
Apelação Cível Nº 5021346-95.2014.4.04.7205/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: CARLOS ROBERTO IMHOF
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de apelação cível interposta pela autora contra sentença, publicada em 19/02/2015, que julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial e condenou-a ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa, além de custas processuais, suspensa a exigibilidade das verbas, por ser beneficiária de assistência judiciária gratuita (evento 24).
Em suas razões recursais, a parte autora pretende a reforma do decisum para que seja reconhecida a especialidade do labor nos períodos de 01/02/1992 a 17/11/92, 13/12/1996 a 01/02/2000 e 17/04/2000 a 29/02/2012, com a consequente concessão da aposentadoria especial. Sucessivamente, requer a reafirmação da DER, com cômputo de tempo de contribuição posterior ao protocolo administrativo, para fins de deferimento da aposentadoria especial, ou a implantação da aposentadoria por tempo de contribuição (evento 33).
Sem contrarrazões, foram os autos remetidos a esta Corte para julgamento do recurso.
É o relatório.
VOTO
Atividade urbana especial
Trata-se de demanda previdenciária destinada ao reconhecimento do tempo de serviço prestado sob condições especiais, com a consequente concessão de APOSENTADORIA ESPECIAL, regulamentada no artigo 57 da Lei nº 8.213/91, ou, mediante a conversão daquele(s) interregno(s) para comum, com a concessão de APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO, prevista nos artigos 52 e 53, I e II, da Lei de Benefícios e artigo 9º, § 1º, I, "a" e "b", da Emenda Constitucional nº 20, de 1998.
A natureza da atividade é qualificada pela lei vigente à época da prestação do serviço, sem aplicação retroativa de norma ulterior que nesse sentido não haja disposto (RE nº 174.150-3/RJ, Relator Ministro Octávio Gallotti, DJ 18/08/2000). Também por força do princípio tempus regit actum, o modo de comprovação da atividade especial é orientado pela lei vigente ao tempo da prestação do serviço. A partir dessa premissa geral, articulam-se as seguintes diretrizes para o presente julgado:
a) Para as atividades exercidas até 28/04/1995, véspera da vigência da Lei nº 9.032/95, é possível o reconhecimento do tempo de atividade especial pelo pertencimento à determinada categoria profissional ou pela exposição aos agentes nocivos, nos termos previstos pelos decretos regulamentares. Por outro lado, em razão do caráter protetivo ao trabalhador, é de ser reconhecida a natureza qualificada da atividade ainda que as condições que prejudicam sua saúde ou integridade física não se encontrem expressas em determinado regulamento (inteligência da Súmula nº 198 do extinto TFR).
b) Após a vigência da Lei nº 9.032/95, em 29/04/1995, a concessão da aposentadoria especial pressupõe a comprovação, pelo segurado, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física (Lei nº 8.213/91, art. 57, § 3º). Sem embargo, para a caracterização da especialidade não se reclama exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, sendo suficiente que o trabalhador, em cada dia de labor, esteja exposto a agentes nocivos em período razoável da jornada (salvo exceções, v.g., periculosidade) (TRF4, EINF nº 0010314-72.2009.404.7200, Terceira Seção, Relator Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07/11/2011).
c) Para as atividades desempenhadas a partir de 06/03/1997, com a vigência do Decreto nº 2.172, a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos se dá mediante formulário, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho (Lei nº 8.213/91, art. 58, § 1º) (TRF4, AC nº 2002.71.07.001611-3, Quinta Turma, Relator Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07/07/2008).
d) Em relação aos agentes nocivos físicos ruído, frio e calor, é necessária a apresentação de laudo técnico independentemente do período de prestação da atividade, dada a necessidade de medição da intensidade desses agentes nocivos. De qualquer modo, a partir de 01/01/2004, é suficiente a apresentação de Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, elaborado conforme as exigências legais (TRF4, EINF nº 0010314-72.2009.404.7200, Terceira Seção, Relator Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07/11/2011).
e) A extemporaneidade do laudo pericial não lhe retira a força probatória, em face da presunção de conservação do anterior estado de coisas, que deve operar desde que não evidenciada a alteração das condições de trabalho. A rigor, dada a evolução das normas de proteção ao trabalhador e em face das inovações tecnológicas, é plausível a tese de que, à época da prestação do serviço, as condições ambientais eram ainda mais ofensivas à saúde do trabalhador (TRF4, EINF 0031711-50.2005.404.7000, Terceira Seção, Relator Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, D.E. 08/08/2013).
