
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5019909-66.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA ANA LÚCIA IUCKER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CELIO VIEIRA ROCHA
Advogado do(a) APELADO: GABRIEL DINIZ DA COSTA - RS63407-A
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5019909-66.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA ANA LÚCIA IUCKER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CELIO VIEIRA ROCHA
Advogado do(a) APELADO: GABRIEL DINIZ DA COSTA - SP247941-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Senhora Juíza Convocada Ana Lúcia Iucker (Relatora): Trata-se de agravo interno interposto pelo ente autárquico em face da decisão monocrática Id 290536628, que negou provimento à apelação do INSS e fixou honorários de sucumbência recursal.
Sustenta o INSS, em breve síntese, não restar comprovado o exercício de atividade especial pelo aeronauta, à míngua de informação sobre os agentes de risco no Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP.
Sem contrarrazões.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5019909-66.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA ANA LÚCIA IUCKER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CELIO VIEIRA ROCHA
Advogado do(a) APELADO: GABRIEL DINIZ DA COSTA - SP247941-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Senhora Juíza Convocada Ana Lúcia Iucker (Relatora): Recebo o presente recurso, haja vista que tempestivo, nos termos do artigo 1.021 do Código de Processo Civil.
Trata-se de agravo interno interposto em face da r. decisão monocrática, que negou provimento à apelação do INSS e fixou honorários de sucumbência recursal.
Insurge-se o INSS contra a especialidade reconhecida na sentença e mantida nesta via recursal relativa ao período de 09/07/2011 a 20/02/2016, em que a parte autora laborou como comissário de voo na companhia aérea TAM, em razão da exposição a pressões atmosféricas anormais.
Como consignado na decisão agravada, ainda que o Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP indique a exposição ao ruído abaixo do limite de tolerância, os laudos periciais elaborados em outros processos, que analisaram condições de trabalho semelhantes às do autor e o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais de empresa similar são hábeis à demonstração do exercício da atividade especial.
De fato, a teor do que dispõem o caput e os respectivos parágrafos do artigo 1º da Lei 13.475/2017, são considerados aeronautas o piloto, o comissário de voo e o mecânico de voo que exerçam suas atividades a bordo de aeronave nacional ou aeronave estrangeira, mediante contrato de trabalho regido pela legislação nacional.
Além deles, são ainda considerados como aeronautas quaisquer tripulantes que exerçam suas funções a bordo das citadas aeronaves (artigo 9º da legislação predita), independentemente da tarefa realizada. Nesse sentido, na esteira do que dispunha a Lei 7.183/1984, o segundo auxiliar, o navegador de voo, o rádio operador de voo, bem como aeromoço, qualificam-se como tripulantes aeronautas.
Segundo se pode constatar do exame da norma de regência de pessoal a bordo de aeronaves civis (Lei 13.475/2017), estes profissionais se encontram constantemente sujeitos a regime de trabalho extenuante, escalas de sobreaviso e de serviço, limitações intervalares, supressão do convívio familiar e, sobretudo, constantes alterações de pressão atmosférica, conjunto de fatores insalutíferos que, historicamente, enseja a caracterização da especialidade da atividade por eles desempenhada.
Em virtude destas condições de trabalho, até 28 de abril de 1997, véspera da publicação do Decreto 2.172/97, a legislação viabilizava o enquadramento das atividades realizadas pelos aeronautas por categorização profissional, conforme estabelecido no Código 2.4.1 do Quadro Anexo ao Decreto n. 53.831/1964 e no Código 2.4.3 do Anexo II do Decreto n. 83.080/1979.
Não obstante a possibilidade de enquadramento por categoria profissional, prosperava ainda panorama compatível com o reconhecimento insalutífero em decorrência da exposição dos aeroviários à pressão atmosférica anormal, pois o interior das aeronaves - local fechado, submetido a condições ambientais artificiais, com pressão superior à atmosférica - reveste-se de todas as características das câmaras hiperbáricas, em relação às quais há expressa previsão legal reconhecendo a condição especial do labor exercido no seu interior (Item 1.1.7 do Decreto 53.831/1964 e Item 1.1.6 do Decreto 83.080/1979).
Sob a ótica da similaridade, a pressão atmosférica anormal é atípica, ou seja, deve comportar tanto as altas (pressão hiperbárica) como as baixas pressões (hipobáricas), não havendo razão para distinção, uma vez que as primeiras já vêm sendo reconhecidas como insalubres desde o Decreto 53.831/64. Tal normatização se seguiu com a promulgação dos Decretos n.º 83.080/79 e n.º 2.172/97, até o Decreto 3.048/99, atualmente em vigor, que, revogando os Decretos anteriores, manteve como agente nocivo a exposição à pressão atmosférica anormal, atualmente constante de seu anexo IV, item 2.0.5.
Com efeito, quanto à caracterização da atividade especial por exposição à pressão atmosférica anormal, entendo que a lista de agentes nocivos constante dos decretos regulamentadores não apresenta rol taxativo, de modo a possibilitar o reconhecimento do exercício de atividade especial exercido, de forma habitual e permanente, sob condições de prejuízo à saúde ou integridade física, nos termos do art. 57, § 3º, da Lei 8.213/91, quando corroborado por laudo ambiental.
Ora, se os efeitos da pressão a bordo de aeronaves são sentidos até mesmo pelos passageiros, são presumíveis os malefícios à higidez corpórea que a reiterada pressurização e despressurização ambiental pode ensejar aos laboristas envolvidos incessantemente nestas operações.
Não é menos conhecida a realidade econômica da exploração de linhas aéreas comerciais no Brasil, em que prospera o constante encerramento de operações de companhias, bem como a fusão e incorporação de umas pelas outras, o que inviabiliza a obtenção de laudos ambientais por ex colaboradores. Nesse sentido, é comum a prevalência de prova emprestada nestes setores econômicos. Destaco a jurisprudência:
“PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL. ATIVIDADE ESPECIAL. AERONAUTA. PRESSÃO ATMOSFÉRICA ANORMAL. POSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DE PROVA EMPRESTADA. NECESSIDADE DE CESSAÇÃO DE QUALQUER ATIVIDADE ESPECIAL. 1. Quanto ao reconhecimento da especialidade das atividades do autor, entendo que a decisão impugnada, ao negar provimento à apelação do INSS, fê-lo em face da jurisprudência dominante desta Corte, e especialmente desta Oitava Turma, que vem reconhecendo a possibilidade de utilização de prova emprestada para o reconhecimento da especialidade da atividade de aeronauta, com sujeição a pressão atmosférica anormal. 2. A atividade do autor deve ser reconhecida como especial, nos termos dos códigos 1.1.7 do quadro a que se refere o art. 2º do Decreto nº 53.831/64, 1.1.6 do Anexo I do Decreto n 83.080/79 e 2.0.5 dos Anexos IV dos Decretos 2.172/97 e 3.048/99, por ser clara a sua exposição a pressão atmosférica anormal. 3. Os laudos técnicos são claros em demonstrar que os aeronautas estão habitualmente expostos a pressão atmosférica anormal. A despeito de terem sido realizados em outros processos, dos quais o autor não foi parte, analisam as condições de trabalho de funções semelhantes àquela exercida pelo autor, dizem respeito a períodos de prestação de serviços semelhantes e foram realizados na mesma empresa em que o autor trabalhava. Ademais, as informações constantes do Programa de Prevenção de Riscos Ambientais da empresa em período imediatamente posterior ao ora analisado corrobora as informações dos laudos judiciais. 4. Não há lógica no argumento do INSS de que o laudo emprestado utilizado como prova nestes autos traz "somente a conclusão de que o colega da parte autora esteve exposto a pressão atmosférica anormal", uma vez que, por mero exercício de racionalidade, não se poderia entender que alguns aeronautas estariam expostos a pressão anormal e outros não. 5. É iterativa a jurisprudência desta Colenda Corte no sentido de que o órgão colegiado não deve modificar a decisão do Relator, salvo na hipótese em que a decisão impugnada não estiver devidamente fundamentada, ou padecer dos vícios da ilegalidade e abuso de poder, e for passível de resultar lesão irreparável ou de difícil reparação à parte. 6. No que se refere à necessidade de afastamento do segurado das atividades nocivas como condição à implantação da aposentadoria especial - artigo 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91 -, em recente julgamento, o C. Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Tema 709, fixou a seguinte tese: "i) É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não. ii) Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o benefício previdenciário em questão". 7. Deve o segurado afastar-se de qualquer atividade especial como condição de recebimento da aposentadoria especial. 8. Agravo interno a que se dá parcial provimento.” (TRF3 - ApCiv 0003785-64.2016.4.03.6183, Relator: Desembargador Federal Luiz de Lima Stefanini - 8ª Turma, Data: 4/3/2021)
Aliás, não há como se afastar a conclusão de que a parte autora esteve exposta à pressão atmosférica nociva à higidez ocupacional, conquanto comprovado que exercente de mister dentro de aeronave pressurizada, tal como seus colegas, o que impõe o acolhimento da prova emprestada como elemento corroborador de tal atividade, consoante é de comum aplicação nesta C. Nona Turma (TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5008576-55.2021.4.03.6105, Rel. Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA, julgado em 21/08/2024, DJEN DATA: 28/08/2024)
Desse modo, resta satisfatoriamente comprovada a atividade especial da parte autora, enquanto comissário de voo, nos termos dos códigos 1.1.7 do Decreto nº 53.831/64, 1.1.6 do Anexo I do Decreto n 83.080/79 e 2.0.5 dos Anexos IV dos Decretos 2.172/97 e 3.048/99, por ser clara a sua exposição a pressão atmosférica anormal.
Acresce relevar que em sede de agravo legal, ora sob análise, o INSS não trouxe argumentos novos capazes de infirmar os fundamentos que alicerçaram a decisão agravada.
Assim considerando, mantenho a decisão recorrida.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO DO INSS, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO. DECISÃO MONOCRÁTICA. ATIVIDADE ESPECIAL. COMPROVAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO.
- Como consignado na decisão agravada, ainda que o Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP indique a exposição ao ruído abaixo do limite de tolerância, os laudos periciais elaborados em outros processos, que analisaram condições de trabalho semelhantes às do autor e o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais de empresa similar são hábeis à demonstração do exercício da atividade especial.
- Desse modo, resta satisfatoriamente comprovada a atividade especial da parte autora, enquanto comissário de voo, nos termos dos códigos 1.1.7 do Decreto nº 53.831/64, 1.1.6 do Anexo I do Decreto n 83.080/79 e 2.0.5 dos Anexos IV dos Decretos 2.172/97 e 3.048/99, por ser clara a sua exposição a pressão atmosférica anormal.
- Agravo interno desprovido.
ACÓRDÃO
JUÍZA FEDERAL