais e vegetais, e frio ().
De acordo com a documentação acostada aos autos, a averbação como tempo especial pode se dar com base em outros agentes nocivos, além do ruído, tais como poeiras minerais e vegetais, umidade e, de forma mais notória, frio de -10º C.
Nesse sentido, há precedentes desta Corte que tratam especificamente da atividade de estivador no Porto de Paranaguá na mesma época:
PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL. SENTENÇA ANTERIOR AO CPC DE 2015. REVISÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA. ESTIVADORES. AVERBAÇÃO DE TEMPO ESPECIAL. AGENTE NOCIVO RUÍDO. APLICAÇÃO RETROATIVA DO DECRETO 4.882/2003. IMPOSSIBILIDADE. CONVERSÃO DE TEMPO ESPECIAL EM COMUM. CABIMENTO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. LEI 11.960/09. DIFERIDOS. IMPLANTAÇÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO. (...) 7. Constatada a exposição do estivador a outros agentes nocivos, como poeiras minerais e vegetais, umidade, especialmente frio, por conta do trabalho em navios frigoríficos, ficando sujeito o trabalhador a temperaturas negativas, sendo cabível o reconhecimento da especialidade do período, mesmo que o agente nocivo frio não esteja mais previsto nos Decretos nºs 2.172/1997 e 3.048/1999, posto que identificado o prejuízo para a saúde do trabalhador, incidindo a Súmula nº 198 do extinto TFR. (...) (TRF4 5001467-82.2012.4.04.7008, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 05/09/2017)
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. PESCADOR ARTESANAL. TRABALHADOR AVULSO PORTUÁRIO. TEMPO ESPECIAL. CATEGORIA PROFISSIONAL. ESTIVADOR. EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS. APOSENTADORIA ESPECIAL. AFASTAMENTO COMPULSÓRIO. REVISÃO DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO DE QUE É TITULAR. CONCESSÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. LEI Nº 11.960/09. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO. TUTELA ESPECÍFICA. (...) 3. A atividade de trabalhador avulso portuário (estiva e a armazenagem) é passível de enquadramento por categoria profissional, forte no código 2.5.6 (Estiva e armazenagem) do Decreto nº 53.831/64, e código 2.4.5 do Decreto n. 83.080/79 (Transporte manual de carga na área portuária. Estivadores (trabalhadores ocupados em caráter permanente, em embarcações, no carregamento e descarregamento de carga). Arrumadores e ensacadores. Operadores de carga e descarga nos portos). (...) 5. Quanto ao período posterior a Lei n. 9.032/95, a parte autora apresentou laudos elaborados por engenheiros de segurança do trabalho, os quais trazem minuciosamente a existência de agentes nocivos a saúde no ambiente de trabalho, além do Ruído. Com efeito, foi acostado Informações das Atividades Especiais emitidas em 31 de dezembro de 2003, com a especificação dos agentes nocivos presentes no ambiente de trabalho, prevendo ruído entre 77 e 101 dB, cuja média superava a 85 decibéis. Foi acostado nesse Evento pela OGMO (Órgão de Gestão de Mão-de-Obra do Trabalho Portuário e Avulso) formulário PPP discriminando minuciosamente os períodos em que a parte autora prestou serviços a esse empregador e a exposição aos agentes nocivos a saúde no ambiente de trabalho. Esses elementos de prova, evidenciam a harmonia e convergência em estabelecer o contato com gases, poeiras vegetais e minerais, enxofre, cálcio, fósforo, perigo de acidente e frio de -10°, devido a trabalho em navios frigoríficos, no labor rotineiro, permanente, habitual e diário. (...) (TRF4 5003725-65.2012.4.04.7008, SEXTA TURMA, Relator EZIO TEIXEIRA, juntado aos autos em 01/03/2017)
Diante desse contexto, deve ser acolhido o reconhecimento da especialidade do labor exercido no período de 19/11/2003 a 31/12/2003, em virtude da exposição à associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física supra referidos, ponto em que merece reforma a sentença.
Por outro lado, em que pese toda a documentação acostada, para apuração das condições de trabalho portuário a partir de 01/01/2004, utilizo-me do Perfil Profissiográfico Previdenciário elaborado pelo Órgão de Gestão de Mão de Obra do Trabalhador Portuário e Avulso do Porto Organizado de Paranaguá - OGMO/PR constante nos autos da Apelação Cível nº 5003572-90.2016.4.04.7008/PR. Os laudos periciais que embasaram o seu preenchimento foram juntados aos autos ao longo do trâmite em primeira instância e já foram considerados pela fundamentação da sentença.
Referido trabalho pericial compôs o acervo probatório de diversos processos previdenciários com trâmite na Circunscrição Judiciária de Paranaguá debatendo idêntico tema, reconhecimento da especialidade do labor de estivadores e afins no Porto de Paranaguá (5000394-36.2016.4.04.7008, 5000470-60.2016.4.04.7008, 5002717-14.2016.4.04.7008, 5002788-16.2016.4.04.7008, 5003813-64.2016.4.04.7008, 5000040-74.2017.4.04.7008, 5000090-03.2017.4.04.7008, entre outros).
Registre-se que o PPP em questão foi baseado em inspeções no Porto de Paranaguá no período de 03/01/2004 a 31/03/2011. Foram mais de sete anos ininterruptos de avaliações quase que diárias de dezenas de centenas de navios atracados no Porto, averiguando as condições de trabalho das funções de portaló, contra-mestre de porão, estivador em equipe, operador de ponte, operador de guincho e contra-mestre geral, todas ligadas aos serviços de estiva.
Trata-se de exame aprofundado e estatisticamente inconteste, pois não se resumiu a avaliar as condições de trabalho de pequeno número de embarcações. O exame de mais de sete anos, nos quais diariamente se procedeu à apuração da pressão sonora sofrida em cada tipo de navio, nas mais diversas atividades desenvolvidas pelos serviços de estiva, resulta em apuração fidedigna das reais condições de trabalho tão sujeito a variações, a depender da natureza da embarcação, da mercadoria transportada e, ainda e mais importante, da atividade desenvolvida pelo estivador. Além da constatação dos ruídos suportados pelos trabalhadores, o PPP trouxe o exame da exposição às poeiras incomodas, queda de nível e postura inadequada.
Cabe notar a grande contagem de navios avaliados nesse trabalho pericial, dos mais diversos tipos de embarque e produtos transportados, totalizando dezenas de centenas de navios, beirando ao milhar, demonstrando assim o exame no maior espectro de embarcações possível.
A diversidade de navios atracados diariamente no Porto sugerem variantes das mais diversas matizes: ano de fabricação, condições de manutenção, qualidade dos equipamentos embarcados, tecnologia da embarcação, tipo de mercadoria transportada, forma de embarque e desembarque da carga, se frigorífico, se graneleiro, se roll-on roll-off, se conteineiro, enfim, uma miríade de variantes que exigem um exame de centenas de navios a trazer um panorama mais próximo da realidade. Não nos parece que poucos navios sejam, estatisticamente, um número adequado ao exame.
Referido Perfil Profissiográfico Previdenciário, produzido pelo Órgão de Gestão de Mão de Obra do Trabalhador Portuário e Avulso do Porto Organizado de Paranaguá - OGMO/PR, passa a detalhar as atividades diárias do estivador, bem como a incidência de agentes nocivos. Observa-se que na maior parte do tempo havia exposição apenas a ruídos inferiores a 85 decibéis, com picos de 87 decibéis de forma bastante eventual. Desse modo, como habitualmente os níveis de pressão sonora estavam dentro do limite legal para a época, não há direito à contagem de tempo especial pela exposição ao ruído. Os demais agentes consignados no formulário, como queda de nível, queda de material, prensagem, postura inadequada e poeiras incômodas não encontram amparo legal a ensejar o reconhecimento da especialidade do labor.
Considerando a qualidade do trabalho pericial demonstrado no referido PPP, bem como a necessidade de padronizar as decisões judiciais, evitando concessões de benefícios previdenciários diferenciados e conflitantes para a mesma classe de segurados, a depender da instrução de cada processo, julgo a propriedade da sua utilização para a avaliação de exposição de agentes nocivos no caso concreto.
Portanto, a partir da avaliação produzida no citado PPP, iniciada em 01/01/2004, não é cabível o reconhecimento da especialidade da atividade de estivador, bem como das funções decorrentes na área portuária, como portaló, contra-mestre de porão, estivador em equipe, operador de ponte, operador de guincho, contra-mestre geral e todas as demais ligadas aos serviços de estiva.
Quanto à exposição a outros agentes nocivos, além do ruído, verifico que tal questão foi muito bem apreciada pelo juízo a quo, de modo que, a fim de evitar tautologia, reporto-me a excertos da bem lançada sentença, adotando-os como razões de decidir:
Quanto aos demais agentes mencionados pela parte autora, o perito judicial afirmou que a exposição a frio, poeiras, calor, radiações ionizantes e não-ionizantes, pressões anormais, umidade, agentes químicos, agentes biológicos e vibrações não excedia os limites de tolerância estabelecidos pela NR-15 ().
No que tange ao frio, acrescenta-se que no LTCAT produzido para o OGMO em 2001 (), e aqueles emitidos nos anos de 2004 a 2011, apontam que os trabalhadores somente ficam expostos a esse agente físico quando trabalham em cargas frigorificadas, transportadas em navios com temperatura de -10ºC, mediante utilização de EPI. Entretanto, há algum tempo o porto de Paranaguá não recebe navios frigorificados, ou seja, desde então deixou de existir a exposição a frio. Nesse ponto, note-se que os PPP emitidos pelo OGMO para a atividade desenvolvida a partir de janeiro/2004, acima mencionados, nos quais foram relacionados os agentes presentes em cada dia de trabalho, não há menção ao frio. Da mesma forma quanto ao laudo produzido para o OGMO em 2021 (, p. 26) consta, na parte relativa ao frio, "não se aplica".
Sobre a umidade, nos laudos do OGMO de 2001 a 2011 mencionou-se o contato direto com locais alagados ou encharcados nos dias de chuva, porém, mediante utilização de EPI adequado. No laudo De 2021 acima descrito, afirmou-se que "não se aplica ao caso" (, p. 26).
O fornecimento de EPI foi afirmado no laudo pericial produzido nos autos nº 5001506-79.2012.4.04.7008 (, p. 5, itens "a" e "b"):
a) A empresa OGMO apresentou Comprovantes de Fornecimento ao Autor dos EPI Equipamentos de Proteção Individual: Capacete, calça, camiseta, capa de chuva, sapato de segurança, botas de borracha, óculos, protetor auricular, luvas (malha, sinaleira, vaqueta, nitrílica e raspa), meias térmicas, jaqueta para frigorífico, blusa e protetor solar. Itens fornecidos com os respectivos CA Certificados de Aprovação. Estes fornecimentos estão datados de 22/07/1997 a 17/05/2011.
b) O Autor declarou ter recebido os EPI Equipamentos de Proteção Individual de modo habitual, no período a serviço da OGMO (junho/1996 até 17/05/2011).
Os agentes poeiras, gases e vapores (não especificados e quantificados) também não estão previstos como ensejadores de aposentadoria especial. Note-se que no aludido laudo de 2021 há referência à exposição a "particulado respirável", com concentração inferior ao limite de tolerância, sendo a conclusão de que inexiste insalubridade nesse ponto.
Além disso, ressalto, com base nos laudos técnicos analisados nesta sentença, que também não se pode dizer que eventual exposição dos estivadores no porto de Paranaguá a esses agentes ocorra de forma habitual e permanente.
Relevante consignar que nenhum dos laudos técnicos apresentados aponta exposição a sílica livre cristalina, cristalizada ou em quartzo. No laudo pericial judicial constou que as mercadorias movimentadas pelo Autor, como fertilizantes e grãos alimentares, não geram nuvens de poeiras minerais ou sílica livre (, p. 18, item "18.14", "b").
Especificamente quanto ao fósforo, deve-se esclarecer inicialmente que constou apenas em "relatório de inspeção" feito em 2005 por encomenda do sindicato, e não pelo OGMO (). De qualquer forma, o próprio documento, emitido há cerca de 18 anos, indica que esse produto químico compõe apenas determinado tipo de fertilizante utilizado na agricultura (p. 14 do documento), todavia a atividade de estivador é exercida no embarque e desembarque de inúmeras cargas diversas, sendo que o contanto com esse fertilizante específico, se existente, certamente ocorre de forma eventual. Some-se a isso o fato de que esse agente somente enseja aposentadoria especial quando a exposição ocorre de modo habitual e permanente, não ocasional nem intermitente, no exercício das seguintes atividades previstas pelo item 1.0.12 do Decreto 3.048/1999 (item 1.0.12): a) extração e preparação de fósforo branco e seus compostos; b) fabricação e aplicação de produtos fosforados e organofosforados (sínteses orgânicas, fertilizantes e praguicidas); c) fabricação de munições e armamentos explosivos.
Sobre o calor, o perito judicial afirmou que não há fonte artificial de calor no ambiente de trabalho do autor, como fornos e estufas, logo a exposição não é habitual. Acrescentou que a fonte natural solar não tem presença permanente, altera-se a cada época do ano (, p. 7-8). Outrossim, note-se que em regra o estivador portuário tem jornada de seis horas diárias, sendo que dois dos quatro turnos de trabalho possíveis ocorrem no período noturno. Ainda quanto a esse agente físico, frisa-se que não foi mencionado no PPP relativo à atividade de estivador a partir de 01/01/2004. O LTCAT do OGMO de 2021 afirma que a exposição ao agente calor "não se aplica neste caso" (, p. 19).
Relativamente à vibração, também não se pode afirmar a habitualidade, pois essas atividades constituem pequena parte das diversas funções exercidas pelo estivador.
No LTCAT do OGMO do ano de 2021 há informação da ocorrência de vibração de corpo inteiro apenas na função de operador de equipamentos específicos, quais sejam, pá-carregadeira (p. 59 e 63) e guincho (p. 50), o que não é habitual.
No que tange ao caulim (https://www.gov.br/anm/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/serie-estatisticas-e-economia-mineral/outras-publicacoes-1/6-2-caulim#:~:text=Em menor escala o caulim,auxiliares de filtração, cosméticos, produtos), produto mineral mencionado pelo autor, não está arrolado como agente nocivo no anexo do decreto nº 3.048/99, não há informação de que consiste em agente cancerígeno e não está previsto na LINACH. Veja-se que esse produto não foi mencionado no laudo judicial e em diversos outros que instruem os autos. De qualquer forma, eventual exposição é ocasional porque relativa a apenas um dos diversos tipos de carga movimentados no porto de Paranaguá e, por fim, ressalte-se que o laudo que apontou a presença desse mineral também afirmou o uso de máscara respiratória própria (, p. 10).
Ainda de acordo com o laudo pericial judicial, o estivador não é exposto à periculosidade decorrente do abastecimento de navios pois, ainda que isso ocorra durante seu turno de trabalho, haja vista a distância entre a entrada do tanque do navio e os possíveis postos de trabalho (, p. 19). Também não se afirmou a existência de risco no que tange à suposta movimentação de contêineres com cargas inflamáveis (p. 20-21).
Ademais, o mesmo raciocínio utilizado para a verificação da efetiva exposição habitual à intensidade de ruído aproveita também para os demais agentes nocivos.
Como já visto, diante da necessidade de padronizar as decisões judiciais, evitando concessões de benefícios previdenciários diferenciados e conflitantes para a mesma classe de segurados, para apuração das condições de trabalho a partir de 01/01/2004, mostra-se razoável a utilização do Perfil Profissiográfico Previdenciário elaborado pelo Órgão de Gestão de Mão de Obra do Trabalhador Portuário e Avulso do Porto Organizado de Paranaguá - OGMO/PR constante da Apelação Cível nº 5000258-05.2017.4.04.7008/PR e que se embasou nas perícias realizadas entre 2004 e 2011 juntadas aos autos.
Referido Perfil Profissiográfico Previdenciário, produzido pelo Órgão de Gestão de Mão de Obra do Trabalhador Portuário e Avulso do Porto Organizado de Paranaguá - OGMO/PR, passa a detalhar as atividades diárias do estivador, bem como a incidência de agentes nocivos.
Assim, a partir de 2004, há prova técnica que discrimina de forma pormenorizada as condições de trabalho do autor, com a indicação de todos os navios em que exerceu as atividades ao longo do período, bem como as respectivas funções e agentes nocivos incidentes.
O conteúdo da documentação juntada pela parte autora não é capaz de desconstituir essas informações. Embora algumas situações descritas sejam capazes de, em tese, ensejar o reconhecimento da especialidade, trata-se de registros colhidos em outros navios e épocas. Deve-se presumir que a prova realizada no próprio local de trabalho, contemporânea à prestação do serviço, contenha informações mais fidedignas acerca da incidência de agentes nocivos durante a jornada.
Quanto à alegação de que o autor estaria exposto ao elemento fósforo, o código 1.0.12 do anexo IV ao Decreto 3.048/99 prevê as seguintes atividades que podem ser consideradas insalubres por exposição ao respectivo agente:
FÓSFORO E SEUS COMPOSTOS TÓXICOS
a) extração e preparação de fósforo branco e seus compostos;
b) fabricação e aplicação de produtos fosforados e organofosforados (sínteses orgânicas, fertilizantes e praguicidas);
c) fabricação de munições e armamentos explosivos.
Logo, aplica-se aos trabalhadores que se dedicam à extração e preparação do referido elemento químico, ou, ainda, à fabricação ou aplicação de produtos que contenham fósforo, isto é, aos trabalhadores em atividade habitual e permanente com exposição ao referido agente nocivo.
No caso, tal exposição não restou comprovada no caso concreto, pois o autor não trabalhou em tais atividades, mas apenas na movimentação de cargas embaladas no Porto de Paranaguá. Os documentos que retratam suas efetivas atividades não mencionam tal circunstância.
De fato, a alegada exposição a poeiras cuida-se de informação genérica lançada em alguns documentos, sem força probatória para sustentar o pretendido enquadramento do tempo de contribuição como especial.
Incabível, assim, o reconhecimento da especialidade do labor exercido nos períodos de 01/01/2004 a 28/02/2006, de 01/04/2006 a 31/05/2006, de 01/07/2006 a 09/07/2008, de 01/12/2008 a 13/10/2009, de 01/05/2010 a 28/06/2011, de 01/09/2011 a 31/08/2014, de 10/12/2014 a 31/01/2017, de 01/06/2017 a 30/11/2017, de 01/01/2018 a 30/04/2018, de 01/06/2018 a 31/01/2019, de 01/03/2019 a 31/07/2019, de 01/11/2019 a 30/11/2019 e de 01/02/2020 a 31/03/2020.
Portanto, rejeito a apelação do INSS e dou parcial provimento à apelação da parte autora, reconhecendo o tempo especial no período de labor de 19/11/2003 a 31/12/2003, em virtude da exposição à associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física supra referidos.
CONCLUSÃO QUANTO À ANÁLISE DO TEMPO ESPECIAL CONTROVERTIDO
Nesse contexto, resta reconhecido como especial, exercido sob condições nocivas à saúde ou à integridade física do segurado, o tempo de serviço relativo aos períodos de 05/03/1997 a 28/02/1999, 01/04/1999 a 30/11/1999, 01/02/2000 a 29/02/2000, 01/07/2000 a 28/02/2003 e 01/06/2003 a 18/11/2003 e 19/11/2003 a 31/12/2003 (além dos períodos de 01/06/1991 a 28/02/1993, 01/04/1993 a 30/04/1993, 19/05/1993 a 04/03/1997, reconhecidos pelo juízo a quo e não impugnados), em decorrência do que é devido à parte autora o acréscimo resultante da conversão em tempo comum para fins de aposentadoria, reformando-se em parte a sentença (para admitir o tempo especial nos períodos de 19/11/2003 a 31/12/2003).
DIREITO À APOSENTADORIA COMUM NO CASO CONCRETO
A sentença já reconheceu em favor da parte autora o direito à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER, situação que não se altera. O presente acórdão apenas acrescentou o período de atividade especial de 19/11/2003 a 31/12/2003, o que deverá ser considerado na contagem para a verificação do direito ao melhor benefício a ser efetuada em cumprimento de sentença.
HONORÁRIOS RECURSAIS
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do CPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do CPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
O CPC de 2015 inovou de forma significativa com relação aos honorários advocatícios, buscando valorizar a atuação profissional dos advogados, especialmente pela caracterização como verba de natureza alimentar (§ 14 do art. 85 do CPC) e do caráter remuneratório aos profissionais da advocacia.
Cabe ainda destacar, que o atual diploma processual estabeleceu critérios objetivos para fixar a verba honorária nas causas em que a Fazenda Pública for parte, conforme se extrai da leitura do § 3º, incisos I a V, do art. 85. Referidos critérios buscam valorizar a advocacia, evitando o arbitramento de honorários em percentual ou valor aviltante que, ao final, poderia acarretar verdadeiro desrespeito à profissão. Ao mesmo tempo, objetiva desestimular os recursos protelatórios pela incidência de majoração da verba em cada instância recursal.
No caso dos autos, contudo, o juízo a quo postergou a fixação dos honorários advocatícios para a fase de liquidação, por considerar a sentença ilíquida (art. 85, § 4º, II).
A partir dessas considerações, mantida a sentença de procedência, impõe-se a majoração da verba honorária em favor do advogado da parte autora.
Por outro lado, em atenção ao § 4º do art. 85 e art. 1.046, CPC, tratando-se de sentença ilíquida e sendo parte a Fazenda Pública, a definição do percentual fica postergada para a fase de liquidação do julgado, restando garantida, de qualquer modo, a observância dos critérios definidos no § 3º, incisos I a V, conjugado com § 5º, todos do art. 85 do CPC.
Outrossim, em face do desprovimento da apelação do INSS - e com fulcro no § 11 do art. 85 do CPC -, atribuo o acréscimo de mais 50% (cinquenta por cento) incidente sobre o valor a ser apurado em sede de liquidação a título de honorários.
TUTELA ESPECÍFICA - IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO
Em face da ausência de efeito suspensivo de qualquer outro recurso, é determinado ao INSS (obrigação de fazer) que implante ao segurado, a partir da competência atual, o benefício abaixo descrito, no prazo máximo de vinte (20) dias para cumprimento.
| TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB | |
|---|---|
| Cumprimento | Implantar Benefício |
| NB | 1890871130 |
| Espécie | Aposentadoria por Tempo de Contribuição |
| DIB | 03/04/2020 |
| DIP | Primeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício |
| DCB | |
| RMI | A apurar |
| Segurado Especial | Não |
| Observações | |
PREQUESTIONAMENTO
Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.
CONCLUSÃO
Negado provimento à apelação do INSS.
Parcialmente provida a apelação da parte autora para reconhecer a especialidade do período de 19/11/2003 a 31/12/2003, com adequação do tempo total de contribuição à ATC.
Honorários majorados, na forma da fundamentação supra.
Determinada a implantação do benefício.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS, dar parcial provimento à apelação da parte autora e determinar a implantação do benefício, via CEAB.
Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005290829v19 e do código CRC 7c6ea1aa.
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Apelação Cível Nº 5000668-24.2021.4.04.7008/PR
RELATOR Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA ESPECIAL. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. DESPROVIMENTO DO RECURSO DO INSS. PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO DA PARTE AUTORA.
I. CASO EM EXAME:
1. Ação ajuizada contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) objetivando a concessão de aposentadoria especial ou, subsidiariamente, aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento da natureza especial de diversas atividades laborais exercidas como trabalhador avulso (estivador/arrumador) no Porto de Paranaguá, além de períodos em gozo de auxílio-doença. A sentença julgou parcialmente procedente, reconhecendo alguns períodos como especiais e concedendo aposentadoria por tempo de contribuição. Ambas as partes apelaram.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO:
2. Há três questões em discussão: (i) o reconhecimento do exercício de atividade especial em diversos períodos de trabalho como estivador/arrumador no Porto de Paranaguá, com exposição a agentes nocivos como ruído, agentes químicos, poeiras, gases, vapores, frio, umidade e periculosidade; (ii) a possibilidade de cômputo como tempo especial dos períodos em gozo de auxílio-doença; e (iii) a consequente concessão de aposentadoria especial ou por tempo de contribuição.
III. RAZÕES DE DECIDIR:
3. O reconhecimento da especialidade do trabalho deve observar a lei em vigor à época em que a atividade foi exercida, pois o segurado adquire o direito à contagem como tal, não se aplicando retroativamente lei nova mais restritiva, conforme entendimento do STJ (AGREsp nº 493.458/RS, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 23.06.2003; REsp nº 491.338/RS, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 23.06.2003) e o art. 70, § 1º, do Decreto nº 3.048/99, inserido pelo Decreto nº 4.827/03.
4. A comprovação da especialidade da atividade laboral segue a evolução legislativa: até 28/04/1995, era possível o enquadramento por categoria profissional ou por agentes nocivos (exceto ruído e calor, que exigiam perícia); de 29/04/1995 a 05/03/1997, exigia-se demonstração efetiva de exposição a agentes nocivos por formulário-padrão (exceto ruído e calor, que exigiam perícia); e a partir de 06/03/1997, passou-se a exigir formulário-padrão embasado em laudo técnico ou perícia.
5. A conversão de tempo especial em comum é admitida após maio de 1998, conforme entendimento firmado pelo STJ (REsp nº 1.151.363/MG, Tema 422, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 23.03.2011), sendo reconhecida para o tempo cumprido até a data de entrada em vigor da EC nº 103/19 (art. 25, § 2º), vedada a conversão para o tempo cumprido após esta data.
6. Para o agente nocivo ruído, devem ser adotados os seguintes níveis de exposição para fins de reconhecimento do tempo de atividade especial: superior a 80 dB(A) até 05/03/1997; superior a 90 dB(A) de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB(A) a partir de 19/11/2003, sendo impossível a aplicação retroativa do Decreto nº 4.882/03, conforme entendimento do STJ no REsp nº 1.398.260-PR (Tema 694, Rel. Min. Herman Benjamin, j. 14.05.2014).
7. A utilização de EPI é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais antes de 03/12/1998. A partir dessa data, o STF (ARE 664.335/SC, Tema 555, Rel. Min. Luiz Fux, j. 04.12.2014) fixou que o EPI eficaz descaracteriza a aposentadoria especial, exceto para *ruído*. O TRF4 (IRDR 15) e o STJ (Tema 1.090) consolidaram que a simples anotação no PPP não é suficiente para afastar a especialidade, o ônus de comprovar a ineficácia do EPI recai sobre o autor, e a dúvida sobre a real eficácia favorece o segurado, mantendo as exceções para agentes biológicos, cancerígenos, periculosidade, calor, radiações ionizantes e condições hiperbáricas.
8. A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada, mas que tal exposição seja inerente ao desenvolvimento das atividades do trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de caráter eventual, conforme entendimento do TRF4 (EINF nº 2007.71.00.046688-7, Rel. Celso Kipper, j. 07.11.2011; EINF nº 0004963-29.2010.4.04.9999, Rel. Vivian Josete Pantaleão Caminha, j. 12.03.2013; EINF nº 0031711-50.2005.4.04.7000, Rel. Luiz Carlos de Castro Lugon, j. 08.08.2013) e do STJ (Tema 1.083).
9. A atividade de estivador no Porto de Paranaguá é reconhecida como especial nos períodos até 28/04/1995 por enquadramento em categoria profissional (códigos 2.5.6 do Decreto nº 53.831/64 e 2.4.5 do Decreto nº 83.080/79). O período de 19/11/2003 a 31/12/2003 também é reconhecido como especial devido à exposição à associação de agentes prejudiciais à saúde, como ruído (acima dos limites legais), calor, poeiras vegetais e minerais, umidade e frio (-10ºC), conforme PPPs e laudos técnicos (1996, 2001, 2003) e precedentes do TRF4 (TRF4 5001467-82.2012.4.04.7008, Rel. Fernando Quadros da Silva, j. 05.09.2017; TRF4 5003725-65.2012.4.04.7008, Rel. Ezio Teixeira, j. 01.03.2017).
10. A partir de 01/01/2004, não é cabível o reconhecimento da especialidade da atividade de estivador e funções correlatas, pois o PPP elaborado pelo OGMO/PR, baseado em extensas inspeções de 2004 a 2011, demonstra que os níveis de *ruído* estavam habitualmente dentro do limite legal (inferiores a 85 dB(A)). Ademais, outros agentes como frio, umidade, poeiras, calor, vibração, fósforo e periculosidade não excediam os limites de tolerância, não eram habituais e permanentes, ou não se enquadravam nas atividades específicas para reconhecimento, conforme laudos técnicos e pericial judicial.
11. A concessão da aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER é mantida, conforme já decidido em sentença, sendo que o período adicional de atividade especial de 19/11/2003 a 31/12/2003, reconhecido neste acórdão, deverá ser considerado na contagem para a verificação do direito ao melhor benefício em fase de cumprimento de sentença.
12. Em face do desprovimento da apelação do INSS e da vigência do CPC/2015 (sentença proferida após 18/03/2016), os honorários advocatícios em favor do advogado da parte autora são majorados em 50% sobre o valor a ser apurado em liquidação, conforme o art. 85, § 11, do CPC.
13. Diante da ausência de efeito suspensivo de qualquer outro recurso, é determinada a implantação do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (NB 189.087.113-0, DIB 03/04/2020) pelo INSS, no prazo máximo de 20 dias.
IV. DISPOSITIVO E TESE:
14. Negado provimento à apelação do INSS. Parcialmente provida a apelação da parte autora para reconhecer a especialidade do período de 19/11/2003 a 31/12/2003, com adequação do tempo total de contribuição à aposentadoria por tempo de contribuição. Determinada a implantação do benefício.
Tese de julgamento: O reconhecimento da especialidade da atividade de estivador no Porto de Paranaguá é possível até 31/12/2003, em razão da exposição à associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, mas não a partir de 01/01/2004, conforme PPP do OGMO/PR que demonstra níveis de ruído dentro dos limites de tolerância e ausência de outros agentes em níveis prejudiciais.
___________
Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 85, § 11, e 487, I; Lei nº 8.213/91, arts. 57 e 58; EC nº 103/19, art. 25, § 2º; Decreto nº 3.048/99, art. 70, § 1º, e Anexo IV, item 1.0.12; Decreto nº 53.831/64, Quadro Anexo, código 2.5.6; Decreto nº 83.080/79, Anexo II, código 2.4.5; Decreto nº 4.882/03.
Jurisprudência relevante citada: STJ, AGREsp nº 493.458/RS, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 23.06.2003; STJ, REsp nº 491.338/RS, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 23.06.2003; STJ, REsp nº 1.151.363/MG, Tema 422, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 23.03.2011; STJ, REsp nº 1.398.260-PR, Tema 694, Rel. Min. Herman Benjamin, j. 14.05.2014; STF, ARE 664.335/SC, Tema 555, Rel. Min. Luiz Fux, j. 04.12.2014; TRF4, IRDR 15; STJ, Tema 1.090; STJ, Tema 1.083; TRF4 5001467-82.2012.4.04.7008, Rel. Fernando Quadros da Silva, j. 05.09.2017; TRF4 5003725-65.2012.4.04.7008, Rel. Ezio Teixeira, j. 01.03.2017; Súmula nº 198 do extinto TFR.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, dar parcial provimento à apelação da parte autora e determinar a implantação do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 04 de novembro de 2025.
Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005290830v5 e do código CRC 1f9624e1.
Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADOData e Hora: 04/11/2025, às 18:30:19
Conferência de autenticidade emitida em 11/11/2025 04:08:52.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 28/10/2025 A 04/11/2025
Apelação Cível Nº 5000668-24.2021.4.04.7008/PR
RELATOR Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
PRESIDENTE Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PROCURADOR(A) ANDREA FALCÃO DE MORAES
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 28/10/2025, às 00:00, a 04/11/2025, às 16:00, na sequência 14, disponibilizada no DE de 17/10/2025.
Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.
RELATOR DO ACÓRDÃO Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante Juiz Federal LEONARDO CASTANHO MENDES
Votante Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
SUZANA ROESSING
Secretária
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Identificações de pessoas físicas foram ocultadas