f) O limite de tolerância para ruído é de 80 dB(A) até 05/03/1997; 90 dB(A) de 06/03/1997 a 18/11/2003; e 85 dB(A) a partir de 19/11/2003 (STJ, RESP nº 1.398.260/PR, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014, julgamento proferido de acordo com a sistemática de representativo de controvérsia - CPC, art. 543-C).
g) Quanto aos efeitos da utilização do equipamento de proteção individual, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial. Todavia, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria (ARE nº 664.335, Relator Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 04/12/2014, DJ 12/02/2015). Deve-se observar, contudo, que a adoção de EPI não deve ser considerada para fins de caracterização da atividade especial em tempo anterior a 03/12/1998, visto que esta exigência apenas foi disposta pela MP nº 1.729/98, convertida na Lei nº 9.732/89 (IN INSS/PRES nº 77/2015, art. 279, §6º).
h) A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico vigente à época da prestação do serviço (STJ, EDcl no RESP nº 1.310.034/PR, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 26/11/2014, DJ 02/02/2015, julgamento proferido de acordo com a sistemática de representativo de controvérsia - CPC, art. 543-C). Dessa forma, é possível a conversão do tempo especial em comum mesmo para as atividades exercidas anteriormente à vigência da Lei nº 6.887/80, ao passo que a conversão do tempo comum em especial é apenas possível para o segurado que cumpriu os requisitos para aposentadoria especial até a vigência da Lei nº 9.032/95. O Egrégio STJ firmou entendimento, em recurso repetitivo representativo de controvérsia (RESP nº 1.151.363), que é possível a conversão de tempo de serviço especial em comum mesmo após 1998, já que a última reedição da MP nº 1.663, parcialmente convertida na Lei nº 9.711/98, suprimiu a parte do texto das edições anteriores que revogava o § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
i) Segundo pacífica jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (ED no RE 567360, Rel. Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, DJe de 06-08-2009; RE nº 262082, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, DJ de 18-05-2001), em matéria previdenciária, para a análise das condições da inativação, a lei de regência é aquela vigente no tempo em que implementados os requisitos legais para a concessão do benefício, consoante o princípio tempus regit actum. Assim, nos casos em que os requisitos para a aposentadoria se perfectibilizaram sob a égide da legislação anterior, quando vigia o Decreto 83.080, de 24-01-1979, o fator de conversão a ser aplicado é 1,2. No entanto, quando os requisitos da aposentadoria forem implementados durante a vigência da Lei nº 8.213, de 24-07-1991, que prevê o fator de conversão 1,4, este é o fator a ser aplicado em todo o período laboral.
Exame do tempo especial no caso concreto
A questão pertinente à análise da nocividade das condições ambientais do trabalho prestado pela parte autora foi percucientemente examinada pela juíza a quo na sentença, razão pela qual, a fim de evitar tautologia, reproduzo os seus fundamentos, os quais adoto como razões de decidir (evento 24):
Para comprovar a especialidade da atividade desenvolvida nos períodos acima o autor apresentou os seguintes documentos:
a) período de 01-02-1992 a 17-11-1992 na empresa Lince Participações e Empreendimentos Ltda, como auxiliar de enfermagem:
No EVENTO 1 - PROCADM 7 - fls. 02 03 consta PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário, datado de 16-11-2011, que informa a exposição do autor aos agentes agressivos biológico (vírus e bactérias), com fornecimento de equipamento de proteção individual eficaz (CA 19078), com a seguinte descrição das atividades "Atender todas as pessoas que procuram o ambulatório, auxiliar o médico nos exames necessários e pequenas cirurgias, orientar os pacientes na utilização dos medicamentos, encaminhar para exames de laboratório, marcar e registrar consultas."
O autor acostou Levantamento Ambiental da empresa acima, datado de 1995 (EVENTO 1 – PROCADM 6 – fls. 16 e 17 e PROCADM 7 – fl. 01 e fls. 05 a 07), com a seguinte descrição das atividades:
"ATIVIDADE DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO MÉDICO, ROTINAS CLÍNICAS/AMBULATORIAIS, COM POSSIBILIDADE DE OCORRER CONTAMINAÇÃO INFECTO CONTAGIOSA, TIPICO NA EXECUÇÃO DAS TAREFAS DE ATENDIMENTO AOS FUNCIONÁRIOS. AGENTE AGRESSIVOS É O BIOLÓGICO."
b) período de 13-12-1996 a 01-02-2000 na empresa Santa Isabel Cardiologia Intervencionista S/C Ltda, na função de auxiliar de enfermagem
O autor acostou o PPP – Perfil Profissiográfico Previdenciário do EVENTO 1 – PROCADM 7 – fls. 08 e 09 que indica a sua exposição a agentes agressivos radiações ionizantes, álcool 70%, degermante povidine, álcool iodado, clorexidine degermante, vírus (HIV, hepatite B e C) e bacilo do tétano e consigna que o autor trabalhava na sala de exames, auxiliando na preparação da sala, dos materiais, na administração de medicamentos, na realização do exame e de curativos, se necessário.
c) período de 17-04-2000 a 29-02-2012, na empresa Sociedade Divina Providência Hospital Santa Isabel, na função de auxiliar de enfermagem
O autor acostou o PPP – Perfil Profissiográfico Previdenciário do EVENTO 1 – PROCADM 6 – fls. 11 e 12 que indica a sua exposição a agentes agressivos “vírus, bactérias e bacilos”, com a seguinte descrição das atividades desempenhadas:
14.1 - Período 17/04/2000 a 31/12/2005 LTCAT 2004
Auxiliar na realização dos exames e circular na sala, executando as diversas atividades normais de enfermagem.
14.1 - Período 01/01/2006 a ATUAL LTCAT 2011
Admitir e preparar os pacientes para o procedimento indicado: realizar punção venosa, verificar sinais vitais, realizar orientações referentes ao exame indicado; Participar do trans-operatório auxiliando o médico na realização do procedimento (circular e/ou instrumentar). Atender o paciente no pós-operatório, retirar o introdutor arterial ou venoso; realizar compressão hemostática da artéria, realizar curativo, digitação de gastos, realizar evolução de enfermagem e passar plantão a equipe do setor do paciente. Oferecer e auxiliar quanto à dieta; Realizar a limpeza e preparo dos materiais (órtese e prótese) e instrumentais cirúrgicos e encamihá-los para a central de esterilização ou acondicioná-los em caixa própria para esterilização por empresa terceirizada."
O autor acostou Laudo Técnico das Condições Ambientais de Trabalho da empresa acima, datados de 2011 (EVENTO 1 – PROCADM 7 – fls. 14 a 20 e PROCADM 8 – fls. 01 a 14 e LAU 19), de 2004 (EVENTO 1 – PROCADM 8 – fls. 15 a 25 e PROCADM 9 – fls. 01 a 30 e LAU 18), laudo técnico pericial, datado de 1999 (EVENTO 1 – PROCADM 9 – fl. 31 e PROCADM 10 – fls. 01 a 11). E, no EVENTO 1 – LAU 15 a 17 o autor acostou também Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho – LTCAT da empresa “Centro de Diagnose Cardiovascular S/S” consignando na inicial que “nas observações constantes do PPP, este foi preenchido com base no LTCAT atual da empresa Centro de Diagnose Cardiovascular SS, de mesma atividade econômica e proprietário, e que, como não há registro dos CA’s dos EPI’s fornecidos na época, foram informados os utilizados atualmente.” (EVENTO 1 – INIC 1 – fl. 03).
Com efeito, os agentes agressivos presentes nos locais de trabalho do autor são Agentes Biológicos constantes no Anexo do Decreto 53.831/64 sob o código 1.3.2; Anexo I do Decreto 83.080/79 sob o código 1.3.4; Anexo IV do Decreto 2.172/97 sob o código 300; e, Anexo IV do Decreto 3.048/99 sob o código 300.
Como se vê, a análise do acervo probatório comprova o exercício de atividade especial pela parte autora nos intervalos de 01/02/1992 a 17/11/92, 13/12/1996 a 01/02/2000 e 17/04/2000 a 29/02/2012, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição a agentes biológicos, bem como em face do enquadramento por categoria profissional, este limitado a 28/04/1995.
Ao contrário do que entendeu a julgadora, a sujeição ao agente nocivo, para configurar a especialidade da atividade, não necessita ocorrer durante todos os momentos da jornada de trabalho. Basta que seja diuturna e contínua, que o trabalhador esteja exposto ao agente agressivo em período razoável da sua prestação laboral, que a desempenhe expondo sua saúde à nocividade das condições ambientais do serviço. Sobre a questão, assim se manifestou este Regional:
"EMBARGOS INFRINGENTES. ATIVIDADE ESPECIAL. INSALUBRIDADE. COMPROVAÇÃO. EXPOSIÇÃO HABITUAL E PERMANENTE RUÍDOS ACIMA DE 80 Db. Prevaleceu o entendimento de que a exposição habitual e permanente a ruídos superiores a 80 dB caracteriza atividade especial, segundo o Decreto nº 53.831/64, deve ser aplicado o limite mais favorável ao segurado. Não há falar em eventualidade e intermitência, se a exposição ao agente nocivo é não-eventual, diurna e contínua; mesmo que durante parte de sua jornada de trabalho não haja contato ou presença de agentes insalutíferos, o trabalhador tem direito ao cômputo do tempo de serviço especial." (EIAC nº 2000.04.01.088061-6/RS, Relator Juiz Federal Fernando Quadros da Silva, 3ª Seção, DJU 03-03-2004).
"PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. ATIVIDADE ESPECIAL. INSALUBRIDADE. COMPROVAÇÃO. EXPOSIÇÃO HABITUAL E PERMANENTE. PERÍODO ANTERIOR A ABRIL DE 1995. INSTALADOR HIDRÁULICO JUNTO A HOSPITAL. 1) Para caracterizar a especialidade, não há necessidade de haver exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral. Habitualidade e permanência hábeis para os fins visados pela norma - que é protetiva - devem ser analisadas à luz do serviço cometido ao trabalhador, cujo desempenho, não descontínuo ou eventual, exponha sua saúde à prejudicialidade das condições físicas, químicas, biológicas ou associadas que degradam o meio ambiente do trabalho, como no caso de hospital. (...)" (EINF nº 2004.71.00.028482-6, Relator Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, 3ª Seção, D.E. 08/01/2010).
Deve-se lembrar, ademais, que o Decreto nº 4.882/03 alterou o Decreto nº 3.048/99, o qual, para a aposentadoria especial, em seu art. 65, passou a considerar trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais, aquele cuja exposição ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, o que ocorre no caso vertente.
Esta Corte, ao julgar os EINF nº 0010314-72.2009.404.7200 (Relator Des. Federal Celso Kipper, Terceira Seção, D.E. 07/11/2011), decidiu que Para caracterização da especialidade não se reclama exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, sendo suficiente que o trabalhador, em cada dia de labor, esteja exposto a agentes nocivos em período razoável da jornada. De fato, Os requisitos da habitualidade e da permanência devem ser entendidos como não-eventualidade e efetividade da função insalutífera, continuidade e não-interrupção da exposição ao agente nocivo. A intermitência refere-se ao exercício da atividade em local insalubre de modo descontínuo, ou seja, somente em determinadas ocasiões. Se o trabalhador desempenha diuturnamente suas funções em locais insalubres, mesmo que apenas em metade de sua jornada de trabalho, tem direito ao cômputo do tempo de serviço especial, porque estava exposto ao agente agressivo de modo constante, efetivo, habitual e permanente (TRF/4, AC nº 2000.04.01.073799-6, 6ª Turma, Relator Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, DJU 09/05/2001).
Conforme dispõe a NR nº 15 do MTE, ao tratar da exposição a agentes biológicos em seu Anexo nº 14, são insalubres as atividades desempenhadas em hospitais, serviços de emergência, enfermarias, ambulatórios, postos de vacinação e outros estabelecimentos destinados aos cuidados da saúde humana, quando houver contato direto com pacientes ou objetos por estes utilizados. Analisadas as atividades desenvolvidas pelo autor, descritas nos formulários PPP e laudos acima referidos, conclui-se que era ínsito ao labor a realização de procedimentos e atividades diárias que o expunham a sangue e secreções, suficientes para configurar exposição a agentes biológicos e caracterizar risco à saúde do trabalhador, tais como vírus, bactérias, protozoários, bacilos, parasitas, fungos e outros microorganismos.
Com efeito, A exposição de forma intermitente aos agentes biológicos não descaracteriza o risco de contágio, uma vez que o perigo existe tanto para aquele que está exposto de forma contínua como para aquele que, durante a jornada, ainda que não de forma permanente, tem contato com tais agentes (TRF4, APELREEX 5002443-07.2012.404.7100, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão João Batista Pinto Silveira, juntado aos autos em 26/07/2013).
A Turma Nacional de Uniformização, sobre o tema debatido, já sinalizou que, no caso de agentes biológicos, o conceito de habitualidade e permanência é diverso daquele utilizado para outros agentes nocivos, pois o que se protege não é o tempo de exposição (causador do eventual dano), mas o risco de exposição a agentes biológicos. (PEDILEF nº 0000026-98.2013.490.0000, Relator Juiz Federal Paulo Ernane Moreira Barros, DOU 25/04/2014, páginas 88/193).
Não é demais dizer que somente com o advento da Lei nº 9.032 é que se tornou necessária a comprovação da exposição habitual e permanente ao agente nocivo para fins de cômputo de tempo especial, o que seria suficiente para acolher a pretensão quanto ao reconhecimento da insalubridade no intervalo de 01/02/1992 a 17/11/92. A partir de então, a submissão aos agentes agressivos encontra respaldo nos laudos da empresa e nos formulários PPP, elaborados com base em monitoração do ambiente de trabalho do autor.
Por fim, não obstante também realizasse tarefas administrativas, é possível afirmar que em razoável parcela da sua jornada de trabalho o autor diuturna e continuamente estava em contato com agentes biológicos no ambiente de trabalho.
A regra contida no art. 290 da IN nº 77/2015 do INSS dispõe que O exercício de funções de chefe, gerente, supervisor ou outra atividade equivalente e servente, desde que observada a exposição a agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes, não impede o reconhecimento de enquadramento do tempo de serviço exercido em condições especiais.
De igual modo, a tese de que a nocividade do trabalho foi neutralizada pelo uso de EPIs não se sustenta. A um, porque a utilização de equipamentos de proteção individual é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 03 de dezembro de 1998, conforme já referido. A dois, porque o Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, deixou assentado que O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial (ARE nº 664.335, Tribunal Pleno, Relator Ministro Luiz Fux, DJE 12/02/2015).
Todavia, o simples fornecimento do EPI pelo empregador não exclui a hipótese de exposição do trabalhador aos agentes nocivos à saúde. É preciso que, no caso concreto, estejam demonstradas a existência de controle e periodicidade do fornecimento dos equipamentos, a sua real eficácia na neutralização da insalubridade ou, ainda, que o respectivo uso era, de fato, obrigatório e continuamente fiscalizado pelo empregador. Tal interpretação, aliás, encontra respaldo no próprio regramento administrativo do INSS, conforme se infere da leitura do art. 279, § 6º, da IN nº 77/2015, mantida, neste item, pela subsequente IN nº 85/2016.
No que diz respeito à prova da eficácia dos EPIs/EPCs, a Terceira Seção desta Corte, na sessão de julgamento realizada em 22/11/2017, nos autos do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas nº 5054341-77.2016.4.04.0000 (Tema nº 15), decidiu por estabelecer a tese jurídica de que a mera juntada do PPP referindo a eficácia do EPI não elide o direito do interessado em produzir prova em sentido contrário (Relator para acórdão Des. Federal Jorge Antonio Maurique, por maioria). Restou assentada no aresto, ainda, a orientação no sentido de que a simples declaração unilateral do empregador, no Perfil Profissiográfico Previdenciário, de fornecimento de equipamentos de proteção individual, isoladamente, não tem o condão de comprovar a efetiva neutralização do agente nocivo. Deve ser propiciado ao segurado a possibilidade de discutir o afastamento da especialidade por conta do uso do EPI, como garantia do direito constitucional à participação do contraditório.
Na situação em apreço, nenhuma das condições acima referidas restou devidamente comprovada, ressaltando-se que foram juntados aos autos laudos periciais das empresas, nos quais, embora haja menção sobre o fornecimento de EPIs aos trabalhadores, o expert foi categórico ao reconhecer a insalubridade da atividade.
Ademais, em se tratando de agentes biológicos, concluiu-se, no bojo do IRDR (Tema nº 15 deste Regional), ser dispensável a produção de prova sobre a eficácia do EPI, pois, segundo o item 3.1.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS no ano de 2017, aprovado pela Resolução nº 600, de 10/08/2017, como não há constatação de eficácia de EPI na atenuação desse agente, deve-se reconhecer o período como especial mesmo que conste tal informação.
Conclusão quanto ao tempo de atividade especial
Possível o reconhecimento da nocividade nos períodos de 01/02/1992 a 17/11/92, 13/12/1996 a 01/02/2000 e 17/04/2000 a 29/02/2012.
Do direito da parte autora à concessão do benefício
A soma do tempo de serviço especial computado administrativamente pelo INSS (04/12/1978 a 05/04/1982 e 01/02/1986 a 31/01/1992 - evento 01, PROCADM10, pp. 16-18) com o que está sendo reconhecido no acórdão totaliza 25 anos, 01 mês e 22 dias, suficientes à concessão da aposentadoria especial desde a DER (03/07/2012), bem como ao recebimento das parcelas devidas desde então.
Implantação do benefício
Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do NCPC [Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.] e da jurisprudência consolidada da Colenda Terceira Seção desta Corte (QO-AC nº 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper). Dessa forma, deve o INSS implantar o benefício em até 45 dias, a contar da publicação do presente acórdão, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.
Saliente-se, por oportuno, que, na hipótese de a parte autora estiver auferindo benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor da renda mensal atual desse benefício for superior ao daquele.
Faculta-se, outrossim, à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Dos consectários
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
Correção monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei nº 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei nº 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema nº 905 (REsp nºº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DE 02-03-2018).
Juros moratórios
Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula nº 204 do STJ), até 29/06/2009.
A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei nº 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema nº 810 da repercussão geral (RE nº 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe nº 216, de 22/09/2017.
Honorários advocatícios
Devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência.
Saliente-se, por oportuno, que não incide a sistemática dos honorários prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida antes de 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016), conforme prevê expressamente o artigo 14 do NCPC [A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada].
Custas processuais: O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e responde por metade do valor no Estado de Santa Catarina (art. 33, parágrafo único, da Lei Complementar estadual 156/97).
Conclusão
Devem ser computados como tempo de serviço especial os períodos de 01/02/1992 a 17/11/92, 13/12/1996 a 01/02/2000 e 17/04/2000 a 29/02/2012.
A parte autora conta com mais de 25 anos de atividades nocivas, suficientes à concessão da aposentadoria especial, a contar da DER (03/07/2012), bem como ao pagamento das parcelas devidas desde então.
Sentença reformada para (a) reconhecer a especialidade dos períodos 01/02/1992 a 17/11/92, 13/12/1996 a 01/02/2000 e 17/04/2000 a 29/02/2012; e (b) condenar o INSS a implantar em favor do autor a aposentadoria especial e a pagar as parcelas devidas desde a DER, acrescidas de correção monetária e juros de mora, na forma da fundamentação, além de honorários advocatícios.
Recurso da parte autora provido.
DISPOSITIVO
Pelo exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora e determinar a imediata implantação do benefício.
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Apelação Cível Nº 5021346-95.2014.4.04.7205/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: CARLOS ROBERTO IMHOF
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS.
1. Comprovado o exercício de atividade especial por mais de 25 anos, a parte autora faz jus à concessão da aposentadoria especial.
2. A exposição a agentes biológicos enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial. As atividades de técnico/auxiliar de enfermagem, exercidas até 28/04/1995, devem ser reconhecidas como especial em decorrência do enquadramento, por equiparação, à categoria profissional de enfermagem.
3. Os equipamentos de proteção individual não são suficientes para descaracterizar a especialidade da atividade exercida, porquanto não comprovada a sua real efetividade por meio de perícia técnica especializada e não demonstrado o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho.
4. A exposição a agentes biológicos não precisa ser permanente para caracterizar a insalubridade do labor, sendo possível o cômputo do tempo de serviço especial diante do risco de contágio sempre presente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade dar provimento à apelação da parte autora e determinar a imediata implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 07 de novembro de 2018.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000710672v3 e do código CRC c926cd98.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 07/11/2018
Apelação Cível Nº 5021346-95.2014.4.04.7205/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: CARLOS ROBERTO IMHOF
ADVOGADO: ANDRÉ DE OLIVEIRA GODOY ILHA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 07/11/2018, na sequência 21, disponibilizada no DE de 16/10/2018.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA, DECIDIU, POR UNANIMIDADE DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DETERMINAR A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
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