
Apelação Cível Nº 5000316-89.2019.4.04.7120/RS
RELATOR Juiz Federal MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA
RELATÓRIO
Trata-se de recurso inominado interposto pela parte autora, J. O. G. E., contra a r. sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Federal de Santiago, que julgou parcialmente procedente o pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, conforme dispositivo:
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para:
a) Reconhecer e determinar que o INSS averbe o tempo de trabalho exercido em condições especiais pela parte autora, no período compreendido de 17/12/2005 a 30/10/2007, nos termos da fundamentação.
b) Reconhecer e determinar que o INSS averbe o período rural de 21/10/1976 a 31/12/1977, como tendo sido laborado pelo autor na condição de segurado especial em regime de economia familiar, nos termos da fundamentação.
Face à sucumbência, que reputo recíproca, condeno cada uma das partes ao pagamento dos honorários advocatícios da ex adversa, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, em conformidade com o art. 85, § 4°, III, c/c art. 85, § 3º, I, ambos do CPC, atualizado até o efetivo pagamento pelo IPCA-E, respondendo a parte autora por 80% e o INSS por 20%, dessa verba, sendo vedada a sua compensação, conforme art. 85, § 14, do CPC. Ressalto que tal valor, no que diz respeito ao montante devido pela parte autora, resta suspenso em virtude dos efeitos da gratuidade de justiça deferida.
Condeno a parte autora a pagar 80% das custas e demais despesas processuais. Contudo, a exibilidade das verbas devidas pela parte autora (honorários e custas/despesas) resta suspensa em virtude dos efeitos da gratuidade de justiça deferida.
Não cabe condenação do INSS em custas processuais, porque inexistente adiantamento pela parte autora, bem como à vista da sua isenção legal (artigo 4º, inciso I, da Lei n° 9.289/96).
Interposto recurso de apelação, intime-se a parte adversa para apresentar contrarrazões no prazo legal (art. 183, caput, e/ou 1.010, § 1º, do CPC). Após, deve ser dada vista ao recorrente caso sejam suscitadas pelo recorrido as matérias referidas no § 1º do art. 1.009, nos termos do § 2º do mesmo dispositivo. Por fim, remetam-se os autos ao Egrégio TRF da 4ª Região, nos termos do 1.010, § 3º, do Código de Processo Civil.
Transitada em julgado, e nada sendo requerido, dê-se baixa e arquive-se.
Publicação automática.
Sem necessidade de registro.
Intimem-se.
É o relatório.
Os autos vieram a esta Corte.
VOTO
1. Juízo de Admissibilidade
O apelo é cabível, tempestivo e cumpre os requisitos formais, merecendo ser conhecido.
2. Sentença Recorrida |controvérsia
A r. sentença examinou e decidiu com precisão todos os pontos relevantes da lide, motivo pelo qual a adoto como razões de decidir (naquilo que não for objeto de reforma), transcrevendo o excerto pertinente, a fim de evitar tautologia:
I - RELATÓRIO
J. O. G. E., qualificado na inicial, ajuizou a presente ação em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, igualmente qualificado, objetivando, em síntese, a a concessão de benefício aposentadoria por tempo de contribuição, com reconhecimento de períodos laborados em condições especiais de 03/08/1998 a 30/06/2004 e 17/12/2005 a 30/10/2007, com a conversão do tempo especial em comum, além do reconhecimento de período rural laborado sob regime de economia familiar de 21/10/1976 a 31/12/1977. Pretende, ainda, a condenação do réu ao pagamento das parcelas vencidas e vincendas.
Foi deferida a gratuidade da justiça e determinada a citação da parte ré (Ev09).
O processo administrativo aportou ao evento 24.
O INSS contestou. No mérito teceu considerações acerca da comprovação do exercício da atividade rural, aduzindo que, no caso concreto parte-autora não logrou êxito em demonstrar os fatos constitutivos de seu direito, uma vez que há início de prova material de atividade rural em regime de economia familiar. Quanto aos pleito de reconhecimento de períodos como de serviço especial, teceu comentários acerca dos requisitos legais para o reconhecimento da atividade como especial, ao longo do tempo, ressaltando que, no casso concreto, os documentos carreados ao processo administrativo são insuficientes para reconhecer a atividade como especial nos períodos requeridos. Requereu, ao final, a improcedência da demanda (Ev29).
Sobreveio réplica (Ev34).
Oportunizada a produção de provas (Ev36), a parte autora manifestou ao evento 39.
Após, oportunizado o contraditório (Ev40), vieram os autos conclusos para sentença.
É o relatório. Passo a motivar e decidir.
II - FUNDAMENTAÇÃO
MÉRITO
Em observância ao princípio tempus regit actum, assim como tendo em consideração a DER, ressalto que a presente sentença faz referência à legislação, constitucional e infraconstitucional, anterior à Reforma da Previdência - EC n.º 103/2019.
Atividade Especial
Com o advento da Lei 8.213/91, através de seu art. 152 ficou consignado que "a relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física deverá ser submetida à apreciação do Congresso Nacional, no prazo de 30 (trinta) dias a partir da data da publicação desta Lei, prevalecendo, até então, a lista constante da legislação atualmente em vigor para a aposentadoria especial". Dessa forma, permaneceram em vigor e aplicáveis para a conversão do tempo de serviço especial em comum os Decretos 53.831, de 25/03/64, e 83.080, de 24/01/79.
Nesse prisma, o reconhecimento do labor especial está sujeito ao seguinte regramento:
- Até 28/04/1995, o enquadramento da atividade especial se dava pela categoria profissional ou pelo agente agressivo, nos termos dos Decretos Executivos 53.831 de 25 de março de 1964 e 83.080 de 24 de janeiro de 1979 e legislação especial, ou ainda por laudo pericial que considerasse a atividade prejudicial à saúde ou integridade física. (Súmula 198 do TFR)
- Entre 28/04/1995 e 06/03/1997 permanece a aplicação dos Decretos Executivos 53.831 de 25 de março de 1964 e 83.080 de 24 de janeiro de 1979, e seus respectivos quadros anexos, comprovando-se a atividade através de formulário SB-40, DSS-8030 ou LTCAT, na forma como exigida pelo Instituto Nacional do Seguro Social, anteriormente à mudança efetivada pelo Decreto nº 2.172/97, ou ainda na forma da súmula 198 do TFR.
- Após 06/03/1997, é necessário laudo pericial demonstrando os requisitos do art. 57 § 3° da Lei 8.213/91, ou seja, tempo de trabalho em condições especiais de modo: permanente, não ocasional, nem intermitente.
Com relação à exigência de demonstração de exposição de forma permanente, não ocasional, nem intermitente manifestou-se o STJ:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADO. TEMPO DE SERVIÇO EXERCIDO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. INCIDÊNCIA DA LEI VIGENTE NO MOMENTO DA PRESTAÇÃO. DECRETOS 53.831/64 E 83.080/79. ROL EXEMPLIFICATIVO. COMPROVAÇÃO DO EXERCÍCIO DE FORMA HABITUAL E PERMANENTE. DESNECESSIDADE. [...] 4. A exigência de exposição de forma habitual e permanente sob condições especiais somente foi trazida pela Lei 9.032/95, não sendo aplicável à hipótese dos autos, que é anterior à sua publicação. [...] (REsp 977.400/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, julgado em 09/10/2007, DJ 05/11/2007 p. 371)g.n.
Por fim, nos termos do enunciado da Súmula 198 do TFR:
"atendidos os demais requisitos, é devida aposentadoria especial, se a perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em regulamento".
Ficam ressalvados os casos de contato com os agentes ruído e calor, para os quais é exigida a comprovação dos níveis de exposição, em qualquer época do desempenho da atividade.
Outrossim, ante o cancelamento da súmula 16 da TNU (27/03/2009), entendo que não há limite temporal para conversão do tempo especial em comum.
Habitualidade e Permanência
É importante ressaltar também o significado das expressões "habitual", "permanente" e "intermitente":
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO/SERVIÇO. REQUISITOS. ATIVIDADE RURAL ANTERIOR AOS 14 ANOS DE IDADE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES BIOLÓGICOS. CATEGORIA PROFISSIONAL. ENFERMAGEM. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. 1. (...) 8. Para a caracterização da especialidade, não se reclama exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, visto que habitualidade e permanência hábeis para os fins visados pela norma - que é protetiva - devem ser analisadas à luz do serviço cometido ao trabalhador, cujo desempenho, não descontínuo ou eventual, exponha sua saúde à prejudicialidade das condições físicas, químicas, biológicas ou associadas que degradam o meio ambiente do trabalho. 9. (...). (TRF4, APELREEX 0010597-06.2010.404.9999, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 30/06/2011); (grifei)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. INTERMITÊNCIA. (...) 3. Os requisitos da habitualidade e da permanência devem ser entendidos como não-eventualidade e efetividade da função insalutífera, continuidade e não-interrupção da exposição ao agente nocivo. A intermitência refere-se ao exercício da atividade em local insalubre de modo descontínuo, ou seja, somente em determinadas ocasiões. 4. Se o trabalhador desempenha diuturnamente suas funções em locais insalubres, mesmo que apenas em metade de sua jornada de trabalho, tem direito ao cômputo do tempo de serviço especial, porque estava exposto ao agente agressivo de modo constante, efetivo, habitual e permanente" (TRF4, AC 2000.04.01.073799-6/PR, 6ª Turma, Rel. Juiz Luiz Carlos de Castro Lugon, DJU 9-5-2001)
Quanto ao EPI
Em relação aos EPI´s, vinha entendendo que a mera informação de fornecimento ou utilização de equipamentos de proteção individual não seria suficiente para presumir, de per si, a neutralização do agente agressivo. Entendia que eram necessárias provas concretas da qualidade do equipamento e sua adequação, incluindo até mesmo a intensidade da proteção propiciada, em concreto, para o trabalhador e sua efetiva utilização, não bastando a mera afirmação genérica e formal acerca do emprego dos equipamentos.
Porém, o E. TRF da 4ª Região, nos autos do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas nº 5054341-77.2016.4.04.0000, ao discutir se a comprovação da eficácia do EPI, e consequente neutralização dos agentes nocivos, pode ser demonstrada somente pelo PPP ou requer dilação probatória, fixou a tese de que "a mera juntada do PPP referindo a eficácia do EPI não elide o direito do interessado em produzir prova em sentido contrário" (julgamento 22/11/2017).
Desse modo, curvando-me à tese fixada no citado IRDR pelo TRF/4, passo a adotar o entendimento de que a informação acerca da eficácia do EPI no PPP possui presunção juris tantum de veracidade, incumbindo à parte autora o ônus de impugná-la especificadamente e produzir prova em sentido contrário.
Ressalte-se, no entanto, que há situações que dispensam a produção de prova da eficácia do EPI, quando deve ser desconsiderada a informação e o tempo considerado especial, quais sejam:
a) períodos anteriores a 03/12/1998; b) enquadramento por categoria profissional; c) ruído; c) agentes biológicos; d) agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos; e) periculosidade; f) os demais agentes nocivos que, sabidamente, não possuam EPI eficaz no mercado, quais sejam: calor, vibração, radiação ionizante e pressões anormais (agentes físicos) e arsênios, asbestos, benzeno, berílio, cádmio, carvão mineral, cromo, níquel, sílica livre, benzopireno, 1,3 butadieno e 4 ? nitrodifenil (agentes químicos).
Em todos estes casos a discussão acerca do EPI é irrelevante por não ser capaz de afastar a especialidade mesmo quando existente.
Quanto ao Agente Ruído
Quanto ao agente ruído, revejo posicionamento anteriormente externado e passo a aplicar, para fins de verificação da atividade especial, o nível de ruído superior a 80 decibéis até 05.03.1997; o nível de ruído superior a 90 decibéis de 06.03.1997 até 18.11.2003 e, a partir de 19.11.2003 o nível de ruído superior a 85 decibéis, conforme restou pacificado perante o Superior Tribunal de Justiça ao apreciar o REsp nº 1.398.260/PR, sob o rito dos recursos repetitivos, in verbis:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO RETROATIVA DO DECRETO 4.882/2003 PARA RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6/3/1997 a 18/11/2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB. De início, a legislação que rege o tempo de serviço para fins previdenciários é aquela vigente à época da prestação, matéria essa já abordada de forma genérica em dois recursos representativos de controvérsias, submetidos ao rito do art. 543-C do CPC (REsp 1.310.034-PR, Primeira Seção, DJe 19/12/2012 e REsp 1.151.363-MG, Terceira Seção, DJe 5/4/2011). Ademais, o STJ, no âmbito de incidente de uniformização de jurisprudência, também firmou compreensão pela impossibilidade de retroagirem os efeitos do Decreto 4.882/2003. (Pet 9.059-RS, Primeira Seção, DJe 9/9/2013). Precedentes citados: AgRg no REsp 1.309.696-RS, Primeira Turma, DJe 28/6/2013; e AgRg no REsp 1.352.046-RS, Segunda Turma, DJe 8/2/2013. REsp 1.398.260-PR, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 14/5/2014. (grifei)
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ATIVIDADE INSALUBRE. AGENTE NOCIVO RUÍDO. DECRETO 4.882/2003. IRRETROATIVIDADE. REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ. PET 9.059/DF E RECURSO ESPECIAL REPETITIVO 1.398.260/PR. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Quanto ao agente nocivo ruído, a Primeira Seção do STJ, ao apreciar a Pet 9.059/DF, acolheu o Incidente de Uniformização de Jurisprudência suscitado pelo INSS, ratificando o entendimento de que não é possível a aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, tal como proclamado pela decisão ora agravada. 2. De igual modo, a Primeira Seção reafirmou, em sede de representativo da controvérsia, Recurso Especial Repetitivo 1.398.260/PR, o mesmo entendimento, observando o princípio tempus regit actum. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 384.058/MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/05/2014, DJe 28/05/2014); (grifei)
Análise do Caso Concreto
A parte autora fundamentou na inicial que trabalhou em contato com agentes nocivos nos seguintes períodos não reconhecidos pelo INSS.
* Período de 03/08/1998 a 30/06/2004, como auxiliar geral, para Construvidro Comercial de Vidros e Materiais de Construção.
Há registro dos contratos de trabalho na CTPS do autor (Evento 24, PROCADM1, p. 8) no cargo de "auxiliar geral" em estabelecimento de especialidade " comércio de vidros e materiais de construção, ferramentas e ferragens".
O PPP anexado, emitido em 01/03/2017, impugnado pelo INSS em razão do preenchimento incorreto, informa as mesmas atividades de auxiliar de vidraceiro. Ocorre que, em virtude da generalidade do cargo "auxiliar geral", em estabelecimento de comércio de vidros e materiais de construção, não se pode presumir que o autor efetivamente realizou as atividades de auxiliar de vidraceiro. Nesse ínterim, anoto que o autor não comprovou no autos que, no período em debate, as suas atividades estavam relacionas apenas com o corte e instalação de vidros, a afastar a presunção generalidade das ativiades do cargo anotado na CTPS .
Com efeito, anoto que além de constar as mesmas atividades para cargos de nomenclatura diferentes, o PPP apresentado não informa a forma de exposição aos agentes nocivos, além de que, a responsável técnica que assinou o documento apenas obteve a habilitação técnica para tanto em período posterior ao lapso que o autor laborou na empresa, conforme anotado pela ré em contestação.
Inobstante, instada a complementar a instrução (ev 24), juntando aos autos os documentos que embasaram o preenchimento do PPP, a parte autora anexou aos autos somente o LTCAT referente ao cargo de auxiliar de vidraceiro, e sequer comprovou que solicitou os documentos referente ao cargo de auxiliar geral ao empregador.
Ademais, esclareço que não é demasiado exigir da parte autora a apresentação dos laudos técnicos que respaldaram os formulários emitidos pelos empregadores, já que tal medida está em sintonia com o princípio do ônus da prova.
A propósito, uma vez que havia laudo técnico do próprio empregador apto a instruir o feito e que a autora não demonstrou a impossibilidade de juntá-lo, não há razão para que se adote laudo por similaridade ou se realize perícia.
Impõe-se notar, nesse prisma, que o ônus da prova acerca da especialidade das atividades laborais é da parte autora, nos termos do art. 373, inciso I, do CPC e do art. 57, §§ 3º e 4º, da Lei n.º 8.213/91, segundo os quais é do segurado, e não do Juízo, tampouco do INSS, o dever de provar o tempo especial mediante documentação.
A propósito, eventual inconformismo da parte autora com as informações constantes dos formulários previdenciários - que são ou deveriam ser prestadas pela empresa com base nos laudos que produz, existindo importantes efeitos tributários que lhe são conexos, bem como repercussão mesmo na esfera penal decorrente de eventual prestação de informações inverídicas - deve ser equacionado pelo segurado em sede e momento adequados, que não em demanda previdenciária em curso.
Assim, considerando-se que se oportunizou ao autor, de forma clara e objetiva as provas necessárias para comprovar suas alegações, o que foi desatendido sem que tenha vindo justificativa, restaram atendidos por esse juízo o princípio do contraditório, o direito de produzir provas e os deveres de cooperação e de boa-fé processuais.
Às partes não basta simplesmente alegar os fatos. Incumbe-lhes prová-los, a fim de que o magistrado resolva a lide em consonância com a real situação fática levada à apreciação. Embora hodiernamente se defenda uma postura mais ativa do juiz no sentido de ordenar a produção de provas para esclarecer pontos que ficaram obscuros na instrução processual, não há que se confundir essa postura, de todo louvável sob o prisma de uma prestação jurisdicional efetiva, com outra no sentido de que o juiz deve substituir as partes verdadeiramente.
Portanto, estando o PPP apresentado incorreto e/ou incompleto, e não tendo a parte autora se desincumbido do ônus de apresentar os laudos técnicos dos empregadores que embasaram o seu preenchimento, inviável o reconhecimento da especialidade no período acima analisados
* Período de de 17/12/2005 a 30/10/2007 como auxiliar de vidraceiro para Construvidro Comercial de Vidros e Materiais de Construção.
Conforme o PPP emitido em 01/03/2017 (Ev 24, PROCADM1, p. 13 a 16), impugnado pelo INSS em razão do preenchimento incorreto, o autor, nos cargos "auxiliar de vidraceiro", no setor "área de produção", desenvolvia atividades de preparar máquinas, equipamentos e instrumentos para corte de vidros; confeccionar e lapidar vitrais; cortar alumínio; selecionar o vidro, baseando-se nas dimensões e tipos requeridos, para ajustá-los ao local de colocação; efetuar a traçagem e o corte de peças de vidros; efetuar a limpeza. dos encaixes e os procedimentos necessários para a fixação de peças de vidro; montar peças de vidro em encaixes e dar o acabamento necessário ao trabalho; polir as bordas das chapas de vidro; efetuar jateamento de areia em cabine; aplicar massa de vidro e silicone para fixação das chapas; substituir vidros em ambientes comerciais, industriais ou residenciais; utilizar, limpar e fazer a manutenção de diversos tipos de equipamentos; trabalhar em canteiro de obras; utilizar caneta diamante de vidro e mesa de corte; trabalhar em lugares altos, incluindo o trabalho em escadas e andaimes; manusear lâminas de vidro grandes e incômodas; trabalhar em posição incômodas e permanecer em pé por períodos prolongados; trabalhar com ferramentas manuais e elétricas; trabalhar ao ar livre, em clima quente ou frio; executar outras tarefas de mesma natureza e nível de complexidade associados ao ambiente organizacional. Estava exposto a: (i) ruído de 76 a 102 dB(A) (ii) pó de sílica, (iii) hidrocarbonetos aromáticos; (iv) trabalhos com vidros/máquinas e equipamentos; (v) má postura e carregamento de peso (Evento 24, PROCADM1, p. 13 a 16).
Inicialmente, verifico que o PPP apresentado está incompleto eis que não apresenta forma de exposição dos agentes nocivos.
A despeito da imprestabilidade do PPP como meio de prova, o autor anexou LTCAT individual emitido pela ex-empregadora em março de 2017, assinado por engenheira de segurança do trabalho, no qual o trabalhador, no de "cargo de auxiliar de vidraceiro", realizando atividades idênticas às descritas no PPP, estava exposto, dentre outros agentes nocivos a ruído de forma habitual e permanente.
Anoto que, apesar de o laudo apresentado não ser contemporâneo ao labor do autor, eis que a responsável técnica que o produziu não tinha habilitação para tanto no lapso em que o autor laborou na empresa, anoto que, no caso, a adoção de laudo extemporâneo mostra-se perfeitamente possível, eis que o documento refere-se genericamente a trabalhador no cargo de auxiliar de vidraceiro, e não especificamente ao labor do autor na empresa durante certo lapso de tempo.
Na oportunidade, foram apurados níveis de ruído de 78 dB(A) da furadeira, 87 dB da lapidadeira, 96 dB(A) da serra circular, 102 dB(A) da serra circular de alumínio, 90 dB(A) da lixadeira e 76 dB(A) da mesa de corte (Ev24, PROCADM1, p. 22).
Nessa perspectiva, convém repisar que caracteriza a atividade como especial o nível de ruído ruído superior a 80 decibéis até 05/03/1997; o nível de ruído superior a 90 decibéis de 06/03/1997 até 18/11/2003 e, a partir de 19/11/2003 o nível de ruído superior a 85 decibéis.
Com base na prova produzida, o autor estava exposto a ruído médio de 88,16 dB(A) de forma habitual e permanente, considerando o nível ruído médio das fontes geradoras a que o trabalhador estava exposto, sendo assim, possível caracterizar a atividade desenvolvida como especial no lapso de 17/12/2005 a 30/10/2007.
Convém notar que a exposição a níveis elevados de ruído não causa danos apenas à audição, de sorte que protetores auriculares não são capazes de neutralizar os riscos à saúde do trabalhador. Os ruídos ambientais não são absorvidos apenas pelos ouvidos e suas estruturas condutivas, mas também pela estrutura óssea da cabeça, sendo que o protetor auricular reduz apenas a transmissão aérea e não a óssea, daí que a exposição, durante grande parte do tempo de serviço produz efeitos nocivos a longo prazo, como zumbidos e distúrbios do sono.
E, nessa esteira, o julgamento do STF a respeito da matéria, ARE 664.335, em 04-12-2014, pacificou a questão, restando assentado pelo Tribunal Pleno que, "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria". Na mesma linha, a Súmula n.º 9 da TNU, já referida, e o julgamento do IRDR 15 pelo TRF/4.
Por essa razão, ainda que houvesse informação acerca da eficácia dos EPI´s, tal circunstância não teria o condão de afastar o reconhecimento da atividade desenvolvida pelo autor como especial.
Anoto também que o LTCAT informa exposição ao agente pó de sílica, configurando-se atividade especial pelo código 1.2.12 do Anexo I do Decreto n. 83.080 de 1979 e pelo código 1.0.18 do Anexo IV do Decreto n. 3.048, de 1999.
Quanto à exposição a hidrocarbonetos noticiada no LTCAT, tendo em vista que as funções do autor, denominadas auxiliar geral/auxiliar de vidraceiro são relacionadas à fabricação e instalação de vidros e ferragens, conforme a descrição das inúmeras atividades por ele realizadas constantes no documento, verifico que o manuseio de tais agentes químicos não é sequer habitual ou rotineiro, pois o maquinário normalmente utilizado para corte de vidro geralmente é elétrico e não mecânico. Assim a exposição a hidrocarbonetos não ocorreu durante toda a jornada de trabalho do autor e tampouco todos os dias, a ponto de ser caracterizada a especialidade, como seria, por exemplo, no caso de um trabalhador que exerce a função de mecânico. Assim, considero que a alegada exposição do autor a hidrocarbonetos, se existiu na verdade foi eventual, não caracterizando enquadramento dos períodos em especiais. Nesse mesmo sentido, em caso bastante semelhante, recentemente decidiu a 1ª Turma Recursal do RS, no julgamento do Recurso 5002129-47.2015.4.04.7103, em 16/02/2018.
Por sua vez, fatores ergonômicos como movimentos repetitivos e postura inadequada, assim como risco de acidentes, a não ser em casos bem específicos, não induzem à especialidade da atividade, pois não há previsão legal para o enquadramento como tempo especial por "fatores ergonômicos" e por "risco de acidentes", nos termos da jurisprudência majoritária a exemplo de inúmeros julgados do TRF da 4ª Região e da Turma Recursal: 5016114-24.2017.4.04.7100, SEGUNDA TURMA RECURSAL DO RS, Relator GABRIEL DE JESUS TEDESCO WEDY, julgado em 19/03/2018; 5000204-72.2018.4.04.7212, PRIMEIRA TURMA RECURSAL DE SC, Relator EDVALDO MENDES DA SILVA, julgado em 08/11/2018; TRF4, AC 0010901-29.2015.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator ALTAIR ANTONIO GREGÓRIO, D.E. 03/10/2018; TRF4, AC 5014523-75.2013.4.04.7000, SEXTA TURMA, Relator PAULO PAIM DA SILVA, juntado aos autos em 12/06/2015.
Assim, estando o autor exposto de modo habitual e permanente a pó de sílica e a ruído em nível de intensidade superior ao limite de tolerância em parte dos períodos analisados, é devido o reconhecimento do exercício da atividade especial de 17/12/2005 a 30/10/2007.
Atividade Rural
A respeito do regime de economia familiar, estabelece o § 1º do art. 11 da Lei 8.213/91:
"Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados."
A comprovação da atividade em apreço deve ser analisada à luz do disposto no artigo 55, § 3º, da Lei n° 8.213/91, o qual determina que:
"a comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo a ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento".
É preciso avaliar ainda as seguintes súmulas:
TRU4, súmula nº 09: Admitem-se como início de prova material, documentos em nome de integrantes do grupo envolvido no regime de economia familiar rural.
TNU, súmula nº 6: A certidão de casamento ou outro documento idôneo que evidencie a condição de trabalhador rural do cônjuge constitui início razoável de prova material da atividade rurícola.
Súmula 149 do STJ: a prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade ruricola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciario.
Súmula 34 da TNU: Para fins de comprovação do tempo de labor rural, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar.
Súmula 41 da TNU: A circunstância de um dos integrantes do núcleo familiar desempenhar atividade urbana não implica, por si só, a descaracterização do trabalhador rural como segurado especial, condição que deve ser analisada no caso concreto.
Relativamente ao trabalho rural desempenhado pelo menor, disciplina a súmula nº 5 da TNU:
A prestação de serviço rural por menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser reconhecida para fins previdenciários.
Quanto ao tamanho da propriedade
A Lei 11.718/2008 incluiu critério objetivo relativo ao tamanho da área rural explorada para caracterização do segurado especial. A interpretação literal do dispositivo legal citado (art. 11, VII, §1º da Lei 8.213/91) torna a caracterização de uma situação fática extremamente subordinada a uma regra matemática, ou seja, uma questão subjetiva passa a ser vetorada por um critério objetivo, tendo em vista que a condição de segurado especial requer uma análise circunstancial da vida laboral do trabalhador.
Nesse sentido que a TNU emitiu a seguinte súmula:
Súmula n.º 30 da TNU: Tratando-se de demanda previdenciária, o fato de o imóvel ser superior ao módulo rural não afasta, por si só, a qualificação de seu proprietário como segurado especial, desde que comprovada, nos autos, a sua exploração em regime de economia familiar.
Registre-se que a TNU ainda mantém válida tal súmula, aplicando-a a seus julgados mesmo após a alteração legal que incluiu o critério objetivo:
EMENTA-VOTO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SÚMULA N. 30 DA TNU. SÚMULA 41 DA TNU. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ DO INSS. ARTIGO 17, I, II E V COMBINADO COM ARTIGO 18 DO CPC. DECISÃO MONOCRÁTICA MANTIDA. 1. A TR do Mato Grosso confirmou sentença que julgou procedente o pedido de aposentadoria por idade rural. Sustentou o INSS que a decisão contraria entendimento do STJ e da TNU, com base no tamanho da propriedade registrada no INCRA, na existência de empregados e em razão do vínculo de professor do cônjuge da autora. 2. A Súmula n. 30 da TNU pacificou: ?Tratando-se de demanda previdenciária, o fato de o imóvel ser superior ao módulo rural não afasta, por si só, a qualificação de seu proprietário como segurado especial, desde que comprovada, nos autos, a sua exploração em regime de economia familiar.? 3. Não é o tamanho do imóvel que descaracteriza o regime de economia familiar, mas a sua forma de exploração. Neste sentido, a preciosa sentença é bastante clara ao consignar que ?a área utilizável é de apenas 13 (treze) hectares?. 4. Quanto ao trabalho de professor (em escola rural, diga-se de passagem), incide a Súmula 41 da TNU: ?A circunstância de um dos integrantes do núcleo familiar desempenhar atividade urbana não implica, por si só, a descaracterização do trabalhador rural como segurado especial, condição que deve ser analisada no caso concreto.? 5. Por fim, a r. sentença afirmou que ?a autora apresentou ofício do INCRA retificando os dados do certificado rural da propriedade no sentido de que não existiram assalariados permanentes desde 1981?. 6. O INSS, no seu pedido de uniformização, omitiu esta informação e, ainda, insistiu na tese sem respaldo fático. 7. Conduta temerária que implica em litigância de má-fé (art. 17, I, II e V c/c art. 18 do CPC), razão da condenação do INSS a pagar multa de 1% do valor da causa a favor da parte autora. 8. Agravo regimental improvido. Decisão monocrática mantida. (TNU, PEDILEF 00233085220094013600, JUIZ FEDERAL ANTÔNIO FERNANDO SCHENKEL DO AMARAL E SILVA, 29/02/2012)
ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONSONÂNCIA COM A SÚMULA 30 DESTA TNU. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. O TAMANHO DA PROPRIEDADE, POR SI SÓ, NÃO O AFASTA. QUESTÃO DE ORDEM Nº 13. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO NÃO CONHECIDO. (...) O incidente, no entanto, não merece ser conhecido. Em que pese o entendimento consignado nas decisões transcritas pelo INSS, o acórdão recorrido encontra-se em consonância com a Súmula 30 desta TNU. (...) No julgamento do AgRg no REsp 1042401, Relator Min. Arnaldo Esteves Lima, assim restou afirmado: PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. TRABALHADOR RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL. DIMENSÃO DA PROPRIEDADE RURAL. NÃO-DESCARACTERIZAÇÃO DO REGIME. APOSENTADORIA POR IDADE. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.
1. A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que o tamanho da propriedade rural não é capaz de descaracterizar o regime de economia familiar do segurado, se preenchidos os demais requisitos necessários a sua configuração, quais sejam: ausência de empregados e a mútua dependência e colaboração da família no campo.(...) 3. Agravo regimental improvido. Isso se explica porque as características da atividade rural são extremamente complexas. Seria preciso averiguar qual a área cultivada na propriedade, se na área existem terras improdutivas, florestas, morros, terrenos pedregosos, áreas de preservação,... A própria natureza da cultura influencia o juízo, pois é notório que determinadas culturas exigem mais mão-de-obra que outras. Isso sem falar na possibilidade de a família dos autores ser numerosa ? fato comum no meio rural, em que filhos e cônjuges trabalham e moram juntos no meio rural. Embora o INSS alegue que a propriedade dos autores tenha 242 hectares, não houve maior aprofundamento no conjunto probatório para se determinar se as características de exploração do imóvel se aproximam do regime de economia familiar ou não. A descaracterização do produtor rural segurado especial para empregador rural equiparado a autônomo somente se legitima com a verificação de elementos de fato que aproximem a exploração da propriedade rural do conceito de empresa, cujo ônus da demonstração é do INSS. (TNU, PEDILEF 200936007023486, JUIZ FEDERAL JOSÉ EDUARDO DO NASCIMENTO, Data da Decisão, 02/12/2010, Fonte/Data da Publicação, DOU 08/02/2011 SEÇÃO 1).
Portanto, a simples constatação de que a propriedade explorada pelo trabalhador possua área superior a 4 (quatro) módulos fiscais não tem a capacidade absoluta de desqualificá-lo como segurado especial, à medida que outros elementos devem ser analisados, a fim de se aferir se o modo de produção do requerente se adéqua aos requisitos legais da condição de segurado especial.
Quanto à prova de comercialização de produtos agrícolas a partir do mês de novembro de 1991
De acordo com o artigo 12, VII, da Lei n° 8212/1991, o segurado especial que exerce a atividade individualmente ou em regime de economia familiar está enquadrado como segurado obrigatório e, como tal, deve recolher contribuições para que mantenha o vínculo e faça jus à aquisição de benefícios.
A contribuição do segurado especial (trabalhador rural em regime de economia familiar) é calculada mediante a aplicação de uma alíquota que tem como base de cálculo a receita bruta proveniente da comercialização de sua produção. Nestes termos, estabelece o art. 25 da Lei n.º 8.212/91:
Art. 25. A contribuição do empregador rural pessoa física, em substituição à contribuição de que tratam os incisos I e II do art. 22, e a do segurado especial, referidos, respectivamente, na alínea a do inciso V e no inciso VII do art. 12 desta Lei, destinada à Seguridade Social, é de: (Redação dada pela Lei nº 10.256, de 9.7.2001)
I - 2% da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção;
Como a Lei n.º 8.212/1991 foi publicada no dia 24 de julho de 1991, diante da anterioridade nonagesimal, as contribuições do segurado especial são devidas a partir do dia 01/11/1991. Portanto, a partir da referida data é indispensável que o segurado comprove a comercialização da produção para poder contar, para fins previdenciários, o tempo de serviço na agricultura.
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADO ESPECIAL. MAQUINÁRIO AGRÍCOLA. EXTENSÃO DA PROPRIEDADE. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. CARACTERIZAÇÃO. CONSECTÁRIOS. TUTELA ANTECIPATÓRIA. REQUISITOS PREENCHIDOS. DEFERIMENTO.1. A aposentadoria rural por idade conferida ao segurado especial é uma exceção ao sistema contributivo da Previdência Social e, por isso mesmo, deve ser concedida de forma restritiva, tão-somente àqueles que de fato preencham seus requisitos.2. O regime de economia familiar pressupõe que a atividade agrícola seja indispensável à própria subsistência e seja exercida em condição de mútua dependência e colaboração, sem o uso de empregados.3. É essencial que haja produção agrícola para fins de comercialização, não adquirindo a qualidade de segurado especial aquele que planta apenas para subsistência, pois a contribuição do segurado especial para a previdência social decorre da comercialização do seu excedente, nos termos do art. 25 da LCPS, que concretiza o disposto no §8º do art. 195 da Lei Maior. (Apelação Cível n° 2005.04.01.052865-7, Turma Suplementar, Relator: Fernando Quadros da Silva, julgado em 14/11/2007)
No entanto, importa referir que a contribuição assim definida apenas concede ao segurado especial o direito a usufruir dos benefícios do artigo 39, inciso I, da LBPS. Para usufruir do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, deverá verter contribuições como facultativo, a teor do inciso II do artigo 39 da LBPS c/c os artigos 21 e 25, I da LCPS.
Nesse sentido, aplico a súmula 272 do STJ:
O trabalhador rural, na condição de segurado especial, sujeito à contribuição obrigatória sobre a produção rural comercializada, somente faz jus à aposentadoria por tempo de serviço, se recolher contribuições facultativas.
Portanto, o cômputo de labor rural em regime de economia familiar após 01/11/1991, para fins de aposentadoria por tempo de contribuição, só é possível mediante recolhimento de contribuições, por parte do segurado especial, como facultativo.
Assentadas tais premissas, passo a análise dos requisitos para a averbação do período rural no caso concreto.
Para comprovar a atividade rural, em regime de economia familiar, no período controverso (21/10/1976 a 31/12/1977), a parte autora trouxe aos autos os seguintes elementos, visando preencher o requisito legal de início de prova material:
a) Histórico Escolar, emitido em 11/05/2017 pela Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Santiago-RS, informando que o autor cursou a Escola Municipal de 1º Grau Incompleto Aparício Bittencourt, situada na localidade Paraíso, em Santiago-RS, nos anos de 1973 a 1977;
b) Subscrição de quotas partes, em nome do pai do autor, datada em 18/01/1973;
c) Matrícula n° 5.410, Livro n° 2 ? Registro Geral, Ofício de Registro de Imóveis Comarca de Santiago, constando o nome do pai do autor, qualificado como agricultor, como adquirente de uma área de 14ha, 66a e 66ca, em 15/12/1978;
d) Ficha de associado do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santiago-RS, em nome do pai do autor, com data de associação em 22/08/1972 a pagamento de contribuições nos anos dede 1972 a 1988;
e) Associados Conta Capital, junto à Cooperativa Regional Tritícola Santiaguense, em nome do pai do autor, com movimentações nos anos de 1973 a 1981;
f) Subscrição de quotas partes, em nome do pai do autor, datada em 18/01/1973;
Inicialmente, observo que o INSS já reconheceu a condição de segurado especial do autor de 01/01/1978 a 02/02/1983 e 16/12/1983 a 31/10/1991 (Evento 7, PROCADM1, p. 114). Já o período ora pleiteado, de 21/10/1976 a 31/12/1977, anterior ao já reconhecido, não foi considerado pela Autarquia, sob o motivo de inexistência de início de prova material.
Ocorre que, ao contrário do que alega o INSS, entendo que, para o período pleiteado, existem indícios suficientes do labor rural em nome do autor, consubstanciados principalmente no histórico escolar em escola rural, e no nome do pai do autor, consubstanciados principalmente na prova da propriedade rural, na ficha de associação ao sindicato rural e na conta de associação à cooperativa agrícola com movimentações.
Nesse caso, como não há controvérsia acerca de integrarem o mesmo grupo familiar, aplica-se ao caso o enunciado da Súmula nº 09 da TRU4, in verbis:
Admitem-se como início de prova material, documentos em nome de integrantes do grupo envolvido no regime de economia familiar rural.
Assim, nascido em 21/10/1964, é presumível que o autor a partir de seus 12 anos, em 21/10/1976, acompanhou seus pais nas lidas campesinas.
Além da prova material existente, as testemunhas ouvidas administrativamente (Evento 24, PROCADM4, p. 38 a 43), de forma uníssona e coerente, afirmaram que: (i) conhecem o autor desde pequeno; (ii) o autor junto dos pais e irmãos, desde a tenra idade, quando não estava na escola rural, laborava em lides campesinas, na localidade de "Paraíso", interior de Santiago-RS, plantando pequenas lavouras e criando animais para subsistência; (iii) a terra, no início, era arrendada, com pagamento de uma porcentagem do que produziam ao proprietário, sendo que, depois, o pai autor adquiriu terra própria na mesma localidade; (iv) o núcleo familiar não tinha outra fonte de renda senão a atividade rural.
De fato, à prova material apresentada, foi agregada robusta prova testemunhal, comprovando o desempenho de labor rural do autor, em regime de economia familiar, a partir de seus 12 anos.
Enfim, dado o contexto probatório e as considerações acima, não tendo nenhuma prova que descaracterize a condição de segurado especial, reconheço o exercício de atividade rural pela parte autora, em regime de economia familiar, de 21/10/1976 a 31/12/1977.
Direito à Aposentadoria por Tempo de Contribuição
Somando-se aos tempos comuns averbados pelo INSS (Evento 24, PROCADM5, Página 10), os tempos especiais convertidos pelo fator 1,4 e o tempo rural ora reconhecido, em 21/03/2017 (DER), a parte autora possuía o seguinte tempo de contribuição:
| Nº | Início | Fim | Fator | Tempo | Carência |
| 1 | 21/10/1976 | 31/12/1977 | 1.00 | 1 anos, 2 meses e 10 dias | 15 |
| 2 | 01/01/1978 | 02/02/1983 | 1.00 | 5 anos, 1 meses e 2 dias | 62 |
| 3 | 03/02/1983 | 15/12/1983 | 1.00 | 0 anos, 10 meses e 13 dias | 10 |
| 4 | 16/12/1983 | 31/10/1991 | 1.00 | 7 anos, 10 meses e 15 dias | 94 |
| 5 | 03/08/1998 | 30/06/2004 | 1.00 | 5 anos, 10 meses e 28 dias | 71 |
| 6 | 17/12/2005 | 30/10/2007 | 1.40 especial | 2 anos, 7 meses e 14 dias | 23 |
| 7 | 01/03/2008 | 21/03/2017 | 1.00 | 9 anos, 0 meses e 21 dias | 109 |
| Marco Temporal | Tempo de contribuição | Carência | Idade | Pontos (Lei 13.183/2015) |
| Até 16/12/1998 (EC 20/98) | 15 anos, 4 meses e 24 dias | 186 | 34 anos, 1 meses e 25 dias | - |
| Pedágio (EC 20/98) | 5 anos, 10 meses e 2 dias | |||
| Até 28/11/1999 (Lei 9.876/99) | 16 anos, 4 meses e 6 dias | 197 | 35 anos, 1 meses e 7 dias | - |
| Até 21/03/2017 (DER) | 32 anos, 7 meses e 13 dias | 384 | 52 anos, 5 meses e 0 dias | 85.0361 |
Nesses termos, passo a analisar as modalidades de aposentadoria a que a parte autora poderia fazer jus na data do requerimento.
Aposentadoria por Tempo de Contribuição
Com a reforma da Previdência pela EC nº 20/98, o regime de aposentadoria por tempo de serviço foi transformado em aposentadoria por tempo de contribuição. O art. 4º da EC nº 20/98, contudo, previu que seja considerado como tempo de contribuição o tempo de serviço até que lei discipline a matéria.
Além do tempo de serviço/contribuição, para concessão da aposentadoria, é preciso que o requerente cumpra o período de carência. Nesse aspecto, como a parte autora já era inscrita no RGPS em julho/1991, faz jus à aplicação da regra de transição prevista no art. 142 da Lei nº 8.213/1991.
O pedido administrativo é posterior à EC n° 20/98, a qual afastou a aposentadoria proporcional e passou a exigir tempo de contribuição de 35 anos para homem e 30 anos para a mulher (art. 201, § 7°, inciso I, da CF/88).
Com relação à forma de cálculo deste benefício, deve ser observado o disposto no art. 39, caput, IV do Decreto 3.048. Determina este diploma que a renda mensal será de 100% do salário de benefício aos 35 anos de serviço/contribuição se homem e 30 anos se mulher.
O salário de benefício, por sua vez, deve ser apurado conforme a disciplina do art. 29 da Lei 8.213, ou seja, pela média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a 80% de todo o período contributivo, multiplicada pelo fator previdenciário.
O cálculo salário de benefício se dá pela média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição, correspondentes a 80% de todo o período contributivo decorrido desde a competência julho de 1994, multiplicada pelo fator previdenciário (art. 3º da Lei n.º 9.876, combinado com o art. 29, I da Lei nº 8.213, com a redação dada por essa Lei).
Atendendo a pedido da parte autora, deve-se utilizar como salário-de-contribuição o total dos valores vertidos por competência, inclusive em atividades concomitantes (sem aplicação do revogado artigo 32 da Lei n.º 8.213/91), respeitado o teto (art. 28, § 5º, da Lei n.º 8.212/91).
O § 2º do art. 3º da Lei n.º 9.876 ainda disciplina que o divisor considerado no cálculo da média referida acima não poderá ser inferior a 60% do período decorrido da competência julho de 1994 até a data de início do benefício, limitado a cem por cento de todo o período contributivo.
Entretanto, vale observar que posteriormente foi editada a Medida Provisória nº 676, de 17/06/2015, alterando a Lei n.º 8.213/91, a fim de possibilitar a exclusão do fator previdenciário quando o homem atingir 95 pontos ou a mulher 85 pontos, em ambos os casos, resultante da soma da idade e do tempo de contribuição, incluídas as frações, na data de requerimento da aposentadoria.
Esta Medida Provisória foi convertida na Lei n.º 13.183/2015, a qual acabou por incluir o artigo 29-C na Lei de Benefícios nos seguintes termos:
Art. 29-C. O segurado que preencher o requisito para a aposentadoria por tempo de contribuição poderá optar pela não incidência do fator previdenciário no cálculo de sua aposentadoria, quando o total resultante da soma de sua idade e de seu tempo de contribuição, incluídas as frações, na data de requerimento da aposentadoria, for:
I - igual ou superior a noventa e cinco pontos, se homem, observando o tempo mínimo de contribuição de trinta e cinco anos; ouII - igual ou superior a oitenta e cinco pontos, se mulher, observado o tempo mínimo de contribuição de trinta anos.§ 1° Para os fins do disposto no caput, serão somadas as frações em meses completos de tempo de contribuição e idade.§ 2° As somas de idade e de tempo de contribuição previstas no caput serão majoradas em um ponto em:I - 31 de dezembro de 2018;II - 31 de dezembro de 2020;III - 31 de dezembro de 2022;IV - 31 de dezembro de 2024; eV - 31 de dezembro de 2026.§ 3° Para efeito de aplicação do disposto no caput e no § 2º, o tempo mínimo de contribuição do professor e da professora que comprovarem exclusivamente tempo de efetivo exercício de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio será de, respectivamente, trinta e vinte e cinco anos, e serão acrescidos cinco pontos à soma da idade com o tempo de contribuição.
§ 4° Ao segurado que alcançar o requisito necessário ao exercício da opção de que trata o caput e deixar de requerer aposentadoria será assegurado o direito à opção com a aplicação da pontuação exigida na data do cumprimento do requisito nos termos deste artigo.§ 5° (VETADO).
Assim, a contar da data da edição da Medida Provisória nº 676, em 18/06/2015, o cálculo do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição deve ser feito de modo a garantir o direito a não incidência do fator previdenciário, acaso preenchidos os demais requisitos.
A partir dessas considerações, somando-se o tempo de serviço ora reconhecido e convertido com aquele apurado pelo próprio INSS, verifico que a parte autora contava com 32 anos, 7 meses e 13 dias de tempo de serviço/contribuição na data do pedido administrativo, não fazendo jus, a princípio, à aposentadoria integral na forma da legislação atual.
Aposentadoria por Tempo de Serviço
Não obstante, a EC nº 20/98 assegurou a concessão da aposentadoria integral ou proporcional por tempo de serviço aos segurados que até a data da publicação da emenda (16.12.1998) tivessem cumprido os requisitos para a concessão do benefício (art. 3º).
Para alcançar aposentadoria integral, o segurado deveria completar 30 anos de serviço, se mulher e 35, se homem, bem como satisfazer ao requisito da carência.
Para alcançar aposentadoria proporcional, bastavam 25 anos de serviço para mulher e 30 para homem, caso em que a renda mensal inicial seria de 70% do salário-de-benefício, acrescido de 6% para cada novo ano completo de atividade, até o máximo de 100% (art. 53 da Lei 8.213).
O salário-de-benefício da aposentadoria por tempo de serviço era calculado da seguinte forma: média aritmética simples de todos os últimos salários-de-contribuição dos meses imediatamente anteriores ao do afastamento da atividade ou da data da entrada do requerimento, até o máximo de 36 (trinta e seis), apurados em período não superior a 48 (quarenta e oito) meses. Isso, em conformidade com a redação original do art. 29 da lei 8.213.
O § 1º deste artigo, ainda determinava que contando o segurado com menos de 24 (vinte e quatro) contribuições no período máximo citado, o salário de benefício corresponderia a 1/24 (um vinte e quatro avos) da soma dos salários-de-contribuição apurados.
No caso dos autos, até 16/12/1998, considerando o tempo acima reconhecido somado ao tempo computado administrativamente, o autor totalizava 15 anos, 4 meses e 24 dias de tempo de serviço, não tendo completado tempo suficiente à aposentadoria proporcional por tempo de serviço naquela data.
Aposentadoria Proporcional conforme Regras de Transição
A Emenda Constitucional n° 20/98 extinguiu o benefício de aposentadoria proporcional por tempo de serviço. No entanto, a referida emenda criou uma regra de transição, que permite àqueles filiados antes de sua promulgação usufruir da aposentadoria proporcional mesmo com cômputo de período posterior a 16/12/1998, desde que cumpridos os requisitos exigidos pela regra de transição prevista em seu art. 9º.
Os requisitos são: contar com pelo menos 53 anos de idade se homem e 48 anos se mulher; completar 30 anos de serviço/contribuição se homem e 25 anos se mulher, mais um período adicional de 40% sobre o tempo que faltava, em 16/12/1998, para a aposentadoria proporcional (30 ou 25 anos).
A renda mensal deste benefício, conforme art. 9º, § 1º, II, da EC 20/98, consiste em 70% do salário de benefício, acrescido de 5% para cada ano de contribuição que supere os 30 ou 25 anos exigidos (conforme o sexo), até o limite de 100%.
O salário de benefício tem sua forma de cálculo determinada de acordo com a data do implemento dos requisitos, se antes ou depois do advento da lei 9.876/99:
* Se o demandante implementou os requisitos até 25/11/1999 o salário de benefício se dá pela média aritmética simples de todos os últimos salários-de-contribuição dos meses imediatamente anteriores ao do afastamento da atividade ou da data da entrada do requerimento, até o máximo de 36 (trinta e seis), apurados em período não superior a 48 (quarenta e oito) meses. Isso, em conformidade com a redação original do art. 29 da lei 8.213/91.
O § 1º deste artigo, ainda determinava que contando o segurado com menos de 24 (vinte e quatro) contribuições no período máximo citado, o salário de benefício corresponderia a 1/24 (um vinte e quatro avos) da soma dos salários-de-contribuição apurados.
* Se o demandante implementou os requisitos a partir de 26/11/1999, tendo se filiado ao RGPS antes desta data, o salário de benefício se dá pela média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição, correspondentes a 80% de todo o período contributivo decorrido desde a competência julho de 1994, multiplicada pelo fator previdenciário (art. 3º da lei 9.876, combinado com o art. 29, I da Lei no 8.213/91, com a redação dada por essa Lei).
O § 2º do art. 3º da Lei 9.876 ainda disciplina que o divisor considerado no cálculo da média referida acima não poderá ser inferior a 60% do período decorrido da competência julho de 1994 até a data de início do benefício, limitado a cem por cento de todo o período contributivo.
Dito isso, verifico que sequer o requisito etário restou atendido em 21/03/2017, quando o autor possuía 52 anos. Em 16/12/1998 a parte autora contava com 15 anos, 4 meses e 24 dias de tempo de serviço/contribuição. Assim, deveria cumprir o pedágio de 5 anos, 10 meses e 2 dias, completando 35 anos, 10 meses e 24 dias de tempo de serviço/contribuição, o que não se verifica no caso dos autos, de modo que também não faz jus à aposentadoria proporcional pelas regras de transição.
Em tempo, esclareço que, à luz do princípio da primazia do acertamento judicial, "é devida a outorga da proteção social com efeitos retroativos ao momento em que foram aperfeiçoados os pressupostos legais para sua concessão (quando se instaurou o conteúdo obrigacional), ainda que esta circunstância tenha ocorrido posteriormente ao término da tutela administrativa. (SAVARIS, José Antonio. Princípio da primazia do acertamento judicial da relação jurídica de proteção social. Revista NEJ - Eletrônica, Vol. 17 - n. 3 -p. 419-437/set-dez 2012, p. 428).
Segue daí que devem ser considerados fatos supervenientes à propositura da demanda, de modo que, para fins de concessão da efetiva proteção previdenciária, admite-se a "reafirmação da DER", computando-se tempo de contribuição entre a data do requerimento e a data do ajuizamento da ação ou, mesmo, da prolação da sentença, na hipótese de a parte autora não implementar o tempo mínimo para o benefício até aquela data.
Dito isso, em consulta ao CNIS, constata-se que, após a DER, em 21/03/2017, o autor continuou a verter contribuições, como empregado, para: (i) Herotides V. M. Menezes Eireli, até 20/11/2017; (ii) Rita de C. E. Prestes, de 01/12/2018 a 12/03/2020; e (iii) Luciane W. Menezes, a partir de 03/08/2020, como se extrai da seguinte tela de consulta:

Na hipótese em tela, todavia, mesmo computados períodos de contribuição entre a DER e a data da sentença, a parte autora não implementaria o requisito temporal para concessão da benesse previdenciária pretendida.
Enfim, a presente ação deve ser julgada parcialmente procedente tão-somente para reconhecer o tempo de trabalho exercido pela parte autora em atividades especiais e como segurado especial em regime de economia familiar, determinando a sua averbação pelo INSS.
2.3. Caso concreto
Da Sentença Recorrida (Trecho Pertinente à Negativa)
O Juízo a quo negou o reconhecimento do período de 03/08/1998 a 30/06/2004, exercido na Construvidro Comercial de Vidros e Materiais de Construção, sob a seguinte fundamentação:
"Há registro dos contratos de trabalho na CTPS do autor (Evento 24, PROCADM1, p. 8) no cargo de "auxiliar geral" em estabelecimento de especialidade " comércio de vidros e materiais de construção, ferramentas e ferragens". O PPP anexado, emitido em 01/03/2017, impugnado pelo INSS em razão do preenchimento incorreto, informa as mesmas atividades de auxiliar de vidraceiro. Ocorre que, em virtude da generalidade do cargo "auxiliar geral", em estabelecimento de comércio de vidros e materiais de construção, não se pode presumir que o autor efetivamente realizou as atividades de auxiliar de vidraceiro. Nesse ínterim, anoto que o autor não comprovou no autos que, no período em debate, as suas atividades estavam relacionas apenas com o corte e instalação de vidros, a afastar a presunção generalidade das ativiades do cargo anotado na CTPS".
"Portanto, estando o PPP apresentado incorreto e/ou incompleto, e não tendo a parte autora se desincumbido do ônus de apresentar os laudos técnicos dos empregadores que embasaram o seu preenchimento, inviável o reconhecimento da especialidade no período acima analisados".
Quanto aos hidrocarbonetos, o juízo a quo entendeu que: "Quanto à exposição a hidrocarbonetos noticiada no LTCAT, tendo em vista que as funções do autor, denominadas auxiliar geral/auxiliar de vidraceiro são relacionadas à fabricação e instalação de vidros e ferragens, conforme a descrição das inúmeras atividades por ele realizadas constantes no documento, verifico que o manuseio de tais Da Atividade Especial – Período de 03/08/1998 a 30/06/2004 (Hidrocarbonetos Aromáticos)*
A despeito dos fundamentos da r. sentença, verifica-se que o Recorrente buscou sanar as dúvidas documentais, anexando declaração e impugnando a recusa do laudo, sob a alegação de que o PPP e o LTCAT foram confeccionados por profissional habilitada, com todas as folhas rubricadas e assinadas, e que as atividades de "auxiliar geral" eram, de fato, as mesmas.
O Recorrente informa e demonstra pelo documento vinculado no que os agentes químicos envolvidos são, entre outros, querosene (hidrocarbonetos) e silicone acético basic (polidimetilsiloxano, agentes de carga, agentes auxiliares e reticulador de acetooxisilano).
Conforme jurisprudência pacificada, a avaliação da exposição a agentes químicos com potencial cancerígeno, tais como os hidrocarbonetos aromáticos (presentes em óleos, graxas, querosene, solventes), é estritamente qualitativa, conforme o Anexo 13 da NR apenas "eventual" não se coaduna com a descrição das atividades rotineiras de corte, instalação, limpeza e aplicação de silicone/massa (que contêm hidrocarbonetos), conforme comprovado nos autos.
Ademais, é relevante a contradição apontada pelo Recorrente, de que os mesmos documentos (PPP e LTCAT) foram utilizados e aceitos para o reconhecimento do período subsequente (17/12/2005 a 30/10/2007) exposição aos hidrocarbonetos aromáticos (Agente Químico), cujo enquadramento é qualitativo (Anexo 13 da NR-15), o que configura o provimento do recurso neste ponto.
2.3.1. Da Concessão do Benefício e Reafirmação da DER
O tempo de serviço total da parte autora na DER (21/03/2017), considerando os períodos reconhecidos na sentença (17/12/2005 a 30/10/2007 - especial; 21/10/1976 a 31/12/1977 deve ser recalculado.
O Recorrente pleiteou subsidiariamente a reafirmação da DER para que, caso o pedido principal fosse indeferido, fossem acrescidos períodos posteriores ao requerimento administrativo, visando o implemento do lapso temporal para a concessão da aposentadoria ou do melhor benefício.
Considerando que o reconhecimento do período de 03/08/1998 a 30/06/2004 já acrescenta tempo significativo, e em observância ao princípio da primazia do acerto judicial, que permite considerar fatos supervenientes, se preenchidos os requisitos de transição.
Caso o tempo na DER seja insuficiente, proceder à reafirmação da DER até a data do acórdão ou data posterior necessária para implementação dos requisitos, conforme o pedido subsidiário do autor.
2.4. Consectários, Honorários e Prequestionamento
I. Consectários Legais.
Consectários Legais Nas condenações judiciais impostas à Fazenda Pública, o trânsito em julgado de decisão de mérito com previsão de índice específico de juros ou de correção monetária não impede a incidência de legislação ou entendimento jurisprudencial do STF supervenientes [STF, Temas nºs 1.170 e 1.361].
Considerando a evolução do contexto fático-normativo no decorrer da tramitação do feito – no que se inclui o advento da EC nº 136/2025, que alterou o art. 3º da EC nº 113/2021 –, os consectários deverão ser revistos, no que couber, em sede de liquidação ou de cumprimento definitivo de sentença, com observância da disciplina jurídica aplicável e dos critérios definidos em precedentes vinculantes [STF, Temas nºs 810 e 1.170 da Repercussão Geral, e STJ, Tema Repetitivo nº 905].
Incide, no caso, o disposto nos arts. 491, I, e § 2º, e 535, III, e § 5º, do CPC, prejudicada eventual insurgência recursal específica, neste momento, ante a alteração superveniente dos parâmetros normativos.
II. Honorários Advocatícios Recursais.
Em face do parcial provimento do recurso da parte autora, a sucumbência recíproca fixada na sentença deve ser reavaliada.
Assim, inverto a sucumbência nos termos fixados na sentença em desfavor do INSS.
III. Prequestionamento. Para fins de acesso às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as questões e os dispositivos legais invocados pelas partes, nos termos dos artigos 1.022 e 1.025 do CPC, evitando-se a oposição de embargos de declaração com propósito de prequestionamento.
3. DISPOSITIVO
Por todo o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo do autor.
Documento eletrônico assinado por MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005434631v7 e do código CRC 67a839e2.
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Apelação Cível Nº 5000316-89.2019.4.04.7120/RS
RELATOR Juiz Federal MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. SUJEIÇÃO A HIDROCARBONETOS. REAFIRMAÇÃO DA DER.
1. Conforme jurisprudência pacificada, a avaliação da exposição a agentes químicos com potencial cancerígeno, tais como os hidrocarbonetos aromáticos (presentes em óleos, graxas, querosene, solventes), é estritamente qualitativa, conforme o Anexo 13 da NR apenas "eventual" não se coaduna com a descrição das atividades rotineiras de corte, instalação, limpeza e aplicação de silicone/massa (que contêm hidrocarbonetos), conforme comprovado nos autos.
2. Reafirmação da DER. Verificado que o somatório dos tempos de serviço, incluindo o período rural reconhecido, não atinge o tempo mínimo necessário para a aposentadoria por tempo de contribuição na Data de Entrada do Requerimento (DER - 21/03/2017), totalizando 32 anos, 7 meses e 13 dias. Considerando os fatos supervenientes, deve ser deferido o pedido subsidiário de reafirmação da DER para momento posterior, incluindo períodos contributivos que permitam a concessão do benefício.
3. Apelação da parte autora parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Central Digital de Auxílio 2 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo do autor, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 04 de novembro de 2025.
Documento eletrônico assinado por MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005438152v4 e do código CRC ac514eea.
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Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO PRESENCIAL DE 04/11/2025
Apelação Cível Nº 5000316-89.2019.4.04.7120/RS
RELATOR Juiz Federal MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA
PRESIDENTE Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
PROCURADOR(A) JOÃO GUALBERTO GARCEZ RAMOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Presencial do dia 04/11/2025, na sequência 584, disponibilizada no DE de 22/10/2025.
Certifico que a Central Digital de Auxílio 2, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A CENTRAL DIGITAL DE AUXÍLIO 2 DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DO AUTOR.
RELATOR DO ACÓRDÃO Juiz Federal MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA
Votante Juiz Federal MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA
Votante Juíza Federal DIENYFFER BRUM DE MORAES FONTES
Votante Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
MÁRCIA CRISTINA ABBUD
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 12/11/2025 04:08:53.
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