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CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. DEFICIÊNCIA COMPROVADA POR LAUDO PERICIAL. MISERABILIDADE. TERMO INICIAL. CUSTAS PROCESSUAIS. ...

Data da publicação: 24/12/2024, 16:23:38

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. DEFICIÊNCIA COMPROVADA POR LAUDO PERICIAL. MISERABILIDADE. REQUISITOS PREENCHIDOS. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. CUSTAS PROCESSUAIS. INVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA. - A mera irresignação com a conclusão do perito ou a alegação de que o laudo é contraditório ou omisso, sem o apontamento de nenhuma divergência técnica justificável, não constituem motivos aceitáveis para a invalidação da prova pericial. - Preliminar afastada. - São condições para a concessão do benefício da assistência social: ser o postulante portador de deficiência ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. - Comprovada, por meio de perícia médica judicial, a deficiência da parte autora, bem como demonstrada, por estudo social, a situação de hipossuficiência financeira de seu núcleo familiar, é devido o benefício assistencial requerido. - O termo inicial do benefício é a prévia postulação administrativa. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ). - Sobre atualização do débito e compensação da mora, até o mês anterior à promulgação da Emenda Constitucional n. 113, de 8/12/2021 (EC n. 113/2021), há de ser adotado o seguinte: (i) a correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal; (ii) os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês, até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947), observada, quanto ao termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431. - Desde o mês de promulgação da EC n. 113/2021, a apuração do débito se dará unicamente pela Taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da Taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária. - Sobre as custas processuais, no Estado de São Paulo, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/1974, 8.620/1993 e 9.289/1996, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/1985 e 11.608/2003. Contudo, essa isenção não a exime do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio. - Inversão da sucumbência. Condenação do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) a pagar honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas até a data deste acórdão, consoante critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do Código de Processo Civil e Súmula n. 111 do STJ, já aplicada a majoração decorrente da fase recursal. - Apelação provida. (TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5076137-49.2024.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA, julgado em 08/08/2024, DJEN DATA: 12/08/2024)


Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região

9ª Turma


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5076137-49.2024.4.03.9999

RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA

APELANTE: SILVIA APARECIDA PEREIRA

Advogado do(a) APELANTE: ANA CAROLINA DE OLIVEIRA FERREIRA - SP215536-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região

9ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5076137-49.2024.4.03.9999

RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA

APELANTE: SILVIA APARECIDA PEREIRA

Advogado do(a) APELANTE: ANA CAROLINA DE OLIVEIRA FERREIRA - SP215536-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

  

R E L A T Ó R I O

Cuida-se de apelação interposta pela parte autora em face da sentença que julgou improcedente o pedido de benefício assistencial de prestação continuada à pessoa com deficiência, condenando-a ao pagamento de verba honorária, observada a gratuidade de justiça. 

Nas razões recursais, suscita, preliminarmente, cerceamento de defesa, por deficiência na produção da prova pericial. No mérito, alega o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício e requer a reforma do julgado.

Sem contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.

O Ministério Público Federal manifestou-se pelo provimento do recurso.

É o relatório.

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região

9ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5076137-49.2024.4.03.9999

RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA

APELANTE: SILVIA APARECIDA PEREIRA

Advogado do(a) APELANTE: ANA CAROLINA DE OLIVEIRA FERREIRA - SP215536-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

V O T O

Conheço da apelação, em razão da satisfação dos seus requisitos.

Preliminarmente, não prospera a alegação de nulidade da sentença por cerceamento de defesa.

No caso em análise, como prevê o artigo 370 do Código de Processo Civil (CPC), foi coletada a prova pericial, a fim de verificar a existência, ou não, da alegada deficiência do autor.

O laudo pericial apresentado, elaborado pelo médico de confiança do Juízo, mencionou o histórico dos males relatados, descreveu os achados no exame clínico e nos registros complementares que lhe foram apresentados e respondeu aos quesitos essenciais ao deslinde da lide.

Desse modo, não está configurada a alegada ilegalidade na decisão recorrida, pois não houve óbice à formação do convencimento do MM. Juízo a quo por meio da perícia realizada, revelando-se desnecessária a sua complementação.

A mera irresignação com a conclusão do perito ou a alegação de que o laudo é contraditório, incompleto ou inconclusivo, sem o apontamento de nenhuma divergência técnica justificável, não constituem motivos aceitáveis para nova perícia, apresentação de quesitos complementares ou realização de diligências.

Ademais, o médico nomeado pelo Juízo possui habilitação técnica para proceder ao exame pericial da parte requerente, de acordo com a legislação em vigência, que regulamenta o exercício da medicina.

A propósito, é entendimento desta Corte ser desnecessária a nomeação de um perito especialista para cada sintoma alegado. Nesse sentido: 

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 203, V, CF/88, LEI N. 8.742/93 E 12.435/2011. PRELIMINAR DE NOVA PERÍCIA COM ESPECIALISTA. PRAZO PARA ALEGAÇÕES FINAIS. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS.
- Muito embora o objeto da causa verse sobre matéria de direito e de fato, "in casu", prescinde de nova perícia, uma vez que existem provas material e pericial suficientes para o deslinde da causa, não se configurando hipótese de cerceamento de defesa ou de qualquer outra violação de ordem constitucional ou legal.
- Ademais, da análise dos laudos periciais médicos produzidos nos autos, verifico que os mesmos foram conduzidos de maneira adequada, com respostas às indagações propostas, dispensando qualquer outra complementação. Vale ressaltar que os peritos são devidamente registrados no respectivo Conselho Profissional (CRM), presumindo-se que detenham conhecimentos gerais da área de atuação, suficientes ao exame e produção da prova determinada.
- Prescindível a prova oral e não se tratando de causa complexa, o magistrado, desde que não haja prejuízo às partes, tem a faculdade de abrir ou não prazo para a apresentação de memoriais.
- O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência ou idoso que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
- Na hipótese dos autos, a parte autora não comprovou o preenchimento do requisito legal da deficiência.
- Honorários advocatícios majorados ante a sucumbência recursal, observando-se o limite legal, nos termos do §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015.

- Matéria preliminar rejeitada.
- Apelação da parte autora desprovida. " (TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5158635-47.2020.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN, julgado em 16/08/2023, Intimação via sistema DATA: 21/08/2023)

No mérito, discute-se nos autos o direito da parte autora a benefício assistencial de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/1993, regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.

Essa lei conferiu eficácia ao inciso V do artigo 203 da Constituição Federal (CF/1988) ao estabelecer as condições para a concessão do benefício da assistência social, a saber: ser o postulante portador de deficiência ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar a situação de miserabilidade ou hipossuficiência, ou seja, não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.

DA HIPOSSUFICIÊNCIA OU MISERABILIDADE

A respeito do requisito objetivo, o tema foi levado à apreciação do Pretório Excelso por meio de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN), movida pelo Procurador Geral da República, na qual, em meio à análise de outros temas, decidiu-se que o benefício de que trata o artigo 203, inciso V, da CF/1988 pode ser exigido somente a partir da edição da Lei n. 8.742/1993.

Trata-se da ADIN n. 1.232-2, de 27/8/1998, publicada no DJU de 1º/6/2001, de relatoria do Ministro Maurício Correa (RTJ 154/818), na qual o Supremo Tribunal Federal (STF) reputou constitucional a restrição contida no § 3º do artigo 20 da Lei n. 8.742/1993.

Posteriormente, em controle difuso de constitucionalidade, o STF manteve aquele entendimento (vide RE n. 213.736-SP, Rel. Min. Marco Aurélio, Informativo STF n. 179; RE 256.594-6, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 28/4/2000, Informativo STF n. 186; RE n. 280.663-3, São Paulo, j. 6/9/2001, Rel. Min. Maurício Corrêa).

Não obstante, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em vários precedentes, considerou que a presunção objetiva absoluta de miserabilidade, da qual fala a lei, não afasta a possibilidade de comprovação da condição de miserabilidade por outros meios de prova (REsp n. 435.871, 5ª T., Rel. Min. Felix Fischer, j. 19/9/2002, DJ 21/10/2002, p. 61;REsp n. 222.764, STJ, 5ªT,, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 13/2/2001, DJ 12/3/2001, p. 512; REsp n. 223.603/SP, STJ, 5ª T., Rel. Min. Edson Vidigal, DJU 21/2/2000, p. 163).

Recentemente, o STF reviu seu posicionamento e, em sede de repercussão geral, reconheceu que o requisito do artigo 20, §3º, da Lei n. 8.742/1993 não pode ser considerado taxativo (RE n. 580963, Tribunal Pleno, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe n. 225, 14/11/2013).

No mesmo julgamento, ao examinar, incidenter tantum, a constitucionalidade do parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/2003), o Plenário do STF manifestou-se pela “inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo”.

Referido normativo dispõe expressamente que o valor do benefício assistencial auferido por idoso “não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS”.

Contudo, diante do entendimento consagrado por ocasião do julgamento do RE n. 580963, abriu-se a possibilidade de exclusão, do cálculo da renda familiar, dos benefícios assistenciais recebidos por idosos e por deficientes e também dos benefícios previdenciários concedidos ao idoso, no valor de até um salário mínimo.

A decisão concluiu, ainda, que a mera interpretação gramatical do preceito, por si só, pode resultar no indeferimento da prestação assistencial em casos nos quais, embora o limite legal de renda per capita seja ultrapassado, evidencia-se um quadro de notória hipossuficiência econômica.

Essa insuficiência da regra decorre não apenas das modificações fáticas (políticas, econômicas e sociais), mas principalmente das alterações legislativas que ocorreram no País desde a edição da Lei Orgânica da Assistência Social, em 1993.

A legislação federal recente, por exemplo, reiterada pela adoção de vários programas assistenciais destinados a famílias carentes, considera pobres aqueles que possuem renda mensal per capita de até meio salário mínimo (nesse sentido, a Lei n. 9.533, de 10/12/1997, regulamentada pelos Decretos n. 2.609/1998 e 2.728/1999, as Portarias n. 458 e 879, de 3/12/2001, da Secretaria da Assistência Social, o Decreto n. 4.102/2002, a Lei n. 10.689/2003, criadora do Programa Nacional de Acesso à Alimentação).

Assim, não há como considerar o critério previsto no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/1993 como absoluto e único para aferição da situação de miserabilidade, até porque o próprio Estado Brasileiro elegeu outros parâmetros, como os defluentes da legislação acima citada.

Deve-se verificar, na questão in concreto, a ocorrência de situação de pobreza – entendida como a falta de recursos e de acesso ao mínimo existencial –, para se concluir se é devida ou não a prestação pecuniária da assistência social constitucionalmente prevista.

Assim, ao menos desde 14/11/2013 (RE n. 580963), o critério da miserabilidade contido no § 3º do artigo 20 da Lei n. 8.742/1993 não impede o julgador de levar em conta outros dados, a fim de identificar a situação de vida do idoso ou do deficiente, principalmente quando estiverem presentes peculiaridades, a exemplo de necessidades especiais com medicamentos ou com educação.

Nesse diapasão, podem-se estabelecer alguns parâmetros norteadores da análise individual de cada caso, como, por exemplo: (i) todos os que recebem renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo são miseráveis; (ii) nem todos os que percebem renda familiar per capita superior a ¼ do salário mínimo e inferior a ½ salário mínimo são miseráveis; (iii) nem todos os que percebem renda familiar per capita superior a ½ salário mínimo deixam de ser miseráveis; (iv) todos os que perceberem renda mensal familiar superior a um salário mínimo (artigo 7º, IV, da CF/1988) não são miseráveis.

Dessa forma, em todos os casos, outras circunstâncias devem ser levadas em conta, mormente se o patrimônio do requerente também se subsome à noção de hipossuficiência, devendo ser apurado se vive em casa própria, com ou sem ar-condicionado, se possui veículo, telefones celulares, auxílio permanente de parentes ou de terceiros etc.

Cumpre salientar que o benefício de prestação continuada foi previsto, na impossibilidade de atender a um público maior, para socorrer aos desamparados (artigo 6º, caput, da CF/1988), ou seja, àquelas pessoas que nem sequer teriam possibilidade de equacionar um orçamento doméstico, pelo fato de não terem renda ou de ser essa insignificante.

CONCEITO DE FAMÍLIA

Para apurar se a renda per capita do requerente atinge ou não o âmbito da hipossuficiência, faz-se necessário abordar o conceito de família.

Nesse sentido, o artigo 20 da Lei n. 8.742/1993 estabelecia, para efeitos de concessão do benefício, os conceitos de família (conjunto de pessoas do artigo 16 da Lei n. 8.213/1991, desde que vivendo sob o mesmo teto - § 1º), de pessoa portadora de deficiência (aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho - § 2º) e de família incapacitada de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa (aquela com renda mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - § 3º).

A Lei n. 12.435, vigente desde 7/7/2011, alterou os §§ 1º e 2º do artigo 20 da Lei n. 8.742/1993 e estabeleceu que a família, para fins de concessão do benefício assistencial, deve ser aquela composta pelo requerente, pelo cônjuge ou companheiro, pelos pais e, na ausência de um deles, pela madrasta ou pelo padrasto, pelos irmãos solteiros, pelos filhos e enteados solteiros e pelos menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.

Ao mesmo tempo, o dever de sustento familiar (dos pais em relação aos filhos e destes em relação àqueles) não pode ser substituído pela intervenção Estatal, pois o próprio artigo 203, V, da CF/1988 estabelece que o benefício será devido quando o sustento não puder ser provido pela família. Essa conclusão tem arrimo no princípio da solidariedade social, conformado no artigo 3º, I, do Texto Magno.

Com isso, à guisa de regra mínima de coexistência entre as pessoas em sociedade, a técnica de proteção social prioritária é a família, em cumprimento ao disposto no artigo 229 da CF/1988, que assim estabelece: “Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”.

A propósito, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU), ao analisar um pedido de uniformização formulado pelo Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), fixou a tese de que “o benefício assistencial de prestação continuada pode ser indeferido se ficar demonstrado que os devedores legais podem prestar alimentos civis sem prejuízo de sua manutenção”.

A decisão foi proferida durante sessão realizada em 23/2/2017, em Brasília. Quanto ao mérito, o relator afirmou em seu voto que a interpretação do artigo 20, §1º, da Lei n. 8.742/1993, conforme as normas veiculadas pelos artigos 203, V, 229 e 230, da CF/1988, deve ser a de que “a assistência social estatal não deve afastar a obrigação de prestar alimentos devidos pelos parentes da pessoa em condição de miserabilidade socioeconômica (arts. 1694 e 1697, do Código Civil), em obediência ao princípio da subsidiariedade”.

SUBSIDIARIEDADE DA ASSISTÊNCIA SOCIAL

À vista da preponderância do dever familiar de sustento, hospedado no artigo 229 da CF/1988, a Assistência Social, tal como regulada na Lei n. 8.742/1993, terá caráter subsidiário em relação às demais técnicas de proteção social (previdência social, previdência privada, caridade, família, poupança etc.), considerada a gratuidade de suas prestações.

Com efeito, levando-se em conta o alto custo do pretendido “Estado de bem-estar social”, forjado no Brasil pela Constituição Federal quando a grande maioria dos países europeus já havia reconhecido sua inviabilidade financeira, é lícito inferir que ela só deve ser prestada em casos de real necessidade, sob pena de comprometer – dada a crescente dificuldade de custeio – a proteção social da coletividade, não apenas das futuras gerações, mas também da atual.

De fato, o benefício previsto no artigo 203, V, da CF/1988 tem o valor de 1 (um) salário mínimo, ou seja, a mesma quantia paga a milhões de brasileiros que se aposentaram no Regime Geral de Previdência Social mediante o pagamento de contribuições, durante vários anos.

Destarte, a assistência social deve ser fornecida com critério, pois, de outro modo, serão gerados privilégios e desigualdades, em oposição à própria natureza dos direitos sociais, que é a de propiciar igualdade e isonomia de condições a todos, observados os fins sociais (não individuais) da norma, à luz do artigo 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB).

Diga-se, de passagem, que a concessão indiscriminada do benefício assistencial, mediante interpretação extensiva ou ampliativa dos requisitos constitucionais, geraria não apenas injustiça aos contribuintes da previdência social, mas incentivo para que esses deixem de contribuir, ou mesmo não se filiem ou não contribuam para a Seguridade Social, o que constituiria situação anômala e gravíssima do ponto de vista atuarial, apta a comprometer o custeio de todo o sistema.

É pertinente rememorar, in casu, o ensinamento do professor de direito previdenciário Wagner Balera a respeito da dimensão do princípio da subsidiariedade:

“O Estado é, sobretudo, o guardião dos direitos e garantias dos indivíduos. Cumpre-lhe, assinala Leão XIII, agir em favor dos fracos e dos indigentes exigindo que sejam por todos respeitados os direitos dos pequenos. Mas, segundo o princípio da subsidiariedade - que é noção fundamental para a compreensão do conteúdo da doutrina social cristã – o Estado não deve sobrepor-se aos indivíduos e aos grupos sociais na condução do interesse coletivo. Há de se configurar uma permanente simbiose entre o Estado e a sociedade, de tal sorte que ao primeiro não cabe destruir, nem muito menos exaurir a dinâmica da vida social I (é o magistério de Pio XI, na Encíclica comemorativa dos quarenta anos da 'RerumNovarum', a 'Quadragésimo Anno', pontos 79-80).” (Centenárias Situações e Novidade da 'RerumNovarum', p. 545).

Por fim, quanto a esse tópico, é lícito concluir que quem está coberto pela previdência social está, em regra, fora da abrangência da assistência social. Nesse sentido, prelecionou Celso Bastos:

“A Assistência Social tem como propósito satisfazer as necessidades de pessoas que não podem gozar dos benefícios previdenciários, mas o faz de uma maneira comedida, para não incentivar seus assistidos à ociosidade. Concluímos, portanto, que os beneficiários da previdência social estão automaticamente excluídos da assistência social. O benefício da assistência social, frise-se, não pode ser cumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo o de assistência médica.” (Celso Bastos e Ives Gandra Martins, in Comentários à Constituição do Brasil, 8o Vol., Saraiva, 2000, p. 429).

PESSOAS IDOSAS E PESSOAS COM DEFICIÊNCIA

Na hipótese de postulante pessoa idosa, a idade mínima de 70 (setenta) anos foi reduzida para 67 (sessenta e sete) anos pela Lei n. 9.720/1998, a partir de 1º de janeiro de 1998, e, mais recentemente, para 65 (sessenta e cinco) anos, com a entrada em vigor do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/2003), atualmente denominado "Estatuto da Pessoa Idosa" (Lei n. 10.741/2022).

No que se refere ao conceito de pessoa com deficiência - previsto no § 2º do artigo 20 da Lei n. 8.742/1993, com a redação dada pela Lei n. 13.146/2015, passou a ser considerada aquela com impedimentos de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, possam obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

Assim, ratificou-se o entendimento consolidado nesta Corte de que o rol previsto no art. 4º do Decreto n. 3.298/1999 (regulamentador da Lei n. 7.853/1989, que dispõe sobre a Política Nacional da Pessoa Portadora de Deficiência) não era exaustivo. Constatado, portanto, que os males sofridos pelo postulante impedem sua inserção social, restará preenchido um dos requisitos exigidos para a percepção do benefício.

Menciona-se também o conceito apresentado pela Organização das Nações Unidas (ONU), elaborado por meio da Resolução n. 3.447 (XXX): “1. O termo ‘pessoa deficiente’ refere-se a qualquer pessoa incapaz de assegurar a si mesma, total ou parcialmente, as necessidades de uma vida individual ou social normal, em decorrência de uma deficiência, congênita ou não, em suas capacidades físicas ou mentais”.

Esse conceito dá maior ênfase à necessidade, inclusive da vida individual, ao passo que o conceito proposto por Luiz Alberto David Araujo prioriza a questão da integração social, como se verá.

Nair Lemos Gonçalves apresentou os principais requisitos para sua definição: “desvio acentuado dos mencionados padrões médios e sua relação com o desenvolvimento físico, mental, sensorial ou emocional, considerados esses aspectos do desenvolvimento separada, combinada ou globalmente” (Verbete Excepcionais. In: Enciclopédia Saraiva de Direito, n. XXXIV. São Paulo: Saraiva, 1999).

Luiz Alberto David Araujo, por sua vez, compilou muitos significados da palavra “deficiente”, extraídos dos dicionários de Língua Portuguesa. Observa ele que, geralmente, os dicionários trazem a ideia de que a pessoa deficiente sofre de falta, de carência ou de falha.

Esse autor critica essas noções porque a ideia de deficiência não se apresenta tão simples, à medida em que as noções de falta, de carência ou de falha não abrangem todas as situações de deficiência, como, por exemplo, o caso dos superdotados, ou o de um portador do vírus HIV que consiga levar a vida normalmente, sem manifestação da doença, ou ainda o de um trabalhador intelectual que tenha um dedo amputado.

Por serem as noções de falta, de carência ou de falha insuficientes à caracterização da deficiência, Luiz Alberto David Araujo propõe um norte mais seguro para a identificação da pessoa protegida, cujo fator determinante do enquadramento ou não no conceito de pessoa com deficiência seja o meio social:

“O indivíduo portador de deficiência, quer por falta, quer por excesso sensorial ou motor, deve apresentar dificuldades para seu relacionamento social. O que define a pessoa portadora de deficiência não é falta de um membro nem a visão ou audição reduzidas. O que caracteriza a pessoa portadora de deficiência é a dificuldade de se relacionar, de se integrar na sociedade. O grau de dificuldade para a sua integração social é o que definirá quem é ou não portador de deficiência.” (A Proteção Constitucional das Pessoas Portadoras de Deficiência. Brasília: Ministério da Justiça, 1997, p. 18-22)

Assim, quanto mais complexo o meio social, maior rigor se exigirá da pessoa com deficiência para sua adaptação social. De outra parte, na vida em comunidades mais simples, como nos meios agrícolas, a pessoa com deficiência poderá integrar-se com mais facilidade.

Desse modo, o conceito de Luiz Alberto David Araujo é adequado e de acordo com a norma constitucional, motivo pelo qual é possível seu acolhimento para a caracterização desse grupo de pessoas protegidas nas várias situações reguladas pela CF/1988, nos artigos 7º, XXXI, 23, II, 24, XIV, 37, VIII, 203, V e 208, III.

Mas é preciso delimitar a proteção constitucional apenas àquelas pessoas que realmente dela necessitam, porquanto existem graus de deficiência que apresentam menores dificuldades de adaptação à pessoa. E essa verificação somente poderá ser feita diante de um caso concreto.

Luiz Alberto David Araujo salienta que os casos-limite podem, desde logo, ser excluídos, como o exemplo do bibliotecário que perde um dedo ou do operário que perde um artelho; em ambos os casos, as pessoas continuam integradas socialmente. Em outro exemplo, pequenas manifestações de retardo mental (deficiência mental leve) podem passar despercebidas em comunidades simples, pois essa pessoa poderá “não encontrar problemas de adaptação a sua realidade social (escola, trabalho, família)”, de maneira que não se pode afirmar que ela deverá receber proteção, “tal como aquele que sofre restrições sérias em seu meio social” (obra citada, p. 42-43). E continua:

“A questão, assim, não se resolve sob o ângulo da deficiência, mas, sim sob o prisma da integração social. Há pessoas portadoras de deficiência que não encontram qualquer problema de adaptação no meio social. Dentro de uma comunidade de doentes, isolados por qualquer motivo, a pessoa portadora de deficiência não encontra qualquer outro problema de integração, pois todos têm o mesmo tipo de dificuldade” (obra citada, p. 43).

Enfim, a constatação da existência de graus de deficiência é de fundamental importância para identificar aqueles que receberão a proteção social prevista no artigo 203, V, da CF/1988.

Feitas essas considerações, torna-se possível inferir que não será qualquer pessoa com deficiência que se subsumirá no molde jurídico protetor da Assistência Social.

Noutro passo, o conceito de pessoa com deficiência, para fins de concessão do benefício de amparo social, foi tipificado no artigo 20, § 2º, da Lei n. 8.742/1993, que em sua redação original assim dispunha: “§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.”

Como se vê, pressupunha-se que o deficiente era aquele que: (i) tinha necessidade de trabalhar, mas não podia, em razão da deficiência; (ii) estava também incapacitado para a vida independente. Assim, o benefício era devido a quem deveria trabalhar, mas não poderia e, além disso, não tinha capacidade para a vida independente sem a ajuda de terceiros.

É lícito concluir que, tal como os benefícios previdenciários, o benefício de amparo social, enquanto vigente a redação original do artigo 20, § 2º, da Lei n. 8.742/1993, era substitutivo do salário. Isto é, era reservado aos que tinham a possibilidade jurídica de trabalhar, mas não tinham a possibilidade física ou mental para tanto.

Mas a redação original do artigo 20, § 2º, da LOAS foi alterada pelo Congresso Nacional, exatamente porque sua dicção gerava um sem número de controvérsias interpretativas na jurisprudência, sobrevindo a Lei n. 12.435/2011, alterando o teor do dispositivo, que passou a vigorar com a seguinte redação:

“§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, considera-se: 

I - pessoa com deficiência: aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas;

II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.”

Com a novel legislação, o benefício continuou sendo destinado àqueles deficientes que: (i) tinham necessidade de trabalhar, mas não podiam, por conta de limitações físicas ou mentais; (ii) estavam também incapacitados para a vida independente.

Todavia, o legislador, não satisfeito, mais uma vez alterou o conceito de pessoa com deficiência, introduzindo, pela Lei n. 12.470/2011, modificações no artigo 20, da Lei n. 8.742/1993:

“Art. 20 (...)

“§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.”

(...)

“§ 10 Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2º deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.”

Nota-se que, com o advento dessa lei, dispensou-se a menção à incapacidade para o trabalho ou à incapacidade para a vida independente como requisito à concessão do benefício assistencial.

Finalmente, a Lei n. 13.146/2015, que “institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência”, com início de vigência em 2/1/2016, novamente alterou a redação do artigo 20, § 2º, da LOAS:

“§ 2º Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.”

Reafirma-se, assim, que o foco, doravante, para fins de identificação da pessoa com deficiência, passa a ser a existência de impedimentos de longo prazo (que produza efeitos pelo prazo mínimo de dois anos), apenas e tão somente, tornando-se despicienda a referência à necessidade de trabalho.

RESERVA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL

O benefício assistencial de prestação continuada não pode ser postulado como substituto de aposentadoria por invalidez, atualmente denominada aposentadoria por incapacidade permanente (Emenda Constitucional n. 103/2019).

Muitos casos de incapacidade temporária ou mesmo permanente para o trabalho devem ser tutelados exclusivamente pelo seguro social (artigo 201, da CF/1988).

Afinal, a cobertura dos eventos (riscos sociais) incapacidade temporária ou permanente para o trabalho depende do pagamento de contribuições, na forma dos artigos 201, caput e inciso I, da CF/1988, abaixo transcrito:

“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a: I - cobertura dos eventos de incapacidade temporária ou permanente para o trabalho e idade avançada; (...)”.

Como se vê, a pretendida ampliação do espectro da norma do artigo 20, § 2º, da Lei n. 8.742/1993 encontra óbice na própria Constituição da República, segundo a qual caberá à Previdência Social a cobertura dos eventos de incapacidade para o trabalho.

CASO CONCRETO

De acordo com a perícia médica judicial, realizada no dia 30/9/2022, a autora (nascida em 1975, diarista/trabalhadora rural, com ensino fundamental incompleto) está parcial e permanentemente incapacitada para o trabalho, por ser portadora de "osteoartrose generalizada, com quadro álgico de lombalgia por transtornos de discos lombares, com mielopatia".

Segundo o perito, a autora está inapta para atividades laborais com esforços repetitivos e carregamento de pesos superiores a doze quilos.

Lembro, por oportuno, que o magistrado não está adstrito ao laudo pericial.

Muito embora o perito tenha constato incapacidade parcial, sem mencionar incapacidade total, entendo que a condição de saúde da autora, com histórico laboral braçal, aliada à sua idade e à baixa escolaridade, torna impossível sua reabilitação com sucesso para o exercício de outra atividade laboral a fim de prover a sua subsistência.

Nesse passo, a autora se enquadra no conceito de deficiente trazido pela redação do artigo 20, §§ 2º e 10, da Lei n. 8.742/1993.

No tocante à condição socioeconômica, o estudo social realizado em 27/10/2022, apontou as seguintes informações:

(i) o núcleo familiar é composto pela autora e sua filha menor de idade (nascida em 2009). A família vive em casa própria, térrea, construída em terreno cedido pelo ex sogro ao ex marido. Composta por três cômodos, sendo um quarto, uma sala, uma cozinha e um banheiro. É guarnecida com mobiliário básico. Condições precárias de moradia e habitabilidade. O bairro situa-se em área urbana, considerado tranquilo, com acesso a bens e serviços. Apresenta via pública sem pavimentação, há fornecimento de energia elétrica no bairro, água encanada, sem tratamento de esgoto, que é escoado para fossa séptica. Utiliza transporte público. A autora não possui bens; 

(ii) a renda mensal é composta pelos valores percebidos a título de Auxílio-Brasil (R$ 400,00), além da remuneração como faxineira diarista, no valor médio de R$ 240,00, e da pensão alimentícia (R$ 240,00); 

(iii) as despesas mensais declaradas totalizam a quantia de R$ 460,00 e incluem custos com água (R$ 80,00), energia elétrica (R$ 120,00), gás de cozinha (R$ 120,00) alimentação/higiene/limpeza (R$ 140,00). 

As fotos apresentadas aos autos demonstram que a casa é bastante simples e contém móveis básicos, em ruim estado de conservação.  

Nesse passo, os elementos de prova dos autos demonstram a situação de miserabilidade da autora.

Não obstante, como o artigo 21 da Lei n. 8.742/1993 determina as condições que deram origem à concessão do benefício a cada dois anos, não há óbice ao deferimento do benefício pleiteado, cabendo a revisão administrativa em momento oportuno.

Assim, estando presentes os requisitos exigidos para a concessão do benefício, impõe-se a reforma da sentença.

O termo inicial do benefício fica fixado na data do requerimento administrativo, consoante jurisprudência dominante.

A propósito, cito o seguinte precedente (g. n.):

“PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. TERMO INICIAL. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. 1. Afasta-se a incidência da Súmula 7/STJ, porquanto o deslinde da controvérsia requer apenas a análise de matéria exclusivamente de direito. 2. Nos termos da jurisprudência pacífica do STJ, o termo inicial para a concessão do benefício assistencial de prestação continuada é a data do requerimento administrativo e, na sua ausência, a partir da citação. Agravo regimental improvido.” (AgRg no REsp 1532015/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/08/2015, DJe 14/08/2015)

Passo à análise dos consectários.

Sobre atualização do débito e compensação da mora, até o mês anterior à promulgação da Emenda Constitucional n. 113, de 8/12/2021, há de ser adotado o seguinte: (i) a correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal; (ii) os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês, até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947), observada, quanto ao termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431.

Contudo, desde o mês de promulgação da Emenda Constitucional n. 113, de 8/12/2021, a apuração do débito se dará unicamente pela Taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da Taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária.

Sobre as custas processuais, no Estado de São Paulo, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/1974, 8.620/1993 e 9.289/1996, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/1985 e 11.608/2003. Contudo, essa isenção não a exime do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.

Invertida a sucumbência, condeno o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) a pagar honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas até a data deste acórdão, consoante critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC e Súmula n. 111 do STJ, já aplicada a majoração decorrente da fase recursal.

Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se o valor da condenação ou do proveito econômico ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (artigo 85, § 4º, II, do CPC).

Defiro a tutela provisória de urgência, nos termos dos artigos 300, caput, 302, I, 536, caput, e 537 e §§ do CPC, para determinar ao INSS a concessão da prestação em causa, tendo em vista o caráter alimentar do benefício.

Diante do exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, dou provimento à apelação para conceder benefício assistencial à parte autora, desde o requerimento administrativo, acrescido dos consectários legais acima discriminados.

Informe-se ao INSS, via sistema, para o cumprimento do julgado no tocante à implantação do benefício.

É o voto.



E M E N T A

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. DEFICIÊNCIA COMPROVADA POR LAUDO PERICIAL. MISERABILIDADE. REQUISITOS PREENCHIDOS. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. CUSTAS PROCESSUAIS. INVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA.

- A mera irresignação com a conclusão do perito ou a alegação de que o laudo é contraditório ou omisso, sem o apontamento de nenhuma divergência técnica justificável, não constituem motivos aceitáveis para a invalidação da prova pericial.

- Preliminar afastada.

- São condições para a concessão do benefício da assistência social: ser o postulante portador de deficiência ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.

- Comprovada, por meio de perícia médica judicial, a deficiência da parte autora, bem como demonstrada, por estudo social, a situação de hipossuficiência financeira de seu núcleo familiar, é devido o benefício assistencial requerido.

- O termo inicial do benefício é a prévia postulação administrativa. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

- Sobre atualização do débito e compensação da mora, até o mês anterior à promulgação da Emenda Constitucional n. 113, de 8/12/2021 (EC n. 113/2021), há de ser adotado o seguinte: (i) a correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal; (ii) os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês, até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947), observada, quanto ao termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431.

- Desde o mês de promulgação da EC n. 113/2021, a apuração do débito se dará unicamente pela Taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da Taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária.

- Sobre as custas processuais, no Estado de São Paulo, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/1974, 8.620/1993 e 9.289/1996, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/1985 e 11.608/2003. Contudo, essa isenção não a exime do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.

- Inversão da sucumbência. Condenação do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) a pagar honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas até a data deste acórdão, consoante critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do Código de Processo Civil e Súmula n. 111 do STJ, já aplicada a majoração decorrente da fase recursal.

- Apelação provida.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
DALDICE SANTANA
DESEMBARGADORA FEDERAL

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