Processo
RemNecCiv - REMESSA NECESSáRIA CíVEL / SP
5002166-98.2019.4.03.6121
Relator(a)
Desembargador Federal VANESSA VIEIRA DE MELLO
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
08/10/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 15/10/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. REMESSA OFICIAL EM
MANDADO DE SEGURANÇA. CESSAÇÃO ADMINISTRATIVA DE BENEFÍCIO POR
INCAPACIDADE CONCEDIDO JUDICIALMENTE. REABILITAÇÃO PROFISSIONAL PREVISTA
NO TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL.
- O mandado de segurança é remédio constitucional (art. 5º, LXIX, CF/88) destinado à proteção
de direito líquido e certo contra ato ilegal ou abusivo perpetrado por autoridade pública.
- Nos termos do art. 101 da Lei de Benefícios, não se nega que ao INSS é permitida a realização
de exame médico-pericial voltado a verificar se houve modificação no estado de saúde do
segurado. Contudo, é defeso à autarquia suspender automaticamente o benefício implementado
por força de decisão judicial, sob pena de descumprimento da ordem proferida.
- Garantido à impetrante a manutenção do auxílio-doença – benefício de caráter alimentar – até
que ela seja submetida ao procedimento de reabilitação profissional, conforme determinado na
ação previdenciária pretérita.
- Remessa oficial desprovida.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº5002166-98.2019.4.03.6121
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
PARTE AUTORA: DALVA HELENA CORREA DA SILVA
Advogado do(a) PARTE AUTORA: THAISE MOSCARDO MAIA - SP255271-N
PARTE RE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº5002166-98.2019.4.03.6121
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
PARTE AUTORA: DALVA HELENA CORREA DA SILVA
Advogado do(a) PARTE AUTORA: THAISE MOSCARDO MAIA - SP255271-N
PARTE RE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
Cuida-se de reexame necessário em sentença que concedeu a segurança, para determinar que a
autoridade coatora mantenha o benefício de auxílio-doença NB 31/547.958.980-2 até que seja
dada como reabilitada para o desempenho de nova atividade que lhe garanta a subsistência, nos
termos do art. 62 da Lei 8.213/1991.
Subiram os autos a esta Corte.
Manifestou-se a Procuradoria Regional da República pelo desprovimento do reexame necessário.
É o relatório.
REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº5002166-98.2019.4.03.6121
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
PARTE AUTORA: DALVA HELENA CORREA DA SILVA
Advogado do(a) PARTE AUTORA: THAISE MOSCARDO MAIA - SP255271-N
PARTE RE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
Conheço da remessa oficial, ex vi legis.
O mandado de segurança é remédio constitucional (art. 5º, LXIX, CF) destinado à proteção de
direito líquido e certo contra ato ilegal ou abusivo praticado por autoridade pública.
No mandado de segurança deve o impetrante demonstrar direito líquido e certo. Ensina Hely
Lopes Meirelles (Mandado de Segurança: ação popular, ação civil pública, mandado de injunção,
"habeas data" - 13. ed. Atual. Pela Constituição de 1988 - São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 1989) que "Direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto na sua existência,
delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração. Por outras
palavras, o direito invocado, para ser amparável por mandado de segurança, há de vir expresso
em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante: se
sua existência for duvidosa; se sua extensão ainda não estiver delimitada; se o seu exercício
depender de situações e fatos ainda indeterminados, não rende ensejo à segurança, embora
possa ser defendido por outros meios judiciais" (pp. 13/14).
Portanto, o direito líquido e certo deve estar plenamente demonstrado por prova pré-constituída,
pois a ausência desse requisito específico torna a via mandamental inadequada ao desiderato
visado.
Como é cediço, não há possibilidade de dilação probatória em mandado de segurança, motivo
pelo qual o juiz fica sem instrumento processual hábil a aferir todo o rol dos requisitos para a
concessão, ou a denegação, do benefício pretendido.
No presente caso, os documentos incluídos neste processo revelam a existência de ilegalidade.
A aposentadoria por invalidez, segundo a dicção do art. 42 da Lei n. 8.213/1991, é devida ao
segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o
trabalho e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a
subsistência.
Assim, o evento determinante para a concessão desse benefício é a incapacidade para o
trabalho.
São exigidos à concessão dos benefícios por incapacidade: a qualidade de segurado, a carência
de doze contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma
permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a
subsistência (aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem
como a demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao
Regime Geral da Previdência Social.
Trata-se de benefício a ser mantido rebus sic stantibus, ou seja, enquanto perdurar a
incapacidade. À luz do artigo 101 da Lei n 8.213/1991, deverá ser cassado após constatação da
recuperação da capacidade de trabalho, em perícia médica.
A Administração Pública goza de prerrogativas, entre as quais o controle administrativo, sendo
dado rever os atos de seus próprios órgãos, anulando aqueles eivados de ilegalidade, bem como
revogando os atos cuja conveniência e oportunidade não mais subsista.
Trata-se do poder de autotutela administrativo, enunciado nas Súmulas 346 e 473 do Supremo
Tribunal Federal, tendo como fundamento os princípios constitucionais da legalidade e
supremacia do interesse público, desde que obedecidos os regramentos constitucionais do
contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, LIV e LV, da CF), além da Lei n. 9.784/1999, aplicável
à espécie.
A Administração pode rever seus atos. Ao final das contas, a teor da Súmula 473 do STF “A
administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais,
porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência e oportunidade,
respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos a apreciação judicial”.
Deve o INSS observar as regras constitucionais, sob pena de ver seus atos afastados por
intervenção do Poder Judiciário. Com efeito, a garantia do inciso LV do artigo 5º da Constituição
da República determina que em processos administrativos também deve ser observado o
contraditório regular.
Ocorre que o presente feito tem uma particularidade: o benefício foi concedido judicialmente pelo
Juizado Especial Federal (0003499-67.2015.403.6330), tendo o título executivo determinado,
também, a concessão de reabilitação profissional (vide decisão monocrática proferida em
14/3/2017).
A necessidade de reabilitação só tem vez quando o segurado for tido por incapacitado total e
definitivamente para o exercício da sua ocupação habitual, mas não para o trabalho que lhe
permita o sustento, quando então haverá a obrigação da autarquia de reabilitá-lo ao exercício de
nova ocupação profissional, nos exatos termos do caput do art. 62 da Lei 8.213/1991.
Esse o caso dos autos.
Lícito é inferir que o INSS simplesmente menoscabou o título executivo e, sem prestar o serviço
de reabilitação profissional, cassou o benefício da autora por perícia regular.
Ao prestar informações, a Autoridade Impetrada esclareceu que “a perícia realizada em
25/02/2019 no NB 547.958.980-2 foi a mais recente realizada pela impetrante. Em 07/02/2019, a
impetrante compareceu na APS Taubaté e tomou ciência da perícia médica que seria realizada
em 25/02/2019. Nessa data, foi realizada perícia de reabilitação profissional e o médico concluiu
que a autora não reunia mais condições de elegibilidade para manutenção em processo de
reabilitação profissional, fixando a DCB em 25/02/2019. No entanto, houve falha do sistema no
processamento da DCB e o benefício permaneceu ativo. Somente em 29/07/2019 o perito médico
efetuou revisão no benefício para cessação, fixando nova DCB nessa mesma data”
Digno de nota é que a decisão do Juizado Especial Federal não outorgou à Autarquia
Previdenciária o juízo de valor quanto à possibilidade de submissão da parte autora ao
procedimento de reabilitação profissional, segundo disciplinado no art. 62 da Lei 8.213/1991. Foi
determinada a sua realização, como condição à cessação do benefício.
Trata-se de manifesta ilegalidade, reconhecida em alguns julgados:
PREVIDENCIÁRIO E CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA.
RESTABELECIMENTO DE BENEFÍCIO. AUXÍLIO-DOENÇA. ACORDO JUDICIAL.
MANUTENÇÃO DO BENEFÍCIO ATÉ A CONCLUSÃO DO PROCESSO DE REABILITAÇÃO
PROSSIONAL. DESCUMPRIMENTO. MANUTENÇÃO DO JULGADO. REMESSA OFICIAL
DESPROVIDA. 1. O acordo firmado entre o impetrante e o INSS, homologado por sentença nos
autos da Ação Ordinária n. 2005.36.00.910675-8, em curso perante a 6ª Vara do Juizado
Especial Federal de Mato Grosso, determinou a manutenção do benefício de auxílio-doença do
impetrante até a conclusão do seu processo de reabilitação profissional. 2. A prova dos autos
revela que o INSS inscreveu o impetrante em processo de reabilitação profissional, mas não
cumpriu o acordo judicial em sua integralidade, pois a cessação do benefício se deu antes de
concluída a reabilitação do segurado para o desempenho de nova atividade profissional que lhe
garantisse a subsistência. 3. A incapacidade para o trabalho deve ser aferida considerando-se as
condições pessoais do trabalhador e as atividades por ele desempenhadas, não lhes sendo exigir
a reabilitação em outra atividade dissociada do histórico profissional até então exercido. 4.
Remessa oficial desprovida (REMESSA 00017594320104013602, REMESSA EX OFFICIO EM
MANDADO DE SEGURANÇA, Relator(a) DESEMBARGADORA FEDERAL NEUZA MARIA
ALVES DA SILVA, TRF1, SEGUNDA TURMA, Fonte e-DJF1 DATA:20/09/2013 PAGINA:204).
REMESSA NECESSÁRIA. PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE
SEGURANÇA. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE COMPROVADA. CESSAÇÃO INDEVIDA.
ARTIGO 62 DA LEI 8.213/91. REMESSA NECESSÁRIA CONHECIDA E DESPROVIDA. 1. O
mandado de segurança, previsto no art. 5º, LXIX, da Constituição Federal, é ação constitucional
que obedece a procedimento célere. Por esta razão, o direito cuja tutela se pretende deve ser
líquido e certo, apurável sem a necessidade de dilação probatória, ou seja, os fatos em que se
fundam o pedido devem estar provados documentalmente no processo. 2 - No caso, houve a
concessão definitiva da segurança, mantendo a medida liminar que determinou à autoridade
impetrada o restabelecimento do benefício previdenciário NB 31/130.748.057-5, até 30/04/2010,
sem prejuízo de novas prorrogações em virtude da persistência da incapacidade, devidamente
apurada em perícia médica. 3 - Assim, tratando-se de concessão de segurança, a sentença está
sujeita ao duplo grau de jurisdição, nos termos do §1º, do art. 14, da Lei nº 12.016/2009. 4 -
Pretendeu a parte autora o restabelecimento de seu benefício de auxílio-doença nº
31/130.748.057-5 até 30/04/2010. 5 - Infere-se no mérito que, embora a incapacidade da autora
estivesse devidamente comprovada, eis que o perito que a examinou em 13/01/2010 sugeriu,
inclusive, sua aposentadoria por invalidez, o benefício foi indevidamente cessado por "limite
médico", conforme ofício de fl. 42 e documentos de fls. 43/48 . 6 - Conforme artigo 62 da Lei
8.213/91 e seu parágrafo único, "o segurado em gozo de auxílio-doença, insusceptível de
recuperação para sua atividade habitual, deverá submeter-se a processo de reabilitação
profissional para o exercício de sua atividade habitual ou de outra atividade", devendo o benefício
ser mantido "até que o segurado seja considerado reabilitado para o desempenho de atividade
que lhe garanta a subsistência ou, quando considerado não recuperável, seja aposentado por
invalidez". 7- Desta forma, não havendo limitação temporal para o gozo de auxílio-doença,
indevida a cessação do benefício da autora. Nestes termos, a r. decisão está fundamentada de
acordo com o entendimento adotado por esta Egrégia Corte Regional. 8 - O pagamento dos
valores atrasados deverá ocorrer no âmbito administrativo, considerando que a via mandamental
não se presta à cobrança de valores retroativos. 9 - Remessa necessária conhecida e desprovida
(REOMS 00027997220104036102, REOMS - REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL – 325865,
Relator(a) DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO, TRF3, SÉTIMA TURMA, Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/05/2017).
Impõe-se o reconhecimento de que são irretocáveis as razões que alicerçaram a sentença
monocrática, a qual mantenho integralmente.
Diante do exposto, nego provimento ao reexame necessário.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. REMESSA OFICIAL EM
MANDADO DE SEGURANÇA. CESSAÇÃO ADMINISTRATIVA DE BENEFÍCIO POR
INCAPACIDADE CONCEDIDO JUDICIALMENTE. REABILITAÇÃO PROFISSIONAL PREVISTA
NO TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL.
- O mandado de segurança é remédio constitucional (art. 5º, LXIX, CF/88) destinado à proteção
de direito líquido e certo contra ato ilegal ou abusivo perpetrado por autoridade pública.
- Nos termos do art. 101 da Lei de Benefícios, não se nega que ao INSS é permitida a realização
de exame médico-pericial voltado a verificar se houve modificação no estado de saúde do
segurado. Contudo, é defeso à autarquia suspender automaticamente o benefício implementado
por força de decisão judicial, sob pena de descumprimento da ordem proferida.
- Garantido à impetrante a manutenção do auxílio-doença – benefício de caráter alimentar – até
que ela seja submetida ao procedimento de reabilitação profissional, conforme determinado na
ação previdenciária pretérita.
- Remessa oficial desprovida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento ao reexame necessário, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA