
Apelação Cível Nº 5033345-16.2021.4.04.7200/SC
RELATOR: Juiz Federal LADEMIRO DORS FILHO
RELATÓRIO
Trata-se de apelação em face de sentença proferida em ação de procedimento comum proposta por E. R. Z. contra a UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO, na qual se postula a concessão de aposentadoria voluntária com proventos integrais e com garantia de paridade com os servidores em atividade, de acordo com as regras de transição previstas nos arts. 2º, 6º e 6º-A da EC nº 41/2003 e no art. 3º da EC nº 47/2005.
A sentença julgou improcedente o pleito (evento 14).
Inconformada, apela a autora defendendo a inconstitucionalidade das regras de transição previstas nos artigos 4º e 20 da EC 103/2019, em razão de violação aos princípios da proteção à confiança, segurança jurídica, razoabilidade e proporcionalidade.Pede provimento.
Contrarrazões no evento 24.
É o relatório.
VOTO
Trata-se de discussão unicamente de Direito, referente à constitucionalidade das regras de transição previstas nos artigos 4º e 20 da EC 103/2019. Não há insurgência quanto à conclusão de que, nos ditames do regramento previdenciário em vigor, a autora ainda não faz jus à jubilação.
A sentença proferida pelo juízo a quo analisou com primor os argumentos reiterados pela apelante, razão pela qual adoto seus fundamentos como razões de decidir:
(...) A Emenda Constitucional nº 103, de 12.11.2019, que alterou o sistema de previdência social e estabeleceu novas regras de transição. Nessa data, a autora preenchia o requisito previsto no inciso II do art. 3º da Emenda Constitucional nº. 47/2005, mas ainda não havia implementado o requisito de contribuição de trinta de anos e idade mínima de 62 anos, exigência dos incisos I e III do referido dispositivo legal, os quais se dariam após a instituição da reforma da previdência - aproximadamente no dia 25/01/2027 (evento 1, PROCADM7, p. 43-45).
Como se vê, cinge-se a controvérsia quanto à possibilidade da autora ter reconhecido o direito à aposentadoria integral e paritária com base no art. 3ª da EC nº 47, afastando-se, por consequência, a disposição contida no art. 35 da EC nº 103/2019.
Ocorre que deve ser aplicada a lei vigente na data da implementação de todos requisitos para a concessão da aposentadoria e, se o servidor não havia preenchidos todos os requisitos até a data da edição da EC nº 103/2019, por consequência, não possui ele direito adquirido a esta aposentadoria.
Por outro lado, se o servidor já tenha cumprido com todas as exigências para se aposentar, ele possui direito adquirido a esta aposentadoria e isso não será modificado, mesmo que surjam novas legislações.
Necessário ressaltar que, para situações similares à da autora, qual seja, servidores que estavam próximos a preencherem todos os requisitos para concessão do benefício de aposentadoria, o legislador atento a esta possibilidade e, objetivando atender às expectativas de direito fundadas em normas anteriores à nova norma, prevê as denominadas regras de transição.
A respeito de expectativa direito e direito adquirido de servidor quanto ao regime jurídico previdenciário, o Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RExt 630.501/RS, julgado em 21/02/2013, com repercussão geral reconhecida, de relatoria da Ministra Ellen Gracie, decidiu, in verbis:
“O que este Supremo Tribunal Federal não reconhece é o direito adquirido a regime jurídico, ou seja, não considera abrangido pela garantia constitucional a proteção de simples expectativas de direito. [destaquei]
Nesse diapasão, se o servidor já tinha cumprido com todas as exigências para se aposentar, ele possui direito adquirido a esta aposentadoria e isso não será modificado, mesmo que surjam novas legislações. Por outro lado, se o servidor não tinha cumprido com todas as exigências para se aposentar, ele possui mera expectativa de direito.
Portanto, não há direito adquirido a regime jurídico previdenciário, não há violação aos princípios da segurança jurídica, proteção à confiança, proporcionalidade ou razoabilidade, tampouco ao princípio da proibição do retrocesso.
Diante desse cenário, a improcedência do pleito autoral é medida que se impõe. (...)
Acrescento que o fato da EC 103/2019 ter alterado a previsão de aposentação da autora em tempo maior do que o fizeram as emendas constitucionais anteriores não implica em violação aos princípios jurídicos debatidos. Estima-se que a autora, com as novas regras de transição, cumprirá o tempo necessário em 25/01/2027, ocasião na qual terá 57 anos de idade, a qual ainda é bastante inferior à atual idade mínima de 60 anos estabelecida pela nova reforma e que alcança os novos servidores.
O legislador não está adstrito aos parâmetros estabelecidos pelas reformas anteriores; ainda que a alteração recente tenha de fato sido mais rígida, ela se deu por conta de diversos fatores econômicos e sociais amplamente discutidos pelo Congresso Nacional, mormente a sustentabilidade do sistema previdenciário face ao constante crescimento da proporção de pessoas idosas em razão do achatamento da pirâmide etária.
Segundo dados do IBGE, a proporção de pessoas idosas aumentou de 4,0% para 5,9% de 1980 a 2000 e de lá até 2022 quase dobrou, para 10,9%1:

Portanto, não é irrazoável, tampouco desproporcional, o Poder Reformador ter optado em 2019 por alterações mais impactantes do que as ocorridas em 2003, já que a sustentabilidade da previdência para as gerações futuras depende do equilíbrio econômico, atualmente ameaçado.
Ainda que tenha discutido outros dispositivos da EC 103/2019, é de suma importância trazer à lume a ementa do julgamento feito pelo Supremo Tribunal Federal na ação direta de inconstitucionalidade 7051, em sessão virtual de 16.06.2023 a 23.06.2023:
Direito constitucional e previdenciário. Ação direta de inconstitucionalidade. Reforma da Previdência Social. Emenda Constitucional nº 103/2019. Critérios de cálculo da pensão por morte no RGPS. 1. Ação direta contra o art. 23, caput, da Emenda Constitucional nº 103/2019, que fixou novos critérios para o cálculo da pensão por morte no regime geral (RGPS) e nos regimes próprios de previdência social (RPPS). A requerente se volta, especificamente, contra a norma referente ao RGPS. O contexto da nova Reforma da Previdência 2. A população brasileira está vivendo mais. De acordo com projeções da Organização das Nações Unidas, em 2100, o Brasil será o 10º maior país do mundo em proporção de idosos. Em paralelo, a população em idade ativa vem diminuindo, em razão da queda na taxa de fecundidade. Com isso, há menos jovens para financiar os benefícios dos mais idosos. 3. O déficit previdenciário é incontestável e teve piora significativa nos últimos anos. O pagamento de aposentadorias e pensões consome fatia relevante do PIB e do orçamento estatal, deixando poucos recursos para setores como saúde e educação. Reformas na Previdência Social que reduzam o endividamento público podem ter impactos macroeconômicos positivos, como o estímulo ao consumo e à produção. Vetores interpretativos aplicáveis ao caso 4. Dever de autocontenção judicial. As questões abrangidas pela reforma previdenciária são divisivas, de difícil obtenção de consenso. A cautela e deferência próprias da jurisdição constitucional acentuam-se aqui pelo fato de se tratar de uma emenda à Constituição, cuja aprovação tem o batismo da maioria de três quintos de cada Casa do Congresso Nacional. Além disso, a intervenção do Poder Judiciário deve ter em conta os limites impostos por sua capacidade institucional e pelos efeitos sistêmicos que as decisões judiciais podem produzir nessa matéria. Análise do vício de inconstitucionalidade alegado 5. Novos critérios de cálculo da pensão por morte (art. 23 da EC nº 103/2019), que asseguram uma cota familiar de 50%, mais uma cota por dependente de 10% dos proventos do segurado falecido. O patamar está próximo à realidade de outros países e é compatível com os valores de pensão alimentícia comumente fixados pelo Poder Judiciário. Ademais, leva em conta as condições de elegibilidade para os benefícios previdenciários estabelecidas pela legislação brasileira, tais como a idade dos beneficiários e o tempo de convívio marital ou de união estável. Qualquer interferência judicial no montante da prestação deveria considerar todos esses aspectos, o que se mostra praticamente inviável. Os limites oriundos da capacidade institucional do Judiciário e o risco de efeitos sistêmicos recomendam, também aqui, a autocontenção. Conclusão 6. Improcedência do pedido, com a fixação da seguinte tese de julgamento: “É constitucional o art. 23, caput, da Emenda Constitucional nº 103/2019, que fixa novos critérios de cálculo para a pensão por morte no Regime Geral e nos Regimes Próprios de Previdência Social”.
(ADI 7051, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 26/06/2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 01-08-2023 PUBLIC 02-08-2023) *grifei
Como visto, a Suprema Corte também tem demonstrado preocupação no tocante ao déficit previdenciário e aos impactos econômicos decorrentes das alterações populacionais e tendido a defender as alterações promovidas pela EC 103/2019 e a autocontenção do Poder Judiciário em relação às intervenções no tema. Essa tendência vem sendo mantida no julgamento da ADI 6254, no qual, apesar da atual suspensão, já há maioria formada em favor da constitucionalidade da maior parte dos dispositivos discutidos.
Portanto, voto pelo DESPROVIMENTO do apelo.
Honorários advocatícios relativos à sucumbência recursal
A majoração dos honorários em decorrência da sucumbência recursal, conforme preconizado pelo STJ, depende da presença dos seguintes requisitos: (a) que o recurso seja regulado pelo CPC de 2015; (b) que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido; (c) que a parte recorrente tenha sido condenada em honorários no primeiro grau, de forma a poder a verba honorária ser majorada pelo Tribunal. Atendidos esses requisitos, a majoração dos honorários é cabível, independentemente da apresentação de contrarrazões pela parte recorrida.
No caso dos autos, estão presentes os requisitos exigidos pela jurisprudência, impondo-se a majoração em desfavor do apelante. Com base no art. 85, §11, do CPC de 2015, majoro os honorários advocatícios em 10%, percentual incidente sobre a verba honorária fixada na sentença.
Prequestionamento
Para evitar futuros embargos, dou expressamente por prequestionados todos os dispositivos constitucionais e infraconstitucionais indicados pelas partes no processo. A repetição de todos os dispositivos é desnecessária, para evitar tautologia.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação, nos termos da fundamentação.
Documento eletrônico assinado por LADEMIRO DORS FILHO, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004818287v11 e do código CRC ccacf7d2.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LADEMIRO DORS FILHO
Data e Hora: 10/12/2024, às 18:29:22
Conferência de autenticidade emitida em 17/12/2024 04:22:26.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Apelação Cível Nº 5033345-16.2021.4.04.7200/SC
RELATOR: Juiz Federal LADEMIRO DORS FILHO
EMENTA
APELAÇÃO cível. ação ordinária. concessão de aposentadoria voluntária com proventos integrais e com garantia de paridade com os servidores em atividade, de acordo com as regras de transição previstas nos arts. 2º, 6º e 6º-A da EC nº 41/2003 e no art. 3º da EC nº 47/2005.
1. Deve ser aplicada a lei vigente na data da implementação de todos requisitos para a concessão da aposentadoria e, se o servidor não havia preenchidos todos os requisitos até a data da edição da EC nº 103/2019, por consequência, não possui ele direito adquirido a esta aposentadoria.
2. Apelação desprovida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 10 de dezembro de 2024.
Documento eletrônico assinado por LADEMIRO DORS FILHO, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004818288v4 e do código CRC 419abfb6.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LADEMIRO DORS FILHO
Data e Hora: 10/12/2024, às 18:29:22
Conferência de autenticidade emitida em 17/12/2024 04:22:26.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO PRESENCIAL DE 10/12/2024
Apelação Cível Nº 5033345-16.2021.4.04.7200/SC
RELATOR: Juiz Federal LADEMIRO DORS FILHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
PROCURADOR(A): LUIZ CARLOS WEBER
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Presencial do dia 10/12/2024, na sequência 149, disponibilizada no DE de 28/11/2024.
Certifico que a 3ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 3ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal LADEMIRO DORS FILHO
Votante: Juiz Federal LADEMIRO DORS FILHO
Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
Votante: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
GILBERTO FLORES DO NASCIMENTO
Secretário
Conferência de autenticidade emitida em 17/12/2024 04:22:26.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas