
| D.E. Publicado em 26/06/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora e dar parcial provimento às remessa necessária e apelação do INSS para, reformando em parte a r. sentença de 1º grau, julgar improcedente o pedido de concessão de "aposentadoria especial", mantendo o r. julgado no tocante ao reconhecimento de labor especial nos intervalos de 04/12/1974 a 30/05/1975, 02/03/1976 a 14/05/1976, e 01/03/1983 a 22/11/2004, determinando à Autarquia previdenciária que proceda à respectiva averbação, alfim estabelecendo a sucumbência recíproca, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0008321-64.2007.4.03.6109/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e apelações interpostas, pelo autor ORLANDO BUENO CARDOSO e pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária objetivando a concessão de "aposentadoria especial", mediante o reconhecimento de trabalho desempenhado exclusivamente sob condições especiais.
A r. sentença (fls. 338/342) julgou parcialmente procedente a ação, reconhecendo a especialidade dos intervalos laborativos de 04/12/1974 a 30/05/1975, 02/03/1976 a 14/05/1976 e 01/03/1983 a 04/09/2007, assim condenando o INSS no pagamento, ao autor, de "aposentadoria especial" (totalizados 25 anos, 02 meses e 14 dias de tempo laborativo especial, consoante tabela confeccionada pelo d. Juízo, fl. 343), desde 11/09/2007 (data do ajuizamento da demanda), com incidência de atualização monetária e juros de mora sobre as parcelas devidas. Condenou-se a parte autora no pagamento dos honorários advocatícios da parte ré, isso porque não provocada a administração, previamente, para o deferimento da benesse. Por outro lado, ressaltou-se a isenção de que gozariam as partes, no tocante às custas processuais. Determinaram-se, por fim, o reexame necessário da sentença e o adiantamento da tutela jurisdicional, com a implantação da benesse, pelo INSS.
A parte autora recorreu (fls. 360/366), pleiteando o reconhecimento da especialidade também quanto aos intervalos de 28/10/1975 a 26/01/1976 e 31/05/1976 a 07/02/1977, mantendo-se a concessão da "aposentadoria especial" - já, então, com o somatório alcançado de 26 anos, 01 mês e 21 dias de labor efetivamente especial - com, alfim, a inversão da sucumbência e condenação do INSS em verba advocatícia.
Apelou o INSS (fls. 371/375), requerendo, de início, o recebimento de seu recurso no efeito suspensivo; ademais, a reforma integral do julgado, ressaltando a falta de comprovação da atividade especial em caráter habitual e permanente, destacando, neste ponto, o uso eficaz de EPI, pelo autor, ao longo da jornada laboral, restando neutralizados eventuais agentes insalubres; também apontou a autarquia a impossibilidade de enquadramento profissional, in casu. Se diverso deste, o entendimento, pleiteia: a) a fixação do termo inicial da benesse na data da juntada dos laudos ao processo, e b) a observância da letra da Súmula 111 do C. STJ, em caso de sua eventual condenação no pagamento de verba advocatícia.
Devidamente processados os recursos, com o oferecimento de correspectivas contrarrazões (fls. 369/370 e 379/384), foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Enfatizo que a propositura da demanda dera-se em 11/09/2007 (fl. 02), com a posterior citação da autarquia em 27/03/2008 (fl. 315) e a prolação da r. sentença aos 28/10/2009 (fl. 342), sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
Conforme narrada na inicial, a pretensão da parte autora resumir-se-ia ao reconhecimento dos intervalos laborativos especiais de 04/12/1974 a 30/05/1975, 28/10/1975 a 26/01/1976, 02/03/1976 a 14/05/1976, 31/05/1976 a 07/02/1977 e 01/03/1983 a 04/09/2007, visando à concessão de "aposentadoria especial".
Quanto ao pedido de suspensão da antecipação da tutela, consubstanciado no pleito do INSS, de recepção do recurso em ambos os efeitos - devolutivo e suspensivo - cumpre salientar que, nesta fase processual, a análise será efetuada juntamente com o mérito das questões trazidas a debate pelo recurso, conjugado com a remessa necessária determinada expressamente em sentença.
Observo que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios.
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos, enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação prevê que "(...) será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)". (grifo nosso)
Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79 (presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador, independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para ruído e calor.
A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro formulário equivalente, para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição do trabalhador às condições especiais.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, frise-se, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80 dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90 dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90 dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80 dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90 dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
No mais, observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Do caso em tela.
A demanda foi instruída com diversos documentos secundando a exordial (fls. 12/236, ainda emendada às fls. 247/310), destacando-se as cópias de CTPS da parte autora (fls. 13/17), demonstrando, de forma pormenorizada, seu ciclo laborativo. Certo é que, dentre toda aludida documentação, sobressai aquela que diretamente trata da questão controvertida nos autos: a especialidade (ou não) dos períodos laborados pela parte autora.
E do minucioso exame realizado, conclui-se pela excepcionalidade do labor, como segue:
* de 04/12/1974 a 30/05/1975, como fresador, junto à empresa Auto-Pira S/A Indústria e Comércio de Peças, por meio de formulário DSS-8030 (fl. 18) e laudo técnico (fls. 21/31), evidenciando a exposição da parte autora a ruídos, entre mínimo e máximo, de 82 e 89 dB(A), possibilitando o reconhecimento da especialidade à luz do item 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64;
* de 02/03/1976 a 14/05/1976, como ajudante de produção (em caldeiraria), junto à empresa Codistil S/A Dedini, com nova razão social Dedini S/A - Indústria de Base, por meio de formulário DSS-8030 (fl. 19) evidenciando, ainda, a exposição da parte autora a soldas elétricas e maçaricos, possibilitando o reconhecimento da especialidade à luz do item 2.5.3 do Decreto nº 53.831/64;
* de 01/03/1983 a 22/11/2004 (data de emissão da documentação) como técnico de laboratório (em laboratório de química), junto à empresa Instituto Educacional Piracicabano, por meio de formulário (fl. 35), PPP (fls. 36/37) e correlatos (fls. 49/143 e 247/310) evidenciando a exposição da parte autora a agentes químicos (reagentes; manipulação de cromatos e bicromatos; emprego de produtos contendo hidrocarbonetos aromáticos como solventes; emprego de defensivos organofosforados; manipulação de ácidos oxálico, sulfúrico, nítrico, bromídrico, fosfórico e pícrico; aplicação e emprego de pastas, líquidos e pós à base de compostos de chumbo; manuseio de álcalis cáusticos) e também biológicos (micro-organismos), possibilitando o reconhecimento da especialidade à luz dos itens 1.2.0 e 1.3.0 do Decreto nº 53.831/64; 1.2.0, 1.3.0 e 2.1.2 do Decreto nº 83.080/79; 1.0.0 e 3.0.0 do Decreto nº 2.172/97; e 1.0.0 e 3.0.0 do Decreto nº 3.048/99.
Por sua vez, quanto ao intervalo de 28/10/1975 a 26/01/1976, na qualidade de apontador (no setor de fiação), junto à empresa Cia Industrial e Agrícola "Boyes", conquanto o formulário DSS-8030 (fl. 33) indique a sujeição do autor a ruído entre 94 e 95 dB(A), não houve a apresentação de laudo técnico - considerado imprescindível em casos envolvendo mensuração de níveis de pressão sonora - impedindo, assim, o acolhimento da suposta atividade de índole especial.
E no tocante ao período de 31/05/1976 a 07/02/1977, como apontador de produção junto à empresa Motocana Máquinas e Implementos Ltda., o próprio formulário DSS-8030 acostado (fl. 20) descreve textualmente as atividades do autor em sala administrativa existente na dependência da fábrica, bem como nos diversos setores produtivos da empresa, executando tarefas de 1) acompanhamento das atividades dos operadores de máquinas, soldadores, caldeireiros, a fim de anotar os tempos de operação, paradas de máquinas por falta de material, acidentes de trabalho, etc; e 2) copiar os tempos anotados e fazer relatório de produção, verificando a produtividades de cada atividade na fábrica. Também refere o formulário que agentes agressivos seriam inerentes ao setor produtivo da empresa, sendo que o autor, somente quando necessário, deslocar-se-ia a este setor.
Em suma: conforme narrado acima, o trabalho do autor envolveria afazeres de natureza notadamente intelectual (coleta de dados e produção de relatórios), sem a permanência em um único setor específico, alternando-se ora num (setor), ora noutro. E não há, portanto, traço qualquer de insalubridade nas atividades prestadas.
Eis que, com o reconhecimento do tempo laborativo supradescrito, computando-se todos os intervalos de índole unicamente especial, constata-se que, na data do aforamento da demanda, a parte autora totalizava 22 anos, 05 meses e 02 dias de tempo de serviço exclusivamente especial, número este aquém do necessário à consecução da "aposentadoria especial" vindicada.
Resta, pois, improcedente a demanda neste ponto específico.
Por outro lado, o pedido formulado na inicial merece parcial acolhida, no sentido de compelir a autarquia previdenciária a reconhecer e averbar tempo laborativo especial correspondente a 04/12/1974 a 30/05/1975, 02/03/1976 a 14/05/1976, e 01/03/1983 a 22/11/2004.
Ante a sucumbência recíproca, deixo de condenar as partes em honorários advocatícios, conforme prescrito no art. 21 do CPC/73, e em custas processuais, dada a gratuidade da justiça conferida ao autor (fl. 311) e por ser o INSS delas isento.
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora e dou parcial provimento às remessa necessária e apelação do INSS para, reformando em parte a r. sentença de 1º grau, julgar improcedente o pedido de concessão de "aposentadoria especial", mantendo o r. julgado no tocante ao reconhecimento de labor especial nos intervalos de 04/12/1974 a 30/05/1975, 02/03/1976 a 14/05/1976, e 01/03/1983 a 22/11/2004, determinando à Autarquia previdenciária que proceda à respectiva averbação, alfim estabelecendo a sucumbência recíproca.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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