
Apelação Cível Nº 5005048-24.2020.4.04.7009/PR
RELATORA: Desembargadora Federal GISELE LEMKE
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária proposta por A. J. M. D. O. C., relativamente incapaz à época do ajuizamento, em face da UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO, na qual requer o pagamento das diferenças de pensão militar havidas entre o soldo de 3º e 2º Sargento ao soldo de 2º Tenente, desde sua implantação até 30 de março de 2015, bem como condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais.
Sustentou, em síntese, que a administração militar reconheceu o erro no cálculo do benefício e a consequente existência de valores a serem complementados relativamente aos últimos cinco anos, ou seja, de 01 de Abril de 2015 a 30 de Abril de 2020. No entanto, por ser menor de idade à época do falecimento do instituidor, afirma possuir direito às diferenças desde a implantação da pensão militar até 30 de março de 2015, com a devida correção monetária e acrescida de juros legais, bem como a condenação do réu ao pagamento de danos morais em razão do erro na concessão da pensão militar.
Apesar de instadas a integrar o polo ativo, a viúva pensionista PATRÍCIA MONGRUEL DE OLIVEIRA CRUZ e a filha MARIA EDUARDA MONGRUEL OLIVEIRA CRUZ não demonstraram interesse em participar da lide.
Em despacho saneador, foram afastadas as preliminares de ilegitimidade ativa e falta de interesse de agir, suscitadas pela União.
Sobreveio sentença com o seguinte dispositivo:
a) julgo procedente o pedido da parte autora e extinto o feito na forma do artigo 487, inciso I, do novo Código de Processo Civil, para condenar a União ao pagamento das diferenças entre o soldo de 3º e 2º Sargento e o soldo de 2º Tenente da pensão militar instituída por Juliano de Oliveira Cruz, desde a concessão da pensão, em 10/04/2003, até 30/03/2015, observada a cota-parte da demandante, 1/4 (um quarto) do valor total das diferenças a serem apuradas, acrescidas de correção monetária e juros, nos termos da fundamentação..
b) Julgo improcedente, e extinto o feito na forma do artigo 487, inciso I, do novo Código de Processo Civil, o pedido de indenização por danos morais.
Condeno União ao pagamento dos honorários advocatícios em favor da parte autora, em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, §§ 2º do CPC.
Condeno a parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios em favor da União, os quais arbitro em 10% do valor requerido a título de danos morais, nos termos do art. 85, §§ 2º do CPC. Contudo, observada a gratuidade de justiça que ora defiro a parte autora (), a exigibilidade desta verba fica suspensa, nos termos do artigo 98, § 3º, do CPC.
Em razões recursais, a União reiterou a ilegitimidade ativa da parte autora em razão do disposto no art. 9º, caput, §3º da Lei nº 3.765/60, bem como a falta de interesse de agir pela existência de requerimento administrativo pendente de decisão. Alegou, ainda, a ocorrência da prescrição qüinqüenal.
Apresentadas contrarrazões, os autos vieram a este Tribunal para julgamento.
É o relatório. -
VOTO
Ao apreciar os pedidos constantes da inicial, o juízo singular decidiu a controvérsia, na parte que interessa, nos seguintes termos:
2. Fundamentação
Preliminares
As preliminares de ilegitimidade ativa e ausência de interesse processual foram analisadas e afastadas na decisão acostada ao , nestes termos:
3.1 Ilegitimidade Ativa
A União sustenta que há ilegitimidade ativa da parte autora, uma vez que sua genitora e titular da pensão militar, Patrícia Mongruel de Oliveira Cruz, está em pleno exercício do seu direito de pensionista militar como titular, portanto, a pretensão somente seria factível à autora em caso de falecimento da titular, fato que não ocorreu. Estando a pensionista viva, não teria a autora legitimidade ativa para requerer as diferenças de soldo pleiteadas na presente ação, na medida em que a cota-parte da autora é recebida por sua genitora.
A legislação aplicável à pensão por morte é aquela vigente na data do óbito. Verifico que o instituidor da pensão militar faleceu no ano de 2003, de modo que se aplica ao caso a Lei nº 3.765/1960, com as alterações promovidas pela Medida Provisória nº 2.215-10/2001.
