
Apelação Cível Nº 5006231-27.2020.4.04.7204/SC
RELATORA Juíza Federal ALINE LAZZARON
RELATÓRIO
Trata-se de Apelação interposta pela parte autora J. C. contra a sentença () que julgou:
III. DISPOSITIVO.
Ante o exposto, afasto a prejudicial de prescrição quinquenal e ACOLHO em parte o pedido formulado na ação, resolvendo o mérito na forma do art. 487, I, do CPC, para declarar que o(a) autor(a) exerceu atividade sujeita a condições especiais, no regime de 25 anos, no(s) período(s) de 19/03/1993 a 28/04/1995, condenando o INSS a averbá-lo(s) para fins previdenciários, com a possibilidade de conversão para tempo comum.
Tendo em vista sucumbência recíproca, e que a Fazenda Pública é parte, fixo os honorários advocatícios em 10% sobre o valor atualizado da causa, que serão repartidos na proporção de 30% para o advogado do autor e 70% para o procurador da parte ré (art. 85, § 2º, § 4º, III, 86, caput, e art. 87, § 1º, do CPC). Com relação à parte autora, contudo, fica suspensa a execução, ante a gratuidade judicial deferida.
Demanda isenta de custas (art. 4º da Lei nº 9.289/96).
Nas razões recursais (), a parte autora sustenta a necessidade de reforma da sentença para reconhecimento dos períodos de atividade especial, alegando, em suma, que as provas (PPP e LTCAT) demonstram a exposição a ruídos e hidrocarbonetos aromáticos/óleo mineral, e que a alegação de menção genérica à NR-15 e a parcialidade do LTCAT não devem prevalecer para negar o direito.
Com as contrarrazões (), vieram os autos para esta Corte.
É o relatório.
VOTO
I - Análise do Mérito
A controvérsia recursal cinge-se ao reconhecimento das condições especiais da atividade laboral da parte autora nos seguintes períodos: 01/01/2004 a 31/05/2004 (Marcobin) e 03/01/2005 a 23/10/2018 (Peraro Plásticos).
A sentença de origem não reconheceu a especialidade, fundamentando que:
Período(s): 19/03/1993 a 28/04/1995 e 01/01/2004 a 31/05/2004. |
Nome empresarial: Marcobin Ind. e Com. de Móveis Ltda. |
Formulário; laudo: Evento 1, procadm7, 57-58; evento 13.
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Análise administrativa: Evento 1, procadm7, 75-81. |
Análise judicial: * Período de 19/03/1993 a 28/04/1995: Ruído: Cabível o enquadramento porque o(a) autor(a) esteve exposto(a) ao agente nocivo em limite(s) superior(es) ao(s) previsto(s) (80dB(A) até 05/03/1997, 90dB(A) de 06/03/1997 a 18/11/2003 e 85dB(A) a partir de 19/11/2003) nos Códigos 1.1.6 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/1964, 1.1.5 do Anexo I do Decreto nº 83.080/1979, 2.0.1 do Anexo IV dos Decretos nº 2.172/1997 e 3.048/1999, e Anexo 1 da Portaria MTb nº 3.214/1978, NR-15.
* Período de 01/01/2004 a 31/05/2004: Ruído: Incabível o enquadramento tendo em vista que a parte autora, embora intimada (evento 4), não se desincumbiu do ônus probatório de demonstrar o critério utilizado para aferição do ruído (se NR 15 ou NHO 01 da FUNDACENTRO), conforme Tema nº 174 da TNU. O LTCAT de 2003 (evento 13) foi parcialmente anexado e não descreve a medição de ruído para as atividades do(a) autor(a). |
Período(s): 03/01/2005 a 23/10/2018. |
Nome empresarial: Peraro Indústria de Móveis e Plásticos Ltda. |
Formulário; laudo: Evento 1, procadm7, 59-60; evento 1, procadm7, 61-62, e evento 13.
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Análise administrativa: Evento 1, procadm7, 75-81. |
Análise judicial: Hidrocarbonetos: Incabível o enquadramento porque a atividade foi realizada a partir de 04/12/1998 e o PPP refere a existência de equipamentos de proteção eficazes, que afastam a especialidade do labor. Em que pese a possibilidade de produção de prova contrária, entendo que a impugnação genérica não tem o condão de afastar a informação de eficácia constante no formulário. Em acréscimo, a alegação genérica de que os documentos técnicos não retratam a realidade deve ser deduzida previamente e em ação própria na jurisdição competente, porque no âmbito previdenciário, quando firmados por profissionais habilitados, presumem-se verdadeiros, e dispensam, como regra, a realização de prova pericial (salvo prova conclusiva documentada de equívocos claros e manifestos - inexistente, in casu) (5001607-93.2015.404.7208, Primeira Turma Recursal de Santa Catarina, Relator Juiz Federal Edvaldo Mendes da Silva, anexado aos autos em 29/04/2016). Ruído: Incabível o enquadramento tendo em vista que a parte autora, embora intimada (evento 4), anexou cópia parcial do LTCAT, do qual não é possível extrair, em que pese a menção genérica à NR-15, a informação quanto ao critério utilizado para aferição da média do ruído, conforme Tema nº 174 da TNU. |
A decisão do juízo a quo merece reparos.
A orientação desta Corte Federal está assim sedimentada quanto à exposição dos agentes nocivos:
1) AGENTE NOCIVO RUÍDO: O reconhecimento da especialidade da atividade pela exposição a ruído exige a demonstração da efetiva exposição, mediante aferição do nível de decibéis (dB) por meio de parecer técnico. Os limites de tolerância para ruído são: Até 05.03.1997: Superior a 80 dB(A) (Decreto nº 53.831/64 e Decreto nº 83.080/79). De 06.03.1997 a 18.11.2003: Superior a 90 dB(A) (Decreto nº 2.172/97 e Decreto nº 3.048/99). O Superior Tribunal de Justiça (Tema 694 - REsp n° 1398260/PR) pacificou que é impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB. A partir de 19.11.2003: Superior a 85 dB(A) (Decreto nº 3.048/99, alterado pelo Decreto nº 4.882/2003). Metodologia de Medição (NEN/Pico): O Superior Tribunal de Justiça (Tema 1083 - REsp 1886795/RS) fixou que o reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição. A exigência do NEN no LTCAT e PPP é a partir do Decreto n. 4.882/2003. (TRF4, AC 5001035-06.2020.4.04.7001, 10ª Turma , Relator para Acórdão LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO , julgado em 12/08/2025). EPI´s: Eventual utilização de EPI´s é irrelevante para elidir a nocividade decorrente da exposição ao ruído excessivo, conforme decisão do STF no ARE 664.335/SC.
2) AGENTES QUÍMICOS (ÓLEOS, GRAXAS, HIDROCARBONETOS): A exposição a hidrocarbonetos aromáticos, como óleos e graxas de origem mineral, é qualitativa, pois se tratam de agentes químicos reconhecidamente cancerígenos, conforme a Portaria Interministerial nº 9/2014 e o Anexo 13 da NR-15. A utilização de EPI, ainda que atenue a exposição, não é capaz de neutralizar completamente o risco, conforme decidido pelo TRF4 no IRDR Tema 15. (TRF4, AC 5071483-41.2019.4.04.7000, 10ª Turma , Relatora para Acórdão CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI , julgado em 05/08/2025.
No caso concreto, o autor buscou o reconhecimento de dois períodos com exposição a agentes nocivos:
Período de 01/01/2004 a 31/05/2004: O PPP (, pág. 57) aponta a exposição a ruído de 96,4 dB.
Período de 03/01/2005 a 23/10/2018: A atividade exercida foi a de mecânico, com contato com óleo mineral/hidrocarbonetos e ruído de 89,2 dB, conforme PPP (, págs. 59-60).
Tendo em vista que estes períodos são posteriores a 19/11/2003, e o limite de tolerância aplicável é de 85 dB(A), a exposição ao ruído de ambos os períodos superam os limites legais. Embora a sentença tenha rejeitado o período com base na ausência de metodologia específica (Tema 174/TNU), o Superior Tribunal de Justiça (Tema 1083) estabeleceu que, ausente a informação sobre o NEN, pode ser adotado o critério do nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que comprovada a habitualidade.
Quanto aos agentes químicos, este Tribunal entende que a exigência relativa à necessidade de especificação da composição e concentração a que o segurado esteve exposto não encontra pleno respaldo na legislação previdenciária, a qual, para fins de reconhecimento da especialidade do labor, demanda, via de regra, somente prova de que tenha havido contato com agentes químicos nocivos à saúde, elencados na legislação aplicável.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. NÍVEL DE CONCENTRAÇÃO DOS AGENTES QUÍMICOS. DESNECESSIDADE. AVALIAÇÃO QUALITATIVA. A alegação no sentido de que se mostra necessária a explicitação da composição química e da concentração dos agentes a que o segurado esteve exposto não encontra respaldo na legislação previdenciária, a qual reconhece a especialidade do labor quando existe contato com agentes químicos nocivos à saúde, elencados na legislação de regência, o que restou comprovado no caso concreto." (EINF nº 5004090-13.2012.404.7108, 3ª Seção, Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, por unanimidade, juntado aos autos em 06/12/2013)
Pelos fundamentos acima delineados deve ser provido o apelo do autor para reconhecer os períodos de 01/01/2004 a 31/05/2004 e 03/01/2005 a 23/10/2018 como tempo especial.
Da soma do tempo para obtenção do benefício.
A implementação dos requisitos para a concessão/revisão da aposentadoria por tempo de contribuição/especial deverá ser verificada pelo juízo de origem através da liquidação do julgado. Em caso de implantação do benefício, deverá ser observada a hipótese de cálculo que for mais vantajosa ao autor, dentre as que resultarem possíveis.
Na hipótese de concessão de aposentadoria especial / revisão de espécie para fins de concessão de aposentadoria especial, deverá ser observada a tese jurídica fixada pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 709.
Benefícios inacumuláveis.
Fica desde logo autorizado o desconto integral, sobre as parcelas vencidas, dos valores eventualmente recebidos, a contar da DIB, a título de benefício inacumulável, nos termos do art. 124 da Lei nº 8.213/1991 e à luz da vedação ao enriquecimento sem causa.
Reafirmação da DER
Considerando que o direito à concessão do benefício mais vantajoso é decorrência da lei previdenciária, dos normativos internos do próprio INSS e da jurisprudência consolidada, desde já fica autorizada, para estes fins, a reafirmação da DER.
A matéria não comporta maiores digressões, visto que o STJ, em sede recurso repetitivo (Tema 995/STJ), fixou a seguinte tese:
É possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir.
No tocante aos efeitos financeiros:
a) reafirmação da DER durante o processo administrativo: efeitos financeiros a partir da implementação dos requisitos e os juros de mora a partir da citação;
b) implementação dos requisitos entre o final do processo administrativo e o ajuizamento da ação: efeitos financeiros e juros de mora a partir da citação;
c) implementados os requisitos após o ajuizamento da ação: efeitos financeiros a partir da implementação dos requisitos; juros de mora apenas se o INSS não implantar o benefício no prazo de 45 dias da intimação da respectiva decisão, contados a partir desse termo final.
Assim, viável a reafirmação da DER por ocasião da liquidação do julgado, cumprindo à parte autora, em sede de cumprimento de sentença, indicar a data para a qual pretende ver reafirmada a DER de seu benefício de aposentadoria, acompanhada de planilha de contagem de tempo de serviço/contribuição e comprovação da existência de contribuições vertidas após a DER, observada a data desta Sessão de Julgamento como limite para fins de reafirmação.,
Registro que somente os recolhimentos sem pendências administrativas podem ser considerados para tal finalidade.
II - Consectários, Honorários e Prequestionamento
Consectários Legais Os consectários legais devem ser fixados, quanto aos juros, nos termos do que definido pelo STF no julgamento do Tema 1170. No que tange à correção monetária, até 08/12/2021, deve ser aplicado o INPC (Lei 11.430/06). A partir de 09/12/2021, incidirá a taxa SELIC, para todos os fins (correção, juros e compensação da mora), conforme o art. 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021.
Honorários Advocatícios Recursais Tendo em vista a modificação da sucumbência, devem ser redistribuídos os honorários, que ficarão a cargo da parte ré, sendo devidos sobre o valor da condenação, nos patamares mínimos previstos no art. 85, §§2º e 3º do CPC, considerando-se, para tanto, as parcelas vencidas até a data do presente Acórdão (Sumulas 111 do STJ e 76 do TRF4), ou, em não havendo proveito econômico, sobre o valor atualizado da causa.
Prequestionamento Para fins de acesso às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as questões e os dispositivos legais invocados pelas partes, nos termos dos artigos 1.022 e 1.025 do CPC, evitando-se a oposição de embargos de declaração com propósito de prequestionamento.
Dispositivo
Voto por dar provimento à apelação da parte autora.
Documento eletrônico assinado por ALINE LAZZARON, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005401240v8 e do código CRC 4f9959ea.
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Apelação Cível Nº 5006231-27.2020.4.04.7204/SC
RELATORA Juíza Federal ALINE LAZZARON
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL.
1. A lei em vigor quando da prestação dos serviços define a configuração do tempo como especial ou comum, o qual passa a integrar o patrimônio jurídico do trabalhador, como direito adquirido.
2. Até 28/04/1995 é admissível o reconhecimento da especialidade do trabalho por categoria profissional; a partir de 29/04/1995 é necessária a demonstração da efetiva exposição, de forma não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde, por qualquer meio de prova. A contar de 06/05/1997 a comprovação deve ser feita por formulário padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica.
3. Comprovado nos autos a exposição da parte autora a agentes nocivos, incorreta a sentença, devendo ser modificada, conforme orientação delineada por esta Corte Federal.
4. Apelação do Autor provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Central Digital de Auxílio 1 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 27 de outubro de 2025.
Documento eletrônico assinado por ALINE LAZZARON, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005401241v3 e do código CRC d152515a.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 20/10/2025 A 27/10/2025
Apelação Cível Nº 5006231-27.2020.4.04.7204/SC
RELATORA Juíza Federal ALINE LAZZARON
PRESIDENTE Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 20/10/2025, às 00:00, a 27/10/2025, às 16:00, na sequência 414, disponibilizada no DE de 09/10/2025.
Certifico que a Central Digital de Auxílio 1, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A CENTRAL DIGITAL DE AUXÍLIO 1 DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATORA DO ACÓRDÃO Juíza Federal ALINE LAZZARON
Votante Juíza Federal ALINE LAZZARON
Votante Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
Votante Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
MÁRCIA CRISTINA ABBUD
Secretária
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