
Apelação Cível Nº 5027530-51.2019.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: LEANDRO DE SOUZA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Leandro de Souza interpôs apelação em face de sentença que julgou improcedente o pedido para concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, condenando-o ao pagamento das custas e honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa. A exigibilidade de ambas as verbas restou suspensa por ser beneficiário da assistência judiciária gratuita (Evento 3 - SENT20).
Sustentou que possui epilepsia, motivo pelo qual não tem aptidão para trabalhar na agricultura, conforme comprovam os documentos anexados aos autos. Afirmou que é necessária a realização de perícia com especialista em neurologia (Evento 3 - APELAÇÃO21).
Sem contrarrazões, subiram os autos.
VOTO
Benefício por incapacidade
O art. 59 da Lei n.º 8.213/91 estabelece que o auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido na referida lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
Por sua vez, o art. 42 da Lei nº 8.213/91 estabelece que a aposentadoria por invalidez será concedida ao segurado que, tendo cumprido, quando for o caso, a carência exigida, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
A Lei nº 8.213/91 estabelece que, para a concessão dos benefícios em questão, deve ser cumprida a carência correspondente a 12 (doze) contribuições mensais (art. 25), que é dispensada nos casos legalmente previstos (art. 26, II, da Lei nº 8.213/91).
O fato de a incapacidade temporária ser total ou parcial para fins de concessão do auxílio-doença não interfere na concessão desse benefício, uma vez que, por incapacidade parcial, deve-se entender aquela que prejudica o desenvolvimento de alguma das atividades laborativas habituais do segurado. No mesmo sentido, assim já decidiu o e. STJ, verbis:
RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE PARCIAL PARA O TRABALHO HABITUAL. 1. É devido o auxílio-doença ao segurado considerado parcialmente incapaz para o trabalho, mas suscetível de reabilitação profissional para o exercício de outras atividades laborais. 2. Recurso improvido. (STJ, REsp 501267 / SP, rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, T6 - SEXTA TURMA, DJ 28/06/2004 p. 427)
Por fim, a diferença entre os dois benefícios restou esclarecida consoante excerto doutrinário abaixo colacionado, verbis:
"A diferença, comparativamente à aposentadoria por invalidez, repousa na circunstância de que para a obtenção de auxílio-doença basta a incapacidade para o trabalho ou atividade habitual do segurado, enquanto para a aposentadoria por invalidez exige-se a incapacidade total, para qualquer atividade que garanta a subsistência. Tanto é assim que, exercendo o segurado mais de uma atividade e ficando incapacitado para apenas uma delas, o auxílio-doença será concedido em relação à atividade para a qual o segurado estiver incapacitado, considerando-se para efeito de carência somente as contribuições relativas a essa atividade (RPS, art. 71, § 1º) (in ROCHA, Daniel Machado da. BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. 15. ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Atlas, 2017)
De modo geral, o acesso aos benefícios previdenciários de aposentadoria por invalidez e de auxílio-doença pressupõe a presença de 3 requisitos: (1) qualidade de segurado ao tempo de início da incapacidade, (2) carência de 12 contribuições mensais, salvo as hipóteses previstas no art. 26, II, da Lei nº 8.213/91, que dispensam o prazo de carência, e (3) requisito específico, relacionado à existência de incapacidade impeditiva para o labor habitual em momento posterior ao ingresso no RGPS, aceitando-se, contudo, a derivada de doença anterior, desde que agravada após o ingresso no RGPS, nos termos do art. 42, § 2º, e art. 59, parágrafo único, ambos da Lei nº 8.213/91.
Caso concreto
Conforme consta do laudo pericial (Evento 3 - LAUDO16), o autor, nascido em 03 de março de 1985, é agricultor, portador de Epilepsia G 40, mas não está incapacitado para as atividades na agricultura. Assim concluiu o perito, médico especialista em psiquiatria:
3. Está a parte autora incapacitada para o labor? Desde quando? Em caso de cessação de benefício por incapacidade, o Perito pode afirmar que a incapacidade existia e se manteve desde a cessação pelo INSS?
Resposta: Incapacitado apenas para trabalho em situações tias como altura, eletricidade.
4. A incapacidade laboral apresentada é total ou parcial? Definitiva ou temporária? Resposta: Não foi verificada incapacidade para a realização de suas atividades como agricultor.
5. Há possibilidade de recuperação da capacidade laborativa da parte autora para o exercício de suas atividades profissionais habituais? Em caso positivo, como poderá ocorrer esta recuperação?
Resposta: Sim. Com medicação.
Analisando a prova dos autos no cotejo com o laudo apresentado pelo perito, percebe-se que há necessidade de realização de novo exame, nesta oportunidade por médico especialista em neurologia, por se tratar de hipótese que envolve quadro de epilepsia, doença que sabidamente tem vários graus de complexidade, atingindo a cada indivíduo de maneira peculiar, situação que somente poderá ser analisada por médico especialista no assunto.
Além disso, o laudo anexado aos autos, embora elaborado por psiquiatra, é insuficiente e não detalha circunstanciadamente a situação do autor, agricultor, diante das crises de epilepsia que diz apresentar, a intensidade das crises, a ocorrência delas e em que circunstâncias. Limitou-se o perito a dizer que há incapacidade para trabalho em altura e com eletricidade, nos termos da conclusão acima transcrita.
De igual modo, não há elementos outros descritos no laudo a fim de emprestar um juízo de certeza sobre o quadro incapacitante, sobre a medicação utilizada, seus efeitos colaterais ou sobre as atividades efetivamente desempenhadas pelo autor na agricultura. Ademais, a perícia administrativa constatou incapacidade para o trabalho habitual, fato que não foi analisado pelo perito.
O quadro mórbido, portanto, apresenta-se complexo, o que exige um exame acurado por parte do perito, devendo constar detalhadamente do laudo quais as medicações utilizadas para o alívio dos sintomas e a prevenção das crises, quais os efeitos colaterais porventura existentes e se tais efeitos influenciam, e em que grau, na capacidade de trabalho especificamente para a agricultura.
Assim, é fundamental que o perito neurologista esclareça se o quadro epilético que acomete o autor está sob controle ou não, e, de igual modo, se a medicação que ele ingere não causa efeitos colaterais que o impeçam de exercer suas atividades, levando em consideração a sua idade (hoje com 35 anos de idade) e condições físicas.
Deverá, portanto, ser realizada nova perícia, na qual o neurologista responda a todos os quesitos formulados pelas partes e pelo juízo, ficando atento ao tipo de atividade exercida (bem como aos riscos a ela inerentes), às condições pessoais do autor, esclarecendo também se o quadro neurológico poderá se agravar no decorrer dos anos, e as consequências que disso poderá advir na capacidade laborativa do autor. Os quesitos em relação a tal ponto deverão ser formulados pelo juízo, dentre todos os outros que entender necessários ao bom julgamento do feito.
Sendo assim, diante da necessidade de realização de outra perícia, desta vez por médico especialista em neurologia, anulo, de ofício, a sentença, determinando ao juízo a quo a reabertura da instrução processual, com a nomeação de perito neurologista para que diga se há incapacidade para o trabalho, atento aos questionamentos constantes no teor deste voto. No mesmo sentido, verbis:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ/AUXÍLIO-DOENÇA. LAUDO PERICIAL INSUFICIENTE. SENTENÇA ANULADA. 1. Quando a perícia judicial não cumpre os pressupostos mínimos de idoneidade da prova técnica, ela é produzida, na verdade, de maneira a furtar do magistrado o poder de decisão. 2. Hipótese em que foi anulada a sentença e reaberta a instrução para a realização de nova prova pericial por médico especialista. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0017026-76.2016.404.9999, Turma Regional suplementar de Santa Catarina, Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE, POR UNANIMIDADE, D.E. 27/09/2017, PUBLICAÇÃO EM 28/09/2017)
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. SENTENÇA ANULADA. REABERTURA PARA PRODUÇÃO DE NOVO LAUDO MÉDICO PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. Insuficiente a perícia médica, elemento essencial para a verificação da incapacidade da postulante ao benefício de prestação continuada, determinada a anulação da sentença, com a reabertura da instrução para que seja produzido novo laudo médico pericial, com levantamento detalhado da moléstia, a ser elaborado por médico especialista, bem como as demais provas que as partes entenderem pertinentes. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0019515-91.2013.404.9999, 5ª TURMA, Des. Federal ROGERIO FAVRETO, POR UNANIMIDADE, D.E. 28/01/2014, PUBLICAÇÃO EM 29/01/2014)
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto no sentido de dar provimento à apelação para anular a sentença, determinando o retorno à origem para reabertura da instrução processual, nos termos do voto.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001973621v3 e do código CRC c3df154b.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5027530-51.2019.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: LEANDRO DE SOUZA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO INSUFICIENTE. CASO CONCRETO. epilepsia. COMPLEXIDADE DA MOLÉSTIA. SENTENÇA ANULADA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL.
1. O laudo pericial não pode, diante de patologia de investigação complexa, como a epilepsia, apresentar conclusão. Exige-se, em contexto semelhante, respostas detalhadas do quadro clínico do segurado.
2. Constatada a necessidade de perícia por médico especialista em neurologia, deve ser anulada a sentença a fim de possibilitar a reabertura da instrução.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação para anular a sentença, determinando o retorno à origem para reabertura da instrução processual, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 22 de setembro de 2020.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001973622v4 e do código CRC 7550421e.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 14/09/2020 A 22/09/2020
Apelação Cível Nº 5027530-51.2019.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): JOÃO HELIOFAR DE JESUS VILLAR
APELANTE: LEANDRO DE SOUZA
ADVOGADO: DIOGO FIGUEIREDO DE OLIVEIRA (OAB RS059750)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 14/09/2020, às 00:00, a 22/09/2020, às 14:00, na sequência 9, disponibilizada no DE de 02/09/2020.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO PARA ANULAR A SENTENÇA, DETERMINANDO O RETORNO À ORIGEM PARA REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Votante: Juíza Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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