Destaco que a Medida Provisória nº 2.215-10/2001 ainda está em vigor em razão do disposto no artigo 2º da Emenda Constitucional nº 32 (Art. 2º As medidas provisórias editadas em data anterior à da publicação desta emenda continuam em vigor até que medida provisória ulterior as revogue explicitamente ou até deliberação definitiva do Congresso Nacional).
Assim dispõe a Lei nº 3.765, de 1960 em seu artigo 7º, com as alterações promovidas pela Medida Provisória nº 2.215-10/2001.
"Artigo 7º: A pensão militar é deferida em processo de habilitação, tomando-se por base a declaração de beneficiários preenchida em vida pelo contribuinte, na ordem de prioridade e condições a seguir:
I - primeira ordem de prioridade:
a) cônjuge;
b) companheiro ou companheira designada ou que comprove união estável como entidade familiar;
c) pessoa desquitada, separada judicialmente, divorciada do instituidor ou a ex-convivente, desde que percebam pensão alimentícia;
d) filhos ou enteados até vinte e um anos de idade ou até vinte e quatro anos de idade, se estudantes universitários ou, se inválidos, enquanto durar a invalidez; e
e) menor sob guarda ou tutela até vinte e um anos de idade ou, se estudante universitário, até vinte e quatro anos de idade ou, se inválido, enquanto durar a invalidez.
II - segunda ordem de prioridade, a mãe e o pai que comprovem dependência econômica do militar;
III - terceira ordem de prioridade:
a) o irmão órfão, até vinte e um anos de idade ou, se estudante universitário, até vinte e quatro anos de idade, e o inválido, enquanto durar a invalidez, comprovada a dependência econômica do militar;
b) a pessoa designada, até vinte e um anos de idade, se inválida, enquanto durar a invalidez, ou maior de sessenta anos de idade, que vivam na dependência econômica do militar.
§ 1o A concessão da pensão aos beneficiários de que tratam o inciso I, alíneas "a", "b", "c" e "d", exclui desse direito os beneficiários referidos nos incisos II e III.
§ 2o A pensão será concedida integralmente aos beneficiários do inciso I, alíneas "a" e "b", ou distribuída em partes iguais entre os beneficiários daquele inciso, alíneas "a" e "c" ou "b" e "c", legalmente habilitados, exceto se existirem beneficiários previstos nas suas alíneas "d" e "e".
§ 3o Ocorrendo a exceção do § 2o, metade do valor caberá aos beneficiários do inciso I, alíneas "a" e "c" ou "b" e "c", sendo a outra metade do valor da pensão rateada, em partes iguais, entre os beneficiários do inciso I, alíneas "d" e "e"."
Ao tempo da concessão da pensão no âmbito administrativo, apenas a viúva do falecido habilitou-se para o recebimento do benefício, inobstante as filhas do falecido Maria Eduarda Mongruel de Oliveira Cruz e A. J. M. D. O. C., encontravam-se respectivamente com três anos e nove meses de vida.
Ainda que não tenha havido a habilitação das filhas, estas estão abrangidas pela primeira ordem de preferência estabelecida na legislação destacada acima, em concorrência com a genitora, de modo que são titulares do direito material da pensão por morte, ainda que não tenham exercido tal direito na época da concessão administrativa por meio da habilitação.
Destaque-se ainda que, nos termos do artigo 198, I c/c artigo 208 do Código Civil, não corre a prescrição nem a decadência contra os absolutamente incapazes. A autora conta atualmente com 19 anos de idade, de modo que o prazo decadencial para pleitear a revisão dos valores pagos e o prazo prescricional para o recebimento dos valores atrasados iniciou-se apenas em 2018, quando a autora completou 16 anos.
Sendo assim, considerando que a autora é filha do falecido instituidor da pensão militar e figura na primeira ordem de preferência dos dependentes em concorrência com sua genitora, entendo que resta configurada a legitimidade ativa da autora para pleitear a revisão do benefício, uma vez que é titular do direito material, ainda que não o tenha exercido na origem.
Afasto, portanto, a preliminar levantada pela União.
3.2 Falta de interesse de agir
A União requereu o reconhecimento da falta de interesse de agir da parte autora, porquanto a sua genitora requereu administrativamente em 02/06/2020 o pagamento de valores retroativos e que caberia à parte autora aguardar a resposta da Administração Militar no âmbito administrativo.
O interesse processual concerne à necessidade e à utilidade da tutela jurisdicional pretendida pelo demandante. Existe interesse quando a parte tem necessidade de ir a juízo para alcançar a tutela pretendida e, ainda, quando essa tutela jurisdicional pode trazer-lhe alguma utilidade do ponto de vista prático.
Não assiste razão à União.
Não é razoável condicionar o ajuizamento da demanda ao esgotamento da esfera administrativa, mormente quando há alegação de que a administração militar reconheceu os valores a serem pagos somente dos últimos 5 (cinco) anos, ou seja, de 01 de Abril de 2015 a 30 de Abril de 2020, conforme o requerimento protocolado junto ao 13º BIB.
A autora requereu a condenação da União ao pagamento das diferenças havidas entre o soldo de 3º e 2º sargento ao soldo de 2º Tenente desde a implantação da pensão militar até 30 de março de 2015. A União contestou o mérito da demanda, alegou preliminares e requereu o reconhecimento da prescrição, de modo que resta configurada a pretensão resistida da parte ré.
Tais fatos constituem indícios de resistência da parte ré à pretensão autoral e fundamentam, portanto, o seu interesse processual.
Assim, afasto a preliminar levantada pela União.
Prejudicial de mérito: prescrição
Análise da prescrição se confunde com o mérito e, dessa forma, será analisada no tópico seguinte.
Mérito
A parte autora, A. J. M. D. O. C., atualmente com 19 anos de idade, é filha do ex-militar do Exército Juliano de Oliveira Cruz (), o qual faleceu em 10/04/2003 ().
O sr. Juliano de Oliveira Cruz deixou a viúva Patrícia Mongruel de Oliveira e duas filhas Maria Eduarda Mongruel de Oliveira Cruz e A. J. M. D. O. C. que, à época do óbito, tinham 03 anos e 09 meses, respectivamente.
Por meio do título de pensão militar nº 094/03, de 04/09/2003 foi concedido o benefício de pensão por morte à sra. Patrícia Mongruel de Oliveira (mãe da autora), na condição de viúva de Juliano de Oliveira Cruz, com proventos calculados considerando o soldo de 3 º sargento, graduação que o ex-militar ocupava à época de seu falecimento (, p. 4).
Em 22/03/2004, foi concedido à sra. Patrícia Mongruel de Oliveira melhoria de pensão a fim de que seus proventos passassem a observar a remuneração de 2º sargento, com efeitos retroativos à data do falecimento (10/04/2003), por motivo de promoção "post mortem" do "de cujus" (, p. 11).
No despacho nº 322-D A PROM/DGP, de 18/11/2019, proferido no processo administrativo nº 215-A2/Asse Ap As Jurd/D A Prom, foi consignado que o art. 1º da Lei 5.195/66 determina que seja considerado promovido ao posto ou graduação imediata, na data do falecimento, o militar que, em pleno serviço ativo, venha a falecer em consequência de acidente em serviço (caso do sr. Juliano de Oliveira Cruz) e que o art. 3º, I, do Decreto nº 52.737/63, que regulamenta o art. 21 da Lei 3.765/60, prevê que a promoção imediata para 3º Sargento corresponde ao posto de 2º Tenente e não à graduação de 2º Sargento. Dessa forma, foi deferido o pedido para o fim de promover "post mortem" o instituidor Juliano de Oliveira Cruz ao posto de 2º Tenente a contar da data do óbito, 10/04/2003 (, p. 5 e 6).
Em 06/03/2020 foi confeccionada a apostila de melhoria de pensão militar decorrente de promoção "post mortem" nº 32/20 e implantada a pensão em favor da beneficiária com observância à remuneração de 2º Tenente (, p. 3).
Administrativamente, a genitora da parte autora recebeu as diferenças de 01 de abril de 2015 a 30 de abril de 2020.
Não há controvérsias no tocante à promoção, após a morte, do instituidor da pensão para o posto de 2º Tenente, o que inclusive foi reconhecido administrativamente. Nesta lide, a parte autora pretende o pagamento das diferenças entre o soldo de 3º e 2º Sargento ao soldo de 2º Tenente, desde a implantação da pensão militar até 30 de março de 2015, bem como condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais. Argumentou que não há prescrição no caso, pois houve erro da administração na fundamentação e emissão da Portaria de Pensão Militar e, dessa forma, há de se reconhecer a nulidade do referido ato. Aduziu, ainda, que a autora, no ajuizamento do feito, era menor relativamente incapaz e contra ela o termo inicial do prazo prescricional só ocorre após os 16 anos.
A União asseverou que estão prescritos os valores anteriores aos cinco anos a partir do requerimento. Alegou que o direito da pensionista, violado por falha humana, foi restaurado na sua origem, na forma do Apostilamento de Melhoria de Pensão Militar n. 32/20 e que a administração se valeu do poder de autotutela para rever o ato administrativo.
A legislação aplicável à pensão por morte é aquela vigente na data do óbito. Verifico que o instituidor da pensão militar faleceu em 10/04/2003 (), de modo que se aplica ao caso a Lei nº 3.765/1960, com as alterações promovidas pela Medida Provisória nº 2.215-10/2001.
Assim dispõe a Lei nº 3.765, de 1960 em seu artigo 7º, com as alterações promovidas pela Medida Provisória nº 2.215-10/2001.
Artigo 7º: A pensão militar é deferida em processo de habilitação, tomando-se por base a declaração de beneficiários preenchida em vida pelo contribuinte, na ordem de prioridade e condições a seguir:
I - primeira ordem de prioridade:
a) cônjuge;
b) companheiro ou companheira designada ou que comprove união estável como entidade familiar;
c) pessoa desquitada, separada judicialmente, divorciada do instituidor ou a ex-convivente, desde que percebam pensão alimentícia;
d) filhos ou enteados até vinte e um anos de idade ou até vinte e quatro anos de idade, se estudantes universitários ou, se inválidos, enquanto durar a invalidez; e
e) menor sob guarda ou tutela até vinte e um anos de idade ou, se estudante universitário, até vinte e quatro anos de idade ou, se inválido, enquanto durar a invalidez.
II - segunda ordem de prioridade, a mãe e o pai que comprovem dependência econômica do militar;
III - terceira ordem de prioridade:
a) o irmão órfão, até vinte e um anos de idade ou, se estudante universitário, até vinte e quatro anos de idade, e o inválido, enquanto durar a invalidez, comprovada a dependência econômica do militar;
b) a pessoa designada, até vinte e um anos de idade, se inválida, enquanto durar a invalidez, ou maior de sessenta anos de idade, que vivam na dependência econômica do militar.
§ 1o A concessão da pensão aos beneficiários de que tratam o inciso I, alíneas "a", "b", "c" e "d", exclui desse direito os beneficiários referidos nos incisos II e III.
§ 2o A pensão será concedida integralmente aos beneficiários do inciso I, alíneas "a" e "b", ou distribuída em partes iguais entre os beneficiários daquele inciso, alíneas "a" e "c" ou "b" e "c", legalmente habilitados, exceto se existirem beneficiários previstos nas suas alíneas "d" e "e".
§ 3o Ocorrendo a exceção do § 2o, metade do valor caberá aos beneficiários do inciso I, alíneas "a" e "c" ou "b" e "c", sendo a outra metade do valor da pensão rateada, em partes iguais, entre os beneficiários do inciso I, alíneas "d" e "e".
A parte autora, A. J. M. D. O. C., 19 anos de idade, comprovou que é filha do instituidor da pensão, sr. Juliano de Oliveira Cruz () e, dessa forma, é beneficiária da pensão militar em primeira ordem de prioridade, juntamente com sua genitora, sra. Patrícia Mongruel, de Oliveira.
Quanto à irmã da autora, Maria Eduarda Mongruel de Oliveira Cruz há dúvidas se atualmente permanece com a condição de beneficiária, haja vista que já completou 22 anos (, p. 9). No entanto, no período que interessa ao feito, de 10/04/2003 a 30/03/2015, a irmã da autora possuía a condição de filha menor de 21 anos. De qualquer forma, tanto a mãe da autora, Patrícia Mongruel, de Oliveira, quanto a irmã, Maria Eduarda Mongruel de Oliveira Cruz, juntaram declarações no sentido de que não possuem interesse em integrar o polo ativo desta demanda ( e ).
Ao tempo da concessão da pensão no âmbito administrativo, apenas a viúva do falecido habilitou-se para o recebimento do benefício, inobstante as filhas do falecido Maria Eduarda Mongruel de Oliveira Cruz e A. J. M. D. O. C., encontravam-se respectivamente com três anos e nove meses de vida.
Ainda que não tenha havido a habilitação das filhas, estas estão abrangidas pela primeira ordem de preferência estabelecida na legislação destacada acima, em concorrência com a genitora, de modo que são titulares do direito material da pensão por morte, ainda que não tenham exercido tal direito na época da concessão administrativa por meio da habilitação.
Assim, a parte autora, na condição de filha menor de 21 anos de idade, tem direito à cota-parte da pensão instituída pelo ex-militar Juliano de Oliveira Cruz e, por consequência, possui direito ao recebimento das diferenças entre o soldo de 3º e 2º Sargento ao soldo de 2º Tenente, respeitada sua cota-parte.
As diferenças referentes a 01 de abril de 2015 a 30 de abril de 2020 foram recebidas administrativamente pela mãe da requerente e, quanto a este período, não há qualquer pedido nos autos.
O pleito cinge-se às diferenças havidas entre o soldo de 3º e 2º Sargento ao soldo de 2º Tenente, desde 10/04/2003, início da pensão militar, até 30/03/2015. Desse modo, resta analisar a alegada ocorrência de prescrição e fixar a cota-parte devida à requerente.
Da conjugação do art. 3º com o art. 198, I, e o art. 208, todos do Código Civil, extrai-se que não corre a prescrição nem decadência contra os menores de 16 anos (absolutamente incapazes):
Art. 3 o São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de 16 (dezesseis) anos. (...)
Art. 198. Também não corre a prescrição:
I - contra os incapazes de que trata o art. 3 o ; (...)
Art. 208. Aplica-se à decadência o disposto nos arts. 195 e 198, inciso I.
A autora conta atualmente com 19 anos de idade, de modo que o prazo decadencial para pleitear a revisão dos valores pagos e o prazo prescricional para o recebimento dos valores atrasados iniciou-se apenas em 2018, quando a autora completou 16 anos.
Destarte, não há que se falar em prescrição ou decadência no presente caso, de modo que a postulante faz jus ao recebimento das diferenças atrasadas desde a concessão da pensão, em 10/04/2003, até 30/03/2015, consoante requerido, observada sua cota-parte.
Quanto à cota-parte da requerente, do já citado artigo 7º, §§ 2º e 3º, da Lei nº 3.765, de 1960, com as alterações promovidas pela Medida Provisória nº 2.215-10/2001, infere-se que, no caso, à viúva cabe metade do valor da pensão e a outra metade deve ser rateada, em partes, iguais, entre as duas filhas do instituidor:
Artigo 7º: A pensão militar é deferida em processo de habilitação, tomando-se por base a declaração de beneficiários preenchida em vida pelo contribuinte, na ordem de prioridade e condições a seguir:
I - primeira ordem de prioridade:
a) cônjuge; (...)
d) filhos ou enteados até vinte e um anos de idade ou até vinte e quatro anos de idade, se estudantes universitários ou, se inválidos, enquanto durar a invalidez; e (...)
§ 2o A pensão será concedida integralmente aos beneficiários do inciso I, alíneas "a" e "b", ou distribuída em partes iguais entre os beneficiários daquele inciso, alíneas "a" e "c" ou "b" e "c", legalmente habilitados, exceto se existirem beneficiários previstos nas suas alíneas "d" e "e".
§ 3o Ocorrendo a exceção do § 2o, metade do valor caberá aos beneficiários do inciso I, alíneas "a" e "c" ou "b" e "c", sendo a outra metade do valor da pensão rateada, em partes iguais, entre os beneficiários do inciso I, alíneas "d" e "e".
Destaque-se que, no período em que é pleiteado o pagamento das diferenças (10/04/2003 a 30/03/2015), a irmã da autora, hoje com 22 anos (, p. 9), possuía a condição de filha menor de 21 anos e, portanto, deve ser considerada na divisão das cotas-partes.
Em síntese, a parte autora tem direito a 1/4 (um quarto) das diferenças atrasadas requeridas.
Destarte, devem ser afastadas as alegações de prescrição e decadência no caso e deve ser acolhido o pedido da parte autora para condenação da parte ré ao pagamento das diferenças havidas entre o soldo de 3º e 2º Sargento ao soldo de 2º Tenente, desde a concessão da pensão, em 10/04/2003, até 30/03/2015, observada a cota-parte da demandante, 1/4 (um quarto) do valor total das diferenças a serem apuradas.
(...)"
A sentença merece ser integralmente mantida.
Com relação à cota-parte da pensão há que se destacar que o direito da filha ao benefício está assegurado em lei. O fato de ser integralizado ao benefício da viúva até seu falecimento, nos termos do §3º do art.9º da Lei 3765/60, não afasta o direito subjetivo e a consequente legitimidade da filha em requerer sua cota-parte, notadamente em relação a diferenças que não foram pleiteadas pela mãe, por desinteresse.
Há que se ter em mente que a previsão legal se amolda à premissa comum que as filhas, enquanto menores, estudantes ou incapazes, serão cuidadas e sustentadas pela genitora, viúva do instituidor, mas não tem o condão de afastar o direito da criança de perceber valores que lhe são próprios, a contar do óbito do provedor, no caso de ausência ou impossibilidade de requerimento pela pensionista. É esse mesmo raciocínio, aliás, que não autoriza protelar a concessão da pensão por morte em razão da falta de habilitação de outro possível dependente.
Portanto, correto o entendimento do juiz sentenciante em reconhecer a legitimidade da parte autora, diante do desinteresse expresso da viúva do militar, mãe da requerente, em participar da demanda.
O mesmo se diga em relação ao interesse de agir. Segundo as razões recursais, a pendência de requerimento administrativo afastaria o interesse processual; no entanto, como bem asseverou o magistrado a quo "Não é razoável condicionar o ajuizamento da demanda ao esgotamento da esfera administrativa, mormente quando há alegação de que a administração militar reconheceu os valores a serem pagos somente dos últimos 5 (cinco) anos, ou seja, de 01 de Abril de 2015 a 30 de Abril de 2020, conforme o requerimento protocolado junto ao 13º BIB".
Esse o entendimento do nosso Regional:
PREVIDENCIÁRIO. ESGOTAMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA. DESNECESSIDADE. CARTA DE EXIGÊNCIAS. CUMPRIMENTO. 1. Está assentado o entendimento da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto jurídico para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário, o que não se confunde com o exaurimento daquela esfera. 2. Conquanto o segurado não precise se utilizar dos recursos administrativos postos a sua disposição, por ser desnecessário o esgotamento da esfera administrativa, está obrigado, sim, a cumprir as determinações do INSS para instruir o processo administrativo, a não ser que isso não seja possível. (TRF-4 - AC: 50045772220224047111 RS, Relator: RODRIGO KOEHLER RIBEIRO, Data de Julgamento: 14/02/2023, QUINTA TURMA)
No mérito, propriamente dito, melhor sorte não socorre à União. Não corre a prescrição contra menores, nos termos do art.198,I, do CC, sendo certo que a autora, nascida em 17/06/2002, completou 16 anos em 17/06/2018, não tendo transcorrido cinco anos até o ajuizamento da demanda, em 17/06/2020
Nesse sentido, pacífica a jurisprudência do STJ:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DEVIDA. NÃO INCIDÊNCIA DE PRESCRIÇÃO CONTRA MENOR DE IDADE. PARCELAS PRETÉRITAS RETROATIVAS À DATA DO ÓBITO. 1. Cuida-se de inconformismo do particular contra acórdão do Tribunal de origem, que entendeu pela possibilidade de concessão de pensão pela morte do avô da recorrente, ex-militar reformado do Comando da Aeronáutica. Contudo, o acórdão reconheceu a prescrição das parcelas referentes aos cinco anos anteriores à data do ajuizamento da presente ação, que se deu em 22/6/2002. 2. Consigne-se que, em se tratando de absolutamente incapaz, não há falar em aplicação do disposto no art. 28 da Lei 3.765/1960, o qual prevê a prescrição das parcelas vencidas há mais de 5 anos da interposição do processo judicial, uma vez que o menor não poderia ser penalizado pela eventual desídia de seu responsável. Logo, não corre a prescrição contra menores impúberes (inteligência do artigo 198, inciso I do Código Civil de 2002, c.c. artigo 103, parágrafo único, da Lei 8.213/1991). 3. Verifica-se, assim, que o entendimento do acórdão recorrido a respeito da controvérsia está em dissonância com a atual jurisprudência do STJ, pois não corre a prescrição contra o menor, nos casos de concessão de benefício previdenciário. REsp 1.656.825. Ministro Benedito Gonçalves. Data da Publicação 15/9/2017; REsp 1.257.059/RS. Ministro Mauro Campbell Marques. segunda turma. DJe 8/5/2012; REsp 1.513.977/CE, Rel. Min. Herman Benjamim, Segunda Turma, DJe 05/08/2015 e REsp 1.626.354. Ministro Sérgio Kukina. Data da publicação: 23/11/2016. 4. Recurso Especial a que se dá provimento, para fixar o termo inicial do benefício do recorrente na data do óbito do instituidor do benefício.(STJ - REsp: 1697648 RJ 2017/0225758-7, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 21/11/2017, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/12/2017)
Nesse passo, não havendo discussão quanto ao direito aos valores corretos da pensão, conforme entendimento exarado pela própria Administração, a manutenção da sentença é medida que se impõe.
