
Apelação Cível Nº 5015698-61.2019.4.04.7108/RS
RELATOR Juiz Federal MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pela parte autora, C. S., em face de sentença que julgou parcialmente procedente o pedido de concessão de Aposentadoria por Tempo de Contribuição, conforme dispositivo:
Dispositivo
Ante o exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC/2015, resolvendo o mérito do processo, para o fim de condenar o réu a:
a) reconhecer e averbar como exercido em atividade especial os intervalos reconhecidos acima, bem como convertê-los em tempo comum, nos termos da fundamentação;
b) conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (B42), a contar do ajuizamento, nos termos da fundamentação;
c) pagar as parcelas vencidas e vincendas corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora, de acordo com os critérios da fundamentação, descontando-se eventuais valores recebidos, no período, a título de benefício previdenciário; e
d) implantar a tutela de urgência deferida, nos seguintes termos:
| () IMPLANTAÇÃO (X) CONCESSÃO () REVISÃO | |
| NB | 189.357.919-8 |
| ESPÉCIE | B42 |
| DIB | 15/08/2019 |
| DIP | Data da intimação desta sentença |
| RMI | a apurar |
Condeno o INSS a pagar os honorários advocatícios, em percentual a ser fixado por ocasião da liquidação de sentença (art. 85, §4º, II, do CPC/2015), sobre o valor condenação, excluídas as parcelas que se vencerem após a prolação da sentença (Súmula nº 111 do STJ).
Sem custas, a teor do art. 4º, da Lei nº 9.289/96.
Ainda que ilíquida, a condenação não alcançará o patamar previsto no art. 496, § 3º, do CPC/2015; portanto, inaplicável a remessa necessária.
Em homenagem aos princípios da instrumentalidade, celeridade e economia processual, eventuais apelações interpostas pelas partes serão recebidas apenas no efeito devolutivo na parte relativa à tutela provisória (art. 1012, § 1º, V, do CPC/2015) e, quanto ao resto, no duplo efeito, salvo nas hipóteses de intempestividade e, se for o caso, ausência de preparo, que serão oportunamente certificadas pela Secretaria.
Havendo interposição de recurso, intime-se a parte contrária para, querendo, ofertar contrarrazões. Decorrido o prazo, remeta-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.
É o relatório.
Os autos vieram a esta Corte.
VOTO
1. Juízo de Admissibilidade
O apelo é cabível, tempestivo e cumpre os requisitos formais, merecendo ser conhecido.
2. Sentença Recorrida |controvérsia
A controvérsia cinge-se: a) à preliminar de cerceamento de defesa; b) ao reconhecimento da especialidade do labor no período de 19/11/2002 a 23/05/2005; c) à data de início do benefício, em face da reafirmação da DER.
Para adequada análise da controvérsia, transcrevo excerto da r. sentença que, com precisão, analisou as questões postas, cujos fundamentos adoto como razões de decidir:
Relatório
Trata-se de procedimento comum ajuizado pela parte autora contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, visando, em síntese, à concessão do benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de tempo de serviço especial e conversão de atividade especial em comum, com efeitos patrimoniais retroativos à data do requerimento administrativo. Referiu que o pedido foi indeferido administrativamente por falta de tempo de contribuição (evento 1).
Foi deferido o benefício da gratuidade de justiça (evento 3).
Citado, o INSS apresentou contestação, refutando as alegações apresentadas pelo autor (evento 10).
Durante a instrução, foram juntadas declarações de testemunhas e laudos similares (evento 26).
É o sucinto relatório. Passo a sentenciar.
Fundamentação
Mérito
Tempo de serviço especial
A legislação aplicável para verificação da submissão do trabalho a condições especiais é a vigente à época em que prestado tal serviço, em respeito ao ato jurídico perfeito.
A aposentadoria especial veio a ser instituída no artigo 31 da Lei n. 3.807/60 - Lei Orgânica da Previdência Social. Por isso, a possibilidade de se reconhecer o exercício de atividade especial inicia-se em 05.09.1960, data em que a referida lei entrou em vigor, inexistindo termo final, conforme entendimento consolidado no Superior Tribunal de Justiça (Recurso Especial 1.151.363/MG, DJe 05/04/2011, processado segundo o regime do art. 543-C do Código de Processo Civil).
Até a edição da Lei n. 9.032/95, em 28 de abril de 1995, era possível o enquadramento pelo mero exercício de atividade considerada, por si só, especial - hipótese em que havia presunção de submissão a agentes nocivos - ou pela exposição a agente nocivo comprovada pelo simples preenchimento de formulário pela empresa (SB-40 ou DSS-8030) - redação original do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 e legislação precedente (CLPS/84 e CLPS/76). Em ambos os casos, era desnecessária a realização de prova pericial, salvo quanto ao agente ruído e qualquer outro que exigisse medição técnica.
Com o advento da Lei n. 9.032/95, não foi mais possível o enquadramento por simples exercício de atividade profissional considerada nociva, pois a legislação passou a exigir que o trabalho fosse efetivamente sujeito a condições prejudiciais à saúde ou à integridade física do segurado, o que poderia ser demonstrado pelo preenchimento dos acima referidos formulários.
A exigência da efetiva exposição a agentes nocivos mediante laudo de avaliação de riscos ambientais, por sua vez, somente veio a ser exigida a partir de 05.03.1997. Isso porque a obrigatoriedade legal de preenchimento do formulário com base em laudo pericial passou a ser prevista na MP nº 1.523/96, posteriormente convertida na Lei nº 9.528/98, a qual foi regulamentada pelo Decreto nº 2.172, de 05 de março de 1997. Por isso, vem a jurisprudência entendendo que a comprovação da especialidade do labor por laudo pericial tão-somente é exigível após a edição do decreto regulamentador da exigência.
Por fim, a partir de 01.01.2004, passou-se a exigir a comprovação mediante apresentação do formulário denominado PPP - perfil profissiográfico previdenciário (art. 68, §§ 2º e 6º a 8º, do Decreto nº 3.048/99, na redação dada pelo Decreto nº 4.032/01, c/c IN 84/02 e IN 95/03).
E, havendo PPP devidamente preenchido, entendo desnecessária a apresentação de laudo pericial a comprovar a exposição efetiva a agentes nocivos, mesmo após 1997 e também em qualquer das hipóteses de exposição a ruído ou qualquer outro agente nocivo que exija medição técnica, porquanto o perfil profissiográfico previdenciário deve ser emitido com base em "laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho", consoante preceitua o parágrafo 1º do artigo 58 da Lei de Benefícios. Ou seja, é dever da empresa manter laudo técnico atualizado, com base no qual emitirá os formulários de exposição a agentes nocivos, sob pena de incorrer na penalidade prevista no artigo 133 da Lei n. 8.213/91 (artigo 58, §§ 3º e 4º). Nesse mesmo sentido, foi a recente decisão da 1ª Seção do STJ, em sede de pedido de uniformização de jurisprudência, à unanimidade:
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. PREVIDENCIÁRIO.COMPROVAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. RUÍDO. PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO (PPP). APRESENTAÇÃO SIMULTÂNEA DO RESPECTIVO LAUDO TÉCNICO DE CONDIÇÕES AMBIENTAIS DE TRABALHO (LTCAT). DESNECESSIDADE QUANDO AUSENTE IDÔNEA IMPUGNAÇÃO AO CONTEÚDO DO PPP.1. Em regra, trazido aos autos o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), dispensável se faz, para o reconhecimento e contagem do tempo de serviço especial do segurado, a juntada do respectivo Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho (LTCAT), na medida que o PPP já é elaborado com base nos dados existentes no LTCAT, ressalvando-se, entretanto, a necessidade da também apresentação desse laudo quando idoneamente impugnado o conteúdo do PPP.2. No caso concreto, conforme destacado no escorreito acórdão da TNU, assim como no bem lançado pronunciamento do Parquet, não foi suscitada pelo órgão previdenciário nenhuma objeção específica às informações técnicas constantes do PPP anexado aos autos, não se podendo, por isso, recusar-lhe validade como meio de prova apto à comprovação da exposição do trabalhador ao agente nocivo "ruído".3. Pedido de uniformização de jurisprudência improcedente.(Pet 10.262/RS, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08/02/2017, DJe 16/02/2017)
Ou seja, havendo PPP, desnecessária a juntada de laudo pericial. Por outro lado, a infirmação dos dados constantes do PPP somente será possível mediante dúvida objetiva e idônea quanto à congruência entre os dados do PPP e do laudo que o tiver embasado.
Importante salientar que os formulários com informações sobre agentes nocivos para reconhecimento de tempo de serviço especial (SB 40 e DSS 8030) devem ser preenchidos pela empresa/empregador (o que deveria ocorrer na época da prestação do serviço). Inexiste previsão no sentido de se aceitar tais documentos quando preenchidos por sindicato da categoria profissional ou por síndico da massa falida, porque, nesses casos, são preenchidos com base em declaração da própria parte ou nas anotações da Carteira de Trabalho, configurando prova formada unilateralmente.
No caso de empresas inativas, não havendo laudo pericial da própria empresa para demonstrar a exposição a agentes nocivos, cabível a utilização de laudos similares, preferencialmente contemporâneos à época em que prestado o serviço. Este Juízo, como regra geral, prefere laudos de empresas similares que sejam da mesma época em que foi prestado o serviço do que perícias judiciais realizadas nos dias de hoje em empresas diversas. Similaridade por similaridade, prefere-se privilegiar a análise dos agentes nocivos feita à época em que prestado o serviço.
Já no caso de empresas ativas, o instrumento adequado a demonstrar a exposição a agentes nocivos é o laudo da própria empresa (atual LTCAT), o qual poderá ser afastado somente diante de algum indício que infirme as informações prestadas pela empresa.
Outrossim, anotações genéricas na CTPS ou nos formulários, indicando como atividade "serviços gerais", "servente" ou "auxiliar, por exemplo, não são aptas, por si só, a comprovar trabalho com exposição a agentes nocivos à saúde, dada a diversidade de atribuições passíveis de inclusão nesses conceitos. Somente no caso concreto, após especificação das atividades exercidas, mediante prova robusta, será possível aferir se eram submetidas a condições especiais.
Quanto ao elenco das atividades e agentes nocivos, devem ser utilizados os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 até 05/03/97, o Decreto nº 2.172/97 até 05.05.99 e o Decreto nº 3.048/99 a partir de então. Importante frisar que essas listas não são taxativas, de modo que pode ser comprovada a exposição a algum outro agente nocivo não arrolado.
O tempo de trabalho laborado com exposição a ruído é considerado especial, para fins de conversão em comum, nos seguintes níveis: superior a 80 decibéis, na vigência do Decreto n. 53.831/64 (1.1.6); superior a 90 decibéis, a partir de 5 de março de 1997, na vigência do Decreto n. 2.172/97; superior a 85 decibéis, a partir da edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003 (Incidente de Uniformização STJ ? Pet. 9.059/RS).
Quanto ao uso de EPI - Equipamento de Proteção Individual -, a neutralização de agente nocivo por seu uso somente será considerada para labor desempenhado a partir de 03 de dezembro de 1998, em virtude da alteração efetuada no parágrafo 2º do artigo 58 da Lei 8.213/91 pela Lei 9.732, de 11/12/1998 (conversão da MP 1.729, de 02 de dezembro de 1998), a partir de quando se determinou que o laudo técnico contivesse informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminuísse a intensidade do agente agressivo aos limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo. Esse é, inclusive, o entendimento adotado pelo INSS na Instrução Normativa INSS/PRES n° 45/20010 (art. 238, §6°).
Por outro lado, "a mera juntada do PPP referindo a eficácia do EPI não elide o direito do interessado em produzir prova em sentido contrário" (tese fixada no julgamento do IRDR do Tema 15, no TRF da 4ª Região). Consoante delimitado no julgamento do Tema 15 (TRF4 5054341-77.2016.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator para Acórdão JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 11/12/2017), o voto condutor traçou parâmetros para condução da prova e sua interpretação:
1 º Passo:
O juiz (a requerimento das partes ou de ofício) deve oficiar ao empregador para que apresente os registros do fornecimento de EPI ao trabalhador, podendo ser "livros, fichas ou sistema eletrônico" (previsão contida na NR-06 - item 6.6.1 "h").
Não existindo esse controle de fornecimento do EPI a prova pericial será inócua, pois não basta o equipamento ser cientificamente adequado para afastar ou neutralizar a nocividade se não houve o controle do fornecimento e substituição do EPI pelo empregador.
2 º Passo:
Havendo documentação que comprove o fornecimento de EPI, poderá ser designada a realização de perícia nos termos parametrizados neste voto, inclusive para apurar se houve o cumprimento das demais condições previstas na IN INSS 77/2015, art. 279, § 6º, quais sejam:
I - da hierarquia estabelecida no item 9.3.5.4 da NR-09 do MTE, ou seja, medidas de proteção coletiva, medidas de caráter administrativo ou de organização do trabalho e utilização de EPI, nesta ordem, admitindo-se a utilização de EPI somente em situações de inviabilidade técnica, insuficiência ou interinidade à implementação do EPC ou, ainda, em caráter complementar ou emergencial;
II - das condições de funcionamento e do uso ininterrupto do EPI ao longo do tempo, conforme especificação técnica do fabricante, ajustada às condições de campo;
III - do prazo de validade, conforme Certificado de Aprovação do MTE;
IV - da periodicidade de troca definida pelos programas ambientais, comprovada mediante recibo assinado pelo usuário em época própria; e
V - da higienização.
Cumpre ainda observar que existem situações que dispensam a produção da eficácia da prova do EPI, pois mesmo que o PPP indique a adoção de EPI eficaz, essa informação deverá ser desconsiderada e o tempo considerado como especial (independentemente da produção da prova da falta de eficácia) nas seguintes hipóteses:
a) Períodos anteriores a 3 de dezembro de 1998:
Pela ausência de exigência de controle de fornecimento e uso de EPI em período anterior a essa data, conforme se observa da IN INSS 77/2015 -Art. 279, § 6º:
"§ 6º Somente será considerada a adoção de Equipamento de Proteção Individual - EPI em demonstrações ambientais emitidas a partir de 3 de dezembro de 1998, data da publicação da MP nº 1.729, de 2 de dezembro de 1998, convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998, e desde que comprovadamente elimine ou neutralize a nocividade e seja respeitado o disposto na NR-06 do MTE, havendo ainda necessidade de que seja assegurada e devidamente registrada pela empresa, no PPP, a observância: (...)"
b) Pela reconhecida ineficácia do EPI:
b.1) Enquadramento por categoria profissional: devido a presunção da nocividade (ex. TRF/4 5004577-85.2014.4.04.7116/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Fed. João Batista Pinto Silveira, em 13/09/2017)
b.2) Ruído: Repercussão Geral 555 (ARE 664335 / SC)
b.3) Agentes Biológicos: Item 3.1.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017.
b.4) Agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos: Memorando-Circular Conjunto n° 2/DIRSAT/DIRBEN/INSS/2015:
Exemplos: Asbesto (amianto): Item 1.9.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017; Benzeno: Item 1.9.3 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017.
b.5) Periculosidade: Tratando-se de periculosidade, tal qual a eletricidade e vigilante, não se cogita de afastamento da especialidade pelo uso de EPI. (ex. APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5004281-23.2014.4.04.7000/PR, Rel. Ézio Teixeira, 19/04/2017 )
Por fim, resta esclarecer, quanto a esse aspecto, que nos casos de empresas inativas e não sendo obtido os registros de fornecimento de EPI, as partes poderão utilizar-se de prova emprestada ou por similaridade (de outros processos, inclusive de reclamatórias trabalhistas) e de oitiva de testemunhas que trabalharam nas mesmas empresas em períodos similares para demonstrar a ausência de fornecimento de EPI ou uso inadequado.
3º Passo:
Esgotada a produção da prova na via judicial e não sendo possível constatar a eficácia do EPI, cabe observar o item 11 do Acórdão do STF no julgamento da Repercussão Geral n.555 (ARE 664335/SC):
"Em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete."
Pelo exposto, voto por solver o IRDR estabelecendo a seguinte tese jurídica: a mera juntada do PPP referindo a eficácia do EPI não elide o direito do interessado em produzir prova em sentido contrário.
Especificamente quanto ao agente ruído, ainda que o EPI afaste os níveis considerados nocivos, não fica descaracterizada a atividade como especial (enunciado 9 da Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais). Isso porque a exposição a níveis elevados de ruído não causa danos apenas à audição, uma vez que os ruídos ambientais não são absorvidos apenas pelos ouvidos e suas estruturas condutivas, mas também pela estrutura óssea da cabeça, sendo que o protetor auricular reduz apenas a transmissão aérea e não a óssea. Nesse mesmo sentido foi o entendimento fixado pelo Plenário do STF, em sede repercussão geral, quando do julgamento do ARE 664335, em 09.12.2014. Igual raciocínio, todavia, não se aplica à utilização de equipamentos de proteção coletiva eficazes, os quais, ao contrário dos equipamentos de proteção individual, bloqueiam a propagação do ruído no ambiente, impedindo a absorção pelo trabalhador, seja pelos ouvidos e estruturas condutivas, seja pela estrutura óssea da cabeça, elidindo, assim, a nocividade.
Quanto aos agentes químicos, segundo o código 1.0.0 do Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, o "que determina o direito ao benefício é a exposição do trabalhador ao agente nocivo presente no ambiente de trabalho e no processo produtivo, em nível de concentração superior aos limites de tolerância estabelecidos". Essa é a regra geral. No entanto, de acordo com o art. 236, § 1º, inciso I, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 45/10, a avaliação continua sendo qualitativa no caso do benzeno (Anexo 13-A da NR-15) e dos agentes químicos previstos, simultaneamente, no Anexo IV do Decreto nº 3.048/99 e no Anexo 13 da NR-15, como hidrocarbonetos aromáticos e cromo.
Desse modo, a partir de 06.05.1999, à exceção do benzeno e dos agentes químicos listados também no Anexo 13 da NR-15, não basta o contato com o agente, é necessário comprovar que o nível de concentração está acima dos limites de tolerância.
Quanto ao multiplicador para a conversão, deve obedecer à legislação vigente na data do requerimento administrativo, conforme entendimento firmado pelo STJ no julgamento do Recurso Especial 1.151.363/MG. Portanto, em se tratando de benefício requerido já na vigência Lei nº 8.213/91, aplica-se o fator de conversão 1,4 (homem - 25 anos de tempo especial para 35 anos de comum) ou 1,2 (mulher - 25 anos de tempo especial para 30 anos de comum).
Quanto aos períodos em que houve gozo de benefício por incapacidade, de acordo com o decidido pela 3ª Seção do TRF4, no julgamento do IRDR 8 (5017896-60.2016.4.04.0000), ocorrido em 25/10/2017, ficou estabelecida a tese jurídica de que "o período de auxílio-doença de natureza previdenciária, independentemente de comprovação da relação da moléstia com a atividade profissional do segurado, deve ser considerado como tempo especial quando o trabalhador exercia atividade especial antes do afastamento".
Por fim, entendo pertinente esclarecer algumas questões específicas da realidade vivida pelos trabalhadores da indústria calçadista do Vale do Sinos, os chamados sapateiros. Atualmente, nesta Subseção de Novo Hamburgo, tramitam milhares de ações envolvendo pedidos de reconhecimento de tempo especial referentes a empresas do ramo do calçado que estão inativas.
Conforme reportagem do jornal NH (http://www.jornalnh.com.br/_conteudo/2015/06/especial/181376-calcado-do-apogeu-aos-tempos-de-crise.html), na década de 80, os Vales do Sinos, Paranhana e Caí viveram o apogeu do setor calçadista, com sólida indústria que hoje não existe mais. Após sucessivas crises e oscilações cambiais, em especial em decorrência da concorrência com os países asiáticos, o perfil atual mudou e as exportações reduziram significativamente.
Os números são a grande prova da mudança do perfil das indústrias calçadistas. Atualmente, o Brasil é o terceiro maior produtor de calçados no mundo, e o Rio Grande do Sul respondeu por 1/3 dessa produção. Em 1985, o Vale do Sinos tinha 584 empresas, que geravam 79,7 mil empregos. Hoje, 30 anos depois, o total de fabricantes mais que dobrou, passando para 1,2 mil, mas os postos de trabalho caíram quase pela metade (41,13 mil).
De grandes empresas, a atividade passou a ser desenvolvida de modo terceirizado, em pequenos ateliês, muitas vezes improvisados nos fundos das residências.
Portanto, ainda que o estágio tecnológico atual dos maquinários cause menos danos à saúde física dos trabalhadores e implique em redução do número de empregados, é certo também que, em muitos casos, o serviço está mais precário e informal.
Voltando às décadas de 80 e 90, a prática jurisdicional nesta Subseção tem mostrado que era extremamente corriqueira a anotação em CTPS de atividade genérica, justamente porque os empregados ficavam muitas vezes vinculados apenas a um setor específico ou, então, exerciam atividades em vários deles.
Não obstante a vasta gama de atividades desenvolvidas e a dificuldade atual em especificar as atividades desenvolvidas, dada a ausência de documentação dessas empresas inativas, tenho que deva ser vista com temperamentos a exigência de precisa delimitação das atividades exercidas e dos agentes nocivos a que estavam submetidas.
Desde 2010, quando passei a atuar na Subseção de Novo Hamburgo, tenho realizado audiências com o único intuito de especificar quais as atividades exercidas por esses trabalhadores da indústria calçadista que foram registrados como ?serviços gerais? em empresas atualmente inativas. Ouço semanalmente relatos muito semelhantes, os quais dão conta de empresas calçadistas, cuja produção se dava em um mesmo pavilhão, sem qualquer separação entre os setores de trabalho (corte, costura, pré-fabricado, montagem e acabamento). Ainda que possa oscilar a forma de trabalho do setor montagem (cavaletes, esteira manual e esteira mecânica), as atividades exercidas eram as mesmas em todas as empresas calçadistas.
Era também extremamente comum que um trabalhador exercesse as mais variadas atividades em seu setor, justamente porque a mão-de-obra não era especializada. E, quando era, havia, via de regra, anotação precisa da atividade na CTPS, como, por exemplo, costureira e cortador.
Ademais, compulsando laudos da época de empresas calçadistas, pode-se verificar que, independentemente da atividade exercida, havia submissão a algum agente nocivo, notadamente ruído superior a 80 dB e hidrocarbonetos aromáticos (?cola?).
O ruído superior a 80 dB estava presente em todo o setor, atingindo, portanto, todos os trabalhadores, independentemente da atividade exercida.
Acrescente-se ao ruído, a grande probabilidade de exposição a hidrocarbonetos aromáticos: ainda que quase pareça um chavão para caracterizar a atividade especial a declaração de que o empregado ?passava cola?, é fato que, em muitos momentos do processo produtivo calçadista, passava-se cola.
