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AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. ABIRATERONA. CÂNCER DE PRÓSTATA. TUTELA PROVISÓRIA. VIABILIDADE. MULTA DIÁRIA. MULTA PO...

Data da publicação: 12/12/2024, 18:23:57

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. ABIRATERONA. CÂNCER DE PRÓSTATA. TUTELA PROVISÓRIA. VIABILIDADE. MULTA DIÁRIA. MULTA POR ATO ATENTATÓRIO À DIGNIDADE DA JUSTIÇA. PRAZO. 1. A indispensabilidade do medicamento vindicado nas demandas alusivas às prestações de saúde deve ser aferida não apenas em razão da comprovada eficácia do fármaco no tratamento de determinada doença, mas, também, da inexistência ou da patente inefetividade das opções terapêuticas viabilizadas pelo SUS. 2. In casu, sobreveio a criteriosa Nota Técnica n.º 227.691/2024, expedida pela equipe médica do renomado Hospital Israelita Albert Einstein (HIAE), que, na qualidade de órgão de assessoramento do juízo em matéria de saúde, chancelou a prescrição da oncologista assistente, assentando a necessidade de manejo da medicação. 3. Muito embora a ABIRATERONA tenha sido padronizada no âmbito do SUS para o tratamento de câncer de próstata de pacientes com uso prévio de quimioterapia (vide Portaria MS/SCTIE n.º 38, de 24 de julho de 2019), este Tribunal, com base em evidências científicas alardeadas pelos órgãos de assessoramento técnico do Poder Judiciário em matéria de saúde, já entendeu, em mais de uma oportunidade, que a dispensação gratuita da droga pode ser judicialmente deferida a paciente idoso que deixou de se submeter previamente à quimioterapia convencional (a exemplo do DOCETAXEL) em razão de sua alta toxicidade. 4. Esta Turma, salvo situações excepcionais, vem fixando, a título de astreintes, o valor de R$100,00 (cem reais) por dia de descumprimento. 5. A multa prevista no artigo 537 do Código de Processo Civil não se confunde com a sanção pecuniária decorrente de ato atentatório ao exercício da jurisdição (art. 77, §2º, do CPC). É dizer: para incidência daquela basta a configuração objetiva da mora, ao passo que para aplicação desta há de se exigir a prova de que a inexecução se deu de forma intencional, injustificada. 6. Esta Corte entende ser o prazo de 15 (quinze) dias razoável para satisfação ordinária de medida antecipatória. (TRF4, AG 5022066-94.2024.4.04.0000, 9ª Turma, Relator CELSO KIPPER, julgado em 10/09/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Agravo de Instrumento Nº 5022066-94.2024.4.04.0000/SC

RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento, interposto pela União, contra decisão interlocutória do Juízo B do 2° Núcleo de Justiça 4.0 - SC, que, nos autos do Processo n.º 5004062-28.2024.4.04.7204, deferiu a tutela de urgência pleiteada (6.1), determinando que os réus fossem obrigados a fornecer à parte autora o medicamento ABIRATERONA para o tratamento de doença oncológica que lhe acomete (câncer de próstata - CID10 C61).

A agravante alega, preliminarmente, que a decisão recorrida tem potencial para causar prejuízo ao Erário, dado o elevado valor do tratamento vindicado, bem como o caráter irreversível da medida satisfativa deferida.

Afirma, citando o teor do Enunciado n.º 101 da Súmula deste Tribunal, que a tutela de urgência foi deferida sem a realização de perícia médica judicial, que considera imprescindível.

Sustenta haver política pública para o tratamento da moléstia que assola a parte autora, inexistindo prova de seu esgotamento, de sua ineficácia, tampouco da superioridade do fármaco requerido.

Questiona a nota técnica produzida pelo NatJus Nacional e diz não existir notícia de que a parte tenha se submetido a tratamento quimioterápico prévio com DOCETAXEL.

Discorre sobre o alto custo da droga, o fornecimento de medicamentos em assistência oncológica, a medicina baseada em evidências, o consequencialismo jurídico, o processo de incorporação de novas tecnologias ao SUS, a relevância das decisões da CONITEC e a tese jurídica fixada pelo STJ no âmbito do Tema 106.

Requer a concessão de efeito suspensivo para cassar a providência antecipatória outorgada na origem.

Subsidiariamente, pede o (i) direcionamento da obrigação de fazer ao Estado de Santa Catarina, com repartição pro rata do ônus financeiro, (ii) a observância do PMVG (Preço Máximo de Venda ao Governo), com a utilização do CAP (Coeficiente de Adequação de Preços), (iii) a fixação de contracautelas, (iv) a ampliação do prazo de cumprimento da ordem e (v) a redução das multas cominadas.

Sobreveio decisão monocrática, de minha lavra (2.1), por meio da qual deferi parcialmente a suspensão almejada, mantendo, contudo, o fornecimento do fármaco.

Com contrarrazões (15.1), retornaram os autos conclusos.

É o relatório.

Decido.

VOTO

Por ocasião da análise do pedido de atribuição de efeito suspensivo, assim me manifestei:

A Constituição da República Federativa do Brasil, no que interessa ao deslinde da controvérsia, assim preconiza:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 90, de 2015)

[...]

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado.

Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:

I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo;

II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;

III - participação da comunidade.

§ 1º. O sistema único de saúde será financiado, nos termos do art. 195, com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes.

Exsurge dos dispositivos acima colacionados que o direito à saúde se traduz em um direito subjetivo público dos indivíduos de exigir do Estado prestações positivas, passíveis de garantia pela via judicial. Nesse aspecto, a velha concepção de que os preceitos constitucionais alusivos à matéria encerrariam diretrizes de caráter meramente programático restou há muito superada em face da necessidade imperiosa de que as normas definidoras das prerrogativas fundamentais, a exemplo dos direitos à vida e à saúde, tenham aplicação imediata, nos termos do artigo 5º, §1º, da Magna Carta, o que autoriza, por consectário, a interferência do Poder Judiciário, quando chamado a atuar, na concretização de tais direitos.

Inobstante, a problemática da judicialização do direito à saúde faz transparecer, à evidência, o conflito entre o que se convencionou denominar “mínimo existencial” e “reserva do possível”. Noutras palavras, em razão da carência de suportes financeiros suficientes à satisfação de toda e qualquer necessidade social, cumpre ao Poder Público, notadamente ao Legislativo e Executivo, enquanto formuladores e executores de políticas sanitárias, estabelecer prioridades e realizar escolhas alocativas, pautadas por critérios de macrojustiça. Doutro vértice, quando o Judiciário, norteado, a rigor, por parâmetros de microjustiça, entrega certa prestação de saúde a um determinado indivíduo que a postulou, acaba, por vezes, ignorando as consequências globais da destinação de recursos públicos em benefício de certa parte, com invariável prejuízo para o todo.

Nesse cenário, a tomada de decisão em matéria de saúde exige do magistrado notável racionalidade para compatibilizar, tanto quanto possível, direitos individuais indispensáveis à realização prática da dignidade da pessoa humana com a máxima efetividade das políticas públicas destinadas à coletividade.

Veja-se, pois, que a legislação infraconstitucional atinente à dispensação de fármacos (Lei n.º 8080/90), ao regular o comando normativo expresso no artigo 197 da Carta da República, tratou de vincular as ações do Sistema Único de Saúde à corrente intitulada de “Medicina com base em evidências”. Confira-se:

Art. 5º São objetivos do Sistema Único de Saúde SUS:

I - a identificação e divulgação dos fatores condicionantes e determinantes da saúde;

II - a formulação de política de saúde destinada a promover, nos campos econômico e social, a observância do disposto no § 1º do art. 2º desta lei;

III - a assistência às pessoas por intermédio de ações de promoção, proteção e recuperação da saúde, com a realização integrada das ações assistenciais e das atividades preventivas.

Art. 6º Estão incluídas ainda no campo de atuação do Sistema Único de Saúde (SUS):

I - a execução de ações:

[...]

d) de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica;

[...]

Art. 19-M. A assistência terapêutica integral a que se refere a alínea d do inciso I do art. 6o consiste em: (Incluído pela Lei nº 12.401, de 2011)

I - dispensação de medicamentos e produtos de interesse para a saúde, cuja prescrição esteja em conformidade com as diretrizes terapêuticas definidas em protocolo clínico para a doença ou o agravo à saúde a ser tratado ou, na falta do protocolo, em conformidade com o disposto no art. 19-P; (Incluído pela Lei nº 12.401, de 2011)

[...]

19-Q. A incorporação, a exclusão ou a alteração pelo SUS de novos medicamentos, produtos e procedimentos, bem como a constituição ou a alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica, são atribuições do Ministério da Saúde, assessorado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS. (Incluído pela Lei nº 12.401, de 2011) 1o A Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS, cuja composição e regimento são definidos em regulamento, contará com a participação de 1 (um) representante indicado pelo Conselho Nacional de Saúde e de 1 (um) representante, especialista na área, indicado pelo Conselho Federal de Medicina. (Incluído pela Lei nº 12.401, de 2011)

§ 2o O relatório da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS levará em consideração, necessariamente: (Incluído pela Lei nº 12.401, de 2011)

I - as evidências científicas sobre a eficácia, a acurácia, a efetividade e a segurança do medicamento, produto ou procedimento objeto do processo, acatadas pelo órgão competente para o registro ou a autorização de uso; (Incluído pela Lei nº 12.401, de 2011)

II - a avaliação econômica comparativa dos benefícios e dos custos em relação às tecnologias já incorporadas, inclusive no que se refere aos atendimentos domiciliar, ambulatorial ou hospitalar, quando cabível. (Incluído pela Lei nº 12.401, de 2011)

À vista de tal regramento, é possível concluir não haver direito incondicional a qualquer medicamento disponível no mercado, sob pena de gerar grave lesão à ordem administrativa e comprometer o próprio funcionamento do Sistema Único de Saúde. Além do que uma medicação em desconformidade com os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) do SUS deve ser vista com cautela, porquanto tende, em princípio, a contrariar um consenso científico vigente a respeito.

De toda sorte, o Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Agravo Regimental na Suspensão de Tutela Antecipada n.º 175/CE, em 17-03-2010, estabeleceu, de forma paradigmática, critérios para solução judicial dos casos concretos envolvendo o direito à saúde. Naquela oportunidade, o Relator, Ministro Gilmar Mendes, concluiu que, a rigor, "deverá ser privilegiado o tratamento fornecido pelo SUS em detrimento de opção diversa escolhida pelo paciente, sempre que não for comprovada a ineficácia ou a impropriedade da política de saúde existente".

A propósito, o Superior Tribunal de Justiça, reverberando a inteligência externada pelo Pretório Excelso, firmou entendimento de que a indispensabilidade do medicamento vindicado nas demandas alusivas às prestações de saúde deve ser aferida não apenas em razão da comprovada eficácia do fármaco no tratamento de determinada doença, mas, também, da inexistência ou da patente inefetividade das opções terapêuticas viabilizadas pelo SUS. (STJ, AgRg no AREsp 697.696/PR, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe de 26-06-2015; STJ, AgRg no REsp 1.531.198/AL, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 08-09-2015; STJ, AgRg no AREsp 711.246/SC, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe de 21-08-2015; STJ, AgRg no AREsp 860.132/RS, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe de 13-04-2016).

Em idêntico sentido, transcrevo precedentes desta Corte:

MEDICAMENTOS. NÃO DEMONSTRAÇÃO DA IMPRESCINDIBILIDADE DO FÁRMACO. ALTERNATIVAS TERAPÊUTICAS EXISTENTES. 1. Somente fará jus ao fornecimento do medicamento pelo Poder Público a parte que demonstra a respectiva imprescindibilidade, que consiste na conjugação da necessidade e adequação do fármaco e da ausência de alternativa terapêutica. 2. Inexistente a prova de que tenha se esgotado a possibilidade de tratamento pelo estabelecimento da rede de atenção oncológica com aqueles medicamentos fornecidos a todos indistintamente, não há evidência nos autos acerca da presença dos requisitos autorizadores da tutela pretendida. (TRF4, Terceira Turma, Apelação n.º 50066499720174047000, rel. Desembargadora Federal Marga Inge Barth Tessler, j. 06-03-2018)

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO À SAÚDE. CONCESSÃO DE MEDICAMENTO. INDISPENSABILIDADE DO FÁRMACO. 1. O direito à saúde se traduz em um direito subjetivo público dos indivíduos de exigir do Estado prestações positivas, passíveis de garantia pela via judicial. Nesse aspecto, a velha concepção de que os preceitos constitucionais alusivos à matéria encerrariam diretrizes de caráter meramente programático restou há muito superada em face da necessidade imperiosa de que as normas definidoras das prerrogativas fundamentais, a exemplo dos direitos à vida e à saúde, tenham aplicação imediata, nos termos do artigo 5º, §1º, da Magna Carta, o que autoriza, por consectário, a interferência do Poder Judiciário, quando chamado a atuar, na concretização de tais direitos. 2. A indispensabilidade do medicamento vindicado nas demandas alusivas às prestações de saúde deve ser aferida não apenas em razão da comprovada eficácia do fármaco no tratamento de determinada doença, mas, também, da inexistência, do esgotamento ou da patente inefetividade das opções terapêuticas viabilizadas pelo SUS. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. 3. In casu, à luz do acervo probatório anexado aos autos originários, notadamente a prova pericial, restaram demonstradas a necessidade e adequação da medicação requerida. (TRF4, Nona Turma, Apelação Cível n.º 5000303-03.2017.4.04.7204, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, j. 28-08-2019)

Impende salientar, ainda, que a egrégia Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em 25-04-2018, concluiu, sob a sistemática dos recursos repetitivos (art. 1.036, CPC/2015), o julgamento do REsp n.º 1.657.156/RJ (Tema 106 - STJ), de relatoria do Ministro Benedito Gonçalves, acerca da obrigatoriedade do poder público de fornecer medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS, ocasião em que foi firmada a seguinte tese jurídica:

A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos:
i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS;
ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito;
iii) existência de registro na ANVISA do medicamento.

Cumpre referir que o colegiado, na sessão de 12-09-2018, ao julgar os embargos de declaração opostos pelo Estado do Rio de Janeiro em face do acórdão que fixou a tese acima colacionada, entendeu por dar-lhes parcial provimento, sem efeitos infringentes, para o fim de esclarecer que onde se lê: "existência de registro na ANVISA do medicamento", leia-se: "existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência". Demais disso, houve por bem alterar o termo inicial da modulação de efeitos do recurso repetitivo para a data de publicação do aresto embargado, isto é, 04-05-2018.

A par da intelecção firmada pela Corte Superior de Justiça, considerando os princípios constitucionais da isonomia e segurança jurídica, e levando em conta que a presente ação foi ajuizada em 31-05-2024 (1.1), posteriormente, portanto, ao citado marco modulatório, reputo inescusável o acatamento ao precedente estabelecido (art. 927, III, CPC/2015).

Assentadas tais premissas, passo ao exame do caso concreto.

De início, tenho que a natureza sumária do juízo de cognição exarado em análise de eventual tutela provisória desobriga o julgador a revelar alto grau de certeza jurídica acerca da pretensão posta em juízo, bastando-lhe, para fins de sua outorga, a constatação da plausibilidade do direito material vindicado, assim como do perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, nos termos do artigo 300, caput, do Novo Código de Processo Civil.

Em face dos elementos até então carreados ao feito, entendo presente a verossimilhança da pretensão autoral, a obstar, por ora, a pretendida revogação da providência satisfativa.

A uma porque este Tribunal tem entendimento cristalizado no sentido de que, em casos de tratamento de doenças oncológicas perante unidades credenciadas como CACON/UNACON, existe, a princípio, presunção de acerto da prescrição médica, razão pela qual, nesses casos, dispensa-se a realização de perícia antes do exame do pleito liminar. A esse respeito, exibo os seguintes julgados: AG 5034170-55.2023.4.04.0000, NONA TURMA, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 26/02/2024; AG 5031755-02.2023.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relator ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, juntado aos autos em 23/11/2023; AC 5040196-51.2019.4.04.7100, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relatora para Acórdão ELIANA PAGGIARIN MARINHO, juntado aos autos em 15/03/2023; AG 5032655-58.2018.4.04.0000, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 04/02/2019; e AG 5047808-68.2017.4.04.0000, QUARTA TURMA, Relator CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, juntado aos autos em 14/12/2017.

Veja-se, pois, que a inteligência firmada nesta Corte supervaloriza a orientação médica do profissional vinculado à Rede de Atenção Oncológica, sendo exatamente esta a hipótese sub examine, na qual a prescrição do fármaco se deu no âmbito do Hospital São José (1.5, 1.10 e 1.11), em Criciúma-SC, nosocômio de referência que ostenta a qualidade de UNACON.

A duas porque sobreveio a criteriosa Nota Técnica n.º 227.691/2024, expedida pela equipe médica do renomado Hospital Israelita Albert Einstein (HIAE), que, na qualidade de órgão de assessoramento do juízo em matéria de saúde, chancelou a prescrição da oncologista assistente, assentando a necessidade de manejo da medicação (4.1).

Ressalto, outrossim, que este Colegiado já pacificou o entendimento de que a perícia judicial, via de regra, pode ser substituída por parecer subscrito por órgão de assessoramento técnico do Poder Judiciário (NAT-Jus). A esse respeito, transcrevo os seguintes precedentes: AG 5044996-48.2020.4.04.0000, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 26/04/2021; AG 5003553-83.2021.4.04.0000, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 21/04/2021 e AG 5037092-74.2020.4.04.0000, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 19/11/2020.

A três porque, muito embora a ABIRATERONA tenha sido padronizada no âmbito do SUS para o tratamento de câncer de próstata de pacientes com uso prévio de quimioterapia (vide Portaria MS/SCTIE n.º 38, de 24 de julho de 2019), este Tribunal, com base em evidências científicas alardeadas pelos órgãos de assessoramento técnico do Poder Judiciário em matéria de saúde, já entendeu, em mais de uma oportunidade, que a dispensação gratuita da droga pode ser judicialmente deferida a paciente idoso que deixou de se submeter previamente à quimioterapia convencional (a exemplo do DOCETAXEL) em razão de sua alta toxicidade, a saber:

DIREITO À SAÚDE. APELAÇÃO. MEDICAMENTOS. ADEQUAÇÃO DO TRATAMENTO. RESPONSABILIDADES. TRATAMENTO ONCOLÓGICO. 1. O Superior Tribunal de Justiça em julgamento realizado sob a sistemática dos recursos repetitivos assentou que a concessão de remédios não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa da comprovação da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento; da ineficácia do tratamento fornecido pelo sistema público de sáude; da incapacidade financeira do postulante e da existência de registro na ANVISA para o uso pleiteado (STJ, EDcl no REsp 1657156/RJ, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 12/09/2018, DJe 21/09/2018). 2. Caso concreto em que restou demonstrada a adequação do tratamento e das evidência científicas na entrega de Abiraterona (Zytiga) para tratamento de neoplasia maligna de próstata (CID10 C 61), tendo em vista a impossibilidade do paciente de se submeter previamente à quimioterapia convencional (com Docetaxel) em razão de sua alta toxicidade. 3. Quanto à responsabilidade financeira por tratamento oncológico, é dever da União viabilizar o custeio da política de saúde (art. 8º, II, Portaria n.º 876/13). (TRF4, AC 5025757-30.2022.4.04.7100, QUINTA TURMA, Relator HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR, juntado aos autos em 13/07/2023, grifei)

SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. ABIRATERONA. CÂNCER DE PRÓSTATA. IMPRESCINDIBILIDADE E ADEQUAÇÃO. TRATAMENTO EM UNACON/CACON. PRESUNÇÃO DE ACERTO PARA FINS DE TUTELA DE URGÊNCIA. 1. Comprovado por Nota Técnica que o medicamento é imprescindível e adequado ao caso concreto. 2. Cuida-se de caso em que não está indicado o tratamento com o fármaco docetaxel, disponibilizado pelo SUS, por tratar-se de paciente com idade avançada, segundo informações do parecer técnico. 3. No que tange à necessidade de realização de perícia prévia ao deferimento da medida de urgência, esta Turma tem flexibilizado tal exigência quando a parte realiza seu tratamento oncológico pelo SUS, em instituição credenciada como CACON/UNACON, porquanto se presume, nesses casos, o acerto da prescrição médica. 4. Esta Corte firmou entendimento no sentido de que a responsabilidade pelo fornecimento de medicamento/tratamento de saúde é solidária entre os três entes da federação e, assim, a parte pode litigar contra qualquer dos responsáveis. 5. A existência de normas administrativas estabelecendo uma atuação prioritária de cada ente de acordo com a complexidade do caso não afasta a obrigação de todos na correta implementação das políticas públicas de saúde. 6. Levando em conta que o objeto do feito originário consiste no fornecimento de medicação oncológica, a responsabilidade financeira da aludida prestação é atribuível ao ente federal, de forma que não há falar em financiamento pro rata da prestação. 7. O Superior Tribunal de Justiça, ao analisar a tese firmada no julgamento do Tema 793 pelo Supremo Tribunal Federal, quando estabelece a necessidade de se identificar o ente responsável a partir dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização do SUS, relaciona-se ao cumprimento de sentença (AgInt no CC n.º 166.964/RS, Rel. Min. Og Fernandes, 1ª Seção, j. 23/10/2019). (TRF4, AG 5006937-20.2022.4.04.0000, NONA TURMA, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 19/05/2022, grifei)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO ONCOLÓGICO. ABIRATERONA (ZYTIGA®) TUTELA DE URGÊNCIA. REQUISITOS PRESENTES. 1. A Constituição Federal de 1988, após arrolar a saúde como direito social em seu artigo 6º, estabelece, no art. 196, que a saúde é "direito de todos e dever do Estado", além de instituir o "acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação". 2. Observando as premissas elencadas no julgado Suspensão de Tutela Antecipada nº. 175 (decisão da Corte Especial no Agravo Regimental respectivo proferida em 17 de março de 2010, Relator o Ministro Gilmar Mendes), quando da avaliação de caso concreto, devem ser considerados, entre outros, os seguintes fatores: (a) a inexistência de tratamento/procedimento ou medicamentosimilar/genérico oferecido gratuitamente pelo SUS para a doença ou, no caso de existência, sua utilização sem êxito pelo postulante ou sua inadequação devido a peculiaridades do paciente; (b) a adequação e a necessidade do tratamento ou do medicamento pleiteado para a doença que acomete o paciente; (c) a aprovação do medicamento pela ANVISA (só podendo ser relevado em situações muito excepcionais, segundo disposto nas Leis n.º 6.360/76 e 9.782/99) e (d) a não configuração de tratamento experimental. 3. Indispensável, em primeira linha, nos casos onde se pretende o fornecimento de fármaco oncológico, submissão do paciente a tratamento perante unidades de CACON ou UNACON, uma vez que o atendimento por estas não se resume a entrega do medicamento para a moléstia específica, mas o tratamento integral do paciente. 4. Na hipótese em exame, os documentos juntados com a inicial demonstram que a parte autora se submete a tratamento na rede pública de saúde, através da União Oeste Paranaense de Estudos e Combate ao Câncer - UOPECCAN, entidade credenciada como CACON/UNACON. Registre-se, ainda, que o relatório médico foi elaborado por profissional especialista na moléstia que acomete o paciente, vinculada à referida instituição, cujo corpo médico é o competente para indicar a medicação adequada ao seu tratamento. 5. Levando-se em consideração a contraindicação à quimioterapia tradicional com docetaxel relatada pelo médico assistente em face da idade avançada e fragilidade do paciente, entende-se, em um juízo perfunctório, não haver nenhum óbice à dispensada da medicação requerida, no atual estágio da doença que acomete o demandante, na medida em que houve demonstração da sua eficácia e superioridade. 6. Presentes os requisitos ensejadores da concessão da tutela de urgência, nos termos do art. 300 do Novo CPC, deve ser mantida a antecipação de tutela deferida pelo juízo monocrático. 7. O Plenário do STF em 22-5-2019 reiterou sua jurisprudência no sentido de que os entes federados têm responsabilidade solidária no fornecimento de medicamentos e tratamentos de saúde. Nos casos em que se discute fornecimento de tratamento oncológico, cabe à União a responsabilidade pelo cumprimento da medida, bem assim o ressarcimento na eventualidade deste ter sido anteriormente imputado a Ente Público diverso, sem prejuízo do redirecionamento em caso de descumprimento. (TRF4, AG 5004397-33.2021.4.04.0000, DÉCIMA TURMA, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 13/05/2021, grifei)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO INCORPORADOS EM ATOS NORMATIVOS DO SUS. RECURSO ESPECIAL N.º 1.657.156/RJ. TEMA 106 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. ABIRATERONA PARA NEOPLASIA MALIGNA DA PRÓSTATA. TUTELA PROVISÓRIA. PRAZO. RESPONSABILIDADE FINANCEIRA. MEDICAÇÃO ONCOLÓGICA. UNIÃO. 1. Nos termos definidos no julgamento do REsp n.º 1.657.156/RJ (Tema 106 - STJ), a concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência. 2. A indispensabilidade do medicamento vindicado nas demandas alusivas às prestações de saúde deve ser aferida não apenas em razão da comprovada eficácia do fármaco no tratamento de determinada doença, mas, também, da inexistência ou da patente inefetividade das opções terapêuticas viabilizadas pelo SUS. 3. In casu, o demandante conta, atualmente, com 68 anos de idade e, como relatado pelo médico que lhe acompanha, especialista em oncologia clínica, já se submeteu a tratamento cirúrgico, radioterapia e hormonioterapia, sem condições clínicas de continuar com tratamento quimioterápico devido a toxicidade excessiva. 4. Esta Corte entende ser o prazo de 15 (quinze) dias razoável para satisfação ordinária de medida antecipatória. 5. Levando em conta que o objeto do expediente originário consiste no fornecimento de medicação oncológica, a responsabilidade financeira da aludida prestação é atribuível ao ente federal. (TRF4, AG 5000630-21.2020.4.04.0000, NONA TURMA, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 03/07/2020, sem o grifo no original)

Certifico-me, então, que o demandante conta, na atualidade, com 71 (setenta e um) anos de idade (1.3).

Nesse cenário, entendo que eventual perigo de irreversibilidade da medida deve curvar-se à verossimilhança das alegações autorais, que, in casu, revela-se patente.

Dessarte, assimilado o referido quadro fático-probante e considerando que custo do medicamento (1.5, fl. 01) supera em muito os proventos mensais do autor (1.7), entendo deva ser mantida a tutela de urgência.

Responsabilidade financeira e direcionamento da obrigação

A norma constitucional extraída do artigo 196 da Carta Magna consagra a responsabilidade solidária dos entes federativos em matéria de saúde pública, eis que o vocábulo "Estado", considerado em sua maior amplitude, retrata o Poder Público como um todo, alcançando, indubitavelmente, a União, os Estados propriamente ditos, o Distrito Federal e os Municípios.

A reforçar tal ilação, o artigo 23, inciso II, bem como o artigo 198, caput e §1º, ambos do Texto Maior, trataram de firmar a competência comum das pessoas federativas com relação à prestação de serviços públicos de saúde e de instituir um Sistema Único de Saúde (SUS), cujo financiamento fosse levado a efeito a partir dos recursos orçamentários de todos os entes.

A jurisprudência corrente dos Tribunais Superiores orienta-se, de maneira uniforme, no sentido de que a responsabilidade dos entes federados traduz litisconsórcio passivo facultativo, de modo que, em ações deste jaez, é dado ao cidadão enfermo obter os medicamentos de que necessite perante quaisquer das pessoas políticas, cabendo-lhe, portanto, o direito subjetivo de demandá-las em conjunto ou isoladamente.

Nada obstante, destaco que o Supremo Tribunal Federal, na sessão de 23 de maio de 2019, ao julgar os embargos de declaração opostos pela União contra decisão do Plenário Virtual no RE n.º 855178/SE (Tema 793), com relatoria para o acórdão do Ministro Edson Fachin, fixou, por maioria, a seguinte tese de repercussão geral:

Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde e, diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro (grifei)

Embora a Corte Suprema tenha reafirmado sua jurisprudência prevalente - no sentido de reconhecer a responsabilidade solidária dos entes federados em matéria de direito à saúde -, tratou de inovar no cenário jurídico, ao exigir, de forma expressa, que o magistrado direcione o cumprimento da obrigação, segundo as normas de repartição de competências, assim como condene a pessoa política legalmente responsável pelo financiamento da prestação sanitária a ressarcir quem suportou tal ônus.

In casu, levando em conta que o objeto do expediente originário consiste no fornecimento de medicação oncológica, a responsabilidade financeira de sua aquisição, consoante iterativa jurisprudência deste Tribunal, é exclusiva da União, não havendo se falar, pois, em financiamento pro rata da prestação sanitária.

Quanto ao direcionamento, não assiste razão à agravante, pois o juízo de primeiro grau já estipulou que "ao Estado de Santa Catarina caberá a obrigação de adquirir e fornecer o medicamento à(o) paciente".

Astreintes

No tocante à multa coercitiva, entendo que o magistrado singular, a seu critério, pode perfeitamente fixá-la, com vistas a garantir a efetividade da tutela por ele concedida em matéria de direito à saúde, até porque a função das astreintes é justamente superar a recalcitrância do devedor em cumprir a obrigação de fazer ou de não fazer que lhe foi imposta.

A propósito, trago à baila a literalidade da norma contida no artigo 537 do Código de Processo Civil:

Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito.

Cuida-se, pois, de medida jurídica dotada de natureza assecuratória para o cumprimento das ordens judiciais, estando revestida de caráter instrumental para a persecução do direito reconhecido.

Demais disso, o STJ já reconheceu, em sede de julgamento repetitivo (REsp n.º 1474665/RS - Tema 98), que, em se tratando de ação na qual se busca o fornecimento de medicamento, cumpre ao juiz, com maior razão, adotar o preceito cominatório em desfavor do ente público para compeli-lo a satisfazer o bem da vida almejado pelo jurisdicionado, sob pena de ser subvertida garantia fundamental. Cuida-se, pois, do denominado "poder geral de efetivação", a cargo legítimo do aplicador do direito.

Quanto ao importe das astreintes, observo que o juízo de origem fixou multa consolidada no valor correspondente ao custo aproximado de 3 (três) meses do tratamento pleiteado, o que excede em muito o valor conhecidamente arbitrado neste Regional. Assim sendo, levando em conta a razoabilidade e a proporcionalidade que devem imperar na aplicação do ordenamento jurídico (art. 8º, NCPC), nela incluída a imposição de multa para efetivação de tutela provisória (arts. 297, p.u., 519 e 536, §1º, NCPC), hei por bem fixá-la, na hipótese sub examine, em R$ 100,00 (cem reais) por dia de descumprimento.

Multa por ato atentatório à dignidade da justiça

No ponto, colho da decisão objurgada a seguinte cominação (evento 6, DESPADEC1):

3.3. Sem prejuízo, expeça-se ofício ao Secretário Executivo do Ministério da Saúde para que, no prazo de 15 dias, promova o cumprimento da ordem de depósito do valor necessário à aquisição do fármaco, conforme orçamentos que acompanham a petição inicial, ou indique conta para sequestro judicial, sob pena de multa de 10% sobre o valor da causa (CPC, art. 77, §§ 1º e 2º).

Registro, então e com lastro em precedente deste Colegiado, que a multa prevista no artigo 537 do Código de Processo Civil não se confunde com a sanção pecuniária decorrente de ato atentatório ao exercício da jurisdição (art. 77, §2º, do CPC). É dizer: para incidência daquela basta a configuração objetiva da mora, ao passo que para aplicação desta há de se exigir a prova de que a inexecução se deu de forma intencional, injustificada. (AG 5001898-13.2020.4.04.0000, NONA TURMA, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 13/05/2020).

Operada tal distinção, não se me afigura legítimo que a multa insculpida no art. 77, §2º, do CPC seja fixada a priori, isto é, antes mesmo de se escrutinar os motivos que eventualmente tangenciam um suposto inadimplemento por parte do ente federal, que, inclusive, já trouxe aos autos originários a comprovação de diligências iniciais para a satisfação da obrigação (20.1).

É claro que o montante arbitrado a título de astreintes (art. 537, CPC) poderá ser majorado, ad futurum, caso constatada eventual recalcitrância dos réus em dar cumprimento regular à tutela provisória, assim como a multa por ato atentatório à dignidade da justiça (art. 77, §2º, do CPC) poderá ser fixada se demonstrada a intenção deliberada do ente público de descumprir a determinação judicial. Confira-se:

DIREITO DA SAÚDE. MULTA POR DESCUMPRIMENTO. VALOR MAJORADO. POSSIBILIDADE. Diante do substancial atraso dos atos administrativos para dar início ao cumprimento da medida antecipada, é possível a majoração da multa diária para além dos cem reais que se tem quotidianamente estabelecido. (TRF4, AG 5048388-59.2021.4.04.0000, NONA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 15/02/2022)

APELAÇÃO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. DESNECESSIDADE DE CONTINUAÇÃO DO TRATAMENTO. PERDA SUPERVENIENTE DE OBJETO. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. EXTINÇÃO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. ATO ATENTATÓRIO À DIGNIDADE DA JUSTIÇA. NÃO CONFIGURAÇÃO. POSSIBILIDADE DE IMPOSIÇÃO DE MULTA DIÁRIA (ASTREINTES). TEMA 98 DO STJ. 1. Havendo expresso desinteresse da parte autora na continuidade do tratamento medicamentoso, sobrevém a perda do objeto da demanda, não sendo mais necessário o provimento jurisdicional reclamado. Nesse sentido, forçosa a extinção do feito sem resolução meritória, consoante disposto no artigo 485, inciso VI, do Novo Código de Processo Civil. 2. Em função do princípio da causalidade, nas hipóteses de extinção do processo sem resolução de mérito, decorrente de perda de objeto superveniente ao ajuizamento da ação, a parte que deu causa à instauração do processo deverá suportar o pagamento das custas e dos honorários advocatícios. 3. Em se tratando de causa afeta à garantia do direito à saúde, cujo valor material é inestimável, a incidência da norma contida no artigo 85, §8º, do Novo Código de Processo Civil, revela-se de todo adequada, ficando a cargo do julgador, mediante apreciação equitativa, o arbitramento da verba honorária. 4. Desde que não haja situação excepcional que recomende outro valor, os reús devem ser condenados em honorários advocatícios à razão de R$ 3.000,00 (três mil reais), pro rata. Precedentes desta Turma. 5. Não comprovada intenção deliberada do ente público de descumprir determinação judicial, torna-se inaplicável a multa prevista no artigo 77, §2º, do Código de Processo Civil. 6. Inobstante, a critério do magistrado singular, poderá ser aplicada multa coercitiva, cujo objetivo é garantir a efetividade da medida judicial deferida em matéria de direito à saúde. A função das astreintes é justamente no sentido de superar a recalcitrância do devedor em cumprir a obrigação de fazer ou de não fazer que lhe foi imposta, incidindo esse ônus a partir da ciência do obrigado e da sua negativa de adimplir a obrigação voluntariamente. Inteligência extraída do julgamento do REsp n.º 1.474.665/RS (Tema 98). (TRF4, NONA TURMA, Apelação Cível n.º 5001964-18.2016.4.04.7215, Relator Desembargador Federal CELSO KIPPER, j. 29-05-2019, sem o grifo no original)

Todavia e por ora, a multa por ato atentatório não se justifica.

Prazo

Relativamente à dilação do prazo para implemento da obrigação, registro que esta Corte já teve a oportunidade de consignar ser o prazo de 15 (quinze) dias razoável para satisfação ordinária de medida antecipatória, a saber:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. TUTELA DE URGÊNCIA. PRESENÇA DOS REQUISITOS. MEDICAMENTO INCORPORADO AO SUS. MEDIDAS DE CONTRACAUTELA.PRAZO PARA CUMPRIMENTO. MULTA DIÁRIA POR DESCUMPRIMENTO. 1. A responsabilidade dos Entes Federados configura litisconsórcio passivo, podendo a ação em que se postula fornecimento de prestação na área da saúde ser proposta contra a União, Estado ou Município, individualmente ou de forma solidária, podendo a autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro. (Recurso Extraordinário (RE 855.178, Tema 793). 2. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. 3. Hipótese em que as circunstâncias do caso concreto são suficientes, em uma análise preliminar, para a caracterização da verossimilhança das razões que embasaram o pedido inicial, considerando tratar-se de medicamento com decisão de incorporação ao SUS. 4. Não obstante não ser o Estado, na presente ação, responsável pelo custeio do medicamento, é responsável solidário para responder pela prestação do serviço à saúde prestado. Portanto, nada impede que se busque o cumprimento de um dos devedores. 5. Nos casos de fornecimento de medicamentos por prazo indeterminado, a adoção de medidas de contracautela são necessárias, a fim de garantir o exato cumprimento da decisão judicial, podendo ser determinadas inclusive de ofício. 6. Nas ações que envolvem o fornecimento de medicamentos, esta Corte tem considerado como razoável a concessão de 15 (quinze) dias para que o ente público cumpra a determinação judicial. 7. Cabível a fixação de astreintes em prejuízo da Fazenda Pública, como meio coercitivo para cumprimento de obrigação de fazer ou para entrega de coisa. Conforme precedentes deste Tribunal, o valor da multa fixada por descumprimento da obrigação é de R$ 100,00 (cem reais), podendo ser alterado em caso de recalcitrância do poder público em relação ao cumprimento da ordem judicial. (TRF4, AG 5015771-12.2022.4.04.0000, DÉCIMA TURMA, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 21/07/2022)

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. CUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL. SEQUESTRO DE VALORES RESTITUÍDOS AO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL PELO CANCELAMENTO OU RETIFICAÇÃO DE PRECATÓRIO OU DE REQUISIÇÃO DE PEQUENO VALOR. POSSIBILIDADE. BLOQUEIO DE VERBAS PÚBLICAS NÃO VINCULADAS AO FUNDO NACIONAL DE SAÚDE. VIABILIDADE. PRAZO. RAZOABILIDADE. 1. É permitida a utilização, de forma emergencial, de montante que foi devolvido ao tribunal para assegurar o cumprimento de obrigação de fazer. 2. Diante da impossibilidade de obter êxito no bloqueio de valores nas contas da União vinculadas ao Fundo Nacional de Saúde, justifica-se, em caráter excepcional, que a medida alcance quantias depositadas em contas públicas diversas. 3. O prazo de 15 (quinze) dias é razoável para a satisfação ordinária de medida antecipatória em matéria de saúde. (TRF4, AG 5035762-08.2021.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 25/02/2022)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. REVISÃO DE ARTRODESE LOMBAR. COLOCAÇÃO DE NEUROESTIMULADOR. 1. Configuradas a probabilidade do direito e o risco de dano irreparável, é de ser concedida tutela de urgência para que seja realizada, no prazo de quinze dias, procedimento cirúrgico de revisão de artrodese lombar associada à fixação da coluna com a substituição de parafusos quebrados e frouxos, além de colocação de neuroestimulador par controle de dor crônica. 2. Em se tratando de procedimento incorporado ao SUS, justifica-se a determinação de que seja realizado, subsidiariamente, em hospital particular. 3. Agravo ao qual se nega provimento. (TRF4, AG 5049364-66.2021.4.04.0000, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 07/04/2022)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. ÓBITO DA PARTE AUTORA. RECURSO PREJUDICADO QUANTO AO MÉRITO. PRAZO PARA CUMPRIMENTO DA TUTELA. INTERESSE REMANESCENTE. 1. Remanesce interesse na análise do prazo, porquanto o falecimento do autor não elide possível penalização pela eventual intempestividade no cumprimento da tutela provisória 2. Esta Corte entende ser o prazo de 15 (quinze) dias razoável para satisfação ordinária de medida antecipatória. (TRF4, AG 5056845-17.2020.4.04.0000, NONA TURMA, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 26/04/2021)

Neste particular, a outorga da suspensão almejada é medida que se impõe.

Contracautelas

No que tange às medidas de contracautela, entendo plenamente satisfatórias aquelas arbitradas na origem, a saber (evento 6):

a) Renovação trimestral da receita médica e respectiva apresentação no local de retirada dos medicamentos;

b) Apresentação de dados atualizados do paciente e de seu advogado à Gerência de Saúde responsável pela entrega dos medicamentos, como endereço residencial e/ou profissional, endereço eletrônico, e telefone;

c) Acondicionamento do(s) fármaco(s) recebido(s) em conformidade com as informações e especificações do laboratório fabricante;

d) Comunicação imediata (prazo de 48 horas) ao responsável pela dispensação/ministração do(s) medicamento(s) acerca da ocorrência de suspensão/interrupção do tratamento, com devolução dos fármacos excedentes ou não utilizados;

e) Exclusividade de administração de medicamento oncológico, se for o caso, ao CACON/UNACON responsável pelo tratamento do enfermo.

Coeficiente de Adequação de Preços (CAP) e Preço Máximo de Venda ao Governo (PMVG)

Não conheço do recurso quanto a matéria, pois da decisão recorrida consta que deverá ser observada a aplicação do Coeficiente de Adequação de Preços (CAP).

Dispositivo

Ante o exposto, conheço em parte do recurso e, na parte conhecida, defiro o pedido de efeito suspensivo apenas para (i) reduzir o valor da multa diária para R$ 100,00 (cem reais), (ii) excluir a multa por ato atentatório à dignidade da justiça e (iii) ampliar o prazo de cumprimento da tutela para 15 (quinze) dias.

Diante do conteúdo da deliberação singular acima transcrito, não vejo razões para alterar o posicionamento então adotado.

Apenas retifico a liminar quanto ao prazo, pois observo que o juízo de primeiro grau fixou um lapso temporal de 15 (quinze) dias para o cumprimento da ordem.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por conhecer em parte do agravo de instrumento para, na parte conhecida, dar-lhe parcial provimento apenas (i) reduzir o valor da multa diária e excluir a multa por ato atentatório à dignidade da justiça.



Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004682100v23 e do código CRC 54b888d7.Informações adicionais da assinatura:
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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Agravo de Instrumento Nº 5022066-94.2024.4.04.0000/SC

RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER

EMENTA

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. ABIRATERONA. câncer de próstata. TUTELA PROVISÓRIA. VIABILIDADE. MULTA DIÁRIA. MULTA POR ATO ATENTATÓRIO À DIGNIDADE DA JUSTIÇA. prazo.

1. A indispensabilidade do medicamento vindicado nas demandas alusivas às prestações de saúde deve ser aferida não apenas em razão da comprovada eficácia do fármaco no tratamento de determinada doença, mas, também, da inexistência ou da patente inefetividade das opções terapêuticas viabilizadas pelo SUS.

2. In casu, sobreveio a criteriosa Nota Técnica n.º 227.691/2024, expedida pela equipe médica do renomado Hospital Israelita Albert Einstein (HIAE), que, na qualidade de órgão de assessoramento do juízo em matéria de saúde, chancelou a prescrição da oncologista assistente, assentando a necessidade de manejo da medicação.

3. Muito embora a ABIRATERONA tenha sido padronizada no âmbito do SUS para o tratamento de câncer de próstata de pacientes com uso prévio de quimioterapia (vide Portaria MS/SCTIE n.º 38, de 24 de julho de 2019), este Tribunal, com base em evidências científicas alardeadas pelos órgãos de assessoramento técnico do Poder Judiciário em matéria de saúde, já entendeu, em mais de uma oportunidade, que a dispensação gratuita da droga pode ser judicialmente deferida a paciente idoso que deixou de se submeter previamente à quimioterapia convencional (a exemplo do DOCETAXEL) em razão de sua alta toxicidade.

4. Esta Turma, salvo situações excepcionais, vem fixando, a título de astreintes, o valor de R$100,00 (cem reais) por dia de descumprimento.

5. A multa prevista no artigo 537 do Código de Processo Civil não se confunde com a sanção pecuniária decorrente de ato atentatório ao exercício da jurisdição (art. 77, §2º, do CPC). É dizer: para incidência daquela basta a configuração objetiva da mora, ao passo que para aplicação desta há de se exigir a prova de que a inexecução se deu de forma intencional, injustificada.

6. Esta Corte entende ser o prazo de 15 (quinze) dias razoável para satisfação ordinária de medida antecipatória.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, conhecer em parte do agravo de instrumento para, na parte conhecida, dar-lhe parcial provimento apenas (i) reduzir o valor da multa diária e excluir a multa por ato atentatório à dignidade da justiça, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 10 de setembro de 2024.



Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004682101v7 e do código CRC be7c21f8.Informações adicionais da assinatura:
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Conferência de autenticidade emitida em 12/12/2024 15:23:57.


Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 03/09/2024 A 10/09/2024

Agravo de Instrumento Nº 5022066-94.2024.4.04.0000/SC

RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER

PRESIDENTE: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PROCURADOR(A): ANDREA FALCÃO DE MORAES

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 03/09/2024, às 00:00, a 10/09/2024, às 16:00, na sequência 859, disponibilizada no DE de 23/08/2024.

Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER EM PARTE DO AGRAVO DE INSTRUMENTO PARA, NA PARTE CONHECIDA, DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO APENAS (I) REDUZIR O VALOR DA MULTA DIÁRIA E EXCLUIR A MULTA POR ATO ATENTATÓRIO À DIGNIDADE DA JUSTIÇA.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal CELSO KIPPER

Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER

Votante: Juíza Federal JACQUELINE MICHELS BILHALVA

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 12/12/2024 15:23:57.


Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

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