Honorários Advocatícios
A sentença condenou a União ao pagamento de honorários de sucumbência fixados nos percentuais mínimos estabelecidos pelo §3º do art. 85 do CPC, incidindo sobre o montante da condenação.
Desacolhido o recurso de apelação e em conformidade com o disposto no art. 85, §11 do CPC, majoro em 20% os ônus sucumbenciais fixados na sentença.
Prequestionamento
Em face do disposto nas súmulas n.ºs 282 e 356 do STF e 98 do STJ, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.
Embargos de declaração interpostos apenas para rediscutir a matéria são passíveis de condenação em multa, ante o seu caráter procrastinatório (§ 2º do art. 1.026 do CPC).
Conclusão
Negado provimento à apelação.
Majorados os honorários advocatícios.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da União.
Documento eletrônico assinado por ANA BEATRIZ VIEIRA DA LUZ PALUMBO, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004801775v13 e do código CRC 5f7bda34.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ANA BEATRIZ VIEIRA DA LUZ PALUMBO
Data e Hora: 2/11/2024, às 17:4:58
Conferência de autenticidade emitida em 12/12/2024 21:53:06.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Apelação Cível Nº 5005048-24.2020.4.04.7009/PR
RELATORA: Desembargadora Federal GISELE LEMKE
EMENTA
ADMINISTRATIVO. DIFERENÇAS EM COTA-PARTE DE PENSÃO MILITAR. FILHA RELATIVAMENTE INCAPAZ. LEGITIMIDADE ATIVA. ESGOTAMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA., INEXIGIBILIDADE. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA.
1. O fato da cota-parte ser integralizada ao benefício da viúva até seu falecimento, nos termos do §3º do art.9º da Lei 3765/60, não afasta o direito subjetivo e a consequente legitimidade da filha em requerer sua parte do benefício, notadamente em relação a diferenças que não foram pleiteadas pela mãe, por desinteresse.
2. Não é razoável condicionar o ajuizamento da demanda ao esgotamento da esfera administrativa, mormente quando há alegação de que a administração militar reconheceu os valores a serem pagos somente dos últimos 5 (cinco) anos, ou seja, de 01 de Abril de 2015 a 30 de Abril de 2020, conforme o requerimento protocolado junto ao 13º BIB
3. Não corre a prescrição contra menores, nos termos do art.198, I, do CC, sendo certo que a autora, nascida em 17/06/2002, completou 16 anos em 17/06/2018, não tendo transcorrido cinco anos até o ajuizamento da demanda, em 17/06/2020.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 12ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação da União, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 27 de novembro de 2024.
Documento eletrônico assinado por ANA BEATRIZ VIEIRA DA LUZ PALUMBO, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004801776v4 e do código CRC 72607e08.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ANA BEATRIZ VIEIRA DA LUZ PALUMBO
Data e Hora: 27/11/2024, às 17:14:29
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 19/11/2024 A 27/11/2024
Apelação Cível Nº 5005048-24.2020.4.04.7009/PR
RELATORA: Juíza Federal ANA BEATRIZ VIEIRA DA LUZ PALUMBO
PRESIDENTE: Desembargador Federal LUIZ ANTONIO BONAT
PROCURADOR(A): JOSE OSMAR PUMES
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 19/11/2024, às 00:00, a 27/11/2024, às 16:00, na sequência 548, disponibilizada no DE de 07/11/2024.
Certifico que a 12ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 12ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA UNIÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal ANA BEATRIZ VIEIRA DA LUZ PALUMBO
Votante: Juíza Federal ANA BEATRIZ VIEIRA DA LUZ PALUMBO
Votante: Juiz Federal RODRIGO KRAVETZ
Votante: Desembargador Federal LUIZ ANTONIO BONAT
SUZANA ROESSING
Secretária
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