
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006898-33.2019.4.03.6183
RELATOR: Gab. 36 - JUÍZA CONVOCADA DIANA BRUNSTEIN
APELANTE: LAURO LAMARC SANTOS LOPES
Advogado do(a) APELANTE: ANGELA FRANCESCHINI DE ANDRADE CANDIDO - SP202898-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006898-33.2019.4.03.6183
RELATOR: Gab. 36 - JUÍZA CONVOCADA DIANA BRUNSTEIN
APELANTE: LAURO LAMARC SANTOS LOPES
Advogado do(a) APELANTE: ANGELA FRANCESCHINI DE ANDRADE CANDIDO - SP202898-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de embargos de declaração opostos pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS) contra acórdão lavrado pela Décima Turma deste Tribunal, assim ementado:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO ESPECIAL. OPERADOR DO PREGÃO VIVA-VOZ DA BM&F/BOVESPA. PROVA EMPRESTADA. POSSIBILIDADE. RUÍDO. EXPOSIÇÃO COMPROVADA. ESPECIALIDADE RECONHECIDA. BENEFÍCIO DEVIDO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. FIXAÇÃO NOS TERMOS DA LEGISLAÇÃO DE REGÊNCIA.
- A Constituição da República (CR) previa na redação original do artigo 202, I e II, e § 1º, a aposentadoria por tempo de serviço, concedida com proventos integrais, após 35 (trinta e cinco) anos de trabalho, ao homem, e, após 30 (trinta), à mulher, ou na modalidade proporcional, após 30 (trinta) anos de trabalho, ao homem, e, após 25 (vinte e cinco), à mulher.
- O exercício de atividades nocivas, causadoras de algum prejuízo à saúde e à integridade física ou mental do trabalhador ao longo do tempo, independentemente de idade, garante ao trabalhador a conversão em tempo comum para fins de aposentação por tempo de contribuição.
- Conforme orientação do C. Superior Tribunal de Justiça, a natureza especial da atividade deve ser reconhecida em razão do tempo da prestação e da legislação então vigente, tornando-se direito adquirido do empregado.
- O agente nocivo deve, em regra, ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva prejudicialidade.
- O labor deve ser exercido de forma habitual e permanente, com exposição do segurado ao agente nocivo indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço.
- A discussão sobre o uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI) como fator de descaracterização do tempo especial encontra-se balizada pelo C. STF no Tema 555 de repercussão geral. Na hipótese de o segurado apresentar PPP indicativo de sua exposição a determinado agente nocivo e inexistindo prova de que o EPI, embora possa atenuar os efeitos prejudiciais, seja capaz de neutralizar totalmente a nocividade do ambiente laborativo, é de rigor reconhecer a especialidade do labor. Além disso, ficou pacificado que inexiste EPI capaz de neutralizar ou minimizar os efeitos nocivos do agente ruído. Precedentes.
- Admite-se o enquadramento especial do labor em razão da exposição a níveis de ruído superiores aos limite de tolerância - 80 dB(A), até 05/03/1997, 90 dB(A), até 18/11/2003, e 85 dB(A), a partir de 19/11/2003 - item 1.1.6 do Anexo do Decreto n. 53.831/1964, item 1.1.5. do Anexo I, do Decreto n. 83.080/1979, item 2.0.1 do Anexo IV do Decreto n. 2.172/97 e item 2.0.1 do Anexo IV do Decreto 3.048/1999.
- A comprovação da especialidade se dá por meio de provas periciais diretas e produzidas de modo individual. Porém, consideradas as características do caso concreto e que ao INSS foi garantido o direito ao contraditório e à ampla defesa, excepcionalmente, admite-se, para comprovar a nocividade do ambiente pela contínua exposição ao ruído, o laudo pericial obtido pelo Sindicato da categoria, dado que a aferição técnica do ruído foi realizada no mesmo local em que o autor desenvolveu suas atividades como auxiliar e operador de pregão na BM&F/BOVESPA.
- Demonstrado que o local de trabalho onde o autor exercia sua atividade junto ao pregão de viva-voz, de fato, se tratava de um ambiente extremamente nocivo à saúde, sobretudo pela contínua e habitual exposição dos profissionais aos altos níveis de pressão sonora, mensurados entre 95 e 103 dB(A), conforme do laudo pericial.
- É adequada a aceitação da referido laudo pericial, mesmo porque seria impossível a realização de outra perícia, seja em virtude da extinção do único pregão viva-voz no Estado de São Paulo, seja pela inexistência de outro ambiente paradigma.
- Reconhecimento da atividade especial, exercida sob condições nocivas à saúde ou à integridade física do segurado, nos períodos de 20/06/1986 a 18/11/1986, 01/10/1986 a 13/03/1987, 24/08/1987 a 01/10/1987, 23/02/1988 a 05/07/1988, 19/05/1989 a 04/07/1991, 05/07/1991 a 18/10/1991, 21/10/1991 a 04/11/1991, 07/11/1991 a 02/04/1992, 03/04/1992 a 28/01/1994, 01/03/1994 a 02/05/1994, 14/09/1994 a 02/07/1996, 09/09/1996 a 22/01/1998, 01/04/1998 a 02/05/2001, 10/05/2001 a 20/09/2001, 21/09/2001 a 19/09/2008.
- Diante dos períodos especiais ora reconhecidos, convertidos para tempo comum pelo fator de conversão 1,40, somados aos demais interregnos de labor comum apontados na CTPS e no relatório CNIS, perfaz a parte autora, na data do requerimento administrativo (DER), em 24/02/2017, o total de 35 anos, 6 meses e 18 dias de tempo de contribuição, tempo suficiente para lhe garantir a concessão, naquela data, do benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição, com a incidência do fator previdenciário.
- A correção monetária e os juros de mora incidirão conforme a legislação de regência, observando-se os critérios preconizados pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, que refere a aplicação da EC n. 113/2001, observados o Tema 96/STF e a Súmula Vinculante 17/STF.
- Preliminar rejeitada e, no mérito, apelação da parte autora provida.
Sustenta o embargante, em síntese, omissão, obscuridade e contradição no julgado. Alega que, para a aposentadoria especial, o autor deve comprovar a exposição a agentes nocivos, de maneira habitual e permanente, o que não ocorreu no caso concreto. Argumenta que "o autor deixa de cumprir a exigência contida na legislação especial ao não apresentar o correspondente PPP, a comprovar a insalubridade da atividade. Desatende também o comando essencial contido no art. 373 do Cód. de Processo Civil, que não pode suprido sob o risco de violação do princípio dispositivo e da inercia da jurisdição." Também afirma que a prova pericial somente seria cabível em situações excepcionalíssimas e que o autor "não comprovou documentalmente haver realizado qualquer diligência junto às empresas em que laborou a fim de obter a comprovação do seu alegado direito, tampouco comprovou a existência de recusa por parte das empresas, mesmo porque conseguiu obter dois PPPs das empresas que laborou." Requer o prequestionamento de toda matéria, com o fim de viabilizar futura interposição de recursos excepcionais.
A parte embargada apresentou contrarrazões, pugnando pela integral manutenção do acórdão.
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006898-33.2019.4.03.6183
RELATOR: Gab. 36 - JUÍZA CONVOCADA DIANA BRUNSTEIN
APELANTE: LAURO LAMARC SANTOS LOPES
Advogado do(a) APELANTE: ANGELA FRANCESCHINI DE ANDRADE CANDIDO - SP202898-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Os embargos de declaração, conforme dispõe o artigo 1.022 do CPC, destinam-se a suprir omissão, afastar obscuridade, eliminar contradição ou corrigir erro material existente no julgado.
O caráter infringente dos embargos somente é admitido a título excepcional, quando da eliminação da contradição ou da omissão decorrer logicamente a modificação do julgamento embargado.
No caso vertente, não se constatam os pressupostos legais para acolhimento dos embargos de declaração, porquanto não há ponto omisso, obscuro ou contraditório no julgado, o qual explicitou as razões que conduziram o órgão colegiado a reconhecer o direito da parte autora e a dar provimento a sua apelação.
De fato, o tempo de trabalho em condições especiais foi reconhecido mediante efetiva comprovação, por laudo produzido por terceiros (prova emprestada), da exposição a fator nocivo à saúde, caracterizado por ruído excessivo em atividade como operador do pregão viva-voz da Bolsa de Valores de São Paulo.
Oportuno ressaltar que o acórdão expôs os fundamentos que afastam a pretensão do embargante:
(...)
Impende consignar que a prova testemunhal não se presta à comprovação da especialidade do trabalho, mormente no caso em que as atividades como operador do pregão viva-voz da Bolsa Valores de São Paulo supostamente foram exercidas com exposição ao ruído, cuja comprovação, aliás, deve necessariamente ser feita por meio de laudo técnico.
Noutro giro, a expedição de ofício à Bovespa também se mostra completamente desnecessária, uma vez que, diante do encerramento do pregão viva-voz, o laudo pericial produzido por terceiros (prova emprestada) pode perfeitamente ser utilizado para comprovar a nocividade das atividades exercidas naquele ambiente de trabalho.
(...)
Necessário ressaltar que, à época, o denominado pregão viva-voz era notoriamente conhecido como um ambiente altamente estressante, hostil e barulhento.
Com a paulatina transição para o meio eletrônico desses negócios, iniciada em 30/09/2005, e a fusão da Bolsa de Valores de São Paulo com a Bolsa de Mercadorias de Futuros em 25/03/2008, o último pregão ocorreu em 29/11/2009.
O Sindicato dos Trabalhadores no Mercado de Capitais do Estado de São Paulo logrou êxito em obter laudo técnico pericial elaborado por engenheiro de segurança do trabalho (ID 254106458 - Págs. 1/14), no qual se comprova a exposição do operador de pregão a níveis de pressão sonora acima dos limites tolerados por lei, apurando a insalubridade em grau médio (20%), com a agravante de que o exercício desta atividade não permitia o uso da proteção auricular, já que, para negociar, era preciso ouvir no nocivo ambiente ruidoso.
Com efeito, a comprovação da especialidade se dá por meio de provas periciais diretas e produzidas de modo individual. Porém, consideradas as características do caso concreto e que ao INSS foi garantido o direito ao contraditório e à ampla defesa, excepcionalmente, admite-se, para comprovar a nocividade do ambiente pela contínua exposição ao ruído, o laudo pericial obtido pelo Sindicato da categoria, dado que a aferição técnica do ruído foi realizada no mesmo local em que o autor desenvolveu suas atividades como operador de pregão na BM&F/BOVESPA.
Demonstrado que o local de trabalho onde o autor exercia sua atividade junto ao pregão de viva-voz, de fato, se tratava de um ambiente extremamente nocivo à saúde, sobretudo pela contínua e habitual exposição dos profissionais aos altos níveis de pressão sonora, mensurados entre 95 a 103 dB(A), conforme do laudo pericial (ID 254106458 - Pág. 11).
Portanto, é adequada a aceitação da referido laudo pericial, mesmo porque seria impossível a realização de outra perícia, seja em virtude da extinção do único pregão viva-voz no Estado de São Paulo, seja pela inexistência de outro ambiente paradigma.
(...)
Com efeito, verifica-se que as alegações recursais denotam o intuito de rediscussão do mérito, diante do inconformismo com o resultado do julgamento, o que não se admite no âmbito dos embargos de declaração.
Por fim, cumpre ponderar que o intuito de prequestionamento da matéria tampouco autoriza o acolhimento do recurso, haja vista que não demonstrada a ocorrência de qualquer dos vícios previstos no artigo 1.022 do Código de Processo Civil.
Ante o exposto, rejeito os embargos de declaração.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. TEMPO ESPECIAL. PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS: OMISSÃO, CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE, ERRO MATERIAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. PREQUESTIONAMENTO. EMBARGOS REJEITADOS.
1. Os embargos de declaração, conforme dispõe o artigo 1.022 do CPC, destinam-se a suprir omissão, afastar obscuridade, eliminar contradição ou corrigir erro material existente no julgado.
2. O caráter infringente dos embargos somente é admitido a título excepcional, quando da eliminação do vício decorrer logicamente a modificação do julgamento embargado.
3. A decisão é clara, tendo sido apreciadas todas as matérias em relação às quais estava o julgador obrigado a pronunciar-se segundo seu convencimento. As razões veiculadas nos embargos, a pretexto de sanarem supostos vícios no acórdão, demonstram mero inconformismo com os fundamentos adotados e o intuito de rediscussão do mérito, o que não se admite nesta via.
4. O acórdão reconheceu o tempo de trabalho em condições especiais mediante efetiva comprovação, por laudo produzido por terceiros (prova emprestada), da exposição a fator nocivo à saúde, caracterizado por ruído excessivo em atividade como operador do pregão viva-voz.
5. O escopo de prequestionar a matéria para efeito de interposição de recursos especial ou extraordinário perde a relevância se não demonstrada ocorrência de qualquer das hipóteses previstas no art. 1.022 do CPC.
6. Embargos de declaração rejeitados.