
Apelação Cível Nº 5001187-07.2024.4.04.7133/RS
RELATOR Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
RELATÓRIO
Da sentença que julgou improcedente o pedido para concessão de amparo assistencial ao deficiente, por ausência de impedimento de longo prazo (), apelou Claudionor Silva D'Avila.
Argumentou que a sentença merece reforma, pois é portador de moléstia que o impede de prover o seu próprio sustento e de sua família. Afirmou que a renda familiar não ultrapassa o mínimo legal. Disse que a deficiência visual pode ser constada pelos laudos médicos acostados aos autos ().
Com contrarrazões (), subiram os autos.
VOTO
Benefício Assistencial ao Idoso ou Portador de Deficiência
Trata-se de demanda previdenciária na qual a parte autora objetiva a concessão de benefício assistencial previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelo artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pelas Leis nº 12.435, de 06 de julho de 2011, e nº 12.470, de 31 de agosto de 2011.
O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.
Saliente-se, por oportuno, que a incapacidade para a vida independente a que se refere a Lei nº 8.742/93, na redação original, deve ser interpretada de forma a garantir o benefício assistencial a uma maior gama possível de pessoas com deficiência, consoante pacífica jurisprudência do STJ (v.g.STJ, 5ª Turma, RESP 360.202/AL, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 01 de julho de 2002) e desta Corte (v.g. AC n. 2002.71.04.000395-5/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJU de 19 de abril de 2006).
Desse modo, a incapacidade para a vida independente (a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou seja incapaz de se locomover; (b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene pessoal e vestir-se sozinho; (c) não impõe a incapacidade de se expressar ou se comunicar; e (d) não pressupõe dependência total de terceiros.
No que diz respeito ao requisito econômico, cabe ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça admitiu, em sede de recurso repetitivo, a possibilidade de demonstração da condição de miserabilidade por outros meios de prova, quando a renda per capita familiar for superior a ¼ do salário mínimo (REsp 1112557/MG, 3ª Seção, rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 20 de novembro de 2009). Posteriormente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em 18 de abril de 2013, a reclamação nº 4374 e o recurso extraordinário nº 567985, este com repercussão geral, reconheceu e declarou a inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 (LOAS), por considerar que o critério ali previsto - ser a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - está defasado para caracterizar a situação de miserabilidade.
Assim, forçoso reconhecer que as despesas com os cuidados necessários da parte autora, especialmente medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico, podem ser levadas em consideração na análise da condição de miserabilidade da família da parte demandante.
Portanto, o direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: (1) requisito etário - ser idoso (assim considerado aquele com 65 anos ou mais, a partir de 1º de janeiro de 2004, data da entrada em vigor do Estatuto do Idoso) ou apresentar condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente); e (2) situação de risco social (ausência de meios para, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família).
No que diz respeito ao requisito etário, em se tratando de benefício requerido na vigência do Estatuto do Idoso, é considerada idosa a pessoa com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. O requisito é objetivo, ou seja, comprovado o atributo etário, a análise da condição incapacitante é desnecessária, bastando apenas verificar a situação de vulnerabilidade socioeconômica a que submetido o idoso.
Quanto à condição de deficiente, deve ficar comprovada a incapacidade para a vida independente, conforme disposto no artigo 20, da Lei 8.742/93, em sua redação original, esclarecendo que este Tribunal consolidou entendimento segundo o qual a interpretação que melhor se coaduna ao princípio da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III) é a que garante o benefício assistencial a maior gama possível de pessoas portadoras de deficiência. Cumpre ao julgador, portanto, ao analisar o caso concreto, observar que a incapacidade para a vida independente (a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou que seja incapaz de locomover-se; (b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene e vestir-se sozinho; (c) não impõe a incapacidade de expressar-se ou de comunicar-se; e (d) não pressupõe dependência total de terceiros (TRF4, EINF 0016689-58.2014.404.9999, Terceira Seção, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 29 de maio de 2015).
A situação de risco social, por sua vez, deve ser analisada inicialmente sob o ângulo da renda per capita do núcleo familar, que deverá ser inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo. Registro, no ponto, que o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no bojo do Tema 185 esclarecendo que a limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, de modo a se presumir absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo (REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009).
Posteriormente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar a Reclamação n. 4374 e o Recurso Extraordinário n. 567985 (este com repercussão geral), estabeleceu que o critério legal de renda familiar per capita inferior a um quarto do salário mínimo encontra-se defasado para caracterizar a situação de miserabilidade, não se configurando, portanto, como a única forma de aferir a incapacidade da pessoa para prover sua própria manutenção ou tê-la provida por sua família.
Na mesma oportunidade, o Plenário do STF, ao julgar o Recurso Extraordinário 580.963/PR, também declarou a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família não será computado para fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS, com base nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da isonomia, bem como no caráter de essencialidade de que se revestem os benefícios de valor mínimo, tanto previdenciários quanto assistenciais, concedidos a pessoas idosas e também àquelas portadoras de deficiência. De acordo com o STF, portanto, não se justifica que, para fins do cálculo da renda familiar per capita, haja previsão de exclusão apenas do valor referente ao recebimento de benefício assistencial por membro idoso da família, quando verbas de outra natureza (benefício previdenciário), bem como outros beneficiários de tais verbas (membro da família portador de deficiência), também deveriam ser contemplados.
Mais recentemente, a Primeira Seção do STJ, com fundamento nos princípios da igualdade e da razoabilidade, firmou entendimento segundo o qual, também nos pedidos de benefício assistencial feitos por pessoas portadoras de deficiência, deve ser excluído do cálculo da renda familiar per capita qualquer benefício, no valor de um salário mínimo, recebido por maior de 65 anos, independentemente se assistencial ou previdenciário, aplicando-se, analogicamente, o disposto no parágrafo único, do art. 34, do Estatuto do Idoso. Confira-se:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA. AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA. IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO. 1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do benefício de prestação mensal continuada a pessoa deficiente. 2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93. 3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código de Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008.(REsp 1355052/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/02/2015, DJe 05/11/2015).
Assim, em regra, integram o cálculo da renda familiar per capita os rendimentos auferidos pelo cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto (art. 20, § 1º, da Lei n.º 8.742/93, com a redação dada pela Lei n.º 12.435/2011).
Devem ser excluídos do cálculo, todavia, o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima (TRF4, EINF 5003869-31.2010.404.7001, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Roger Raupp Rios, juntado aos autos em 10 de fevereiro de 2014), bem como o valor auferido a título de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade (TRF4, APELREEX 2006.71.14.002159-6, Sexta Turma, Relatora Vânia Hack de Almeida, D.E. 10 de setembro de 2015), ressaltando-se que tal beneficiário, em decorrência da exclusão de sua renda, também não será considerado na composição familiar, para efeito do cálculo da renda.
Demais disso, os cuidados necessários com a parte autora, em decorrência de sua deficiência, incapacidade ou avançada idade, que acarretarem gastos - notadamente com medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico, entre outros -, configuram despesas a ser consideradas na análise da condição de risco social da família do demandante (TRF4, APELREEX 5002022-24.2011.404.7012, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, juntado aos autos em 27 de junho de 2013).
Em relação à percepção do benefício instituído pelo Programa Bolsa Família, não só não impede o recebimento do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui forte indicativo de que a unidade familiar encontra-se em situação de risco social (TRF4, APELREEX 2009.71.99.006237-1, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 07 de outubro de 2014).
Concluindo, em linhas gerais, para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, a situação de risco social a que se encontra exposta a pessoa idosa ou portadora de deficiência e sua família deve ser analisada em cada caso concreto (TRF4, EINF 0016689-58.2014.404.9999, Terceira Seção, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 29 de maio de 2015).
Mérito da causa
De acordo com as informações extraídas do laudo pericial judicial, datado de 13/12/2024 (), o autor foi diagnosticado com as seguintes patologias:
Diagnóstico/CID:
- M75.1 - Síndrome do manguito rotador
- M19 - Outras artroses
- M75.5 - Bursite do ombro
- M77 - Outras entesopatias
- H54.7 - Perda não especificada da visão
Após avaliação física e análise da documentação médica complementar acostada aos autos, o expert concluiu que tais patologias não configuram deficiência e não acarretam impedimento de longo prazo, assim consignando a sua conclusão:
Conclusão: sem incapacidade atual
- Justificativa: Conforme avaliação pericial atual fora concluído que mesmo o(a) autor(a) possuindo as patologias descritas acima, não apresenta impedimentos de longo prazo, pois não há alterações nesse sentido ao exame físico/mental atual que cheguem a impedir o exercício de suas atividades habituais, nesse momento ou em período anterior, quando afastado(a) destas, mas sem receber o benefício pretendido. Não comprova alterações que possam obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas em longo prazo. Realiza tratamento medicamentoso. Possui limitações, mas não impedimentos em longo prazo. Dessa forma, conforme quadro clínico atual, idade e grau de instrução do(a) autor(a), não será sugerido seu afastamento das atividades habituais, pois não comprova impedimentos de longo prazo.
- Houve incapacidade pretérita em período(s) além daquele(s) em que o(a) examinado(a) já esteve em gozo de benefício previdenciário? NÃO
- Caso não haja incapacidade atual, o(a) examinado(a) apresenta sequela consolidada decorrente de acidente de qualquer natureza? NÃO
Ao responder aos quesitos formulados pelas partes, complementou o perito:
Quesitos da parte autora:
1- Considerando o conjunto das patologias acometidas no Autor, é possível afirmar que o Periciando se encontra incapaz para exercer alguma atividade laboral?
Não há comprovação de impedimentos em longo prazo. Quesito já abordado pelo laudo eletrônico.
(...)
Quesitos do INSS:
1. Dentro do domínio sensorial (ver e ouvir), como se pontua o periciado?( ) 25 pontos (totalmente dependente)( ) 50 pontos (realiza com auxílio de terceiros)( ) 75 pontos (realiza de forma adaptada)( X ) 100 pontos (realiza de forma independente)2. Dentro do domínio comunicação (produção e recepção de mensagens, conversar, discutir e utilizar dispositivos de comunicação à distância), como se pontua o periciado?( ) 25 pontos (totalmente dependente)( ) 50 pontos (realiza com auxílio de terceiros)( ) 75 pontos (realiza de forma adaptada)( X ) 100 pontos (realiza de forma independente)3. Dentro do domínio mobilidade (mudar e manter a posição do corpo; alcançar e mover objetos; movimentos finos da mão; deslocar-se dentro e fora de casa; utilizar transporte coletivo e individual), como se pontua o periciado?( ) 25 pontos (totalmente dependente)( ) 50 pontos (realiza com auxílio de terceiros)( ) 75 pontos (realiza de forma adaptada)( X ) 100 pontos (realiza de forma independente)4. Dentro do domínio cuidados pessoais (lavar-se; cuidar das partes do corpo; ir ao banheiro; vestir-se; comer; beber; e capacidade de identificar agravos à saúde), como se pontua o periciado?( ) 25 pontos (totalmente dependente)( ) 50 pontos (realiza com auxílio de terceiros)( ) 75 pontos (realiza de forma adaptada)( X ) 100 pontos (realiza de forma independente)5. Dentro do domínio vida doméstica (preparar lanches; cozinhar; realizar tarefas domésticas; manusear utensílios da casa; e cuidar dos outros), como se pontua o periciado?( ) 25 pontos (totalmente dependente)( ) 50 pontos (realiza com auxílio de terceiros)( ) 75 pontos (realiza de forma adaptada)( X ) 100 pontos (realiza de forma independente)6. Dentro do domínio educação, trabalho e vida econômica (educação; qualificação profissional; trabalho remunerado; fazer compras e contratar serviços; e administração de recursos econômicos pessoais), como se pontua o periciado?( ) 25 pontos (totalmente dependente)( ) 50 pontos (realiza com auxílio de terceiros)( ) 75 pontos (realiza de forma adaptada)( X ) 100 pontos (realiza de forma independente)7. Dentro do domínio socialização e vida comunitária (ver e ouvir), como se pontua o periciado?( ) 25 pontos (totalmente dependente)( ) 50 pontos (realiza com auxílio de terceiros)( ) 75 pontos (realiza de forma adaptada)( X ) 100 pontos (realiza de forma independente)8. As eventuais dificuldades do periciado provocam impactos em prazo superior a 2 anos (a partir do início do impedimento até a data estimada de recuperação se houver)?( ) Sim( X ) Não- Resultado:- RESPOSTA “NÃO” AO QUESITO 8 afasta a qualidade de PcD- RESPOSTA “SIM” AO QUESITO, deve ser analisada com o somatório dos pontos:Se menor que 490 pontos: deficiência graveSe maior ou igual a 490 e menor do que 560: deficiência moderadaSe maior ou igual a 560 e menor do que 630: deficiência leveSe maior ou igual a 630: não se enquadra como PcD9. O Sr. Perito Médico concorda com o resultado:( X ) Sim( ) Não – Justifique:
Assim, havendo o laudo médico oficial concluído pela inexistência de deficiência ou impedimento de longo prazo, e inexistindo prova substancial em contrário, não há direito ao benefício pleiteado. Desse modo, a prova produzida pelo demandante se mostra insuficiente para infirmar o laudo médico judicial apresentado.
Destaque-se que o perito judicial detém o conhecimento científico necessário ao exame da parte, ficando ao seu cargo a análise dos exames laboratoriais ou físicos para exarar o seu diagnóstico. A desconsideração do laudo pericial somente se justificaria com base em robusto contexto probatório, constituído por exames que sejam seguramente indicativos da incapacidade para o exercício de atividade laborativa e que coloque, efetivamente, em dúvida a conclusão do expert do juízo.
Embora o julgador não esteja adstrito à perícia judicial, é inquestionável que, tratando-se de controvérsia cuja solução dependa de prova técnica, o juiz só poderá recusar a conclusão do laudo se houver motivo relevante, uma vez que o perito judicial se encontra em posição equidistante das partes, mostrando-se imparcial e com mais credibilidade. Dessa forma, a prova em sentido contrário ao laudo judicial, para prevalecer, deve ser suficientemente robusta e convincente, o que não ocorreu no presente caso.
A deficiência que constitui requisito para a concessão de benefício assistencial não representa qualquer restrição episódica ao exercício de atividade por limitações de pouca duração.
O art. 20, §2º, da Lei nº 8.742, expressamente estabelece:
Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Assim, não se pode equiparar a situação do autor com a de pessoas que efetivamente não possuem a menor capacidade de exercer atividade profissional, em razão de doença física ou psíquica.
O mesmo dispositivo legal, em parágrafo posterior, define inclusive que, para ter direito ao benefício, a pessoa deva ser portadora de deficiência que tenha decisiva influência prejudicial em prazo mínimo de tempo:
§10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2o deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
Por uma e outra razão legal, reitera-se aqui que a autora não tem direito ao benefício assistencial: não é portadora de deficiência e, se equivocadamente fosse assim considerada, essa deficiência não é originária de impedimento de longo prazo.
Além disso, não há documentos médicos que comprovem a alegada severidade de sua condição, o que é imprescindível ao reconhecimento do pedido. Nessa linha de entendimento, vem decidindo o Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA (LOAS). IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO NÃO CONFIGURADO. HONORÁRIOS MAJORADOS. 1. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, consoante a redação original do art. 20, da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, consoante a redação atual do referido dispositivo) ou idoso (assim considerado aquele com 65 anos ou mais, a partir de 1º de janeiro de 2004, data da entrada em vigor da Lei nº 10.741 - Estatuto do Idoso) e situação de risco social (ausência de meios para a parte autora, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família). 2. Diante da ausência de prova em relação à condição de deficiente que acarreta impedimento de longo prazo, não é devido o benefício. 3. Honorários majorados para o fim de adequação ao que está disposto no art. 85, §11, do Código de Processo Civil. (TRF4, AC 5000012-76.2025.4.04.9999, 5ª Turma, Relator para Acórdão OSNI CARDOSO FILHO, julgado em 25/02/2025)
Em resumo, as patologias identificadas não constituem deficiência e, mais ainda, não geram impedimento de longo prazo que inabilite a autora de promover atividade que lhe garanta seu próprio sustento em igualdade de condições com outras pessoas.
Assim, apontando o contexto probatório para a ausência de condição de deficiente que acarrete o impedimento de longo prazo, fica prejudicada a apreciação do exame do requisito sócio-econômico.
Honorários advocatícios
Desprovido o recurso interposto pela parte autora da sentença de improcedência do pedido, devem os honorários de advogado ser majorados, com o fim de remunerar o trabalho adicional do procurador da parte em segundo grau de jurisdição.
Consideradas as disposições do art. 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil (CPC), majora-se em relação ao valor arbitrado mais 20% para apuração do montante da verba honorária, mantendo-se a inexigibilidade da verba em face da concessão da gratuidade da justiça.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto por negar provimento à apelação, majorando, de ofício, os honorários advocatícios.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005339029v6 e do código CRC 93caa8ca.
Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHOData e Hora: 03/11/2025, às 17:23:20
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Apelação Cível Nº 5001187-07.2024.4.04.7133/RS
RELATOR Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA (LOAS). CONDIÇÃO DE DEFICIENTE. IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO NÃO CONFIGURADO. HONORÁRIOS MAJORADOS.
1. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, consoante a redação original do art. 20, da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, consoante a redação atual do referido dispositivo) ou idoso (assim considerado aquele com 65 anos ou mais, a partir de 1º de janeiro de 2004, data da entrada em vigor da Lei nº 10.741 - Estatuto do Idoso) e situação de risco social (ausência de meios para a parte autora, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família).
2. Diante da ausência de prova em relação à condição de deficiente que acarreta impedimento de longo prazo, não é devido o benefício.
3. Honorários majorados para o fim de adequação ao que está disposto no art. 85, §11, do Código de Processo Civil.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, majorando, de ofício, os honorários advocatícios, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de outubro de 2025.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005339030v3 e do código CRC ea6695da.
Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHOData e Hora: 03/11/2025, às 17:23:20
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 17/10/2025 A 24/10/2025
Apelação Cível Nº 5001187-07.2024.4.04.7133/RS
RELATOR Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PRESIDENTE Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
PROCURADOR(A) VITOR HUGO GOMES DA CUNHA
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 17/10/2025, às 00:00, a 24/10/2025, às 16:00, na sequência 614, disponibilizada no DE de 08/10/2025.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, MAJORANDO, DE OFÍCIO, OS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
RELATOR DO ACÓRDÃO Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
Votante Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
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Identificações de pessoas físicas foram ocultadas