APELAÇÃO CÍVEL Nº 5004876-81.2017.4.04.7108/RS
RELATOR | : | LUIZ CARLOS CANALLI |
APELANTE | : | ALEX SANDRO FERREIRA |
ADVOGADO | : | VAGNER STOFFELS CLAUDINO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA / APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PORTADOR DE DEFICIÊNCIA. HIV. INCAPACIDADE. PERÍCIA SÓCIO-ECONÔMICA. SENTENÇA. ANULAÇÃO.
1. Há direito a benefício por incapacidade para pessoa vivendo com HIV, assintomática para AIDS, se o preconceito e a discriminação, associados a outros fatores, impedirem ou reduzirem o exercício de atividade laboral remunerada, como também ao benefício de prestação continuada, se este conjunto de fatores obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de oportunidades. A sorologia para o HIV, por si só, não afasta a avaliação sobre a capacidade, sendo necessário perquirir as possibilidades de inserção laboral da autora aliadas ao estigma associado à doença.
2. Hipótese em que se determina a cassação da sentença e a reabertura da instrução para a realização de perícia sócio-econômica para a aferição das condições econômicas e sociais e eventual hipossuficiência do núcleo familiar.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, anular a sentença determinando a reabertura da instrução probatória, prejudicada a apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 17 de abril de 2018.
Desembargador Federal LUIZ CARLOS CANALLI
Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5004876-81.2017.4.04.7108/RS
RELATOR | : | LUIZ CARLOS CANALLI |
APELANTE | : | ALEX SANDRO FERREIRA |
ADVOGADO | : | VAGNER STOFFELS CLAUDINO |
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RELATÓRIO
Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte autora em face de sentença proferida em 31/07/2017, cuja parte dispositiva tem o seguinte teor:
III - Dispositivo
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos, resolvendo o mérito da demanda, na forma do art. 487, inc. I, do CPC/2015.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários periciais e advocatícios sucumbenciais, estes fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 4º, inc. III, do CPC/2015, cuja exigibilidade, porém, resta suspensa diante da concessão da AJG.
Deixo de submeter esta sentença à remessa necessária, dada a inocorrência de condenação pecuniária do INSS (CPC/2015, art.496, inciso I; REsp 101.727/PR).
Apela a parte autora, requerendo a anulação da decisão recorrida, baixando os autos para realização de nova perícia médica com especialista em infectologia e hepatologia.
Não foram apresentadas contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
A partir das conclusões do laudo médico pericial, a sentença analisou as questões controvertidas da seguinte forma:
(b) Caso Concreto
Examinando a prova existente, verifico que a parte autora possuía na DER (07/08/2015) apenas 09 contribuições, recolhidas logo antes, entre 11/2014 e 07/2015 (evento 10, RESPOSTA1), pelo que, ordinariamente, não cumpriria o requisito da carência.
Em relação ao quadro clínico, o médico perito fez as seguintes ponderações:
Não há, portanto, incapacidade atual que justifique a concessão de benefício.
Em relação ao período de incapacidade pretérita, meados de 2013, como referiu o médico, o demandante não satisfazia os requisitos de carência e de qualidade de segurado, posto que iniciou suas contribuições apenas no ano seguinte (2014).
Ainda que se acolha o exame pericial da autarquia, que atestou a existência de incapacidade laborativa contínua, desde 2013 (evento 10, RESPOSTA1, p. 5), novamente se esbarraria no não preenchimento dos requisitos da qualidade de segurado e da carência. Nesse ponto, aliás, ratifico a decisão que indeferiu a prova técnica com médico especialista (evento 43), uma vez que, mesmo que viesse a ser apontada a existência de incapacidade, o demandante não preencheria os demais requisitos de ordem contributiva - carência ou doença pré-existente ao ingresso no RGPS -, que inviabilizariam a concessão do benefício pleiteado.
No caso concreto o autor, atualmente com 40 anos de idade, reciclador de latas pets, com ensino fundamental incompleto, residente na cidade de Rolante/RS, solicita benefício previdenciário por se encontrar acometido de moléstias que o incapacitam para a atividade laboral.
Cumpre observar que o laudo médico e demais documentos juntados aos autos informam que a parte autora, dentre outras patologias, apresenta o CID CID10-B24 - Doença pelo vírus da imunodeficiência humana, HIV, a demandar a avaliação do contexto social, econômico e cultural em que vive, incumbindo ao julgador verificá-las de forma a analisar a deficiência/incapacidade em sentido amplo, em face da elevada estigmatização social da doença.
Diversa não é a orientação do Egrégio STJ e da Terceira Seção desta Corte nos pedidos de benefício de prestação continuada:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA.ART. 20, § 2º DA LEI 8.742/93. PORTADOR DO VÍRUS hiv. INCAPACIDADE PARA O TRABALHO E PARA PROVER O PRÓPRIO SUSTENTO OU DE TÊ-LO PROVIDO PELA FAMÍLIA. LAUDO PERICIAL QUE ATESTA A CAPACIDADE PARA A VIDA INDEPENDENTE BASEADO APENAS NAS ATIVIDADES ROTINEIRAS DO SER HUMANO. IMPROPRIEDADE DO ÓBICE À PERCEPÇÃO DO BENEFÍCIO. RECURSO DESPROVIDO.
I - A pessoa portadora do vírus hiv, que necessita de cuidados frequentes de médico e psicólogo e que se encontra incapacitada, tanto para o trabalho, quanto de prover o seu próprio sustento ou de tê-lo provido por sua família - tem direito à percepção do benefício de prestação continuada previsto no art. 20 da Lei 8.742/93, ainda que haja laudo médico-pericial atestando a capacidade para a vida independente.
II - O laudo pericial que atesta a incapacidade para a vida laboral e a capacidade para a vida independente, pelo simples fato da pessoa não necessitar da ajuda de outros para se alimentar, fazer sua higiene ou se vestir, não pode obstar a percepção do benefício, pois, se esta fosse a conceituação de vida independente, o benefício de prestação continuada só seria devido aos portadores de deficiência tal, que suprimisse a capacidade de locomoção do indivíduo - o que não parece ser o intuito do legislador.
III - Recurso desprovido.
(REsp 360.202/AL, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 04/06/2002, DJ 01/07/2002, p. 377)
ASSISTÊNCIA SOCIAL. EMBARGOS INFRINGENTES. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEI 8.742/93 (LOAS). REQUISITO DEFICIÊNCIA INCAPACITANTE. PORTADOR DO hiv. 1. A Constituição Federal exige apenas dois requisitos no tocante ao benefício assistencial de que trata o art. 203, V: (a) possuir o requerente deficiência incapacitante para a vida independente ou ser idoso, e (b) encontrar-se a família do requerente em situação de miserabilidade. 2. Ainda que a perícia tenha concluído pela capacidade do segurado para o exercício de atividades laborativas, possível a concessão do benefício de prestação continuada no caso do portador do vírus da SIDA, considerando-se o contexto social e a extrema dificuldade para recolocação no mercado de trabalho, em virtude do notório preconceito sofrido. (TRF4, EINF 5017492-88.2012.404.7100, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, juntado aos autos em 28/05/2015)
Em casos como os da espécie, a partir do exame das circunstâncias concretas postas em análise, tem-se reconhecido a inviabilidade de se exigir que uma pessoa portadora retorne e/ou continue a exercer atividades laborativas em face da extrema dificuldade de inserção no mercado de trabalho em virtude do preconceito sofrido, o que prejudica, inclusive, a vida social do portador da síndrome em razão de todo o contexto envolvendo a doença e o modo como seu portador é visto pela sociedade.
Cabe referir que a mera alegação de que os portadores da doença sofrem discriminação não autoriza concluir pela incapacidade da parte para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
Na hipótese dos autos, a perícia médica atesta estar-se diante de portador sadio do vírus hiv. Todavia, faltam alguns elementos aos autos, haja vista que a sintomatologia, por si, só, não se mostra como critério suficiente para a concessão/indeferimento de benefício.
Nessa perspectiva em que se verifica a carência de elementos, como o laudo social, que atestem circunstância que, eventualmente, possa conduzir a conclusão pela incapacidade laboral da parte autora, há que ser reaberta a instrução para a realização de perícia sócio-econômica requerida pelo ora recorrente, para que se proceda à adequada avaliação das condições pessoais e sociais.
Em consequência, prejudicado o exame do objeto da apelação.
Ante o exposto, voto por, de ofício, anular a sentença e, por isso, declarar prejudicada a apelação.
Desembargador Federal LUIZ CARLOS CANALLI
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 17/04/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5004876-81.2017.4.04.7108/RS
ORIGEM: RS 50048768120174047108
RELATOR | : | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI |
PRESIDENTE | : | Luiz Carlos Canalli |
PROCURADOR | : | Dr. Waldir Alves |
APELANTE | : | ALEX SANDRO FERREIRA |
ADVOGADO | : | VAGNER STOFFELS CLAUDINO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 17/04/2018, na seqüência 236, disponibilizada no DE de 02/04/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DE OFÍCIO, ANULAR A SENTENÇA E, POR ISSO, DECLARAR PREJUDICADA A APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI |
: | Juíza Federal ANA PAULA DE BORTOLI | |
: | Juíza Federal GISELE LEMKE |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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