A jurisprudência e doutrina têm entendido que o rol de agentes nocivos não é taxativo. De igual modo, as atividades enquadradas como especial também não podem ser limitadas àquelas elencadas pelos instrumentos normativos, sob pena de não se tutelar efetivamente o risco social que se pretende cobrir com a aposentadoria especial, qual seja, o exercício de atividade laborativa submetida a agentes nocivos à saúde e à integridade física.
Considerando, portanto, que até 28/04/1995 é possível o enquadramento por categoria profissional, presumindo-se a sujeição a agentes nocivos, entendo que a atividade no setor produtivo da indústria calçadista (?sapateiros?) deve ser considerada, por si só, especial.
Como subsídio à análise fática aqui apresentada, referente ao setor coureiro-calçadista na região do Vale do Sinos, a partir da década de 60, refiro o trabalho doutrinário ?Enfoques de uma crise: o jornal como fonte de pesquisa histórica? (in https://periodicos.ufsc.br/index.php/cadernosdepesquisa/article/viewFile/15938/16341, acesso em 08/05/2017).
Feitas essas considerações, passo ao caso concreto.
Diante da prova produzida neste processo, cabível o reconhecimento da especialidade nos seguintes períodos:
| Empresa | Inarca Indústria de Artefatos para Calçados Ltda. |
| Período requerido | 12/05/1986 a 18/11/1987, 08/12/1987 a 10/04/1991, 15/06/1992 a 12/08/1996 |
| Provas | CTPS (PA - evento 13), DSS 8030 preenchido pelo sindicato (PA - evento 13), declaração de testemunha (evento 26 - DECL2), laudo pericial similar elaborado na ação judicial 5002143-55.2011.404.7108 (evento 26 - LAUDO5) |
| Cargo/Setor | serviços gerais, auxiliar de amostras (conforme CTPS), colador de palmilhas (primeiro intervalo, conforme declaração de testemunha) |
| Enquadramento | Caracterizada a especialidade. Período de 12/05/1986 a 18/11/1987, 08/12/1987 a 10/04/1991, 15/06/1992 a 28/04/1995: enquadramento por categoria profissional (trabalhador em indústria calçadista), conforme já fundamentado.Período de 29/04/1995 a 12/08/1996: adoto como prova o laudo similar, que indica, junto às amostras, a exposição a ruído em intensidade de 82,1 dB(A), superior ao patamar de tolerância. |
| Empresa | Brochier S/A Indústria de Saltos e Calçados |
| Período requerido | 24/11/1987 a 07/12/1987 |
| Provas | CTPS (PA - evento 13), DSS 8030 preenchido pelo sindicato (PA - evento 13) |
| Cargo/Setor | serviços gerais (conforme CTPS) |
| Enquadramento | Caracterizada a especialidade. Em que pese a parte autora não ter localizado testemunha para comprovar as atividades realizadas, verifico, junto à CTPS, que consta a informação de que CBO informado na CTPS para atividade de serviços gerais corresponde a outros trabalhos em calçados, de modo que é possível o enquadramento por categoria profissional (trabalhador em indústria calçadista), conforme já fundamentado. |
| Empresa | Componentes para Calçados Alba Ltda. |
| Período requerido | 25/02/1992 a 12/06/1992, 15/10/1996 a 02/05/2002 |
| Provas | CTPS (PA - evento 13), DSS 8030 preenchido pelo sindicato (PA - evento 13), laudo pericial similar elaborado na ação 5017881-83.2011.4.04.7108 (evento 26 - LAUDO6) |
| Cargo/Setor | conformador, encarregado produção turno misto (conforme CTPS) |
| Enquadramento | Caracterizada a especialidade. Período de 25/02/1992 a 12/06/1992: enquadramento por categoria profissional (trabalhador em indústria calçadista), conforme já fundamentado. Período de 15/10/1996 a 02/05/2002: adoto como prova o laudo similar, que indica, para atividade de encarregado de setor de produção, o contato com hidrocarbonetos, o que, sem o uso comprovado de EPI eficaz, permite o enquadramento, conforme Anexo 13 da NR-15 (cuja avaliação se dá de modo qualitativo). |
Porém, não é possível o enquadramento dos seguintes períodos:
| Empresa | Palmisinos Componentes para Calçados Ltda. |
| Período requerido | 29/07/2002 a 18/11/2002 |
| Provas | CTPS (PA - evento 13), PPP sem indicação de responsável técnico (PA - evento 13), laudo técnico (PA - evento 13) |
| Cargo/Setor | chefe/corte (conforme PPP) |
| Conclusão | Não caracterizada a especialidade, pois o PPP, corroborado pelo laudo técnico, indica a exposição apenas a ruído, em intensidade de 86,6 dB(A), inferior ao patamar de tolerância, o que impede o enquadramento. |
| Empresa | Gerson W. Wolf |
| Período requerido | 19/11/2002 a 23/05/2005 |
| Provas | CTPS (PA - evento 13), PPP com indicação de responsável técnico (PA - evento 13), laudo técnico (PA - evento 13) |
| Cargo/Setor | encarregado/conformação (conforme PPP) |
| Conclusão | Não caracterizada a especialidade, pois o laudo técnico, indica a exposição apenas a ruído, em intensidade de 83 dB(A), inferior ao patamar de tolerância, o que impede o enquadramento. |
Diante dos períodos acima reconhecidos, conclui-se que a parte autora laborou em atividade especial por 14 anos e 11 dias.
Aposentadoria por tempo de contribuição
A aposentadoria por tempo de serviço/contribuição é regulada pelas disposições vigentes na data em que o segurado implementa todos os requisitos necessários para a sua concessão.
Até 16/12/98, segundo as disposições da Lei nº 8.213/91, para ter direito à aposentadoria por tempo de serviço, era necessário que o segurado preenchesse os seguintes requisitos:
a) carência e tempo de serviço mínimo de 30 (trinta) anos, para o segurado homem;
b) carência e tempo de serviço mínimo de 25 (vinte e cinco) anos, para a segurada mulher.
A partir de 16/12/98, data da promulgação da Emenda Constitucional nº 20/98, os requisitos passaram a ser os seguintes:
a) para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição proporcional (regida pelas regras de transição do art. 9º da EC 20/98) :
- ao segurado homem: idade mínima de 53 anos, tempo de contribuição mínimo de 30 anos mais pedágio (equivalente a 40% do período que faltava para atingir o tempo referente à aposentadoria proporcional na data da publicação da Emenda), e carência;
- à segurada mulher: idade mínima de 48 anos, tempo de contribuição mínimo de 25 anos mais pedágio (equivalente a 40% do período que faltava para atingir o tempo referente à aposentadoria proporcional na data da publicação da Emenda), e carência;
b) para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição integral (regida pelas disposições permanentes da Constituição Federal de 1988, na redação dada pela Emenda Constitucional nº 20/98):
- ao segurado homem: tempo de contribuição mínimo de 35 anos e carência;
- à segurada mulher: tempo de contribuição mínimo de 30 anos e carência.
A carência exigida é de 180 meses a partir de 2011 e, antes disso, observa a tabela de transição do artigo 142 da Lei n.º 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 9.032/95.
Diante disso, tendo o segurado direito à aposentadoria por tempo de contribuição em mais de uma das datas-base consideradas (em 16/12/98, em 28/11/99 ou na data do protocolo do requerimento administrativo), tem direito a que for mais vantajosa, cabendo à autarquia previdenciária implantar a que assim o for.
No caso concreto, tem-se a seguinte situação à época da DER:
| CÁLCULO DO TEMPO DE SERVIÇO | ANOS | MESES | DIAS |
| Tempo reconhecido pelo INSS até a DER | 28 | 08 | 17 |
| Acréscimo decorrente da atividade especial reconhecida em sentença | 05 | 11 | 18 |
| TEMPO TOTAL | 34 | 08 | 05 |
Diante disso, verifica-se que a parte autora não faz jus à aposentadoria por tempo de serviço/contribuição de acordo com as regras vigentes na DER nem conforme as regras precedentes à EC 20/98.
Contagem das contribuições vertidas após o requerimento administrativo - reafirmação da DER
Quando não atingido tempo suficiente para aposentação na DER, é possível somar as contribuições vertidas após a data do requerimento administrativo, desde que devidamente registradas no CNIS. Nesse caso, haverá a reafirmação da DER, nos termos do artigo 690 da Instrução Normativa 77/2015 e do artigo 493 do CPC.
A 3ª Seção do TRF da 4ª Região, em julgamento de Incidente de Assunção de Competência, entendeu que, caso ainda não implementado tempo suficiente para o benefício previdenciário na data do ajuizamento da ação, excepcionalmente seria cabível o cômputo dos períodos até a data da sentença ou do julgamento da apelação, desde que devidamente registrados no CNIS (TRF4 5007975-25.2013.4.04.7003, Quinta Turma, Rel. Paulo Afonso Brum Vaz, D.E. 18/04/2017).
O STJ, por sua vez, ao julgar o tema 995, cuja publicação ocorreu em dezembro de 2019, assentou a seguinte tese:
É possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir.
No presente caso verifico que, após a DER (11/12/2017), a parte autora possui recolhimentos regulares como contribuinte individual. Assim, somadas as contribuições vertidas entre a DER, e a última contribuição anterior ao ajuizamento da ação (competência de 07/2019), há um acréscimo de 01 ano, 07 meses e 20 dias ao tempo de contribuição, totalizando 36 anos, 03 meses e 25 dias.
Diante disso, verifica-se que a parte autora faz jus à aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, de acordo com as regras vigentes na DER.
Dessa forma, impõe-se o deferimento do pedido de concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, devendo simular a renda mensal de acordo com as regras aplicáveis ao caso, a fim de que a parte autora opte por aquele benefício que lhe for mais vantajoso. Deverá, inclusive, verificar a possibilidade de aposentadoria nos termos do atual art. 29-C da Lei 8213/91 (?regra 85/95?).
Opção pelo melhor benefício
Caso a parte queira indicar outra data, em que faça jus ao que entende ser o melhor benefício, mediante reafirmação da DER, fica facultada a sua opção, desde que atingidos os requisitos legais do art. 29-C da Lei 8213/91, para concessão do benefício.
Data de início do benefício
Considerando a necessidade de reafirmação da DER para o deferimento do benefício, a DIB será a data da reafirmação da DER (15/08/2019, data do ajuizamento) ou outra data a ser indicada pela parte autora, nos termos do item acima, caso implementados os requisitos para aposentação.
Danos morais
Rejeita-se o pedido de indenização por danos morais, haja vista a não demonstração de qualquer dano concreto sofrido pelo autor imputável à conduta administrativa de indeferir o pedido de aposentação.
É de ressaltar que não se pode banalizar a reparação do dano moral a ponto de se pretender compensar todo e qualquer desconforto ocorrido no cotidiano. Não comprovado o dano moral advindo do indeferimento do benefício, é indevida a indenização pelo alegado abalo (TRF4, AC 5000416-83.2010.404.7015, Sexta Turma, Relatora p/ Acórdão Luciane Merlin Clève Kravetz, juntado aos autos em 27/09/2013) - sem grifo no original.
Consectários legais
A atualização monetária e os juros de mora deverão observar o constante no Manual de Cálculos da Justiça Federal.
Em especial, refiro que a atualização monetária, que incide a contar do vencimento de cada prestação, deverá observar os seguintes índices: IGP-DI (maio de 1996 a agosto de 2006 - MP 1415/96 e Lei 10.192/01) e INPC (a contar de abril de 2006 - Lei 10.741/03, MP 316/06 e Lei 11.430/06).
Os juros de mora devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, a contar da citação, com base no art. 3º do Decreto-Lei n.º 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 do TRF da 4ª. Região.
A contar de 30/06/2009, data em que entrou em vigor a Lei n.º 11.960/09, que alterou o art. 1.º-F da Lei n.º 9.494/97, os juros de mora devem ser calculados com base nos índices oficiais de remuneração básica da caderneta de poupança, em uma única incidência. E, a partir de maio de 2012, deverá incidir o mesmo percentual de juros incidentes sobre a caderneta de poupança, capitalizados de forma simples, correspondentes a 0,5% ao mês, caso a taxa SELIC ao ano seja superior a 8,5%, ou 70% da taxa SELIC ao ano, mensalizada, nos demais casos (art. 1º-F da Lei 9494/97, Lei 8177/91, MP 567/12, Lei 12.703/12).
Quanto à atualização monetária, a despeito das alterações trazidas pela Lei nº 11.690/09, o Supremo Tribunal Federal decidiu, por maioria, após repercussão geral reconhecida no Recurso Extraordinário n.º 870947 (Tema 810), pela inconstitucionalidade da incidência da Taxa Referencial para atualização das condenações fazendárias também no período anterior à expedição da requisição de pagamento, mantendo, contudo, os juros conforme estabelecido pela legislação para as dívidas não-tributárias. Os embargos de declaração que haviam concedido efeito suspensivo à decisão do RE nº 870.947 foram rejeitados. Portanto, cabível a aplicação imediata da decisão do STF.
Quanto ao índice a ser aplicado, ainda em 22 de fevereiro de 2018, o Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, julgou o Recurso Especial n.º 1.495.146, afetado ao rito dos recursos repetitivos e antes suspenso para aguardar a decisão do STF, esclarecendo os índices atuais de correção monetária a serem utilizados. Especificamente quanto às condenações de natureza previdenciária, estabeleceu:
As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).
Destaca-se, por fim, que, havendo alteração legislativa, aplicam-se os índices de correção monetária e de juros que substituírem os ora fixados, haja vista que o segurado possui direito à correção de todas as parcelas pagas intempestivamente, mas não há imposição constitucional do emprego de qualquer índice para que se realize essa atualização, devendo esta obedecer, em princípio, ao disposto na legislação ordinária.
Tutela de urgência
O artigo 300 do novo CPC estabelece que cabe a concessão da tutela de urgência quando houver probabilidade do direito alegado e perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
Em face desta sentença de procedência e do caráter alimentar do benefício previdenciário a ser concedido, concedo a tutela de urgência a fim de que o INSS implante-o, devendo juntar ao processo comprovante de sua implantação/restabelecimento.
Caberá ao réu calcular o valor da RMI, sendo que eventual discordância a este respeito será solvida posteriormente, em sede de execução.
2.2. Cerceamento de Defesa
O apelante alega a ocorrência de cerceamento de defesa, pois o juízo a quo não teria apreciado o pedido de produção de prova pericial, a qual visava demonstrar a exposição a agentes químicos no período controverso.
A preliminar não merece acolhida.
O juiz é o destinatário da prova (art. 370 do CPC) e, como tal, pode indeferir as diligências que entender inúteis ou meramente protelatórias. No caso, a análise da especialidade foi realizada com base nos documentos técnicos fornecidos pela própria empregadora (PPP e laudo técnico), os quais são, em regra, suficientes para a comprovação das condições de trabalho. A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de que, havendo PPP e laudo técnico idôneos, a realização de perícia judicial é desnecessária.
A mera alegação de que o PPP é documento unilateral, sem a indicação de vícios concretos e evidentes que infirmem seu conteúdo, não é suficiente para justificar a produção de prova pericial, mormente quando o formulário se encontra corroborado pelo laudo técnico da empresa.
Portanto, não havendo demonstração de efetivo prejuízo ou da indispensabilidade da prova pericial para o deslinde da causa, afasto a preliminar de cerceamento de defesa.
2.3. Análise do mérito
A) Atividade Especial - Período de 19/11/2002 a 23/05/2005
No mérito, o apelante postula o reconhecimento da especialidade do labor prestado na empresa Gerson W. Wolf, no período de 19/11/2002 a 23/05/2005.
A sentença de primeiro grau, ao analisar as provas dos autos, concluiu pela não caracterização da especialidade, pois o laudo técnico da empresa indicou exposição a ruído em intensidade de 83 dB(A), nível inferior ao limite de tolerância vigente à época, que era de 85 dB(A) (Decreto nº 4.882/03).
O recorrente insiste na tese de exposição a agentes químicos, argumentando que o PPP menciona tal exposição de forma genérica e que um laudo similar, juntado como prova emprestada, atestaria a presença desses agentes.
A irresignação não prospera.
Conforme bem apontado pelo magistrado sentenciante, o laudo técnico específico da empresa, que embasou o PPP, não constatou a presença de agentes químicos para a atividade exercida pelo autor. A simples menção genérica a "agentes químicos" no PPP, sem qualquer especificação e em contradição com o laudo técnico da própria empresa, não é suficiente para o reconhecimento da especialidade.
Ademais, a prova emprestada (laudo similar), embora admissível em certas hipóteses, não pode se sobrepor a um laudo técnico específico do ambiente de trabalho do segurado. Seu uso é cabível, comumente, para comprovar a especialidade em empresas inativas, o que não é o caso dos autos. Havendo documentação técnica da própria empresa, esta deve prevalecer.
Assim, à míngua de provas robustas que demonstrem a efetiva exposição a agentes químicos nocivos de forma habitual e permanente, deve ser mantida a conclusão da sentença que afastou a especialidade do período.
B) Reafirmação da DER
Por fim, o apelante se insurge contra o marco inicial do benefício, fixado na data do ajuizamento da ação (15/08/2019), pleiteando sua retroação para 01/04/2017, momento em que alega ter implementado os requisitos no curso do processo administrativo.
A questão da reafirmação da DER foi pacificada pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Tema 995, que firmou a seguinte tese:
É possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir.
No caso dos autos, a sentença, em consonância com o referido precedente, verificou que o autor não possuía tempo suficiente na DER original (11/12/2017). Procedeu, então, à soma das contribuições vertidas posteriormente e constatou que os requisitos para a aposentadoria foram preenchidos apenas com as contribuições recolhidas até a data do ajuizamento da ação (15/08/2019), momento em que o autor totalizou 36 anos, 03 meses e 25 dias de tempo de contribuição.
A alegação do apelante de que teria implementado os requisitos em 01/04/2017 não encontra respaldo no cálculo de tempo de contribuição efetuado na sentença, o qual se mantém hígido, uma vez que não foi reconhecido o período especial controvertido. Com efeito, na DER (11/12/2017), o autor contava com 34 anos, 8 meses e 5 dias. Para atingir os 35 anos necessários, faltavam, portanto, aproximadamente 4 meses de contribuição, o que só foi implementado após a DER. A data de 15/08/2019, data do ajuizamento, foi o marco eleito pelo juízo de origem como aquele em que, indubitavelmente, os requisitos estavam preenchidos, sendo esta a data correta para o início do benefício e dos respectivos efeitos financeiros.
Dessa forma, a sentença não merece reparos, devendo ser integralmente mantida.
2.4. Consectários, Honorários e Prequestionamento
I. Consectários Legais. Os consectários legais devem ser fixados nos termos que vierem a ser definidos pelo STF no julgamento do Tema 1170. No que tange à correção monetária, até 08/12/2021, deve ser aplicado o INPC (Lei 11.430/06). A partir de 09/12/2021, incidirá a taxa SELIC, para todos os fins (correção, juros e compensação da mora), conforme o art. 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021.
II. Honorários Advocatícios Recursais. Vencido o apelante, majoro em 10% o valor dos honorários advocatícios fixados na sentença, conforme o art. 85, § 11, do CPC, observada a suspensão da exigibilidade em razão da gratuidade de justiça
III. Prequestionamento. Para fins de acesso às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as questões e os dispositivos legais invocados pelas partes, nos termos dos artigos 1.022 e 1.025 do CPC, evitando-se a oposição de embargos de declaração com propósito de prequestionamento.
3. DISPOSITIVO
Por todo o exposto, voto por negar provimento ao apelo.
Documento eletrônico assinado por MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005392724v3 e do código CRC a9c6b020.
Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRAData e Hora: 05/11/2025, às 15:30:48
Conferência de autenticidade emitida em 12/11/2025 04:10:35.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Apelação Cível Nº 5015698-61.2019.4.04.7108/RS
RELATOR Juiz Federal MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. AGENTES QUÍMICOS. AUSÊNCIA DE PROVA DA EXPOSIÇÃO. PPP. LAUDO TÉCNICO. PROVA EMPRESTADA. INSUFICIÊNCIA. REAFIRMAÇÃO DA DER. TEMA 995/STJ. MARCO INICIAL. DATA DO IMPLEMENTO DOS REQUISITOS. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.
1. Não há falar em cerceamento de defesa pelo indeferimento de prova pericial quando os documentos técnicos juntados aos autos (PPP e laudo técnico da empresa) são suficientes para a análise da especialidade do labor, cabendo ao magistrado, destinatário da prova, indeferir as diligências que entender protelatórias ou desnecessárias.
2. Para o reconhecimento da especialidade do labor, a prova da exposição aos agentes nocivos deve ser robusta. Havendo Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) e laudo técnico da empresa indicando exposição a ruído em nível inferior ao limite de tolerância e ausência de outros agentes, não há como reconhecer a especialidade, ainda que o formulário mencione genericamente a existência de "agentes químicos" sem especificá-los.
3. A prova emprestada (laudo similar) somente pode ser utilizada para suprir a ausência de documentação da empresa, não para se sobrepor a laudo técnico específico do ambiente de trabalho do segurado, que prevalece por retratar as condições fáticas do local.
4. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema 995, definiu que é possível a reafirmação da DER para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso ocorra no curso da ação judicial, estabelecendo-se a data do implemento dos requisitos como marco inicial para fins de pagamento. Mantida a reafirmação da DER para a data do ajuizamento da ação, por ser este o momento em que, comprovadamente, foram implementados os requisitos nos autos, conforme apurado em primeiro grau.
5. Apelação da parte autora desprovida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Central Digital de Auxílio 2 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao apelo, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 04 de novembro de 2025.
Documento eletrônico assinado por MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005392759v5 e do código CRC 91e858dd.
Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRAData e Hora: 05/11/2025, às 15:30:48
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO PRESENCIAL DE 04/11/2025
Apelação Cível Nº 5015698-61.2019.4.04.7108/RS
RELATOR Juiz Federal MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA
PRESIDENTE Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
PROCURADOR(A) JOÃO GUALBERTO GARCEZ RAMOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Presencial do dia 04/11/2025, na sequência 310, disponibilizada no DE de 22/10/2025.
Certifico que a Central Digital de Auxílio 2, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A CENTRAL DIGITAL DE AUXÍLIO 2 DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO APELO.
RELATOR DO ACÓRDÃO Juiz Federal MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA
Votante Juiz Federal MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA
Votante Juíza Federal DIENYFFER BRUM DE MORAES FONTES
Votante Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
MÁRCIA CRISTINA ABBUD
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 12/11/2025 04:10:35.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas