
Apelação Cível Nº 5026865-56.2020.4.04.7200/SC
RELATORA Juíza Federal ALINE LAZZARON
RELATÓRIO
rata-se de Apelação Cível interposta pelo Autor A. T. D. S. contra a sentença () proferida nos autos, que julgou os pedidos:
Ante o exposto,
JULGO EXTINTO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO o pedido em relação ao período de 13-04-1998 e 10-07-1998, com fulcro no art. 485, VI do CPC;
JULGO PROCEDENTES EM PARTE OS PEDIDOS formulados na inicial e extingo o feito com resolução de mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC, para condenar o INSS a RECONHECER e AVERBAR como tempo de serviço especial o período de 09-11-1993 a 30-09-1997, com base em 25 anos, para fins de futura aposentadoria.
Foi deferido o benefício da gratuidade da justiça no evento 04.
Havendo sucumbência recíproca, com base no art. 85, §§ 2º, 3º, 4º, 8º, e 14 e no art. 86, ambos do CPC, fixo os honorários para cada um dos patronos. Sendo assim, considerando o mínimo proveito econômico auferido na demanda: [a] condeno o autor a pagar ao INSS honorários sucumbenciais que fixo em R$1.000,00 (um mil reais); e, [b] condeno o INSS a pagar ao autor honorários sucumbenciais no mesmo valor. Por ter sido deferido o benefício da assistência judiciária à parte autora, fica suspensa a exigibilidade enquanto perdurar o benefício.
Nas razões recursais (), a parte autora sustenta a necessidade de reforma da sentença para reconhecimento dos períodos de atividade especial, pedindo a reforma da sentença.
Com as contrarrazões (), vieram os autos para esta Corte.
É o relatório.
VOTO
I - Preliminares
I.I - Da Extinção sem Resolução do Mérito (13/04/1998 a 10/07/1998)
A sentença extinguiu o processo sem resolução do mérito quanto ao período de 13/04/1998 a 10/07/1998, alegando a falta de apresentação de documentos para comprovar a especialidade na via administrativa.
A parte Autora, no entanto, argumenta que a declaração emitida pela Reunidas (fl. 28, ) comprovava o trabalho nas mesmas condições do período anterior (09/11/1993 a 30/09/1997), já reconhecido como especial, o que deveria ser suficiente para demonstrar a pretensão resistida e o interesse processual.
A jurisprudência do TRF4 é pacífica no sentido de que, uma vez protocolado o pedido de aposentadoria, o indeferimento pelo INSS é suficiente para caracterizar a lide, mesmo que a documentação não esteja completa. Caberia à autarquia orientar o segurado sobre a necessidade de complementar a documentação, o que não afasta o interesse processual.
Nesse sentido, a jurisprudência desta Corte:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO. INTERESSE DE AGIR. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. 1. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 631.240, em sede de repercussão geral, assentou entendimento no sentido da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo como pressuposto para que se possa ingressar com ação judicial para o fim de obter a concessão de benefício previdenciário (Tema 350). 2. A conclusão do processo administrativo, com o indeferimento da revisão postulada, demonstra a pretensão resistida e, por consequência, o interesse de agir. (TRF4, AG 5002704-14.2021.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relator ADRIANE BATTISTI, juntado aos autos em 25/05/2022)
Considerando que a documentação acostada ao processo (Declaração e CTPS) é hábil para o exame do mérito da pretensão do segurado, e que a falta de prévio requerimento administrativo se confunde com a insuficiência de prova, afasto a extinção sem resolução do mérito e procedo ao exame da especialidade do período, nos termos do art. 1.013, § 3º, I, do Código de Processo Civil.
I.II - Do Cerceamento de Defesa (Negativa de Produção de Prova Pericial)
Nas razões de apelação, a parte autora aduziu a ocorrência de cerceamento de defesa, ante a negativa de produção de prova pericial, postulando a anulação da sentença e o retorno dos autos à origem para reabertura da instrução processual. O cerceamento é invocado porque o juízo a quo negou a perícia para atestar a ineficácia do EPI.
O pedido de complementação de prova na forma requerida pela parte autora não foi infundado, uma vez que visava garantir a comprovação de seu direito. Todavia, em virtude do exame do mérito que se segue, verifica-se que o conjunto probatório já anexado aos autos (PPPs, laudos técnicos e prova emprestada) é capaz de demonstrar de forma satisfatória as condições de trabalho vivenciadas.
Importa destacar, outrossim, que o afastamento da alegação de cerceamento de defesa não pressupõe o automático reconhecimento da especialidade do período requerido. O retorno dos autos à origem, quando cabível, justifica-se pela ausência nos autos de documentação suficiente para esclarecer as condições de trabalho vivenciadas pela parte autora. Existindo tal documentação, de que são exemplos os formulários e laudos, não há falar em cerceamento de defesa. Entretanto, se a documentação trazida a exame não corroborar o quanto alegado pela parte autora em relação a determinado período alegadamente laborado sob condições especiais, haverá, na verdade, situação de contrariedade e inconformismo com o resultado alcançado, e não propriamente cerceamento do direito de defesa.
Portanto, afasto a preliminar aventada.
II - Análise do Mérito
A controvérsia recursal cinge-se ao reconhecimento das condições especiais da atividade laboral da parte autora.
A sentença de origem não reconheceu a especialidade, fundamentando que:
4 - Do Caso Concreto
A parte autora exerceu atividades alegadamente sujeito a agentes nocivos nos seguintes períodos:
a) 09-11-1993 a 30-09-1997
O autor manteve vínculo de emprego junto à empresa Reunidas S.A. Transportes Coletivos, no cargo de lavador.
Apresenta PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário - que descreve as atividades realizadas na lavação de caminhões e ônibus, com exposição a umidade, ruído de 72 dB(A), inferior ao limite de tolerância, e bactérias.
No campo "Observações", consta que o formulário foi preenchido com base em informações constantes do LTCAT - Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho - elaborado em 2004, tendo a função de lavador sido alterada para servente.
b) 13-04-1998 a 16-04-1999
De acordo com a CTPS - Carteira de Trabalho e Previdência Social -, o ator manteve vínculo com a empresa Vigiserv Serviços Especiais Ltda., entre 13-04-1998 e 10-07-1998, e com a empresa Bravo Administradora de Mão de Obra e Monitoramento Eletrônico S/C Ltda., entre 11-07-1998 e 16-04-1999, ambos na função de lavador, havendo alteração para abastecedor, conforme anotação à fl. 45 da CTPS, porém sem referência à data de mudança da função.
Apresenta declaração emitida pela empresa Reunidas S.A. Transportes Coletivos em que refere ter o autor trabalhado nas duas empresas referidas como prestadoras de serviços, nas mesmas atividades e nas mesmas condições de trabalho do vínculo de 09 de Novembro de 1993 a 30 de setembro de 1997.
Com a petição inicial, junto Certidão de Baixa e Inscrição no CNPJ referente à empresa Bravo, com baixa em 31-12-2008.
c) 24-05-1999 a 13-11-2019
O autor manteve vínculo de emprego junto à empresa Reunidas S.A. Transportes Coletivos, no cargo de abastecedor até 30-09-2000, no abastecimento de ônibus e caminhões e na descarga de óleo diesel do caminhão tanque, passando a auxiliar de mecânico entre 01-10-2000 e 31-08-2003, nos consertos de veículos da frota.
O PPP refere a exposição a ruído de 72 dB(A) no primeiro período e de 75,82 dB(A) no segundo, ambos inferiores ao limite de tolerância. Refere, ainda, contato com hidrocarbonetos derivados de petróleo no primeiro interregno, e com óleos e graxa mineral no segundo.
A partir de 01-10-2000, informa o fornecimento de EPIs tais como : luvas para proteção contra agentes mecânicos e químicos, creme protetor de segurança, protetor auditivo, respirador purificador de ar tipo peça semifacial e luva para proteção contra agentes abrasivos e escoriantes.
Por fim, o autor acosta ao processo administrativo PPP emitido em 21-11-2019, referente ao período a partir de 01-09-2003, segundo o qual passou de auxiliar de mecânico a mecânico a partir de 30-09-2006.
Informa o formulário a exposição a óleo e graxa mineral durante todo o intervalo, bem como aos níveis de ruído entre 75,40 dB(A) e 82,5 dB(A), além de radiações não ionizantes a partir de 01-04-2006.
Quanto aos EPIs, informa o fornecimento de: luvas para proteção contra agentes mecânicos e químicos, creme protetor de segurança, protetor auditivo, respirador purificador de ar tipo peça semifacial, protetor facial e luva para proteção contra agentes abrasivos e escoriantes.
Pois bem.
De início, reconheço a falta de prévio requerimento em relação ao período de 13-04-1998 e 10-07-1998, vez que, no âmbito administrativo, a parte autora não apresentou nenhum documento que pudesse servir de prova para a alegada especialidade, nem foi comprovado o encerramento das atividades da empresa de vínculo a fim de permitir a utilização de prova por similaridade.
É certo que não é necessário exaurir a via administrativa para levar a questão ao Judiciário. Todavia, a pretensão deduzida na petição inicial sequer foi objeto de discussão na via administrativa.
Entendo ser necessário que a ação judicial seja precedida dessa provocação, pois é função do INSS processar e deferir benefícios e não cabe ao Judiciário substituir a função a cargo do Poder Executivo, conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal no acórdão nº 631.240/MG, com relatoria do Ministro Luís Roberto Barroso (data da decisão: 03-09-2014), que dispõe:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE DE AGIR.
1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse de agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo.
2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas. [...]
Com efeito, não houve resistência à pretensão da parte autora por parte do INSS, impendendo à ausência de interesse processual para o prosseguimento da ação.
Com relação à função de lavador exercida na empresa Reunida, trata-se de atividade prevista no item 1.1.3 do Decreto nº 53.831-1964, conforme fundamentação, que permite o reconhecimento como tempo especial pela exposição a umidade excessiva, de modo que se mostra possível o enquadramento do interregno de 09-11-1993 a 30-09-1997.
Quanto ao vínculo com a empresa Bravo, comprovado o encerramento das atividades, mostra-se possível a utilização da prova referente à Reunidas em seu favor. Não obstante, conforme referido, há alteração para a função de abastecedor (sem data), de modo que não há como ser aferido, pelos documentos colacionados, até quando o autor permaneceu na função original.
De outro lado, a atividade de abastecedor se assemelha à de frentista, que não admite enquadramento por atividade presumidamente perigosa, nos termos da súmula 157 da TNU:
Não há presunção legal de periculosidade da atividade do frentista, sendo devida a conversão de tempo especial em comum, para concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, desde que comprovado o exercício da atividade e o contato com os agentes nocivos por formulário ou laudo, tendo em vista se tratar de atividade não enquadrada no rol dos Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79.
Assim, necessária a comprovação, no caso do frentista, de exposição a agentes agressivos capazes de serem nocivos à saúde ou integridade física, de acordo com o Decreto nº 53.831-1964 e Decreto nº 83.080-1979.
Ainda, após 06-03-1997 exige-se laudo técnico para a comprovação da efetiva exposição a agentes nocivos.
Registre-se que, forte na Súmula 49 da TNU, para reconhecimento de condição especial de trabalho antes de 29-04-1995, a exposição a agentes nocivos à saúde ou à integridade física não precisa ocorrer de forma permanente.
Com relação à exposição a agentes nocivos na função de frentista, trago à colação a manifestação do perito judicial Laudinei Lauro Francisco, Engenheiro de Segurança do Trabalho, na perícia realizada nos autos da Ação Previdenciária nº 2008.72.50.007761-1, na qual restou comprovado que inexiste exposição habitual e permanente a agentes nocivos no exercício da atividade de frentista.
Concluiu o perito: considera-se em CONDIÇÕES ESPECIAIS a atividade até 28.04.1995, pela exposição qualitativa a vapores orgânicos voláteis, no manuseio de produtos derivados do petróleo, expostos a hidrocarbonetos (vapores de gasolina), em trabalhos permanentes. A partir de 29.04.1995, embora não tenha sido realizadas avaliações quantitativas, conforme orçamento apresentado no evento 53, com base nos resultados das pesquisas acima e por se tratar o pátio de abastecimento de combustível de ambiente ocupacional muito ventilado, NÃO foi detectada atividades em Condições Especiais por exposição a vapores orgânicos voláteis acima do Limite de Tolerância (LT). (grifei)
Desta forma, somente seria possível o reconhecimento de tempo especial pelo exercício da atividade de frentista se comprovada a exposição habitual e permanente aos derivados de hidrocarbonetos.
Ainda, a Portaria MTPS nº 1.109, de 21-09-2016, dispôs acerca da desnecessidade de utilização de EPIs para os frentistas, a saber:
O artigo 12.1.1 estabelece que os trabalhadores que realizem, direta ou indiretamente, as atividades críticas listadas no subitem 5.1.1.1, exceto as alíneas “d”, “g” e “h”, e, inclusive, no caso de atividade de descarga selada, alínea “e”, devem utilizar equipamento de proteção respiratória de face inteira, com filtro para vapores orgânicos e fator de proteção não inferior a 100, assim como, equipamentos de proteção para a pele.
As exceções referidas pela norma referem-se respectivamente a:
5.1.1.1
(...)
d) estacionamento do caminhão, aterramento e conexão via mangotes aos tanques subterrâneos;
(...)
g) abastecimento de combustível para veículos;
h) abastecimento de combustíveis em recipientes certificados;
Assim, não reconheço a possibilidade de enquadramento dos lapsos de 13-04-1998 a 16-04-1999 e 24-05-1999 a 30-09-2000.
Por fim, no que tange às funções de auxiliar de mecânico e mecânico, os níveis de ruído informados encontram-se abaixo do limite de tolerância, enquanto a nocividade pelo contato com derivados de hidrocarbonetos encontra-se neutralizada pelo fornecimento de EPIs eficazes, de modo que não faz jus ao seu enquadramento como tempo especial.
A decisão do juízo a quo merece reparos.
A orientação desta Corte Federal está assim sedimentada quanto ao reconhecimento do tempo especial diante da categoria profissional até 28/04/1995 e pela exposição dos agentes nocivos:
AGENTE NOCIVO UMIDADE: A exposição à umidade é nociva quando proveniente de fontes artificiais, capaz de ser nociva à saúde (Código 1.3 do Quadro Anexo ao Decreto 53.831/64). Apesar de não haver previsão expressa nos decretos mais recentes (2.172/97 e 3.048/99), a umidade excessiva de fontes artificiais pode ensejar o reconhecimento da especialidade com base na Súmula 198 do TFR, se perícia técnica comprovar a nocividade.
AGENTES BIOLÓGICOS: Para o enquadramento da atividade como especial pela exposição a agentes biológicos, o risco de contágio é o fator determinante, não sendo exigida a exposição permanente, mas sim a habitualidade e a inerência da atividade. Conforme o IRDR Tema 15 deste Tribunal, os EPI´s não são capazes de elidir o risco de contágio desses agentes (TRF4, AC 5005720-15.2022.4.04.9999, 10ª Turma, Rel. Des. Claudia Cristofani, j. 04/04/2023).
PERICULOSIDADE INFLAMÁVEIS: Atividades que submetem o trabalhador a riscos acentuados em virtude da exposição a inflamáveis são consideradas perigosas. O rol de atividades perigosas é exemplificativo (STJ Tema 534 - REsp 1306113/SC). Exposição Não Ocasional/Intermitente: Inexiste necessidade de exposição durante toda a jornada de trabalho, pois o desempenho de funções em áreas de armazenamento ou manuseio de substâncias inflamáveis denota risco potencial sempre presente, inerente à própria atividade (TRF4). Transporte de Inflamáveis: A atividade de transporte de substâncias inflamáveis também pode ser enquadrada como especial em razão da periculosidade inerente (item 16.6 da NR-16 do Ministério do Trabalho e Emprego). EPI e Periculosidade: Para periculosidade (eletricidade, vigilante, inflamáveis), não se cogita de afastamento da especialidade pelo uso de EPI (TRF4, IRDR Tema 15).(TRF4, AC 5013313-71.2022.4.04.7000, 10ª Turma , Relator para Acórdão LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, julgado em 05/08/2025).
AGENTES QUÍMICOS (ÓLEOS, GRAXAS, HIDROCARBONETOS): A exposição a hidrocarbonetos aromáticos, como óleos e graxas de origem mineral, é qualitativa, pois se tratam de agentes químicos reconhecidamente cancerígenos, conforme a Portaria Interministerial nº 9/2014 e o Anexo 13 da NR-15. A utilização de EPI, ainda que atenue a exposição, não é capaz de neutralizar completamente o risco, conforme decidido pelo TRF4 no IRDR Tema 15. (TRF4, AC 5071483-41.2019.4.04.7000, 10ª Turma , Relatora para Acórdão CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI , julgado em 05/08/2025.
RADIAÇÕES NÃO IONIZANTES: As radiações não ionizantes (como a decorrente da solda elétrica) podem ser consideradas insalubres, conforme o Anexo VII da NR-15 do Ministério do Trabalho e Emprego. Rol Exemplificativo e Fontes Artificiais: A ausência de previsão expressa das radiações não ionizantes no rol de agentes nocivos a partir do Decreto n. 2.172/97 não exclui a possibilidade de reconhecimento da especialidade do labor, em face da Súmula 198 do TFR. Contudo, a radiação deve ser proveniente de fontes artificiais.(TRF4, AC 5016646-31.2022.4.04.7000, 10ª Turma , Relatora para Acórdão CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI , julgado em 05/08/2025).
No caso concreto, passo à análise dos períodos:
1) Períodos de 13/04/1998 a 16/04/1999 (Lavador/Abastecedor) e 24/05/1999 a 30/09/2000 (Abastecedor)
No período de 13/04/1998 a 16/04/1999, o Autor laborou como lavador, conforme CTPS (, pág. 10), sendo que a Declaração da Reunidas (, fl. 28) confirmou que o trabalho ocorreu nas mesmas condições do vínculo anterior já reconhecido pela sentença (09/11/1993 a 30/09/1997) por umidade excessiva.
O laudo técnico de fls. 42 () confirmou a exposição permanente à umidade na função de lavador e à agentes biológicos ("despejo de resíduos líquido e esguichar os toaletes dos carros"). Considerando o princípio da primazia da realidade e que o período anterior, com as mesmas condições, foi reconhecido como especial pela própria sentença, impõe-se o reconhecimento do interregno de 13/04/1998 a 16/04/1999 por exposição à umidade e a agentes biológicos.

Em relação à função de abastecedor (frentista), a sentença adotou avaliação quantitativa.
A atividade de frentista é expressamente enquadrada como perigosa pela NR-16, Anexo 2, do MTE, que define como área de risco o raio de 7,5 metros em torno das bombas de abastecimento. A permanência habitual da autora nessa área atrai, por si só, a caracterização da periculosidade.
A jurisprudência deste Tribunal é firme no reconhecimento da especialidade dessas funções:
A atividade de frentista em posto de combustíveis deve ser considerada especial devido à periculosidade decorrente da exposição a substâncias inflamáveis, hipótese em que é ínsito o risco potencial de acidente. (TRF4, APELREEX 0007622-11.2010.404.9999, Sexta Turma, Relatora Eliana Paggiarin Marinho, D.E. 4/8/2011).
Sobre a temática, importa trazer à baila, ainda, a tese firmada pelo STJ na análise do Tema 534:
As normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991).
O TRF4 também já firmou entendimento de que a periculosidade decorrente da exposição a inflamáveis em posto de combustível alcança não apenas os frentistas diretamente envolvidos no abastecimento, mas também os demais trabalhadores que desempenham funções dentro da mesma atmosfera explosiva, a exemplo de caixas, conforme julgado:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS. ATIVIDADE ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A SUBSTÂNCIAS INFLAMÁVEIS. PERICULOSIDADE DECORRENTE DO RISCO DE EXPLOSÃO E INCÊNDIO. TINTAS, ESMALTES, VERNIZES E SOLVENTES. HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS. BENZENO. AGENTE CANCERÍGENO. ANÁLISE QUALITATIVA. IRDR 15/TRF4. INEFICÁCIA PRESUMIDA DO EPI. TUTELA ESPECÍFICA. 1. Em se tratando de atividade em há exposição a substâncias inflamáveis, é notável o risco de explosão e incêndio, evidenciando a periculosidade da atividade laboral. Precedentes desta Corte. (TRF4, AC 5005500-46.2024.4.04.9999, 9ª Turma , Relator para Acórdão CELSO KIPPER , julgado em 10/09/2025)
O Autor comprovou a exposição permanente a hidrocarbonetos e inflamáveis por laudo técnico (fls. 46, ). A periculosidade decorrente do risco de explosão e incêndio no posto de combustível alcança, inclusive, outros trabalhadores além dos frentistas.

Portanto, reconheço como tempo especial os períodos de 13/04/1998 a 16/04/1999 e 24/05/1999 a 30/09/2000.
2) Período de 01/10/2000 a 13/11/2019 (Auxiliar e Mecânico)
A sentença negou o reconhecimento devido ao registro de fornecimento de EPIs eficazes a partir de 01/10/2000.
O LTCAT (fl. 51, ) e os PPPs (fls. 29-30, 33-38, ) comprovam a exposição a óleos/graxas minerais (hidrocarbonetos aromáticos) e à radiações não ionizantes.

Os hidrocarbonetos aromáticos são agentes químicos reconhecidamente cancerígenos (Grupo 1 da LINACH), como o benzeno. Para agentes cancerígenos, a análise é qualitativa e a utilização de EPI é irrelevante para afastar a especialidade.
Assim, afasto a conclusão da sentença sobre a eficácia dos EPIs e reconheço como tempo especial o período de 01/10/2000 a 13/11/2019.
III - Da soma do tempo para obtenção do benefício
Somando-se os períodos reconhecidos apela sentença e por este Colegiado, o autor possui tempo de contribuição suficiente para a concessão do benefício de Aposentadoria Especial.
Período | Função/Agente | Tempo Reconhecido |
09/11/1993 a 30/09/1997 (sentença) | Lavador (Umidade) | 3 anos, 10 meses e 21 dias |
13/04/1998 a 16/04/1999 | Lavador/Abastecedor (Umidade/HC) | 1 ano e 4 dias |
24/05/1999 a 30/09/2000 | Abastecedor (HC/Periculosidade) | 1 ano, 4 meses e 7 dias |
01/10/2000 a 13/11/2019 | Aux. Mecânico/Mecânico (HC Aromáticos) | 19 anos, 1 mês e 13 dias |
TOTAL TEMPO ESPECIAL RECONHECIDO | 25 anos, 4 meses e 15 dias |
O INSS deverá pagar os valores devidos a contar da DER, abatidos eventuais valores já recebidos a título de benefício anterior, de forma atualizada e com incidência de juros a contar da citação, conforme critérios que seguem.
Pelos fundamentos expostos acima, vai, portanto, provida a apelação da parte autora.
IV - Consectários, Efeitos Financeiros e Tutela Específica
Consectários Legais Os consectários legais devem ser fixados, quanto aos juros, nos termos do que definido pelo STF no julgamento do Tema 1170. No que tange à correção monetária, até 08/12/2021, deve ser aplicado o INPC (Lei 11.430/06). A partir de 09/12/2021, incidirá a taxa SELIC, para todos os fins (correção, juros e compensação da mora), conforme o art. 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021.
Honorários Advocatícios Recursais Tendo em vista a modificação da sucumbência, devem ser redistribuídos os honorários, que ficarão a cargo da parte ré, sendo devidos sobre o valor da condenação, nos patamares mínimos previstos no art. 85, §§2º e 3º do CPC, considerando-se, para tanto, as parcelas vencidas até a data do presente Acórdão (Sumulas 111 do STJ e 76 do TRF4).
Prequestionamento Para fins de acesso às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as questões e os dispositivos legais invocados pelas partes, nos termos dos artigos 1.022 e 1.025 do CPC, evitando-se a oposição de embargos de declaração com propósito de prequestionamento.
Dispositivo
Voto por dar provimento à apelação da parte autora para reconhecer a especialidade dos períodos de 13/04/1998 a 16/04/1999, 24/05/1999 a 30/09/2000 e 01/10/2000 a 13/11/2019, determinando a sua averbação junto ao INSS e, em consequência, a concessão do benefício de aposentadoria especial desde a DER (02/12/2019), com o pagamento das parcelas vencidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora, nos termos da legislação de regência.
Documento eletrônico assinado por ALINE LAZZARON, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005412713v8 e do código CRC 842d54b2.
Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): ALINE LAZZARONData e Hora: 29/10/2025, às 16:16:38
Conferência de autenticidade emitida em 05/11/2025 04:10:14.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Apelação Cível Nº 5026865-56.2020.4.04.7200/SC
RELATORA Juíza Federal ALINE LAZZARON
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. LAVADOR E ABASTECEDOR. EXPOSIÇÃO À UMIDADE E HIDROCARBONETOS.
1. A declaração da empresa sobre as condições de trabalho e a comprovação da exposição a agentes nocivos afastam a extinção do processo por falta de prévio requerimento administrativo, devendo ser analisado o mérito da pretensão do segurado.
2. É possível o reconhecimento da especialidade da atividade de lavador (após 1995) e de abastecedor (frentista) pela exposição a umidade de fonte artificial e a hidrocarbonetos aromáticos, sendo esta comprovada pela análise qualitativa, independentemente de quantificação.
3. A atividade de Mecânico/Auxiliar de Mecânico com exposição a óleos e graxas minerais (hidrocarbonetos aromáticos) é considerada especial. A exposição a hidrocarbonetos aromáticos é qualitativa por serem agentes cancerígenos (Portaria Interministerial nº 9/2014).
4. A utilização de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) não descaracteriza a especialidade para agentes cancerígenos ou periculosos, conforme o entendimento do TRF4 (IRDR Tema 15), sendo irrelevante o registro de EPI eficaz no PPP após 1998.
5. Preenchidos os requisitos para a aposentadoria especial (25 anos de atividade especial), o benefício deve ser concedido desde a Data de Entrada do Requerimento (DER), retroagindo os efeitos financeiros àquela data, ainda que o direito tenha sido comprovado em juízo.
4. Apelação do Autor provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Central Digital de Auxílio 1 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora para reconhecer a especialidade dos períodos de 13/04/1998 a 16/04/1999, 24/05/1999 a 30/09/2000 e 01/10/2000 a 13/11/2019, determinando a sua averbação junto ao INSS e, em consequência, a concessão do benefício de aposentadoria especial desde a DER (02/12/2019), com o pagamento das parcelas vencidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora, nos termos da legislação de regência, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 27 de outubro de 2025.
Documento eletrônico assinado por ALINE LAZZARON, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://verificar.trf4.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 40005412714v3 e do código CRC ab2362d4.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 20/10/2025 A 27/10/2025
Apelação Cível Nº 5026865-56.2020.4.04.7200/SC
RELATORA Juíza Federal ALINE LAZZARON
PRESIDENTE Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 20/10/2025, às 00:00, a 27/10/2025, às 16:00, na sequência 416, disponibilizada no DE de 09/10/2025.
Certifico que a Central Digital de Auxílio 1, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A CENTRAL DIGITAL DE AUXÍLIO 1 DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARA RECONHECER A ESPECIALIDADE DOS PERÍODOS DE 13/04/1998 A 16/04/1999, 24/05/1999 A 30/09/2000 E 01/10/2000 A 13/11/2019, DETERMINANDO A SUA AVERBAÇÃO JUNTO AO INSS E, EM CONSEQUÊNCIA, A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA ESPECIAL DESDE A DER (02/12/2019), COM O PAGAMENTO DAS PARCELAS VENCIDAS, CORRIGIDAS MONETARIAMENTE E ACRESCIDAS DE JUROS DE MORA, NOS TERMOS DA LEGISLAÇÃO DE REGÊNCIA.
RELATORA DO ACÓRDÃO Juíza Federal ALINE LAZZARON
Votante Juíza Federal ALINE LAZZARON
Votante Desembargador Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
Votante Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
MÁRCIA CRISTINA ABBUD
Secretária
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