APELAÇÃO CÍVEL Nº 5011761-26.2017.4.04.7201/SC
RELATOR | : | CELSO KIPPER |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | DEISE KELLY DIAS DOS SANTOS |
ADVOGADO | : | CLAUDIA LETICIA SHIGEOKA |
: | ANDREIA REGINA BRUNNER |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE LABORAL. PORTADOR DO VÍRUS HIV.
1. Tratando-se de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, o Julgador firma sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial.
2. Considerando que o autor é portador do vírus HIV, associado ao estigma social da doença e à dificuldade de inserção no mercado de trabalho, é devido o benefício de aposentadoria por invalidez.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e readequar, de ofício, os critérios de correção monetária e juros moratórios, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 17 de maio de 2018.
Des. Federal CELSO KIPPER
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal CELSO KIPPER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9373415v14 e, se solicitado, do código CRC 684EC1EA. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5011761-26.2017.4.04.7201/SC
RELATOR | : | CELSO KIPPER |
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APELADO | : | DEISE KELLY DIAS DOS SANTOS |
ADVOGADO | : | CLAUDIA LETICIA SHIGEOKA |
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RELATÓRIO
Cuida-se de ação ordinária ajuizada por Deise Kelly Dias dos Santos em face do INSS, por meio da qual objetiva o restabelecimento de auxílio-doença e sua consequente conversão em aposentadoria por invalidez, bem como o pagamento de parcelas atrasadas, a contar da DCB (02-07-2016).
Contestado e instruído o feito, foi prolatada sentença de procedência da ação (evento 29, SENT1), para o fim de condenar o INSS a conceder à autora o benefício de aposentadoria por invalidez, com DIB em 02.07.2016 (dia seguinte à cessação do NB 31/535.516.531-8), restando, ainda, a autarquia previdenciária condenada ao pagamento dos valores devidos desde então, com correção monetária e juros na forma explicitada na fundamentação, bem como de honorários advocatícios, em valor a ser fixado na fase de liquidação.
Irresignado, recorre o INSS.
Em suas razões, o apelante sustenta não ser devida a concessão do benefício, porquanto a perícia judicial foi conclusiva ao constatar que a parte autora possui capacidade laborativa. Defende, em relação às pessoas com diagnóstico de Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS), o fato de o portador do vírus HIV poder eventualmente vir a sofrer discriminação social, por si só, não dá direito ao recebimento de benefício por incapacidade.
Oportunizadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Mérito
Qualidade de segurado e carência mínima
A qualidade de segurado e a carência mínima exigidas para a concessão do benefício não foram questionadas nos autos. Além disso, cabe ressaltar que a parte autora percebeu o benefício de auxílio-doença, no período de 29-12-2008 e 01-07-2016 (evento 11 - RESPOSTA1 - fl. 02). Tenho, assim, por incontroverso o preenchimento destes requisitos.
Incapacidade laboral
Resta, pois, averiguar a existência de incapacidade laboral que justifique a concessão dos benefícios postulados.
Tratando-se de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, o Julgador firma sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial.
No caso concreto, a parte autora possui 39 anos e trabalhou com serviços gerais. Foi realizada perícia médica judicial, por especialista em medicina legal e perícias médicas, em 17-10-2017 (evento 19 - LAUDO1). Respondendo aos quesitos formulados, o perito judicial manifestou-se no sentido de que, muito embora a autora seja portadora de HIV, não está incapacitada para o exercício de atividades laborativas.
Nessa linha, o expert esclareceu que a autora possui diagnóstico de artrose leve de quadris - M19, estado de infecção assintomática pelo vírus HIV - Z21 e sequela de fratura em bacia - T91. Todavia, concluiu no sentido de que a autora não apresenta incapacidade laborativa para a função informada. Reputo conveniente extrair do laudo o seguinte fragmento:
O fato de o indivíduo ser HIV positivo não o impede, só por essa circunstância, do exercício de QUALQUER função laboral. Seja no serviço privado, ou serviço público federal (conforme normativas acima), a solicitação rotineira e obrigatória de teste para detecção de HIV configura-se como prática discriminatória.
Destacou o expert que a requerente é soropositivo desde 2007 e que o quadro se mantém assintomático desde então.
Em relação à patologia em questão, ressalto que não se pode ignorar que a síndrome da imunodeficiência adquirida infelizmente é, ainda hoje, uma moléstia socialmente estigmatizante, gerando discriminação capaz de alijar o indivíduo do mercado de trabalho. Nesse sentido, trago os seguintes precedentes das Turmas que compõem a Seção Previdenciária desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE LABORATIVA COMPROVADA. HIV. MARCO INICIAL. ERRO MATERIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. TUTELA ESPECÍFICA. 1. Ainda que em oposição ao laudo pericial, concede-se o benefício por incapacidade ao portador de hiv, mesmo sem apresentar sintomas, quando sua recolocação no mercado de trabalho mostrar-se improvável, considerando-se as suas condições pessoais e o estigma social da doença, capaz de diminuir consideravelmente as suas chances de obter ou de manter um emprego formal. 2. Comprovado pelo conjunto probatório que a parte autora é portadora de enfermidade que a incapacita para o trabalho de forma total e definitiva, é de ser mantida a sentença que concedeu a aposentadoria por invalidez desde a data da cessação administrativa do auxílio-doença. 3. Correção, de ofício, de erro material da sentença quanto à data da cessação administrativa do auxílio-doença (marco inicial da aposentadoria). 4. Nas ações previdenciárias, os honorários advocatícios devem ser fixados no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas devidas até a data da sentença, em consonância com as Súmulas 76 desta Corte e 111 do STJ. 5. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). (TRF4, APELREEX 0003928-24.2016.404.9999, SEXTA TURMA, Relator para Acórdão JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, D.E. 02/12/2016, sem grifo no original)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ADICIONAL dO ART. 45 DA L 8.213/1991. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS. HONORÁRIOS. CUSTAS. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.1. Comprovadas a qualidade de segurado, o preenchimento da carência e a incapacidade permanente para o trabalho, é devida a aposentadoria por invalidez. 2. Embora a prova pericial conclua expressamente pela capacidade do segurado para o exercício do trabalho, concede-se aposentadoria por invalidez ao portador do vírus hiv. Precedentes da Terceira Seção deste Tribunal. 3. O adicional previsto no art. 45 da L 8.213/1991 somente é devido quando estiver comprovado que o segurado necessita do auxílio permanente de terceiros.4. Correção monetária desde cada vencimento pela TR. Juros de mora a contar da citação, de forma simples, conforme os índices aplicados à caderneta de poupança.5. Condenação do INSS ao pagamento de honorários fixados em dez por cento do valor das parcelas vencidas até a data do acórdão. Isenção de custas.6. Ordem para implantação do benefício. Precedente. (TRF4, AC 5069849-45.2012.404.7100, QUINTA TURMA, Relator MARCELO DE NARDI, juntado aos autos em 22/10/2015, sem grifo no original)
A necessidade de que seja considerado o estigma suportado pelo portador do vírus HIV e as particulares socioeconômicas pessoais do segurado para avaliação do direito ao recebimento do benefício de incapacidade é reconhecida pela jurisprudência da Terceira Seção deste Tribunal. A esse respeito, cito o seguinte precedente:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PORTADOR DO HIV. REQUISITOS. INCAPACIDADE. COMPROVAÇÃO. 1. Quatro são os requisitos para a concessão do benefício em tela: (a) a qualidade de segurado do requerente; (b) o cumprimento da carência de 12 contribuições mensais, (c) a superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de qualquer atividade que garanta a subsistência, (d) o caráter definitivo da incapacidade. 2. Ainda que a perícia tenha concluído pela incapacidade apenas temporária do segurado para o exercício de atividades laborativas, possível a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez no caso do portador do vírus da SIDA, considerando-se o contexto social e a extrema dificuldade para recolocação no mercado de trabalho, em virtude do notório preconceito sofrido. (TRF4, EINF 0011882-92.2014.404.9999, TERCEIRA SEÇÃO, Relatora MARIA ISABEL PEZZI KLEIN, D.E. 17/03/2015)
Ressalto, ainda, tal como consta da sentença, a circunstância de que a autora, após ter descoberto a doença, manteve apenas dois curtos vínculos empregatícios (de 01-04-2008 a 24-04-2008 e de 16-05-2008 a 12-2008), o que revela, de fato, que a sua condição de saúde interfere efetivamente na sua vida profissional.
Portanto, considerando o conjunto probatório e tendo em conta o contexto particular que envolve a doença da qual padece, entendo viável o reconhecimento de que a autora se encontra total e permanentemente incapacitada para o exercício de atividades laborativas, devendo, em consequência, ser-lhe concedido o benefício de aposentadoria por invalidez.
Nego, portanto, provimento ao apelo da autarquia previdenciária.
Correção monetária e juros moratórios
Tratando-se de benefício de natureza previdenciária, os índices de atualização monetária da dívida devem seguir os critérios definidos pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp. n. 1.495.146, submetido à sistemática dos recursos repetitivos (Tema STJ 905), a saber: IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n. 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n. 8.880/94) e INPC a partir de 04/2006 (art. 31 da Lei n. 10.741/03, combinado com a Lei n. 11.430/06, precedida da MP n. 316, de 11-08-2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n. 8.213/91).
Quanto aos juros de mora, até 29-06-2009 devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, a contar da citação, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/1987, aplicável, analogicamente, aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte. A partir de 30-06-2009, por força da Lei n. 11.960, de 29-06-2009, que alterou o art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, para fins de apuração dos juros de mora haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice oficial aplicado à caderneta de poupança, conforme decidido pelo Pretório Excelso no RE n. 870.947 (Tema STF 810).
Honorários advocatícios
Observo que a sentença, embora tenha condenado o INSS a suportarto o pagamento da verba honorária, deixou de fixar o percentual correspondente.
Considerando que a sentença foi publicada após 18-03-2016, data definida pelo Plenário do STJ para início da vigência do NCPC (Enunciado Administrativo nº 1-STJ), bem como o Enunciado Administrativo n. 7 - STJ (Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC), aplica-se ao caso a sistemática de honorários advocatícios ora vigente.
Desse modo, considerando a manutenção da sentença de primeiro grau e tendo em conta o disposto no § 11 do art. 85 do NCPC, bem como recentes julgados do STF e do STJ acerca da matéria (v.g.ARE971774 AgR, Relator p/ Acórdão: Min. EDSON FACHIN, PrimeiraTurma, DJe 19-10-2016; ARE 964330 AgR, Relator p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, DJe 25-10-2016; AgIntno AREsp 829.107/RJ, Relator p/ Acórdão Ministro MARCO BUZZI, Quarta Turma, DJe 06-02-2017 e AgInt nos EDcl no REsp1357561/MG, Relator Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Terceira Turma, DJe 19-04-2017), fixo a verba honorária em 12% sobre o valor atualizado da causa, já considerado o trabalho adicional realizado em grau recursal, na forma do aludido parágrafo.
Por fim, dou por prequestionados os dispositivos legais e constitucionais mencionados pela parte apelante, entendendo que nenhum deles é violado com esta decisão nem altera o conteúdo do que foi decidido.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS e readequar, de ofício, os critérios de correção monetária e juros moratórios.
Des. Federal CELSO KIPPER
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal CELSO KIPPER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9373414v12 e, se solicitado, do código CRC BE7BB07E. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 17/05/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5011761-26.2017.4.04.7201/SC
ORIGEM: SC 50117612620174047201
RELATOR | : | Des. Federal CELSO KIPPER |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Fábio Nesi Venzon |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | DEISE KELLY DIAS DOS SANTOS |
ADVOGADO | : | CLAUDIA LETICIA SHIGEOKA |
: | ANDREIA REGINA BRUNNER |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 17/05/2018, na seqüência 100, disponibilizada no DE de 02/05/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E READEQUAR, DE OFÍCIO, OS CRITÉRIOS DE CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS MORATÓRIOS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal CELSO KIPPER |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal CELSO KIPPER |
: | Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE | |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
Ana Carolina Gamba Bernardes
Secretária
| Documento eletrônico assinado por Ana Carolina Gamba Bernardes, Secretária, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9406923v1 e, se solicitado, do código CRC C01C70FE. | |
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