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Agravo de Instrumento Nº 5022467-93.2024.4.04.0000/RS
RELATORA: Juíza Federal ANA PAULA DE BORTOLI
RELATÓRIO
Trata-se de agravo de instrumento interposto pela UNIÃO contra decisão que deferiu a tutela provisória de urgência visando ao "fornecimento do medicamento PEMBROLIZUMABE, por ser portadora de melanoma maligno (CID C 43), atualmente em estágio clínico IIIb".
Requer a parte agravante, em síntese:
5.1 a atribuição do efeito suspensivo ao presente recurso, na forma do artigo 1.019, I, do CPC, sustando-se os efeitos da decisão combatida;
5.2 a intimação da parte agravada, na pessoa de seu procurador, para oferecimento de resposta ao recurso, querendo;
5.3 ao final, seja provido o presente agravo, para que seja REVOGADA A TUTELA ou, sucessivamente:
a) determinada a realização de perícia médica;
b) determinada a realização de prova da situação econômica da parte adversa e seu núcleo familiar;
b) seja imputado o cumprimento da decisão ao ao Estado;
c) seja determinada a observância do CAP/PMVG;
d) sejam estabelecidas medidas de contracautela.
e) seja ampliado o prazo para cumprimento e reduzido o valor da astreinte.
Liminarmente, foi indeferido o pedido de efeito suspensivo (
).Oportunizadas contrarrazões, vieram os autos para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Quando da análise do pedido liminar, foi proferida a seguinte decisão (
):Considerações gerais sobre o direito à saúde
Há balizas já estabelecidas na jurisprudência dos tribunais superiores no que toca ao direito fundamental à saúde à luz da ordem constitucional vigente, e bem assim ao dever de fornecimento de medicamentos e outras prestações dessa natureza pelo poder público, inclusive através de ações judiciais (STF, STA 175 AgR, Relator Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 17/03/2010). Os limites da intervenção judicial sobre políticas públicas de saúde efetivamente existentes, porém, ainda suscitam discussão.
Acerca da "reserva do possível", por exemplo, o entendimento é de que ela não justifica, por si só, o descumprimento dos deveres constitucionais impostos ao Poder Público, inclusive no que diz respeito ao direito à saúde. Nesse exato sentido, aliás, a posição do Supremo Tribunal Federal:
Cumpre advertir, desse modo, que a cláusula da "reserva do possível" - ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível - não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se, dolosamente, do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade.
(...) entre proteger a inviolabilidade do direito à vida e à saúde - que se qualifica como direito subjetivo inalienável a todos assegurado pela própria Constituição da República (art. 5º, "caput", e art. 196) - ou fazer prevalecer, contra essa prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, entendo, uma vez configurado esse dilema, que razões de ordem ético-jurídica impõem, ao julgador, uma só e possível opção: aquela que privilegia o respeito indeclinável à vida e à saúde humanas.
(...) a missão institucional desta Suprema Corte, como guardiã da superioridade da Constituição da República, impõe, aos seus Juízes, o compromisso de fazer prevalecer os direitos fundamentais da pessoa, dentre os quais avultam, por sua inegável precedência, o direito à vida e o direito à saúde. (STA 175, Rel. Min. Celso de Mello, DJE 30/04/2010)
A alegação de "reserva do possível" apenas é legítima quando se demonstra, mediante elementos concretos e objetivamente aferíveis, a absoluta impossibilidade financeira no que tange ao cumprimento da prestação estatal exigida pela Constituição. Com isso, não há que se falar em impossibilidade de reconhecimento do direito à saúde pleiteado com base na genérica alegação de alto custo do tratamento.
Quanto à dispensação de medicamentos, o Superior Tribunal de Justiça, por outro lado, em julgamento realizado sob a sistemática dos recursos repetitivos, assentou no acórdão dos embargos de declaração no REsp 1657156/RJ (Tema 106 - Rel. Min. Benedito Gonçalves, pub DJe 21/9/2018) entendimento no sentido de que "A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos:
"i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS;
ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito;
iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência".
A possibilidade de "off label", como visto, foi restringida. O tema, contudo, ainda suscita controvérsias, havendo posição no sentido de que quem deve decidir sobre a concreta adequação do medicamento, mesmo que "off label", é o profissional médico (REsp 1769557/CE, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 13/11/2018, DJe 21/11/2018). Além disso, noutra oportunidade, foi apontado que "havendo evidências científicas que respaldem a prescrição, é universalmente admitido e corriqueiro o uso off label de medicamento, por ser fármaco devidamente registrado na Anvisa, aprovado em ensaios clínicos, submetido ao Sistema Nacional de Farmacovigilância e produzido sob controle estatal, apenas não aprovado para determinada terapêutica" (REsp 1729566/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 04/10/2018, DJe 30/10/2018).
Por outro lado, nos casos de tratamento do câncer, deve ser ressaltada a existência de sistemática própria, na qual os medicamentos são fornecidos pelos estabelecimentos de saúde habilitados em oncologia (CACON/UNACON) e credenciados pelo SUS. Esses centros oferecem assistência especializada e integral ao paciente, cumprindo observar que são eles que padronizam, adquirem e prescrevem os medicamentos oncológicos.
Em suma, na análise do caso concreto é relevante verificar, dentre outras coisas:
a) se há comprovação cabal da doença e do seu atual estágio, por meio de documentação idônea e atualizada, acompanhada da prescrição da tecnologia com a devida justificativa;
b) se há incapacidade da parte autora de arcar com os custos do seu tratamento;
c) se, em caso de câncer, o tratamento do paciente ocorre junto à rede de saúde credenciada como CACON/ UNACON;
d) se ficou configurado o esgotamento de alternativas de tratamento disponíveis no SUS;
e) se foi demonstrada a eficácia da tecnologia, com realização de estudos científicos idôneos, não se tratando de tecnologia com caráter experimental;
f) se há possibilidade de progressão da doença ou de maior risco de morte em caso de não utilização da tecnologia requerida, sendo demonstrada sua imprescindibilidade; e,
g) se existe Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) em relação à doença apresentada.
A perícia médica não é indispensável em todos os todos os processos que tratam do direito à saúde, nem constitui condição para o exame de pedidos que tratam de situações de urgência. O juiz poderá se valer de pareceres médicos e de notas técnicas para a tomada de decisão e, em situações de urgência, terá que decidir com base em verossimilhança, a ser avaliada diante dos documentos de que dispõe.
Ademais, a perícia técnica poder ser substituída por nota técnica. É o que sugere o Enunciado n° 31, da I Jornada de Direito da Saúde: "Recomenda-se ao Juiz a obtenção de informações do Núcleo de Apoio Técnico ou Câmara Técnica e, na sua ausência, de outros serviços de atendimento especializado, tais como instituições universitárias, associações profissionais, etc."
Adicione-se que a circunstância de o medicamento ou tratamento ser prescrito por médico particular não é, por si só, motivo para excluir o paciente da assistência prestada pelo Poder Público (TRF4, AG 5033599-60.2018.4.04.0000, Sexta Turma, Relatora Taís Schilling Ferraz, juntado aos autos em 23/11/2018).
Por fim, não se pode deixar de considerar, em todos os casos, a real condição de saúde daquele que ingressa em juízo e formula o pleito relacionado à tutela do direito fundamental à saúde.
Do efeito suspensivo postulado
Nos termos do art. 1019, I, do CPC, recebido o agravo de instrumento, é possível a atribuição de efeito suspensivo ou antecipação de tutela recursal ao remédio jurídico. Além disso, nos termos do art. 995, parágrafo único, do CPC, "a eficácia da decisão recorrida poderá ser suspensa por decisão do relator, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso".
Tenho, portanto, que dois requisitos cumulativos devem estar presentes para o deferimento da medida liminar que é buscada nestes autos: (a) demonstração de que o cumprimento da decisão combatida poderá causar um dano grave, de difícil ou impossível reparação e; (b) probabilidade do direito alegado.
No caso dos autos, a decisão agravada, da lavra do Juiz Federal Joel Luis Borsuk, deve por ora ser confirmada pelos próprios fundamentos (
):Recebo a emenda à inicial de evento 18.
Emitida a Nota Técnica requerida por este Juízo (
) vieram os autos conclusos para análise da tutela provisória de urgência.Decido.
1. Tutela de urgência
No que tange à tutela de urgência, dispõe o artigo 300 do Novo Código de Processo Civil que seu deferimento está condicionado à existência de elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.
1.1 Da judicialização de políticas públicas de saúde
Observo, de início, que na dicção do artigo 196 da Constituição Federal o direito à saúde (objeto da presente ação) é estabelecido como direito de todos e dever do Estado, devendo ser garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e ao acesso universal e igualitário às respectivas ações e serviços.
No mesmo sentido, dispõe a Lei nº 8.080/90:
Art. 2º A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.
§ 1º O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.
Acerca dos princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS), dispõe o art. 7º da Lei nº 8.80/90:
Art. 7º As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que integram o Sistema Único de Saúde (SUS), são desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas no art. 198 da Constituição Federal, obedecendo ainda aos seguintes princípios:
I - universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência;
II - integralidade de assistência, entendida como conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema;
Daí já avulta a necessidade de se compatibilizar os preceitos insertos na mesma regra constitucional: trata-se de um direito de todos e autêntico dever do Estado, porém circunscrito a políticas sociais e econômicas que devem ser necessárias e adequadas à redução do risco de doenças e ao acesso universal e igualitário às respectivas ações e serviços.
Partindo desse pressuposto, na judicialização da saúde é imprescindível levar-se em consideração a política pública existente traçada pelo SUS, a qual deve partir de uma medicina baseada em evidências na repartição de recursos escassos da forma mais eficiente possível. Nessa ótica, obrigar a rede pública a financiar qualquer tratamento médico receitado, ainda que sob o legítimo argumento do dever constitucional de assistência, implicaria, ao fim, por comprometer o próprio SUS como sistema, prejudicando ainda mais o atendimento prestado à população.
Sendo assim, seguindo-se os parâmetros delimitados pelo Supremo Tribunal Federal na STA nº 175 de relatoria do Ministro Gilmar Mendes, em geral deverá ser privilegiado o tratamento fornecido pelo SUS em detrimento de opção diversa escolhida pelo paciente.
Tal, contudo, não implica desconsiderar a possibilidade de o Poder Judiciário, no afã do cumprimento do aludido dever constitucional e da inafastabilidade da prestação jurisdicional, decidir que medida diversa da oferecida pelo SUS deva ser adotada em um caso específico.
Para tanto, mister a comprovação de uma série de diretivas destinadas a compatibilizar o direito subjetivo ao sistema de promoção pública de acesso, quais sejam:
a) o paciente/autor deve, por necessidade lógica, estar inserido no SUS, sendo de rigor que sua receita médica seja subscrita por médico vinculado ao sistema;
b) deve haver prova de que o tratamento fornecido pelo SUS não é eficaz ao caso, sendo insubstituível o fornecimento de medicação diversa, não contemplada no protocolo clínico;
c) o medicamento/tratamento deve ter aprovação pela ANVISA, vedada a utilização de tratamento experimental à luz do princípio da precaução;
d) caso não haja tratamento fornecido pelo SUS para o caso - o que só aconteceria dada a própria evolução da ciência médica -, é necessária comprovação, preferencialmente na instrução processual, de que a omissão administrativa não se justifica à luz de uma medicina baseada em evidências.
1.2 Do Medicamento não abrangido pelo Protocolo Clínico do SUS
Recentemente, ao apreciar o Tema nº 106 (REsp nº 1.657.156/RJ), o STJ reputou necessária a presença, de forma cumulativa, dos seguintes requisitos para se reconhecer a obrigação do poder público de fornecer medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS:
1 - Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS;
2 - Incapacidade financeira do paciente de arcar com o custo do medicamento prescrito; e
3 - Existência de registro do medicamento na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Eis a ementa do julgado:
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 106. JULGAMENTO SOB O RITO DO ART. 1.036 DO CPC/2015. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO CONSTANTES DOS ATOS NORMATIVOS DO SUS. POSSIBILIDADE. CARÁTER EXCEPCIONAL. REQUISITOS CUMULATIVOS PARA O FORNECIMENTO.
1. Caso dos autos: A ora recorrida, conforme consta do receituário e do laudo médico (fls. 14-15, e-STJ), é portadora de glaucoma crônico bilateral (CID 440.1), necessitando fazer uso contínuo de medicamentos (colírios: azorga 5 ml, glaub 5 ml e optive 15 ml), na forma prescrita por médico em atendimento pelo Sistema Único de Saúde - SUS. A Corte de origem entendeu que foi devidamente demonstrada a necessidade da ora recorrida em receber a medicação pleiteada, bem como a ausência de condições financeiras para aquisição dos medicamentos. 2. Alegações da recorrente: Destacou-se que a assistência farmacêutica estatal apenas pode ser prestada por intermédio da entrega de medicamentos prescritos em conformidade com os Protocolos Clínicos incorporados ao SUS ou, na hipótese de inexistência de protocolo, com o fornecimento de medicamentos constantes em listas editadas pelos entes públicos.
Subsidiariamente, pede que seja reconhecida a possibilidade de substituição do medicamento pleiteado por outros já padronizados e disponibilizados. 3. Tese afetada: Obrigatoriedade do poder público de fornecer medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS (Tema 106). Trata-se, portanto, exclusivamente do fornecimento de medicamento, previsto no inciso I do art. 19-M da Lei n. 8.080/1990, não se analisando os casos de outras alternativas terapêuticas.
4. TESE PARA FINS DO ART. 1.036 DO CPC/2015 A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: (i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; (ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; (iii) existência de registro na ANVISA do medicamento.
5. Recurso especial do Estado do Rio de Janeiro não provido. Acórdão submetido à sistemática do art. 1.036 do CPC/2015.
(REsp 1657156/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/04/2018, DJe 04/05/2018)
Tendo em vista tais premissas, passo ao exame das particularidades do presente caso.
1.3 Provimento 84/2019 do CNJ - NatJus Nacional
Verifica-se ser indispensável para a análise da tutela provisória requerida a realização de prova técnica, na esteira da Súmula nº 101 do TRF da 4ª Região e Enunciado nº 18 da Jornada de Direito da Saúde do CNJ, que assim dispõem:
Súmula 101 - “Para o deferimento judicial de prestações de saúde não inseridas em um protocolo pré-estabelecido, não basta a prescrição do médico assistente, fazendo-se necessária a produção de provas atestando a adequação e a necessidade do pedido".
Enunciado 18 - “Sempre que possível, as decisões liminares sobre saúde devem ser precedidas de notas de evidência científica emitidas por Núcleo de Apoio Técnico do Judiciário - NatJus e/ou consulta do banco de dados pertinente. (Redação dada pela III Jornada de Direito da Saúde do CNJ – 18/03/2019)”.
Acerca disso, ressalto que, em agosto de 2019, o Conselho Nacional de Justiça editou o Provimento nº 84/2019, dispondo sobre o funcionamento e uso do Sistema Nacional de Pareceres e Notas Técnicas (e-NatJus) para solicitação e pesquisa de pareceres e notas técnicas ao Núcleo Nacional de Apoio Técnico do Judiciário (Nat-Jus Nacional) - este criado pela Resolução nº 238 do CNJ, em dezembro de 2016.
Tais normativas são fruto do convênio realizado entre o CNJ, o Hospital Israelita Albert Einstein e o Ministério da Saúde, e deram origem ao Nat-Jus, responsável pela emissão de notas técnicas, que são tidas como perícias indiretas feitas com base em documentos médicos da parte requerente em processo judicial de concessão de medicamentos e tratamento médico.
Assim, cabe ao magistrado solicitar ao NatJus a emissão de uma nota técnica sobre o caso concreto, ou então proceder à pesquisa de notas técnicas já existentes no banco de dados, emitidas com base em uma situação fática idêntica ou similar.
1.4 Do caso concreto
Da análise dos autos, verifica-se que a parte autora busca o fornecimento do medicamento PEMBROLIZUMABE, por ser portadora de "melanoma maligno (CID C 43), atualmente em estágio clínico IIIb" (
).No caso, desta maneira, é preciso que sejam tomadas todas as cautelas para que, ao mesmo tempo em que se garanta o devido tratamento à parte autora, não exista o indevido uso do dinheiro público.
Em primeiro lugar, porque os recursos para manutenção do sistema de saúde são escassos, não sendo razoável que um sistema de saúde público assegure o melhor tratamento a seus usuários, inclusive tratamentos de ponta de altíssimo custo, na medida em que o fornecimento dessas prestações compromete significativamente as receitas do SUS, tornando necessária a realocação de recursos, com prejuízo a outras prestações de maior abrangência e relevância.
No caso dos autos, cumpre salientar que a perícia judicial restou substituída por parecer subscrito por órgão de assessoramento técnico do Poder Judiciário (NatJus), consoante disposto no Enunciado n.º 18 aprovado na I Jornada de Direito da Saúde do Conselho Nacional de Justiça, in verbis:
Sempre que possível, as decisões liminares sobre saúde devem ser precedidas de notas de evidência científica emitidas por Núcleos de Apoio Técnico em Saúde - NATS.
Dito isso, em análise à Nota Técnica juntada (
), aponto as seguintes considerações:As considerações da nota técnica são corroboradas pelos demais documentos médicos juntados aos autos, que, igualmente, demonstram a urgência no caso concreto.
Cabe destacar que o pembrolizumabe foi incorporado para o tratamento de primeira linha do melanoma avançado não-cirúrgico e metastático através da PORTARIA SCTIE/MS Nº 23, DE 4 DE AGOSTO DE 20201, sendo que o caso da parte autora difere unicamente pelo fato de que o seu caso é cirúrgico e por isso não é custeado pela APAC, conforme se infere do Ofício da Associação Hospital de Caridade de Ijuí ( ).
Ainda, analisando a documentação acostada aos autos, resta evidenciada a incapacidade financeira da parte autora em arcar com os custos do tratamento pleiteado (
, e ).Em tais condições, deve ser deferido o pleito antecipatório pleiteado.
Ante o exposto, presentes os requisitos indispensáveis, DEFIRO a tutela de urgência requerida pela parte autora na petição inicial, devendo os réus serem intimados para, no prazo de 15 (quinze) dias, entregarem o medicamento PEMBROLIZUMABE, na quantidade suficiente para o tratamento da parte autora, conforme prescrição médica, ou então depositarem o valor, necessário à aquisição dos medicamentos pelo período do tratamento.
1.5. Das contracautelas
Por último, determino as seguintes medidas de contracautela:
a) Demonstração trimestral, pelo tempo do tratamento, entregue ao ente público responsável pela entrega direta da medicação, através de informação fornecida pelo médico assistente, na qual conste que não houve alteração do estado clínico, bem como ateste a necessidade da continuidade da utilização do medicamento, considerando sua resposta ao tratamento; e
b) Obrigação da parte autora de informar imediatamente qualquer alteração no tratamento.
1.6. Da repartição das competências
Sobre o tema, o Plenário do STF, em 22/05/2019, reiterou sua jurisprudência no sentido de que os entes federados têm responsabilidade solidária no fornecimento de medicamentos e tratamentos de saúde, fixando a seguinte tese de repercussão geral (RE 855.178, Tema 793): "Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde e, diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro."
Ou seja, reconhecida a legitimidade passiva dos entes federados e sendo solidária sua responsabilidade, também são igualmente responsáveis pelo fornecimento do serviço de saúde pleiteado e concedido.
Conforme ponderado pelo ministro Edson Fachin, quanto à tese fixada, "o texto, em sua primeira parte, reafirma a solidariedade e, ao mesmo tempo, atribui poder-dever à autoridade judicial para direcionar o cumprimento. A tese não trata da formação do polo passivo. Caso se direcione e depois se alegue que, por alguma circunstância, o atendimento da demanda da cidadania possa ter levado um ente da Federação a eventual ônus excessivo, a autoridade judicial determinará o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro." (in Informativo nº 89, de 05/2019 do STF (http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/publicacaoInformativoTema/anexo/Informativomensalmaio2019.pdf).
No que tange ao custeio, considerando que a UNIÃO é a responsável financeira por prover as despesas dos tratamentos de alto custo (tratamento oncológico), cabível registrar desde logo que a ela caberá o pagamento ou ressarcimento das despesas, a serem objeto, se for o caso, de acertamento apenas na via administrativa. Nesse sentido: (os grifos não pertencem ao original):
DIREITO À SAÚDE. APELAÇÃO. MEDICAMENTOS. RESPONSABILIDADE ADMINISTRATIVA. RESPONSABILIDADE FINANCEIRA. 1. Sobre a responsabilidade administrativa nas ações de saúde, a competência para atender diretamente o cidadão, inclusive como porta de entrada para o sistema de saúde e com o fornecimento da ação, medicamento ou produto de saúde pleiteado é, como regra geral, do Estado membro. Em algumas situações, tais atribuições são compartilhadas com os entes municipais e, muito raramente, a atribuição material é da União. 2. Sobre a responsabilidade financeira, no contexto de aperfeiçoamento do SUS, é dever da União prestar cooperação financeira aos demais entes políticos (art. 16, XIII, Lei n.º 8.080/90), até porque o ente federal é o gestor de maior nível na hierarquia e descentralizada do Sistema Único de Saúde. Enquanto ausente uma diretriz objetiva sobre ações de saúde específicas, a responsabilidade pelo custeio é integralmente da União, isto até que haja pactuação em sentido diferente por meio das Comissões Intergestores Bipartite e Tripartite ou por meio de outras diretrizes do Ministério da Saúde. 3. Sem prejuízo de outras situações, a responsabilidade financeira é integralmente da União quando se trata de tratamento oncológico e fornecimento de medicamentos ou tratamentos não inclusos em políticas públicas do Sistema Único de Saúde. (TRF4, APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5009750-31.2020.4.04.7100, 6ª Turma, Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 23/09/2021)
Não obstante, não se deve descurar que, para fins de análise e cumprimento liminar, reconhecida a solidariedade entre os réus, nada impede que a parte autora busque, ou que o julgador determine o cumprimento da tutela em relação a apenas um (ou mais) dos devedores. Nesse sentido:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. TUTELA DE URGÊNCIA. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS PELO PODER PÚBLICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. LEGITIMIDADE PASSIVA DOS ENTES DA FEDERAÇÃO. DEMONSTRAÇÃO DA (IM)PRESCINDIBILIDADE. TAGRISSO (OSIMERTINIBE). NEOPLASIA MALIGNA DE PULMÃO. PRESENÇA DOS REQUISITOS DA TUTELA DE URGÊNCIA. MEDIDAS DE CONTRACAUTELA. 1. A legitimidade passiva de todos os entes federativos para ações que envolvem o fornecimento ou o custeio de medicamento resulta da atribuição de competência comum a eles, em matéria de direito à saúde, e da responsabilidade solidária decorrente da gestão tripartite do Sistema Único de Saúde (artigos 24, inciso II, e 198, inciso I, da Constituição Federal de 1988). (...) 5. Sendo reconhecida a solidariedade passiva, nada impede que o magistrado busque o cumprimento da tutela de um dos devedores que terá, ao seu turno, a possibilidade de ressarcimento em face dos demais devedores, nos termos da legislação administrativa aplicável ao caso. 6. No concernente ao pedido de realização de ressarcimento entre os entes federativos na via administrativa, inexistindo dúvida acerca da legitimidade passiva dos réus e sendo solidária a sua responsabilidade na ação, igualmente são responsáveis pelo fornecimento e pelo ônus financeiro do serviço de saúde pleiteado e concedido. Não obstante, ainda que reconhecida a solidariedade, não cabe aqui declarar as atribuições ou direito de determinado réu em ressarcir-se dos demais quanto às despesas relativas ao cumprimento da obrigação. Eventual acerto de contas que se fizer necessário, em virtude da repartição de competências dentro dos programas de saúde pública e repasses de numerário ou restituições, deverá ser realizado administrativamente, sem prejuízo do cumprimento da decisão judicial. (...). (TRF4, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5030987-18.2019.4.04.0000, 6ª Turma, Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 19/09/2019)”
Nesse contexto, deve ser reconhecido que é a União a responsável financeira pelo custeio do tratamento, nada obstante o medicamento e o serviço médico sejam exigíveis solidariamente de qualquer um dos entes políticos, devendo, se for o caso, haver o ressarcimento do ente responsável ao ente prejudicado pela via administrativa.
Em resumo, inobstante a responsabilidade solidária, tendo em vista que o caso discute tratamento de alto custo, cabe à União, exclusivamente, o custeio do medicamento.
Portanto, alinhando-se à posição do Supremo Tribunal Federal, deve ser definido critérios para cumprimento da obrigação solidária, que, no caso em apreço, determino seja realizada da seguinte forma:
a) ao Estado do Rio Grande do Sul e ao município, caberá a obrigação de fazer/entregar, sob pena de multa diária para a hipótese de descumprimento;
b) à União, caberá efetuar, administrativamente, o ressarcimento integral dos valores despendidos pelo Estado do Rio Grande do Sul, inclusive em caso de sequestro de valores do ente estadual ante ao descumprimento por parte da União e à eventual impossibilidade de sequestro de valores em contas deste ente federal.
c) ao Município caberá auxiliar na entrega da medicação, quando necessário.
Esclareço, ainda, que o referido direcionamento não possui caráter definitivo, podendo ser revisto na sentença, em caso de procedência, conforme se demonstrar necessário no andamento do presente feito.
1.7 Do Coeficiente de Adequação de Preço e do Preço Máximo de Venda ao Governo
Tratando-se de aquisição de medicamento a ser feita pelo poder público (já que os valores da compra terão origem pública), ainda que por intermédio de particular, deve ser aplicado o CAP (Coeficiente de Adequação de Preço).
No caso, o CAP aplica-se não só a fabricantes, mas a quaisquer representantes, farmácias ou drogarias, nos termos da Resolução CMED nº 3, de 2 de março de 2011, uma vez que a origem da verba e o faturamento se dará em nome da União:
Art. 1º As distribuidoras, as empresas produtoras de medicamentos, os representantes, os postos de medicamentos, as unidades volantes, as farmácias e drogarias, deverão aplicar o Coeficiente de Adequação de Preço - CAP ao preço dos produtos definidos no art. 2º desta Resolução, sempre que realizarem vendas destinadas a entes da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
Nesse caso, o estabelecimento comercial (farmácia) deverá conceder o desconto decorrente da incidência do coeficiente de adequação de preços (CAP) sobre o preço de fábrica (PF), respeitando assim o preço máximo de venda ao governo (PMVG), que, em geral, é significativamente inferior àquele adotado na venda a particular.
Dito isso, em posse desta decisão, determino que a parte autora, no prazo de 15 (quinze) dias, contate as farmácias/distribuidoras para que informem a possibilidade de realizarem a venda do medicamento postulado, conforme Resolução CMED nº 3, e junte aos autos novos orçamentos fornecidos.
A presente decisão tem eficácia de AUTORIZAÇÃO para que a parte autora, ao realizar a compra, se valha do desconto obrigatório do Coeficiente de Adequação de Preço (CAP) determinado pela CMED (Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos) e previsto na Resolução CMED n.03/2011;
A parte autora deverá informar nos autos eventual recusa do fornecedor na aplicação do desconto CAP.
A recusa do fornecedor possibilitará que os entes públicos réus solicitem à CMED a instauração do respectivo processo sancionatório.
Na hipótese de recusa de utilização do CAP pelo fornecedor, a parte está autorizada a adquirir o medicamento conforme o menor valor já orçado.
(...)
Com efeito, no caso dos autos, quanto à probabilidade do direito alegado, verifica-se que a decisão de primeiro grau não apenas considerou os vetores jurisprudencialmente aceitos para o reconhecimento do direito à entrega de medicamentos, como ponderou o quadro fático demonstrado pela Nota Técnica (
), favorável à concessão do medicamento diante da presença de elementos técnicos para sustentar a indicação da medicação, bem como para caracterizar a urgência da solicitação.No que se refere ao alto custo do tratamento, importa destacar que, embora não possa ser desconsiderado, não é motivo, por si só, para negar o respectivo fornecimento judicial, quando ficar demonstrada a imprescindibilidade, adequação e esgotamento das diretrizes terapêuticas estabelecidas nos protocolos do SUS, como já decidido pelo Min. Gilmar Mendes, na STA nº 175 AgR/CE, nos seguintes termos: "o alto custo de um tratamento ou de um medicamento que tem registro na ANVISA não seria suficiente para impedir o seu fornecimento pelo poder público".
O pembrolizumabe foi incorporado ao SUS pela Portaria SCTIE/MS 23/2022 para casos clínicos de tratamento de primeira linha do melanoma avançado não-cirúrgico e metastático. De todo modo, este Tribunal tem deferido também o medicamento para tratamentos adjuvantes, porquanto as notas técnicas têm demonstrado a vantagem terapêutica do uso do fármaco (152654, 132266). Nesse sentido:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO INCORPORADOS EM ATOS NORMATIVOS DO SUS. PEMBROLIZUMABE. MELANOMA MALIGNO DE PELE. TERAPIA ADJUVANTE. TUTELA PROVISÓRIA. VIABILIDADE. 1. A indispensabilidade do medicamento vindicado nas demandas alusivas às prestações de saúde deve ser aferida não apenas em razão da comprovada eficácia do fármaco no tratamento de determinada doença, mas, também, da inexistência ou da patente inefetividade das opções terapêuticas viabilizadas pelo SUS. 2. In casu, o órgão de assessoramento do juízo em matéria de saúde, por intermédio da Nota Técnica n.º 99.030/2022, chancelou a prescrição do oncologista assistente, assentando a necessidade de utilização do fármaco pela parte autora. 3. Muito embora o quadro clínico do demandante não equivalha àquele emoldurado no ato de padronização da droga no âmbito do SUS (Portaria SCTIE/MS n.º 23, de 4 de agosto de 2020), esta Turma, em mais de uma oportunidade e com base nas melhores evidências científicas atualmente disponíveis, já entendeu possível a concessão de imunoterapia - em caráter adjuvante - para manejo em jurisdicionados portadores de melanoma. (TRF4, AG 5044992-40.2022.4.04.0000, NONA TURMA, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 22/02/2023).
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. AJG. DECLARAÇÃO DE POBREZA. PRESUNÇÃO JURIS TANTUM. VENCIMENTOS COMPATÍVEIS COM O BENEFÍCIO. CONCESSÃO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO INCORPORADOS EM ATOS NORMATIVOS DO SUS. RECURSO ESPECIAL N.º 1.657.156/RJ (TEMA 106 DO STJ). PEMBROLIZUMABE. MELANOMA MALIGNO. TUTELA PROVISÓRIA. VIABILIDADE. 1. Para o deferimento da assistência judiciária gratuita, basta a mera declaração da parte de que não possui condições de arcar com as despesas processuais sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família, nos termos do art. 99, § 3º, do CPC/2015. Precedente da Corte Especial do TRF4. 2. Rendimentos auferidos que corroboram a hipossuficiência financeira. 3. Nos termos definidos no julgamento do REsp n.º 1.657.156/RJ (Tema 106 - STJ), a concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência. 4. A indispensabilidade do medicamento vindicado nas demandas alusivas às prestações de saúde deve ser aferida não apenas em razão da comprovada eficácia do fármaco no tratamento de determinada doença, mas, também, da inexistência ou da patente inefetividade das opções terapêuticas viabilizadas pelo SUS. 5. O NATJUS/TJDFT, ao subscrever a recentíssima Nota Técnica n.º 10.1682, de 10-08-2020, opinou, com base em evidências científicas idôneas, pela administração do PEMBROLIZUMABE como terapia adjuvante após a ressecação do tumor, sem que houvesse relato de qualquer tratamento prévio, sendo este justamente o caso dos autos. (TRF4, AG 5038195-19.2020.4.04.0000, NONA TURMA, Relatora ELIANA PAGGIARIN MARINHO, juntado aos autos em 25/11/2020).
FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. PEMBROLIZUMABE. MELANOMA EM ESTÁGIO METASTÁTICO. INEFICÁCIA DA POLÍTICA PÚBLICA. EFICÁCIA E ADEQUAÇÃO DO MEDICAMENTO INCORPORADO AO SUS. COMPROVADA. CONCESSÃO JUDICIAL DO FÁRMACO POSTULADO. CABIMENTO. Considerando que a realização de tratamento quimioterápico anterior não exclui o paciente da hipótese de receber terapia com o Pembrolizumabe, e, ainda, comprovada a adequação, eficácia e vantagem terapêutica do tratamento requerido, entendo que está suficientemente demonstrada a necessidade de sua dispensação, conforme indicado na prescrição médica trazida aos autos (TRF4, AG 5015400-14.2023.4.04.0000, DÉCIMA TURMA, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 07/07/2023).
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. MEDICAMENTO ONCOLÓGICO NÃO INCORPORADO AO SUS. MELANOMA MALIGNO DA PELE. PEMBROLIZUMABE. CABIMENTO. - O Superior Tribunal de Justiça, em julgamento realizado sob a sistemática dos recursos repetitivos, assentou no acórdão dos embargos de declaração no REsp 1657156/RJ (Tema 106 - Rel. Min. Benedito Gonçalves, pub DJe 21/9/2018) entendimento no sentido de que "A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos:"i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS;ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito;iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência". - No caso dos autos, quanto à probabilidade do direito alegado, verifica-se dos documentos acostados (evento 1, LAUDO12, evento 1, RECEIT13) que o medicamento Pembrolizumabe foi receitado por médico vinculado a CACON/UNACON, para tratamento adjuvante por médico vinculado ao SUS, que relata que o requente foi diagnosticado com Melanoma Maligno da Pele (CID 10 C43), em estágio clínico IIIB. O Pembrolizumabe foi incorporado ao SUS pela Portaria SCTIE/MS 23/2022 para casos clínicos de tratamento de primeira linha do melanoma avançado não-cirúrgico e metastático. De todo modo, este Tribunal tem deferido também o medicamento para tratamentos adjuvantes, porquanto as Notas Técnicas têm demonstrado a vantagem terapêutica do uso do fármaco (Nota Técnica 152654, 132266). (TRF4, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5026940-59.2023.4.04.0000, 6ª Turma, Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 14/12/2023).
Preenchidos os requisitos estabelecidos no Tema 106 do Superior Tribunal de Justiça, o autor faz jus à medicação postulada.
Ainda, em relação ao cumprimento da obrigação de fazer, isto é, para medidas executórias, deve ocorrer um direcionamento preferencial a quem tem a competência constitucional e legal para atuar, determinando-se, em qualquer caso o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro dessas providências (STF, RE 855.178 ED, Relator Min. Luiz Fux, julgado em 23-05-19). Já no caso de deferimento de tutela provisória, caberá uma avaliação criteriosa acerca das melhores alternativas legítimas para que se atinja o resultado pretendido com a celeridade que a situação vier a exigir.
A assistência à saúde, por sua imprescindibilidade à concretização do direito à vida digna, justifica, inclusive, a adoção das medidas necessárias e eficazes diante do descumprimento da ordem pelo Poder Público. Nesse sentido, prevê o art. 139, IV, do CPC que o magistrado poderá determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial.
É sabido que cabe à União o financiamento do tratamento. Entretanto, isso não significa que os demais entes federativos não possam sofrer medidas constritivas, como forma de conferir efetividade à ordem judicial. Como se está em sede de tutela de urgência, não há impedimento para que, ao término da ação, haja uma redistribuição das responsabilidades pelo cumprimento da decisão ou, até mesmo, que a questão seja primeiro resolvida na via administrativa entre os próprios entes políticos envolvidos, o que, aliás, foi ressaltado pelo Juízo a quo na decisão agravada.
No mais, já foram fixadas contracautelas. Muito embora o Tema 793 do STF tenha definido a necessidade de direcionamento da obrigação e ressarcimento entre os entes, não há que se falar em direcionamento definitivo da obrigação neste momento processual, de decisão provisória de urgência.
Com relação a observância do PMVG e do CAP na aquisição de medicamento, diante do descumprimento da ordem de aquisição de medicamentos, a jurisprudência deste Tribunal é firme no sentido de que é descabido compelir a pessoa natural a obter as mesmas condições de negociação destinadas a favorecer as compras pela Administração Pública, por representar ônus excessivo àquele que deixou de ser contemplado com a medicação necessária à melhoria de seu quadro clínico (TRF4, AG 5021693-68.2021.4.04.0000, Turma Regional Suplementar de SC, Relator Celso Kipper, juntado aos autos em 31/08/2021).
Não há qualquer dado concreto que ateste eventual dificuldade na obtenção do aludido fármaco, a justificar, desde logo, a dilação do prazo para entrega do medicamento. Ao contrário, o quadro fático releva situação de urgência concreta. Assim, resta mantido o prazo estabelecido pelo magistrado a quo.
Por tais elementos, considero não demonstrada a probabilidade do direito invocado pela agravante.
Ante o exposto, indefiro o pedido de efeito suspensivo.
Ausentes novos elementos de fato ou direito, a decisão que resolveu o pedido liminar deve ser mantida, por seus próprios fundamentos.
Prequestionamento
A fim de possibilitar o acesso às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as matérias constitucionais e legais suscitadas no recurso, nos termos dos fundamentos do voto, deixando de aplicar dispositivos constitucionais ou legais não expressamente mencionados e/ou havidos como aptos a fundamentar pronunciamento judicial em sentido diverso do que está declarado.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo de instrumento.
Documento eletrônico assinado por ANA PAULA DE BORTOLI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004687685v2 e do código CRC de267e28.Informações adicionais da assinatura:
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Agravo de Instrumento Nº 5022467-93.2024.4.04.0000/RS
RELATORA: Juíza Federal ANA PAULA DE BORTOLI
EMENTA
agravo de instrumento. direito à saúde. fornecimento de medicamento oncológico. pembrolizumabe. melanoma maligno.
- O Superior Tribunal de Justiça, em julgamento realizado sob a sistemática dos recursos repetitivos, assentou no acórdão dos embargos de declaração no REsp 1657156/RJ (Tema 106 - Rel. Min. Benedito Gonçalves, pub DJe 21/9/2018) entendimento no sentido de que "A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: "i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência."
- No caso dos autos, quanto à probabilidade do direito alegado, verifica-se que a decisão de primeiro grau não apenas considerou os vetores jurisprudencialmente aceitos para o reconhecimento do direito à entrega de medicamentos, como ponderou o quadro fático demonstrado pela Nota Técnica, favorável à concessão do medicamento diante da presença de elementos técnicos para sustentar a indicação da medicação, bem como para caracterizar a urgência da solicitação.
- No que se refere ao alto custo do tratamento, importa destacar que, embora não possa ser desconsiderado, não é motivo, por si só, para negar o respectivo fornecimento judicial, quando ficar demonstrada a imprescindibilidade, adequação e esgotamento das diretrizes terapêuticas estabelecidas nos protocolos do SUS, como já decidido pelo Min. Gilmar Mendes, na STA nº 175 AgR/CE, nos seguintes termos: "o alto custo de um tratamento ou de um medicamento que tem registro na ANVISA não seria suficiente para impedir o seu fornecimento pelo poder público".
- Cabe à União o financiamento do tratamento. Entretanto, isso não significa que os demais entes federativos não possam sofrer medidas constritivas, como forma de conferir efetividade à ordem judicial. Como se está em sede de tutela de urgência, não há impedimento para que, ao término da ação, haja uma redistribuição das responsabilidades pelo cumprimento da decisão ou, até mesmo, que a questão seja primeiro resolvida na via administrativa entre os próprios entes políticos envolvidos, o que, aliás, foi ressaltado pelo Juízo a quo na decisão agravada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 19 de setembro de 2024.
Documento eletrônico assinado por ANA PAULA DE BORTOLI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004687686v5 e do código CRC 9eb559f3.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 12/09/2024 A 19/09/2024
Agravo de Instrumento Nº 5022467-93.2024.4.04.0000/RS
RELATORA: Juíza Federal ANA PAULA DE BORTOLI
PRESIDENTE: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
PROCURADOR(A): RODOLFO MARTINS KRIEGER
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 12/09/2024, às 00:00, a 19/09/2024, às 16:00, na sequência 259, disponibilizada no DE de 03/09/2024.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal ANA PAULA DE BORTOLI
Votante: Juíza Federal ANA PAULA DE BORTOLI
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
LIDICE PENA THOMAZ
Secretária
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