
Apelação Cível Nº 5054287-49.2019.4.04.7100/RS
RELATORA Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
RELATÓRIO
Trata-se de Apelação interposta por A. P. R. e pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS contra a sentença que assim se pronunciou quanto ao pedido inicial ( e ):
III - DISPOSITIVO
Ante o exposto, julgo PROCEDENTES os pedidos, extinguindo o feito com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para o fim de:
a) reconhecer como tempo especial, a ser convertido em tempo comum pelo fator 1,4, se for o caso, o período de 01/02/1991 a 29/06/2017;
b) determinar que o INSS promova a averbação dos períodos acima reconhecidos;
c) condenar o INSS a
c.1) conceder à parte autora benefício de aposentadoria especial ou aposentadoria por tempo de contribuição, a contar de 29/06/2017 (DER 177.875.838-7), assegurado o direito de opção pelo benefício mais vantajoso, exigido, todavia, na primeira hipótese, o seu afastamento das condições especiais de labor a contar da data em que efetivamente implantada a aposentadoria especial na via administrativa (Tema STF n. 709), conforme fundamentação;
c.2) efetuar o pagamento das parcelas vencidas e vincendas, desde 29/06/2017, sendo as vencidas atualizadas monetariamente e com juros de mora, conforme a fundamentação.
Condeno a parte ré ao pagamento dos honorários advocatícios do patrono da parte autora, fixados em 10% (dez por cento) do valor das parcelas vencidas até a sentença, nos termos da Súmula 111 do STJ.
Custas pelo INSS, que é isento do seu pagamento (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96), e sem ressarcimento, dado que não adiantadas pela parte autora.
Sem remessa necessária, tendo em vista que o valor da condenação não ultrapassará mil salários mínimos, conforme preceitua o art. 496 CPC.
Havendo recurso(s) voluntário(s) tempestivo(s), intime(m)-se a(s) parte(s) contrária(s) para apresentação de contrarrazões. Acaso suscitadas em contrarrazões as matérias referidas no artigo 1.009, § 1º, do CPC/2015, dê-se vista a(s) parte(s) contrária pelo prazo de 15 (quinze) dias, nos termos do § 2º do referido dispositivo legal. Juntados os eventuais recursos e as respectivas contrarrazões apresentadas no prazo legal devem ser os autos remetidos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Transcorrido o prazo sem interposição de recursos, certifique-se o trânsito em julgado e, após cumpridas as determinações do julgado, dê-se baixa e arquivem-se.
Publique-se. Intimem-se.
Nas razões recursais (), a parte autora sustenta, preliminarmente: a) negativa de prestação jurisdicional por omissão da decisão quanto à obrigatoriedade de observância do procedimento administrativo previsto no Decreto 3048/99 e na Instrução Normativa INSS 77/2016 para o cancelamento do benefício, violando os arts. 489, §1º, IV e 1022 do CPC. No mérito, argumenta que: (i) a cessação da aposentadoria especial deve ser precedida de notificação prévia, garantindo ao segurado o contraditório e a ampla defesa, nos termos do art. 69 do Decreto 3048/99 e do §2º do art. 254 da IN 77/2016; (ii) a decisão viola os arts. 2º e 28 da Lei 9.784/99 ao não assegurar as formalidades essenciais do processo administrativo, incluindo a produção de provas e a interposição de recursos antes do cancelamento; (iii) defere-se a verificação in loco das atuais condições de trabalho para aferir a persistência da exposição a agentes nocivos; (iv) postula a suspensão da implantação do benefício até o trânsito em julgado do Tema 709 do STF, considerando a pendência de embargos declaratórios que podem modular os efeitos da decisão. Requer, portanto, o provimento do recurso para determinar a observância dos procedimentos administrativos legais no eventual cancelamento do benefício e a suspensão de sua implantação até o julgamento definitivo do Tema 709.
O INSS (), por sua vez, em razões recursais alega que: (i) o agente umidade não mais é considerado nocivo para fins previdenciários a partir de 05/03/1997, data da edição do Decreto nº 2.172/97, que o excluiu do rol de agentes ensejadores de aposentadoria especial, ofendendo o disposto no artigo 57 da Lei 8.213/91; (ii) quanto ao ruído, a comprovação da exposição para o período posterior a 18/11/2003 carece de fundamento, pois o Perfil Profissiográfico Previdenciário não indica a técnica de medição utilizada, não atendendo à obrigatoriedade da metodologia da NHO-01 da Fundacentro ou da NR-15, que reflita a exposição durante toda a jornada, conforme entendimento da Turma Nacional de Uniformização; (iii) a concessão de tempo especial sem o devido lastro legal e comprovação técnica adequada viola o princípio da prévia fonte de custeio, previsto no artigo 195, parágrafo 5º, da Constituição Federal, e os artigos 57 e 58 da Lei 8.213/91, que condicionam o benefício à existência de contribuição específica e à definição dos agentes nocivos por decreto do Poder Executivo. Requer, portanto, a reforma da sentença para excluir o reconhecimento como tempo especial do período de 06/03/1997 a 29/06/2017.
Com as contrarrazões (), vieram os autos para esta Corte.
É o relatório.
VOTO
I - Preliminares
I.1 - Negativa de Prestação Jurisdicional
Nas razões de apelação, a parte autora aduziu, preliminarmente, a ocorrência de negativa de prestação jurisdicional, porquanto a sentença não ressalvou a observância da Lei do Processo Administrativo e da regulamentação administrativa pertinente ao cancelamento da aposentadoria, postulando, assim, a correção do vício em sede recursal.
A negativa de prestação jurisdicional somente ocorre se o magistrado deixa de manifestar sobre questões importantes e imprescindíveis para a solução da controvérsia. O órgão julgador não está obrigado a mencionar, exaustivamente, todos os dispositivos legislativos referidos pelas partes e nem mesmo a analisar e a comentar um a um os fundamentos jurídicos invocados e/ou relativos ao objeto do litígio. Basta a apreciação das questões pertinentes de fato e de direito que lhes são submetidas (art. 489, inc. II, CPC) com argumentos jurídicos suficientes, ainda que não exaurientes.
No presente caso, o pedido de ressalva quanto à aplicabilidade das disposições normativas referentes aos procedimentos administrativos não encontra amparo, uma vez que tais normativos são de observância obrigatória pelo INSS e estão contidos, de forma implícita, no decisum a quo.
Afasto a preliminar.
II - Análise do Mérito
A controvérsia recursal cinge-se ao reconhecimento das condições especiais da atividade laboral da parte autora e ao afastamento da atividade nociva para implantação da aposentadoria especial.
A sentença de origem reconheceu a especialidade e determinou o afastamento da atividade nociva (Tema 709/STF), fundamentando que:
Dos períodos pretendidos nestes autos
Prossigo ao exame das condições em que se deu o labor, a fim de verificar a ocorrência de atividades especiais. Analiso, a seguir, as provas produzidas e apresento as respectivas conclusões para cada período de trabalho requerido:
Período: de 01/02/1991 a 29/06/2017 (DER)
Empregador: Companhia Riograndense de Saneamento - CORSAN
Provas:
- PPP: 0Evento 13, PPP2)
- Laudo Técnico datado de 2009, decorrente de vistoria in loco realizada a pedido de trabalhador da CORSAN: LAUDO12, evento 1
- LTCAT de 2005/2016 da CORSAN: LAUDO14, evento 1
Cargo/Setor: Auxiliar de instalador de rede, instalador de redes I e agente de serviços operacionais/ Distribuição
Atividades:

Agentes nocivos indicados nas provas:
** Segundo o PPP:

** Segundo LTCAT da CORSAN (LAUDO12, evento 1):






Enquadramento legal:
- ruído: código 1.1.6 do Decreto n. 53.831/64 (até 05/03/1997, limite de 80 decibéis); código 2.0.1 do Decreto 2.172/97 (limite de 90 decibéis entre 06/03/1997 a 18/11/2003); Decreto n. 4882/03 (limite de 85 decibéis a partir de 18/11/2003).
- umidade: o enquadramento, até 05/03/1997, se dava no código 1.1.3 do Decreto 53.831/64; sabendo-se que o rol de agentes previsto pelos decretos que regulamentam a matéria é exemplificativo, e não exaustivo, mostra-se possível o reconhecimento da especialidade mesmo após a vigência do Decreto n. 2.172/97, que deixou de mencioná-los, quando comprovada nos autos a insalubridade decorrente da exposição ao referido agente.
- associação de agentes: código n. 4.0.0 do Decreto n. 2.172/97.
Exame de mérito:
Pelo reconhecimento da especialidade dos período em análise, em razão da comprovada exposição - por meio de formulário PPP regularmente preenchido pelo empregador, com base em LTCAT da empresa - a ruído superior aos limites legais de tolerância, associado ao contato com umidade considerada excessiva. Deixo de considerar a menção de exposição a radiações não ionizantes, porque provenientes de fonte natural (raios solares), em desacordo com a legislação que rege a matéria. A exposição a poeiras minerais, por sua vez, se dava de modo meramente eventual segundo o LTCAT (30 minutos por semana), de modo que também não enseja enquadramento.
No caso dos autos, as provas trazidas ao feito comprovam que o autor trabalhava em ambiente excessivamente úmido e ruidoso, de modo a comprovar a permanência da nocividade em razão da associação de agentes.
A neutralização por EPI somente pode ser considerada para labor desempenhado a partir da Lei n 9.732/98 (datada de 11/12/1998), que alterou o § 2º do artigo 58 da Lei 8.213/91. Ademais, para o período posterior:
- não restou comprovada no feito a existência de controle e peridiocidade de fornecimento dos EPIs, a sua real eficácia na neutralização da insalubridade ou, ainda, que o respectivo uso era de fato obrigatório e continuamente fiscalizado pelo empregador;
- tratando-se do agente ruído, não há que se falar na neutralização da nocividade pelo uso de EPI, conforme assentado pelo STF (ARE 664335, Relator Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 04/12/2014).
Registre-se, acerca das impugnações da parte autora aos dados registrados no PPP e à pretensão de realização de perícia no local do trabalho (cujo indeferimento ora reitero), que:
- os documentos que atestam as condições de trabalho, quando firmados por quem de direito, presumem-se verdadeiros e fidedignos, inviabilizando a sua mera desconsideração em razão de insatisfação manifestada pelos interessados, sob pena de se correr o risco de, por via transversas, declará-los inverídicos/não fidedignos, sem a devida oportunização do contraditório ao empregador e ao profissional responsável pelos levantamentos);
- eventual inconformismo da parte autora com as informações constantes do formulário - que são ou deveriam ser prestadas pela empresa com base nos laudos que produz, existindo importantes efeitos tributários que lhe são conexos, bem como repercussão mesmo na esfera penal decorrente de eventual prestação de informações inverídicas - deve ser equacionado pelo segurado em sede e momento adequados (perante a justiça trabalhista competente), que não em demanda previdenciária em curso. Deve, pois, diligenciar, postulando as correções necessárias e, em caso de resistência, denunciar tal situação ao sindicato, à DRT, ao MPT etc. Tudo isso, obviamente, antes de ingressar com a ação previdenciária.
- por fim, não cabe ao Poder Judiciário Federal utilizar perícias judiciais extemporâneas a fim de "conferir" a correção ou suprir omissão dos dados lançados em tais formulários, pois, acaso tal entendimento prevaleça, também o inss poderá requerer prova pericial nova ou adoção de laudos paradigma sempre que o ppp for favorável ao segurado.
Conclusão: período especial reconhecido nos intervalos de 01/02/1991 a 29/06/2017.
A decisão do juízo a quo não merece reparos. A análise probatória foi precisa e a conclusão está em plena consonância com a jurisprudência consolidada nesta Corte.
A orientação desta Corte Federal está assim sedimentada quanto ao reconhecimento do tempo especial diante da categoria profissional até 28/04/1995 e pela exposição ao(s) agente(s) nocivo(s):
AGENTE NOCIVO: RUÍDO
O reconhecimento da especialidade da atividade pela exposição a ruído exige a demonstração da efetiva exposição, mediante aferição do nível de decibéis (dB) por meio de parecer técnico. Os limites de tolerância para ruído são: Até 05.03.1997: Superior a 80 dB(A) (Decreto nº 53.831/64 e Decreto nº 83.080/79). De 06.03.1997 a 18.11.2003: Superior a 90 dB(A) (Decreto nº 2.172/97 e Decreto nº 3.048/99). O Superior Tribunal de Justiça (Tema 694 - REsp n° 1398260/PR) pacificou que é impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB. A partir de 19.11.2003: Superior a 85 dB(A) (Decreto nº 3.048/99, alterado pelo Decreto nº 4.882/2003). Metodologia de Medição (NEN/Pico): O Superior Tribunal de Justiça (Tema 1083 - REsp 1886795/RS) fixou que o reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição. A exigência do NEN no LTCAT e PPP é a partir do Decreto n. 4.882/2003. (TRF4, AC 5001035-06.2020.4.04.7001, 10ª Turma , Relator para Acórdão LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO , julgado em 12/08/2025). EPI´s: Eventual utilização de EPI´s é irrelevante para elidir a nocividade decorrente da exposição ao ruído excessivo, conforme decisão do STF no ARE 664.335/SC.
AGENTE NOCIVO: UMIDADE
A exposição à umidade é nociva quando proveniente de fontes artificiais, capaz de ser nociva à saúde (Código 1.3 do Quadro Anexo ao Decreto 53.831/64). Rol Exemplificativo: Apesar de não haver previsão expressa nos decretos mais recentes (2.172/97 e 3.048/99), a umidade excessiva de fontes artificiais pode ensejar o reconhecimento da especialidade com base na Súmula 198 do TFR, se perícia técnica comprovar a nocividade. Fontes Artificiais vs. Naturais: Somente é possível o reconhecimento da especialidade com base em umidade decorrente de fontes artificiais, e não daquelas provenientes de fontes naturais (chuva, ar livre, etc.).(TRF4, AC 5031753-18.2022.4.04.7000, 10ª Turma , Relatora para Acórdão CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI, julgado em 05/08/2025).
INTERMITÊNCIA
A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física (referidas no artigo 57, § 3º, da Lei n° 8.213/91) não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual ou ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível (EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24-10-2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. 7-11-2011).
Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (EINF n° 2005.72.10.000389-1, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 18-5-2011; EINF n° 2008.71.99.002246-0, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 8-1-2010).
ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO ADICIONAL COMO ÓBICE AO RECONHECIMENTO DA ATIVIDADE ESPECIAL. INEXISTÊNCIA DE CORRELAÇÃO COM O PRINCÍPIO DA PRECEDÊNCIA DO CUSTEIO (CF/88, ART. 195, § 5º)
O argumento do INSS não prospera, porquanto inadequado aferir a existência de um direito previdenciário a partir do modo como formalizada a obrigação fiscal por parte da empresa empregadora. Se os elementos de prova contidos nos autos demonstram a natureza especial da atividade laboral desenvolvida pelo segurado, o reconhecimento de seu direito não é prejudicado por eventual erro na informação da atividade na GFIP ou pela ausência de recolhimento da contribuição adicional por parte da empresa empregadora.
O que importa é que a atividade seja, na realidade, especial. Nesse caso, abre-se ao Fisco, diante de tal identificação, a adoção das providências relativas à arrecadação das contribuições que entender devidas. O raciocínio é análogo às situações de trabalho informal pelo segurado empregado (sem anotação em carteira ou sem recolhimento das contribuições previdenciárias). A constatação de eventual discrepância entre a realidade e o fiel cumprimento das obrigações fiscais poderá constituir um ponto de partida para os procedimentos de arrecadação fiscal e imposição de penalidades correspondentes.
De outro lado, é inadequada a compreensão que condiciona o reconhecimento da atividade especial às hipóteses que fazem incidir previsão normativa específica de recolhimento de contribuição adicional (art. 57, §§ 6º e 7º, da Lei nº 8.213/91). E a ausência de contribuição específica não guarda relação alguma com o princípio da precedência do custeio (CF/88, art. 195, §5º).
Quanto ao ponto, a contribuição adicional apenas foi instituída pela Lei 9.732/98, quase quatro décadas após a instituição da aposentadoria especial pela Lei 3.807/60. Além disso, as empresas submetidas ao regime simplificado de tributação (SIMPLES), como se sabe, não estão sujeitas ao recolhimento da contribuição adicional e essa condição não propicia sequer cogitação de que seus empregados não façam jus à proteção previdenciária diferenciada ou de que a concessão de aposentadoria especial a eles violaria o princípio constitucional da precedência do custeio. Prestigia-se, neste ponto, a realidade e a necessidade da proteção ao trabalhador, de modo que a suposta omissão ou inércia do legislador, quanto à necessidade de uma contribuição específica, não implica a conclusão de que a proteção social estaria a violar o princípio da precedência do custeio.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO URBANO. CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO COMUM EM TEMPO ESPECIAL. IMPOSSIBILIDADE. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. INFORMAÇÕES PRESTADAS EM GFIP. IRRELEVÂNCIA. PRECEDÊNCIA DA FONTE DE CUSTEIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. CONCESSÃO. (...). 5. Para fins de reconhecimento da especialidade da atividade, é irrelevante que a empresa não tenha informado, em GFIP, o caráter especial da atividade exercida pelo autor, bem como que não tenha recolhido a respectiva contribuição adicional. (...) (TRF4 5031012-27.2012.4.04.7000, 10ª Turma, Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, 02.10.2018)
I.1 - Recurso da parte autora:
Afastamento do trabalho em atividade especial
O artigo 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91, na redação conferida pela Lei nº 9.732/98, estabelece que "aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei". Por seu turno, o mencionado artigo 46 refere que "o aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade terá sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno".
A Corte Especial deste Tribunal Regional Federal havia declarado a inconstitucionalidade do art. 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91, no julgamento da Arguição de Inconstitucionalidade nº 5001401-77.2012.404.0000, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, 31.05.2012.
Todavia, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a Repercussão Geral da matéria em 27.3.2014 (Tema nº 709), e concluiu o julgamento do RE 791961 em 05.06.2020, fixando as seguintes teses:
I) É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não.
II) Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o benefício previdenciário em questão.
Nos embargos de declaração opostos, cujo julgamento virtual foi finalizado em 23/02/2021, o Supremo Tribunal Federal proferiu a seguinte decisão:
O Tribunal, por maioria, acolheu, em parte, os embargos de declaração para a) esclarecer que não há falar em inconstitucionalidade do § 8º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, em razão da alegada ausência dos requisitos autorizadores da edição da Medida Provisória que o originou, pois referida MP foi editada com a finalidade de se promoverem ajustes necessários na Previdência Social à época, cumprindo, portanto, as exigências devidas; b) propor a alteração na redação da tese de repercussão geral fixada, para evitar qualquer contradição entre os termos utilizados no acórdão ora embargado, devendo ficar assim redigida: “4. Foi fixada a seguinte tese de repercussão geral: “(i) [é] constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não; (ii) nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros; efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o pagamento do benefício previdenciário em questão.”; c) modular os efeitos do acórdão embargado e da tese de repercussão geral, de forma a preservar os segurados que tiveram o direito reconhecido por decisão judicial transitada em julgado até a data deste julgamento; d) declarar a irrepetibilidade dos valores alimentares recebidos de boa-fé, por força de decisão judicial ou administrativa, até a proclamação do resultado deste julgamento, nos termos do voto do Relator, vencido parcialmente o Ministro Marco Aurélio, que divergia apenas quanto à modulação dos efeitos da decisão. Plenário, Sessão Virtual de 12.2.2021 a 23.2.2021.
A ausência de trânsito em julgado não impede a aplicação dos precedentes firmados pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF, ARE 686607 ED, Rel. Min. Dias Toffoli, 1ª T., j. 30.10.2012; RMS 35348 AgR, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª T., j. 10.5.2019).
Assim, deve ser observada a decisão do Supremo Tribunal Federal no Tema 709 da Repercussão Geral para os fins de cumprimento do julgado.
Quanto aos efeitos da aplicação do Tema 709 no caso concreto, deve ser observado o disposto no item II da tese firmada, que estabeleceu os parâmetros de sua aplicabilidade, a serem observados na implantação do benefício, tanto na via administrativa, quanto em juízo:
(ii) nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros; efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o pagamento do benefício previdenciário em questão.
Nos casos em que há antecipação da tutela, no curso do processo, essa decisão judicial não prejudicará o segurado, conforme a premissa que orientou a tese fixada no referido item II do Tema. Nesse sentido, excerto da fundamentação do voto condutor, do Ministro Dias Toffoli, no Recurso Extraordinário 791961, paradigma do Tema 709:
De todo modo, não me parece que, ocorrendo o reconhecimento do direito à aposentadoria especial ao trabalhador que não se afastou daquela atividade nociva, a DIB deva ser fixada na data do afastamento do labor e não na data do requerimento. Isso porque, julgada procedente a ação, subentende-se que a resistência da autarquia era, desde o requerimento, injustificada. Dito de outro modo, o postulante efetivamente fazia jus ao benefício desde o requerimento administrativo. Deverá ele ser penalizado por uma resistência imotivada do INSS, sobretudo quando sabidamente os processos administrativo e judicial alongam-se por tempo demasiado? Não é razoável exigir o afastamento do trabalho logo quando da postulação, pois entre essa e o eventual deferimento decorre um tempo durante o qual o indivíduo evidentemente necessita continuar a obter renda para seu sustento, sendo incerto, ademais, nesse primeiro momento, inclusive, o deferimento da aposentação.
Quando, ao final do processo, o segurado tem seu direito à aposentadoria reconhecido e fica evidenciada a falta de fundamento para a resistência do INSS desde a entrada do requerimento, o segurado deve ser penalizado com a postergação da data de início do benefício para o momento em que ele se afastar da atividade? Com a devida vênia, aqui me afigura acertada a convicção esboçada pelo Tribunal a quo, o qual, a respeito desse ponto, assinalou que o segurado, quando prossegue no exercício da atividade, possui direito a receber as parcelas vencidas do benefício desde a data do requerimento administrativo.
Isso registrado, vislumbro como mais acertado, quanto a esse tema específico, que, nas hipóteses em que o indivíduo solicita a aposentadoria e continua a exercer o labor especial, a data de início do benefício deva ser a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o benefício previdenciário em questão. Entendendo ser essa uma compreensão que bem harmoniza a segurança jurídica, o direito do segurado e o conteúdo do art. 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91.
Destarte, nos casos em que houve antecipação da tutela em juízo, não haverá efeito retroativo prejudicial ao segurado, que poderá permanecer na atividade sem prejuízo do recebimento do benefício, nos termos da modulação dos efeitos determinada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento dos embargos de declaração no Tema 709, visto que após a apreciação do tema de Repercussão Geral, foram opostos embargos de declaração, cujo julgamento virtual foi finalizado em 23/02/2021, em que o Supremo Tribunal Federal proferiu a seguinte decisão:
O Tribunal, por maioria, acolheu, em parte, os embargos de declaração para a) esclarecer que não há falar em inconstitucionalidade do § 8º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, em razão da alegada ausência dos requisitos autorizadores da edição da Medida Provisória que o originou, pois referida MP foi editada com a finalidade de se promoverem ajustes necessários na Previdência Social à época, cumprindo, portanto, as exigências devidas; b) propor a alteração na redação da tese de repercussão geral fixada, para evitar qualquer contradição entre os termos utilizados no acórdão ora embargado, devendo ficar assim redigida: “4. Foi fixada a seguinte tese de repercussão geral: “(i) [é] constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não; (ii) nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros; efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o pagamento do benefício previdenciário em questão.”; c) modular os efeitos do acórdão embargado e da tese de repercussão geral, de forma a preservar os segurados que tiveram o direito reconhecido por decisão judicial transitada em julgado até a data deste julgamento; d) declarar a irrepetibilidade dos valores alimentares recebidos de boa-fé, por força de decisão judicial ou administrativa, até a proclamação do resultado deste julgamento, nos termos do voto do Relator, vencido parcialmente o Ministro Marco Aurélio, que divergia apenas quanto à modulação dos efeitos da decisão. Plenário, Sessão Virtual de 12.2.2021 a 23.2.2021.
Como se nota, o Supremo Tribunal Federal modulou os efeitos da tese de repercussão geral no sentido de preservar o direito de permanência dos segurados que recebem aposentadoria especial nas atividades especiais até a data do julgamento do embargos declaratórios, isso é, 23/02/2021.
Com a modulação de efeitos, é necessário o afastamento da atividade nociva em razão do recebimento da aposentadoria especial, a partir da decisão do Supremo Tribunal Federal no julgamento daqueles embargos de declaração, em 23/02/2021, ressalvados apenas os casos de profissionais da saúde no período em que estiveram trabalhando diretamente no combate à epidemia do COVID-19, ou prestando serviços de atendimento a pessoas atingidas pela doença em hospitais ou instituições congêneres, públicos ou privados, abrangidos pelos efeitos da decisão, em 15/03/2021, do Ministro Dias Toffoli, Relator do RE 791961 (Tema STF nº 709). Pois bem.
Reconhecido, in casu, o direito à aposentadoria especial, bem assim observado o quanto deliberado pela Corte Suprema, imprescindível que, ante a implantação da aposentadoria especial, a parte afaste-se das atividades reputadas nocivas. Nessa linha, em vista do in dubio pro segurado e do direito ao melhor benefício, não cabe estabelecer a implantação imediata, devendo facultar-se à parte, na fase de cumprimento, (i) optar pelo benefício mais vantajoso, quando reconhecido, na via judicial, que faz jus a mais de uma espécie - como, verbi gratia, aposentadoria especial e aposentadoria por tempo de contribuição -, ou (ii) caso reconhecida, judicialmente, apenas a aposentadoria por tempo especial, deve a autarquia previdenciária averiguar, quando da implantação, se há direito à aposentadoria por tempo de contribuição para facultar à parte eleger aquele benefício que julgar mais adequado. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. INOVAÇÃO RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO. TEMPO ESPECIAL. HIDROCARBONETOS. ENQUADRAMENTO ESPECIAL. APOSENTADORIA ESPECIAL DESDE A DER. AFASTAMENTO DAS ATIVIDADES NOCIVAS. OPÇÃO PELO MELHOR BENEFÍCIO. ÔNUS SUCUMBENCIAIS REMANEJADOS. 1. Não se conhece do recurso quando o recorrente nele suscita matéria que não tenha sido objeto de alegação e, portanto, submetida à análise ao juízo de primeiro grau. 2. Conforme decisão proferida pela 3ª Seção deste Tribunal, na Reclamação 5036135-68.2023.4.04.0000, os hidrocarbonetos são cancerígenos para o ser humano, de modo que a simples exposição (qualitativa) enseja o reconhecimento da atividade como especial, independentemente do nível de concentração no ambiente de trabalho e da existência de EPC e/ou EPI eficaz, sendo inexigível a permanência da exposição. 3. O Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de repercussão geral no RE 788.092/SC (Tema 709), firmando a tese de que é constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não. 4. Implantado o benefício - desde quando preenchidos os requisitos - deve haver o afastamento da atividade tida por especial, inexistindo inconstitucionalidade no § 8º do art. 57 da Lei 8.213/1991, não sendo justificável o condicionamento de sua implantação ao prévio distanciamento da atividade nociva. 5. Cabe à autarquia, na fase de cumprimento de sentença, verificar o preenchimento dos requisitos para a concessão tanto da aposentadoria especial como para aposentadoria por tempo de contribuição e apurar o melhor benefício, possibilitando à parte autora a escolha pelo que lhe for mais conveniente, considerando a necessidade de afastamento da atividade em caso de concessão de aposentadoria especial. 6. Modificada a solução da lide, pagará o INSS honorários advocatícios a parte autora, observadas as Súmulas 111 do STJ e 76 desta Corte, conforme tese firmada pelo STJ no julgamento do Tema 1.105. (TRF4, Apelação Cível nº 5002566-38.2018.4.04.7118, Décima Primeira Turma, Relator Juiz Federal Convocado Herlon Schveitzer Tristão, julgado em 18-12-2024)
Portanto, não merece provimento o recurso da parte autora.
I.2 - Recurso do INSS:
Pelos fundamentos expostos na sentença, que adoto como razões de decidir, e em conformidade com a jurisprudência desta Corte, é de ser mantido o reconhecimento da especialidade do labor nos períodos controvertidos.
Da soma do tempo para obtenção do benefício.
A implementação dos requisitos para a concessão/revisão da aposentadoria por tempo de contribuição/especial deverá ser verificada pelo juízo de origem através da liquidação do julgado. Em caso de implantação do benefício, deverá ser observada a hipótese de cálculo que for mais vantajosa ao autor, dentre as que resultarem possíveis.
Na hipótese de concessão de aposentadoria especial / revisão de espécie para fins de concessão de aposentadoria especial, deverá ser observada a tese jurídica fixada pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 709.
Benefícios inacumuláveis.
Fica desde logo autorizado o desconto integral, sobre as parcelas vencidas, dos valores eventualmente recebidos, a contar da DIB, a título de benefício inacumulável, nos termos do art. 124 da Lei nº 8.213/1991 e à luz da vedação ao enriquecimento sem causa.
III - Consectários, Honorários e Prequestionamento
Consectários Legais Os consectários legais devem ser fixados, quanto aos juros, nos termos do que definido pelo STF no julgamento do Tema 1170. No que tange à correção monetária, até 08/12/2021, deve ser aplicado o INPC (Lei 11.430/06). A partir de 09/12/2021, incidirá a taxa SELIC, para todos os fins (correção, juros e compensação da mora), conforme o art. 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021.
Honorários Advocatícios Recursais Tendo em vista o desprovimento do recurso do INSS, majoro os honorários de sucumbência em 20% (vinte por cento), sobre o valor fixado na sentença, em observância ao disposto no artigo 85, § 11, do Código de Processo Civil.
Prequestionamento Para fins de acesso às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as questões e os dispositivos legais invocados pelas partes, nos termos dos artigos 1.022 e 1.025 do CPC, evitando-se a oposição de embargos de declaração com propósito de prequestionamento.
Dispositivo
Voto por negar provimento à apelação da parte autora e à apelação do INSS.
Documento eletrônico assinado por ANA RAQUEL PINTO DE LIMA, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005406133v7 e do código CRC a7fe3dae.
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Apelação Cível Nº 5054287-49.2019.4.04.7100/RS
RELATORA Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA ESPECIAL. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. AFASTAMENTO DA ATIVIDADE NOCIVA. RECURSOS DESPROVIDOS.
1. Apelações cíveis interpostas pela parte autora e pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) contra sentença que reconheceu tempo especial de 01/02/1991 a 29/06/2017, concedeu aposentadoria especial ou por tempo de contribuição a partir de 29/06/2017, e determinou o afastamento da atividade nociva após a implantação da aposentadoria especial, conforme o Tema 709 do STF.
2. Há três questões em discussão: (i) a ocorrência de negativa de prestação jurisdicional por omissão da sentença; (ii) a necessidade de observância de procedimento administrativo para o cancelamento do benefício e a suspensão da implantação da aposentadoria especial até o trânsito em julgado do Tema 709 do STF; (iii) a validade do reconhecimento do tempo especial em relação aos agentes umidade e ruído, e a alegação de violação do princípio da prévia fonte de custeio.
3. A preliminar de negativa de prestação jurisdicional foi afastada, pois a sentença abordou as questões pertinentes de fato e de direito com argumentos jurídicos suficientes, e a observância dos procedimentos administrativos para cancelamento do benefício é implícita e obrigatória ao INSS, não configurando omissão.
4. O recurso da parte autora foi desprovido, pois a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial para quem permanece em atividade nociva é constitucional, conforme o Tema 709 do STF, que modulou os efeitos para preservar direitos reconhecidos por decisão judicial transitada em julgado até 23/02/2021.5. A ausência de trânsito em julgado não impede a aplicação dos precedentes do STF, e a implantação do benefício, seja administrativa ou judicial, implica a cessação do pagamento caso o segurado continue ou retorne ao labor nocivo.6. O segurado tem direito a receber as parcelas vencidas desde a DER, mesmo continuando no labor especial até a implantação, sem prejuízo retroativo em caso de antecipação de tutela, e poderá optar pelo benefício mais vantajoso na fase de cumprimento.7. O recurso do INSS foi desprovido, mantendo-se o reconhecimento da especialidade do trabalho pela exposição a ruído acima dos limites legais (Decreto nº 53.831/1964, Decreto nº 2.172/1997, Decreto nº 4.882/2003) e umidade excessiva de fontes artificiais (Decreto nº 53.831/1964, cód. 1.3), configurando associação de agentes nocivos (Decreto nº 2.172/1997, cód. 4.0.0).8. A utilização de EPIs é irrelevante para neutralizar o ruído excessivo, conforme o STF no ARE 664.335, e a ausência de contribuição adicional não impede o reconhecimento da atividade especial, pois o direito previdenciário se baseia na realidade laboral, não na formalização fiscal, não violando o art. 195, § 5º, da CF/1988.
9. Apelação da parte autora e apelação do INSS desprovidas.
Tese de julgamento: 10. É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, sendo que a implantação do benefício, seja administrativa ou judicial, cessará o pagamento uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, ressalvados os direitos reconhecidos por decisão judicial transitada em julgado até 23/02/2021. O reconhecimento da especialidade do trabalho por exposição a ruído e umidade excessiva é válido, independentemente da ausência de contribuição adicional, pois o direito previdenciário se baseia na realidade laboral.
___________
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 195, § 5º; CPC, arts. 487, inc. I, 489, inc. II, 1.022, 1.025; Lei nº 8.213/1991, arts. 46, 57, § 3º, § 8º, 58, § 2º, 124; Lei nº 9.732/1998; Lei nº 9.784/1999, arts. 2º, 28; Lei nº 11.430/2006; Decreto nº 53.831/1964, cód. 1.1.3, 1.1.6, 1.3; Decreto nº 83.080/1979; Decreto nº 2.172/1997, cód. 2.0.1, 4.0.0; Decreto nº 3.048/1999; Decreto nº 4.882/2003; Emenda Constitucional nº 113/2021, art. 3º.
Jurisprudência relevante citada: STF, RE 791961 (Tema 709), j. 05.06.2020, ED j. 23.02.2021; STF, ARE 664335, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 04.12.2014; STJ, REsp n° 1398260/PR (Tema 694); STJ, REsp 1886795/RS (Tema 1083); TFR, Súmula 198; TRF4, Apelação Cível nº 5002566-38.2018.4.04.7118, Rel. Juiz Federal Convocado Herlon Schveitzer Tristão, j. 18.12.2024.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Central Digital de Auxílio 1 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora e à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 27 de outubro de 2025.
Documento eletrônico assinado por ANA RAQUEL PINTO DE LIMA, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005406134v4 e do código CRC 7a53275e.
Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): ANA RAQUEL PINTO DE LIMAData e Hora: 29/10/2025, às 14:48:23
Conferência de autenticidade emitida em 05/11/2025 04:10:14.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 20/10/2025 A 27/10/2025
Apelação Cível Nº 5054287-49.2019.4.04.7100/RS
RELATORA Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
PRESIDENTE Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 20/10/2025, às 00:00, a 27/10/2025, às 16:00, na sequência 120, disponibilizada no DE de 09/10/2025.
Certifico que a Central Digital de Auxílio 1, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A CENTRAL DIGITAL DE AUXÍLIO 1 DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E À APELAÇÃO DO INSS.
RELATORA DO ACÓRDÃO Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
Votante Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
Votante Juíza Federal ALINE LAZZARON
Votante Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
MÁRCIA CRISTINA ABBUD
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 05/11/2025 04:10:14.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas