Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
6198096-43.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
30/11/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 03/12/2020
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO DE
PRESTAÇÃO CONTINUADA AO IDOSO E À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. ART. 203, V, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. REQUISITO ETÁRIO PREENCHIDO. BENEFÍCIO DE VALOR
MÍNIMO PAGO AO IDOSO. EXCLUSÃO. ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 10.741/03.
APLICAÇÃO POR ANALOGIA. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS DO STJ
(REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA). STF. DECLARAÇÃO DE
INCONSTITUCIONALIDADE DO § 3º DO ART. 20 DA LEI Nº 8.472/93, SEM PRONÚNCIA DE
NULIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO ISOLADA. ANÁLISE DA MISERABILIDADE EM
CONJUNTO COM DEMAIS FATORES. SITUAÇÃO DE RISCO COMPROVADA. RENDA
FAMILIAR IGUAL A ZERO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO NO VALOR DE UM SALÁRIO
MÍNIMO EXCLUÍDO. NÚCLEO FAMILIAR FORMADO POR 2 PESSOAS COM IDADE
AVANÇADA. ESPOSO DA AUTORA COM MAIS DE 74 (SETENTA E QUATRO) ANOS.
PORTADORES DE DIVERSAS MOLÉSTIAS. REQUERENTE COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA.
FILHOS COM NÚCLEO FAMILIAR PRÓPRIO. AUXÍLIO. IMPOSSIBILIDADE. CONDIÇÕES DE
HABITABILIDADE INSATISFATÓRIAS. CASA COM TELHA TIPO BRASILIT. AUSÊNCIA DE
ACABAMENTO. CONCESSÃO DA BENESSE NA VIA ADMINISTRATIVA. HIPOSSUFICIÊNCIA
ECONÔMICA DEMONSTRADA E RECONHECIDA PELA PARTE RÉ. BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL DEVIDO. DIB. DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. PRECEDENTE.
CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SÚMULA 111
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
DO STJ. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. AÇÃO
JULGADA PROCEDENTE.
1 - O art. 203, V, da Constituição Federal instituiu o benefício de amparo social, assegurando o
pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem
não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2 - A Lei nº 8.742/93 e seus decretos regulamentares estabeleceram os requisitos para a
concessão do benefício, a saber: pessoa deficiente ou idoso com 65 anos ou mais e que
comprove possuir renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo.
3 - Pessoa com deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho, em
decorrência de impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial,
os quais, em interação com uma ou mais barreiras, podem obstruir sua participação plena e
efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, na dicção do art. 20,
§2º, com a redação dada pela Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015.
4 - A Lei Assistencial, ao fixar a renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de
miserabilidade, não sendo vedado comprovar a insuficiência de recursos para prover a
manutenção do deficiente ou idoso por outros meios de prova. Precedente jurisprudencial do
Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso representativo de controvérsia.
5 - No que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo para
comprovar a condição de miserabilidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento
da Reclamação nº 4374/PE, reapreciou a decisão proferida em sede de controle concentrado de
constitucionalidade (ADI nº 1.232-1/DF), declarando a inconstitucionalidade parcial, sem
pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.
6 - Pleiteia a autora a concessão do benefício assistencial, uma vez que, segundo alega, é idosa
e não possui condições de manter seu próprio sustento ou de tê-lo provido por sua família.
7 - O requisito etário fora devidamente preenchido, considerando o implemento da idade mínima
de 65 anos em 05.12.2013 (ID 106886389, p. 01), anteriormente à propositura da presente
demanda (29.04.2015).
8 - O estudo socioeconômico, com base em visita efetivada na casa da demandante em 28 de
maio de 2015 (ID 106886406), informou ser o núcleo familiar formado por ela e seu esposo.
Consta do relatório que "a moradia é própria, construída de bloco e telha Brasilit, onde a família
mora desde 1995. É composta por cozinha, dois dormitórios (sendo uma suíte) e mais um
banheiro, revestidos de piso de cerâmica e azulejo. Quanto ao mobiliário, possui todos os
essenciais e em bom estado de conservação. Na cozinha há geladeira, fogão, micro-ondas,
armários de parede e uma mesa com quatro cadeiras; no dormitório do casal há uma cama de
casal, um guarda-roupa e uma televisão; no segundo dormitório há uma cama de casal, um
guarda-roupa e uma televisão nos dois banheiros há lavatório, vaso sanitário e chuveiro em
apenas um".
9 - A renda familiar, na época do estudo, decorria de benefício de aposentadoria percebido pelo
esposo da requerente, PEDRO PEDROSO, no valor de um salário mínimo.
10 - Trata-se de pessoa maior de 65 (sessenta e cinco) anos, motivo pelo qual defende a
aplicação do disposto no art. 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso, para que seja excluído o
montante em questão do cômputo da renda familiar, o que deve ser atendido, conforme o
decidido pelo C. STJ na apreciação do caso (ID 106886471, p. 07-12).
11 - As despesas mensais, por sua vez, envolvendo gastos com alimentação, água, luz, gás,
telefone fixo e medicamentos, cingiam a aproximadamente R$714,00.
12 - Em síntese, a renda per capita do núcleo familiar equivalia, de acordo com o ordenamento
jurídico pátrio, a zero e, portanto, se mostrava insuficiente para com suas despesas, além de ser,
por óbvio, inferior ao parâmetro jurisprudencial de miserabilidade (1/2 do salário mínimo por
cabeça).
13 - Alie-se, como elemento de convicção, a corroborar a vulnerabilidade do núcleo familiar, o fato
de que este era composto por 2 (duas) pessoas com idade avançada, sendo que, à época, o
esposo da demandante contava com mais 74 (setenta e quatro) anos de idade, e ambos eram
portadores de diversas moléstias, sendo certo que diante desse cenário certamente seus gastos
com saúde aumentariam. O laudo pericial diagnosticou a requerente com “hipertensão arterial”,
“osteoartrose da coluna”, “gastrite” e “deficiência auditiva” (ID 106886410, p. 01-04). Por outro
lado, nos termos do estudo, seu companheiro sofria com “gota” e “hipertensão arterial”.
14 - Na época de elaboração dessa última prova, inclusive, já gastavam cerca de R$110,00 com
medicamentos, o que denota que o Poder Público não conseguia suprir todas as suas carências.
15 - Consta do relatório socioeconômico que possuem 2 (dois) filhos. Destaca-se, nesse sentido,
que o benefício assistencial de prestação continuada existe para auxiliar a sobrevivência das
pessoas portadoras de incapacidade, por idade avançada, ou outras restrições físicas ou
psíquicas para o trabalho e que não possuam parentes próximos em condições de lhes prover o
sustento. O dever, portanto, é, em primeiro lugar, da família. Todavia, por terem seu próprio
núcleo familiar, estavam impossibilitados de ajudarem seus genitores.
16 - Repisa-se que as condições de habitabilidade do casal não eram extremamente satisfatórias,
a despeito de a morada ser própria. Com efeito, era guarnecida por telhas “Brasilit” e construída
em bloco - sem acabamento.
17 - Enfim, informações extraídas do Sistema Integrado de Benefícios - SIBE, as quais seguem
anexas aos autos, dão conta que a demandante percebe, desde 16.11.2016, benefício
assistencial de prestação continuada ao idoso, de NB: 702.718.623-4, deferido pela própria
autarquia administrativamente, ou seja, a própria parte ré reconheceu a sua condição de
miserabilidade.
18 - Por todo o exposto, em minuciosa análise do conjunto fático probatório, verifica-se que o
núcleo familiar se enquadra na concepção legal de hipossuficiência econômica, fazendo,
portanto, a autora, jus ao benefício pleiteado até a sua implantação na via administrativa, que se
deu em 16.11.2016.
19 - Acerca do termo inicial do benefício, firmou-se consenso na jurisprudência que este se dá na
data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência (AgRg
no REsp 1532015/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em
04/08/2015, DJe 14/08/2015). Tendo em vista a apresentação de requerimento administrativo
pela parte autora em 17.02.2014 (ID 106886419), de rigor a fixação da DIB em tal data.
20 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a
partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da
repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E,
tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
21 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
22 - Saliente-se que, não obstante tratar-se de benefício assistencial, deve ser observado o tópico
do Manual atinente aos benefícios previdenciários, a teor do disposto no parágrafo único do art.
37 da Lei nº 8.742/93.
23 - Relativamente aos honorários advocatícios, consoante o disposto na Súmula nº 111, STJ,
estes devem incidir somente sobre o valor das parcelas devidas até a prolação da sentença,
ainda que reformada. E isso se justifica pelo princípio constitucional da isonomia. Na hipótese de
procedência do pleito em 1º grau de jurisdição e sucumbência da autarquia previdenciária, o
trabalho do patrono, da mesma forma que no caso de improcedência, perdura enquanto não
transitada em julgado a decisão final. O que altera são, tão somente, os papéis exercidos pelos
atores judicias que, dependendo da sorte do julgamento, ocuparão polos distintos em relação ao
que foi decidido. Portanto, não se mostra lógico e razoável referido discrímen, a ponto de justificar
o tratamento diferenciado, agraciando com maior remuneração profissionais que exercem suas
funções em 1º e 2º graus com o mesmo empenho e dedicação. Imperiosa, assim, a incidência da
verba honorária até a data do julgado recorrido, em 1º grau de jurisdição, e também, na ordem de
10% (dez por cento), eis que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são
suportadas por toda a sociedade, razão pela qual deve, por imposição legal, ser fixada
moderadamente, o que resta atendido com o percentual supra.
24 - Apelação da parte autora provida. Sentença reformada. Ação julgada procedente.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6198096-43.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: HILDA DE MORAIS PEDROSO
Advogado do(a) APELANTE: MARIA VANDIRA LUIZ SOUTO - SP358312-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6198096-43.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: HILDA DE MORAIS PEDROSO
Advogado do(a) APELANTE: MARIA VANDIRA LUIZ SOUTO - SP358312-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por HILDA DE MORAIS PEDROSO, em ação ajuizada em face
do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício
assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição Federal.
A r. sentença julgou improcedente o pedido inicial, ante a não demonstração da hipossuficiência
econômica. Condenada a parte autora no ressarcimento das despesas processuais
eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, ficando a
exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de
recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do
disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do
CPC (ID 106886432).
Em razões recursais, a parte autora pugnou pela reforma da sentença, ao fundamento de que
preenchia os requisitos para a concessão do benefício ora vindicado (ID 106886438).
Sem contrarrazões.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
Parecer do Ministério Público Federal (ID 106886461, p. 01-03), no sentido do provimento do
apelo.
Em sede de 2º grau de jurisdição, v. acórdão desta E. Turma negou provimento ao recurso,
mantendo hígida a sentença (ID 106886459, p. 01, e ID 106886460).
Opostos embargos pelo parquet(ID 106886458, p. 01-04), estes também foram rejeitados (ID
106886456, p. 01-02, e ID 106886457), assim como não foi admitido, pela Exma. Vice-
Presidência desta Corte, o seu recurso especial (ID 106886448 e ID 106886453, p. 01-04).
Contra a última decisão, foi interposto recurso de agravo, o qual, por sua vez, foi provido pelo
Colendo Superior Tribunal de Justiça a fim de que, in verbis, "se prossiga no exame da presença
dos requisitos necessários para a concessão do benefício postulado, determinando a exclusão da
aposentadoria por invalidez (ID 106886471, p. 07-12).
Com o transito em julgado da decisão (ID 106886472), os autos retornaram a este Tribunal sob
novo número: 6198096-43.2019.4.03.9999 (anterior 0016384-33.2016.4.03.9999).
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6198096-43.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: HILDA DE MORAIS PEDROSO
Advogado do(a) APELANTE: MARIA VANDIRA LUIZ SOUTO - SP358312-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
A República Federativa do Brasil, conforme disposto no art. 1º, III, da Constituição Federal, tem
como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana que, segundo José Afonso da
Silva, consiste em:
"um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o
direito à vida. 'Concebido como referência constitucional unificadora de todos os direitos
fundamentais [observam Gomes Canotilho e Vital Moreira], o conceito de dignidade da pessoa
humana obriga a uma densificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-
constitucional e não uma qualquer idéia apriorística do homem, não podendo reduzir-se o sentido
da dignidade humana à defesa dos direitos pessoais tradicionais, esquecendo-a nos casos de
direitos sociais, ou invocá-la para construir teoria do núcleo da personalidade individual,
ignorando-a quando se trate de garantir as bases da existência humana. Daí decorre que a ordem
econômica há de ter por fim assegurar a todos existência digna (art. 170), a ordem social visará a
realização da justiça social (art. 193), a educação, o desenvolvimento da pessoa e seu preparo
para o exercício da cidadania (art. 205) etc., não como meros enunciados formais, mas como
indicadores do conteúdo normativo eficaz da dignidade da pessoa humana.'"
(Curso de Direito Constitucional Positivo. 13ª ed., São Paulo: Malheiros, 1997, p. 106-107).
Para tornar efetivo este fundamento, diversos dispositivos foram contemplados na elaboração da
Carta Magna, dentre eles, o art. 7º, IV, que dispõe sobre as necessidades vitais básicas como
moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social
e o art. 203, que instituiu o benefício do amparo social, com a seguinte redação:
"A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à
seguridade social, e tem por objetivos:
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por
sua família, conforme dispuser a lei."
Entretanto, o supracitado inciso, por ser uma norma constitucional de eficácia limitada, dependia
da edição de uma norma posterior para produzir os seus efeitos, qual seja, a Lei nº 8.742, de 7 de
dezembro de 1993, regulamentada pelo Decreto nº 1.744, de 8 de dezembro de 1995 e,
posteriormente, pelo Decreto nº 6.214, de 26 de setembro de 2007.
O art. 20 da Lei Assistencial, com redação fornecida pela Lei nº 12.435/2011, e o art. 1º de seu
decreto regulamentar estabeleceram os requisitos para a concessão do benefício, quais sejam:
ser o requerente deficiente ou idoso, com 70 anos ou mais e que comprove não possuir meios de
prover a própria manutenção e nem tê-la provida por sua família. A idade mínima de 70 anos foi
reduzida para 67 anos, a partir de 1º de janeiro de 1998, pelo art. 1º da Lei nº 9.720/98 e,
posteriormente, para 65 anos, através do art. 34 da Lei nº 10.741 de 01 de outubro de 2003,
mantida, inclusive, por ocasião da edição da Lei nº 12.435, de 6 de julho de 2011.
Os mesmos dispositivos legais disciplinaram o que consideram como pessoa com deficiência,
família e ausência de condições de se manter ou de tê-la provida pela sua família.
Pessoa com deficiência é aquela incapacitada para o trabalho, em decorrência de impedimentos
de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com
uma ou mais barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em
igualdade de condições com as demais pessoas, na dicção do art. 20, §2º, com a redação dada
pela Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015.
O impedimento de longo prazo, a seu turno, é aquele que produz seus efeitos pelo prazo mínimo
de 2 (dois) anos (§10º).
A incapacidade exigida, por sua vez, não há que ser entendida como aquela que impeça a
execução de todos os atos da vida diária, para os quais se faria necessário o auxílio permanente
de terceiros, mas a impossibilidade de prover o seu sustento por meio do exercício de trabalho ou
ocupação remunerada.
Neste sentido, o entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça, em julgado da lavra do Ministro
Relator Gilson Dipp (5ª Turma, REsp nº 360.202, 04.06.2002, DJU 01.07.2002, p. 377),
oportunidade em que se consignou: "O laudo pericial que atesta a incapacidade para a vida
laboral e a capacidade para a vida independente, pelo simples fato da pessoa não necessitar da
ajuda de outros para se alimentar, fazer sua higiene ou se vestir, não pode obstar a percepção do
benefício, pois, se esta fosse a conceituação de vida independente, o benefício de prestação
continuada só seria devido aos portadores de deficiência tal, que suprimisse a capacidade de
locomoção do indivíduo - o que não parece ser o intuito do legislador".
No que se refere à hipossuficiência econômica, a Medida Provisória nº 1.473-34, de 11.08.97,
transformada na Lei nº 9.720, em 30.11.98, alterou o conceito de família para considerar o
conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213/91, desde que vivendo sob o mesmo
teto. Com a superveniência da Lei nº 12.435/11, definiu-se, expressamente para os fins do art.
20, caput, da Lei Assistencial, ser a família composta pelo requerente, cônjuge ou companheiro,
os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e
enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto (art. 20, §1º).
Já no que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo para
comprovar a condição de miserabilidade, anoto que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no
julgamento da Reclamação nº 4374/PE, reapreciou a decisão proferida em sede de controle
concentrado de constitucionalidade (ADI nº 1.232-1/DF), declarando a inconstitucionalidade
parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.
O v. acórdão, cuja ementa ora transcrevo, transitou em julgado em 19.09.2013:
"Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V,
da Constituição da República, estabeleceu critérios para que o benefício mensal de um salário
mínimo fosse concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovassem não
possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Art. 20, § 3º
da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal Federal
na ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que "considera-se incapaz de prover a
manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita
seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo". O requisito financeiro estabelecido pela lei teve
sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações de patente
miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto
constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo
Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Reclamação como
instrumento de (re)interpretação da decisão proferida em controle de constitucionalidade abstrato.
Preliminarmente, arguido o prejuízo da reclamação, em virtude do prévio julgamento dos recursos
extraordinários 580.963 e 567.985, o Tribunal, por maioria de votos, conheceu da reclamação. O
STF, no exercício da competência geral de fiscalizar a compatibilidade formal e material de
qualquer ato normativo com a Constituição, pode declarar a inconstitucionalidade,
incidentalmente, de normas tidas como fundamento da decisão ou do ato que é impugnado na
reclamação. Isso decorre da própria competência atribuída ao STF para exercer o denominado
controle difuso da constitucionalidade das leis e dos atos normativos. A oportunidade de
reapreciação das decisões tomadas em sede de controle abstrato de normas tende a surgir com
mais naturalidade e de forma mais recorrente no âmbito das reclamações. É no juízo
hermenêutico típico da reclamação - no "balançar de olhos" entre objeto e parâmetro da
reclamação - que surgirá com maior nitidez a oportunidade para evolução interpretativa no
controle de constitucionalidade. Com base na alegação de afronta a determinada decisão do STF,
o Tribunal poderá reapreciar e redefinir o conteúdo e o alcance de sua própria decisão. E,
inclusive, poderá ir além, superando total ou parcialmente a decisão-parâmetro da reclamação, se
entender que, em virtude de evolução hermenêutica, tal decisão não se coaduna mais com a
interpretação atual da Constituição. 4. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos
preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993.
A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à
aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. Como a lei
permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de contornar o critério objetivo e único
estipulado pela LOAS e avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes
idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais
elásticos para concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que
criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à
Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder
Executivo a conceder apoio financeiro a municípios que instituírem programas de garantia de
renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões
monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do
critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de
notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações
legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros
benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 5. Declaração de inconstitucionalidade
parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 6. Reclamação
constitucional julgada improcedente. (Rcl 4374, GILMAR MENDES, STF)"
Entretanto, interpretando tal decisão, chega-se à conclusão de que a Lei Assistencial, ao fixar a
renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de miserabilidade, não sendo vedado
comprovar a insuficiência de recursos para prover a manutenção do deficiente ou idoso por outros
meios de prova.
Tal entendimento descortina a possibilidade do exame do requisito atinente à hipossuficiência
econômica pelos já referidos "outros meios de prova".
A questão, inclusive, levou o Colendo Superior Tribunal de Justiça a sacramentar a discussão por
meio da apreciação da matéria em âmbito de recurso representativo de controvérsia repetitiva
assim ementado:
"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA,
QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO
MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e
ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe
que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de
deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua
renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
(...)
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se
comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou
seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior
a 1/4 do salário mínimo. 6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento
motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual
essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de
prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do
Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido."
(REsp nº 1.112.557/MG, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Terceira Seção, DJ
20/11/2009). (grifos nossos)
No que pertine à exclusão, da renda do núcleo familiar, do valor do benefício assistencial
percebido pelo idoso, conforme disposto no art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/03, referido
tema revelou-se polêmico, por levantar a discussão acerca do discrímen em se considerar
somente o benefício assistencial para a exclusão referida, e não o benefício previdenciário de
qualquer natureza, desde que de igual importe; sustentava-se, então, que a ratio legis do artigo
em questão dizia respeito à irrelevância do valor para o cálculo referenciado e, bem por isso, não
havia justificativa plausível para a discriminação.
Estabelecido o dissenso inclusive perante o Superior Tribunal de Justiça, o mesmo se resolveu no
sentido, enfim, de se excluir do cálculo da renda familiar todo e qualquer benefício de valor
mínimo recebido por pessoa maior de 65 anos, em expressa aplicação analógica do contido no
art. 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso.
Refiro-me, inicialmente, à Petição nº 7203/PE (Incidente de Uniformização de Jurisprudência),
apreciada pela 3ª Seção do STJ em 10 de agosto de 2011 (Rel. Ministra Maria Thereza de Assis
Moura) e, mais recentemente, ao Recurso Especial nº 1.355.052/SP, processado segundo o rito
do art. 543-C do CPC/73 e que porta a seguinte ementa:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA.
AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA.
IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, NO
VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO.
1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no valor
de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do benefício
de prestação mensal continuada a pessoa deficiente.
2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito
do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso
(Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com
deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário
mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n.
8.742/93.
3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código de
Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008.
(REsp nº 1.355.052/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, 1ª Seção, j. 25/02/2015, DJe
05/11/2015). (grifos nossos)
Pleiteia a autora a concessão do benefício assistencial, uma vez que, segundo alega, é idosa e
não possui condições de manter seu próprio sustento ou de tê-lo provido por sua família.
O requisito etário fora devidamente preenchido, considerando o implemento da idade mínima de
65 anos em 05.12.2013 (ID 106886389, p. 01), anteriormente à propositura da presente demanda
(29.04.2015).
O estudo socioeconômico, com base em visita efetivada na casa da demandante em 28 de maio
de 2015 (ID 106886406), informou ser o núcleo familiar formado por ela e seu esposo.
Consta do relatório que "a moradia é própria, construída de bloco e telha Brasilit, onde a família
mora desde 1995. É composta por cozinha, dois dormitórios (sendo uma suíte) e mais um
banheiro, revestidos de piso de cerâmica e azulejo. Quanto ao mobiliário, possui todos os
essenciais e em bom estado de conservação. Na cozinha há geladeira, fogão, micro-ondas,
armários de parede e uma mesa com quatro cadeiras; no dormitório do casal há uma cama de
casal, um guarda-roupa e uma televisão; no segundo dormitório há uma cama de casal, um
guarda-roupa e uma televisão nos dois banheiros há lavatório, vaso sanitário e chuveiro em
apenas um".
A renda familiar, na época do estudo, decorria de benefício de aposentadoria percebido pelo
esposo da requerente, PEDRO PEDROSO, no valor de um salário mínimo.
Trata-se de pessoa maior de 65 (sessenta e cinco) anos, motivo pelo qual defende a aplicação do
disposto no art. 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso, para que seja excluído o montante em
questão do cômputo da renda familiar, o que deve ser atendido, conforme o decidido pelo C. STJ
na apreciação do caso (ID 106886471, p. 07-12).
As despesas mensais, por sua vez, envolvendo gastos com alimentação, água, luz, gás, telefone
fixo e medicamentos, cingiam a aproximadamente R$714,00.
Em síntese, a renda per capita do núcleo familiar equivalia, de acordo com o ordenamento
jurídico pátrio, a zero e, portanto, se mostrava insuficiente para com suas despesas, além de ser,
por óbvio, inferior ao parâmetro jurisprudencial de miserabilidade (1/2 do salário mínimo por
cabeça).
Alie-se, como elemento de convicção, a corroborar a vulnerabilidade do núcleo familiar, o fato de
que este era composto por 2 (duas) pessoas com idade avançada, sendo que, à época, o esposo
da demandante contava com mais 74 (setenta e quatro) anos de idade, e ambos eram portadores
de diversas moléstias, sendo certo que diante desse cenário certamente seus gastos com saúde
aumentariam. O laudo pericial diagnosticou a requerente com “hipertensão arterial”, “osteoartrose
da coluna”, “gastrite” e “deficiência auditiva” (ID 106886410, p. 01-04). Por outro lado, nos termos
do estudo, seu companheiro sofria com “gota” e “hipertensão arterial”.
Na época de elaboração dessa última prova, inclusive, já gastavam cerca de R$110,00 com
medicamentos, o que denota que o Poder Público não conseguia suprir todas as suas carências.
Consta do relatório socioeconômico que possuem 2 (dois) filhos. Destaco, nesse sentido, que o
benefício assistencial de prestação continuada existe para auxiliar a sobrevivência das pessoas
portadoras de incapacidade, por idade avançada, ou outras restrições físicas ou psíquicas para o
trabalho e que não possuam parentes próximos em condições de lhes prover o sustento. O dever,
portanto, é, em primeiro lugar, da família.
Todavia, por terem seu próprio núcleo familiar, estavam impossibilitados de ajudarem seus
genitores.
Repisa-se que as condições de habitabilidade do casal não eram extremamente satisfatórias, a
despeito de a morada ser própria. Com efeito, era guarnecida por telhas “Brasilit” e construída em
bloco - sem acabamento.
Enfim, informações extraídas do Sistema Integrado de Benefícios - SIBE, as quais ora faço
anexar aos autos, dão conta que a demandante percebe, desde 16.11.2016, benefício
assistencial de prestação continuada ao idoso, de NB: 702.718.623-4, deferido pela própria
autarquia administrativamente, ou seja, a própria parte ré reconheceu a sua condição de
miserabilidade.
Por todo o exposto, em minuciosa análise do conjunto fático probatório, verifico que o núcleo
familiar se enquadra na concepção legal de hipossuficiência econômica, fazendo, portanto, a
autora, jus ao benefício pleiteado até a sua implantação na via administrativa, que se deu em
16.11.2016.
Acerca do termo inicial do benefício, firmou-se consenso na jurisprudência que este se dá na data
do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência. Nessa
esteira, confira-se o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
"PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. TERMO
INICIAL. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO.
1. Afasta-se a incidência da Súmula 7/STJ, porquanto o deslinde da controvérsia requer apenas a
análise de matéria exclusivamente de direito.
2. Nos termos da jurisprudência pacífica do STJ, o termo inicial para a concessão do benefício
assistencial de prestação continuada é a data do requerimento administrativo e, na sua ausência,
a partir da citação .
Agravo regimental improvido.
(AgRg no REsp 1532015/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado
em 04/08/2015, DJe 14/08/2015)."
Assim, tendo em vista a apresentação de requerimento administrativo pela parte autora em
17.02.2014 (ID 106886419), de rigor a fixação da DIB em tal data.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo
com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir
as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Saliento que, não obstante tratar-se de benefício assistencial, deve ser observado o tópico do
Manual atinente aos benefícios previdenciários, a teor do disposto no parágrafo único do art. 37
da Lei nº 8.742/93.
Relativamente aos honorários advocatícios, consoante o disposto na Súmula nº 111, STJ, estes
devem incidir somente sobre o valor das parcelas devidas até a prolação da sentença, ainda que
reformada. E isso se justifica pelo princípio constitucional da isonomia. Na hipótese de
procedência do pleito em 1º grau de jurisdição e sucumbência da autarquia previdenciária, o
trabalho do patrono, da mesma forma que no caso de improcedência, perdura enquanto não
transitada em julgado a decisão final. O que altera são, tão somente, os papéis exercidos pelos
atores judicias que, dependendo da sorte do julgamento, ocuparão polos distintos em relação ao
que foi decidido. Portanto, não se mostra lógico e razoável referido discrímen, a ponto de justificar
o tratamento diferenciado, agraciando com maior remuneração profissionais que exercem suas
funções em 1º e 2º graus com o mesmo empenho e dedicação.
Imperiosa, assim, a incidência da verba honorária até a data do julgado recorrido, em 1º grau de
jurisdição, e também, na ordem de 10% (dez por cento), eis que as condenações pecuniárias da
autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual deve, por
imposição legal, ser fixada moderadamente, o que resta atendido com o percentual supra.
Ante o exposto, dou provimento à apelação da parte autora para reformar a r. sentença e, com
isso, julgar procedente o pedido deduzido na inicial, condenando o INSS na concessão e no
pagamento dos atrasados de benefício assistencial de prestação continuada, desde a data da
apresentação do requerimento administrativo, ocorrida em 17.02.2014, até a data da implantação
da benesse na via administrativa, que se deu em 16.11.2016, sendo que sobre os valores em
atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para
os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será
apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício
requisitório, de acordo com o mesmo Manual, além de condená-lo no pagamento de honorários
advocatícios na ordem de 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da
prolação da sentença de 1º grau de jurisdição.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO DE
PRESTAÇÃO CONTINUADA AO IDOSO E À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. ART. 203, V, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. REQUISITO ETÁRIO PREENCHIDO. BENEFÍCIO DE VALOR
MÍNIMO PAGO AO IDOSO. EXCLUSÃO. ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 10.741/03.
APLICAÇÃO POR ANALOGIA. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS DO STJ
(REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA). STF. DECLARAÇÃO DE
INCONSTITUCIONALIDADE DO § 3º DO ART. 20 DA LEI Nº 8.472/93, SEM PRONÚNCIA DE
NULIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO ISOLADA. ANÁLISE DA MISERABILIDADE EM
CONJUNTO COM DEMAIS FATORES. SITUAÇÃO DE RISCO COMPROVADA. RENDA
FAMILIAR IGUAL A ZERO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO NO VALOR DE UM SALÁRIO
MÍNIMO EXCLUÍDO. NÚCLEO FAMILIAR FORMADO POR 2 PESSOAS COM IDADE
AVANÇADA. ESPOSO DA AUTORA COM MAIS DE 74 (SETENTA E QUATRO) ANOS.
PORTADORES DE DIVERSAS MOLÉSTIAS. REQUERENTE COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA.
FILHOS COM NÚCLEO FAMILIAR PRÓPRIO. AUXÍLIO. IMPOSSIBILIDADE. CONDIÇÕES DE
HABITABILIDADE INSATISFATÓRIAS. CASA COM TELHA TIPO BRASILIT. AUSÊNCIA DE
ACABAMENTO. CONCESSÃO DA BENESSE NA VIA ADMINISTRATIVA. HIPOSSUFICIÊNCIA
ECONÔMICA DEMONSTRADA E RECONHECIDA PELA PARTE RÉ. BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL DEVIDO. DIB. DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. PRECEDENTE.
CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SÚMULA 111
DO STJ. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. AÇÃO
JULGADA PROCEDENTE.
1 - O art. 203, V, da Constituição Federal instituiu o benefício de amparo social, assegurando o
pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem
não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2 - A Lei nº 8.742/93 e seus decretos regulamentares estabeleceram os requisitos para a
concessão do benefício, a saber: pessoa deficiente ou idoso com 65 anos ou mais e que
comprove possuir renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo.
3 - Pessoa com deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho, em
decorrência de impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial,
os quais, em interação com uma ou mais barreiras, podem obstruir sua participação plena e
efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, na dicção do art. 20,
§2º, com a redação dada pela Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015.
4 - A Lei Assistencial, ao fixar a renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de
miserabilidade, não sendo vedado comprovar a insuficiência de recursos para prover a
manutenção do deficiente ou idoso por outros meios de prova. Precedente jurisprudencial do
Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso representativo de controvérsia.
5 - No que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo para
comprovar a condição de miserabilidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento
da Reclamação nº 4374/PE, reapreciou a decisão proferida em sede de controle concentrado de
constitucionalidade (ADI nº 1.232-1/DF), declarando a inconstitucionalidade parcial, sem
pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.
6 - Pleiteia a autora a concessão do benefício assistencial, uma vez que, segundo alega, é idosa
e não possui condições de manter seu próprio sustento ou de tê-lo provido por sua família.
7 - O requisito etário fora devidamente preenchido, considerando o implemento da idade mínima
de 65 anos em 05.12.2013 (ID 106886389, p. 01), anteriormente à propositura da presente
demanda (29.04.2015).
8 - O estudo socioeconômico, com base em visita efetivada na casa da demandante em 28 de
maio de 2015 (ID 106886406), informou ser o núcleo familiar formado por ela e seu esposo.
Consta do relatório que "a moradia é própria, construída de bloco e telha Brasilit, onde a família
mora desde 1995. É composta por cozinha, dois dormitórios (sendo uma suíte) e mais um
banheiro, revestidos de piso de cerâmica e azulejo. Quanto ao mobiliário, possui todos os
essenciais e em bom estado de conservação. Na cozinha há geladeira, fogão, micro-ondas,
armários de parede e uma mesa com quatro cadeiras; no dormitório do casal há uma cama de
casal, um guarda-roupa e uma televisão; no segundo dormitório há uma cama de casal, um
guarda-roupa e uma televisão nos dois banheiros há lavatório, vaso sanitário e chuveiro em
apenas um".
9 - A renda familiar, na época do estudo, decorria de benefício de aposentadoria percebido pelo
esposo da requerente, PEDRO PEDROSO, no valor de um salário mínimo.
10 - Trata-se de pessoa maior de 65 (sessenta e cinco) anos, motivo pelo qual defende a
aplicação do disposto no art. 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso, para que seja excluído o
montante em questão do cômputo da renda familiar, o que deve ser atendido, conforme o
decidido pelo C. STJ na apreciação do caso (ID 106886471, p. 07-12).
11 - As despesas mensais, por sua vez, envolvendo gastos com alimentação, água, luz, gás,
telefone fixo e medicamentos, cingiam a aproximadamente R$714,00.
12 - Em síntese, a renda per capita do núcleo familiar equivalia, de acordo com o ordenamento
jurídico pátrio, a zero e, portanto, se mostrava insuficiente para com suas despesas, além de ser,
por óbvio, inferior ao parâmetro jurisprudencial de miserabilidade (1/2 do salário mínimo por
cabeça).
13 - Alie-se, como elemento de convicção, a corroborar a vulnerabilidade do núcleo familiar, o fato
de que este era composto por 2 (duas) pessoas com idade avançada, sendo que, à época, o
esposo da demandante contava com mais 74 (setenta e quatro) anos de idade, e ambos eram
portadores de diversas moléstias, sendo certo que diante desse cenário certamente seus gastos
com saúde aumentariam. O laudo pericial diagnosticou a requerente com “hipertensão arterial”,
“osteoartrose da coluna”, “gastrite” e “deficiência auditiva” (ID 106886410, p. 01-04). Por outro
lado, nos termos do estudo, seu companheiro sofria com “gota” e “hipertensão arterial”.
14 - Na época de elaboração dessa última prova, inclusive, já gastavam cerca de R$110,00 com
medicamentos, o que denota que o Poder Público não conseguia suprir todas as suas carências.
15 - Consta do relatório socioeconômico que possuem 2 (dois) filhos. Destaca-se, nesse sentido,
que o benefício assistencial de prestação continuada existe para auxiliar a sobrevivência das
pessoas portadoras de incapacidade, por idade avançada, ou outras restrições físicas ou
psíquicas para o trabalho e que não possuam parentes próximos em condições de lhes prover o
sustento. O dever, portanto, é, em primeiro lugar, da família. Todavia, por terem seu próprio
núcleo familiar, estavam impossibilitados de ajudarem seus genitores.
16 - Repisa-se que as condições de habitabilidade do casal não eram extremamente satisfatórias,
a despeito de a morada ser própria. Com efeito, era guarnecida por telhas “Brasilit” e construída
em bloco - sem acabamento.
17 - Enfim, informações extraídas do Sistema Integrado de Benefícios - SIBE, as quais seguem
anexas aos autos, dão conta que a demandante percebe, desde 16.11.2016, benefício
assistencial de prestação continuada ao idoso, de NB: 702.718.623-4, deferido pela própria
autarquia administrativamente, ou seja, a própria parte ré reconheceu a sua condição de
miserabilidade.
18 - Por todo o exposto, em minuciosa análise do conjunto fático probatório, verifica-se que o
núcleo familiar se enquadra na concepção legal de hipossuficiência econômica, fazendo,
portanto, a autora, jus ao benefício pleiteado até a sua implantação na via administrativa, que se
deu em 16.11.2016.
19 - Acerca do termo inicial do benefício, firmou-se consenso na jurisprudência que este se dá na
data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência (AgRg
no REsp 1532015/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em
04/08/2015, DJe 14/08/2015). Tendo em vista a apresentação de requerimento administrativo
pela parte autora em 17.02.2014 (ID 106886419), de rigor a fixação da DIB em tal data.
20 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a
partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da
repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E,
tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
21 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
22 - Saliente-se que, não obstante tratar-se de benefício assistencial, deve ser observado o tópico
do Manual atinente aos benefícios previdenciários, a teor do disposto no parágrafo único do art.
37 da Lei nº 8.742/93.
23 - Relativamente aos honorários advocatícios, consoante o disposto na Súmula nº 111, STJ,
estes devem incidir somente sobre o valor das parcelas devidas até a prolação da sentença,
ainda que reformada. E isso se justifica pelo princípio constitucional da isonomia. Na hipótese de
procedência do pleito em 1º grau de jurisdição e sucumbência da autarquia previdenciária, o
trabalho do patrono, da mesma forma que no caso de improcedência, perdura enquanto não
transitada em julgado a decisão final. O que altera são, tão somente, os papéis exercidos pelos
atores judicias que, dependendo da sorte do julgamento, ocuparão polos distintos em relação ao
que foi decidido. Portanto, não se mostra lógico e razoável referido discrímen, a ponto de justificar
o tratamento diferenciado, agraciando com maior remuneração profissionais que exercem suas
funções em 1º e 2º graus com o mesmo empenho e dedicação. Imperiosa, assim, a incidência da
verba honorária até a data do julgado recorrido, em 1º grau de jurisdição, e também, na ordem de
10% (dez por cento), eis que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são
suportadas por toda a sociedade, razão pela qual deve, por imposição legal, ser fixada
moderadamente, o que resta atendido com o percentual supra.
24 - Apelação da parte autora provida. Sentença reformada. Ação julgada procedente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação da parte autora para reformar a r. sentença e,
com isso, julgar procedente o pedido deduzido na inicial, condenando o INSS na concessão e no
pagamento dos atrasados de benefício assistencial de prestação continuada, desde a data da
apresentação do requerimento administrativo, ocorrida em 17.02.2014, até a data da implantação
da benesse na via administrativa, que se deu em 16.11.2016, sendo que sobre os valores em
atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para
os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será
apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício
requisitório, de acordo com o mesmo Manual, além de condená-lo no pagamento de honorários
advocatícios na ordem de 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da
prolação da sentença de 1º grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA