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PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES EM EMBARGOS À EXECUÇÃO. DECLARAÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DO TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL. ARTIGO 741, II,...

Data da publicação: 16/07/2020, 05:36:45

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES EM EMBARGOS À EXECUÇÃO. DECLARAÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DO TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL. ARTIGO 741, II, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC DE 1973. INAPLICABILIDADE. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO À CONSTITUIÇÃO FEDERAL. EMBARGOS INFRINGENTES PROVIDOS. 1 - O voto majoritário afastou a aplicação da correção em todos os salários-de-contribuição, sobretudo com a utilização do ORTN/OTN, pois tal interpretação iria de encontro à Constituição Federal. De fato, tendo em vista que a aposentadoria foi concedida em 18/06/1974, e a ORTN/OTN foi implementada pela Lei nº 6.423/1977, não poderia ter sido utilizado tal índice na correção do salários-de-contribuição. 2 - A sentença proferida na ação de conhecimento em nenhum momento determinou a correção dos salários-de-contribuição com base no ORTN/OTN, tendo apenas determinado a atualização dos salários-de-contribuição de acordo com a legislação vigente. Destarte, foi o MM. Juízo da Execução, às fls. 80, que determinou de forma errônea a correção dos salários-de-contribuição com base no ORTN/OTN. 4 - Inexiste qualquer determinação no título executivo no sentido de atualizar os salários-de-contribuição pelo ORTN/OTN. Por conseguinte, o título executivo não apresenta qualquer incompatibilidade com a Constituição Federal. Com efeito, foi a decisão proferida pelo Juízo da Execução que determinou a aplicação do ORTN/OTN, ultrapassando os limites impostos pela coisa julgada formada no processo de conhecimento. 5 - Desse modo, descabe falar em declaração de inexigibilidade do título executivo judicial, com base no artigo 741, II, e parágrafo único do CPC de 1973. Portanto, ainda que por fundamento diverso, entendo deva prevalecer o voto vencido, que não declarava a inexigibilidade do título executivo e conhecia da apelação do INSS. Portanto, ainda que por fundamento diverso, deve prevalecer o voto vencido, que não declarava a inexigibilidade do título executivo e conhecia da apelação do INSS. 6 - Embargos Infringentes providos. (TRF 3ª Região, TERCEIRA SEÇÃO, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1520969 - 0023140-68.2010.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO, julgado em 10/08/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/08/2017 )


Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 22/08/2017
EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0023140-68.2010.4.03.9999/SP
2010.03.99.023140-1/SP
RELATOR:Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
EMBARGANTE:DEOLINDA STEFANO CUSMA
ADVOGADO:SP118135 YEDDA FELIPE DA SILVA
SUCEDIDO(A):WALDEMAR CUSMA falecido(a)
EMBARGADO(A):Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
ADVOGADO:SP267926 MAURICIO MARTINES CHIADO
:SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
No. ORIG.:95.00.00087-6 3 Vr SUZANO/SP

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES EM EMBARGOS À EXECUÇÃO. DECLARAÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DO TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL. ARTIGO 741, II, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC DE 1973. INAPLICABILIDADE. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO À CONSTITUIÇÃO FEDERAL. EMBARGOS INFRINGENTES PROVIDOS.
1 - O voto majoritário afastou a aplicação da correção em todos os salários-de-contribuição, sobretudo com a utilização do ORTN/OTN, pois tal interpretação iria de encontro à Constituição Federal. De fato, tendo em vista que a aposentadoria foi concedida em 18/06/1974, e a ORTN/OTN foi implementada pela Lei nº 6.423/1977, não poderia ter sido utilizado tal índice na correção do salários-de-contribuição.
2 - A sentença proferida na ação de conhecimento em nenhum momento determinou a correção dos salários-de-contribuição com base no ORTN/OTN, tendo apenas determinado a atualização dos salários-de-contribuição de acordo com a legislação vigente. Destarte, foi o MM. Juízo da Execução, às fls. 80, que determinou de forma errônea a correção dos salários-de-contribuição com base no ORTN/OTN.
4 - Inexiste qualquer determinação no título executivo no sentido de atualizar os salários-de-contribuição pelo ORTN/OTN. Por conseguinte, o título executivo não apresenta qualquer incompatibilidade com a Constituição Federal. Com efeito, foi a decisão proferida pelo Juízo da Execução que determinou a aplicação do ORTN/OTN, ultrapassando os limites impostos pela coisa julgada formada no processo de conhecimento.
5 - Desse modo, descabe falar em declaração de inexigibilidade do título executivo judicial, com base no artigo 741, II, e parágrafo único do CPC de 1973. Portanto, ainda que por fundamento diverso, entendo deva prevalecer o voto vencido, que não declarava a inexigibilidade do título executivo e conhecia da apelação do INSS. Portanto, ainda que por fundamento diverso, deve prevalecer o voto vencido, que não declarava a inexigibilidade do título executivo e conhecia da apelação do INSS.
6 - Embargos Infringentes providos.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, dar provimento aos embargos infringentes, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 10 de agosto de 2017.
TORU YAMAMOTO
Desembargador Federal


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Data e Hora: 10/08/2017 18:37:25



EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0023140-68.2010.4.03.9999/SP
2010.03.99.023140-1/SP
RELATOR:Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
EMBARGANTE:DEOLINDA STEFANO CUSMA
ADVOGADO:SP118135 YEDDA FELIPE DA SILVA
SUCEDIDO(A):WALDEMAR CUSMA falecido(a)
EMBARGADO(A):Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
ADVOGADO:SP267926 MAURICIO MARTINES CHIADO
:SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
No. ORIG.:95.00.00087-6 3 Vr SUZANO/SP

RELATÓRIO

O Exmo. Desembargador Federal Toru Yamamoto (Relator):


Trata-se de embargos infringentes (fls. 159/166) interpostos pela parte autora (Deolinda Stefano Cusma, sucessora de Waldemar Cusma) contra acórdão da Oitava Turma desta Corte (fls. 155/155vº), que, por maioria, negou provimento ao agravo legal, para manter a decisão terminativa de fls. 129/139, que havia, de ofício, declarado a inexigibilidade do título executivo judicial, com base no artigo 741, inciso II e parágrafo único, do CPC de 1973, julgando prejudicado o recurso de apelação do INSS, nos termos do voto do Exmo. Desembargador Federal David Dantas, com quem votou, com ressalva de entendimento, o então Exmo. Juiz Federal Convocado Carlos Delgado, vencido o Exmo Desembargador Federal Newton De Lucca, que dava provimento ao agravo legal, para conhecer da apelação da Autarquia.

A parte embargante requer a prevalência do voto vencido, alegando que o próprio INSS, não obstante tenha alegado excesso de execução, reconheceu a existência de diferenças no importe de R$ 31.781,78. Afirma também que a questão relativa à inexigibilidade do título executivo sequer foi objeto da apelação da Autarquia. Aduz ainda que a disposição legal introduzida pela Medida Provisória nº 2.180-38/2001 não pode desconstituir a coisa julgada que já havia sido formada nos presentes autos. Diante disso, requer a reforma do aresto embargado, a fim de que seja afastada a inexigibilidade do título executivo e analisada a apelação do INSS em seus exatos termos.

Os embargos infringentes foram admitidos às fls. 167.

Não obstante tenha sido intimado, o INSS não apresentou contrarrazões (fls. 170).

Às fls. 173/176, foi juntado aos autos o inteiro teor do voto vencido.

É o Relatório.



TORU YAMAMOTO
Desembargador Federal


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EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0023140-68.2010.4.03.9999/SP
2010.03.99.023140-1/SP
RELATOR:Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
EMBARGANTE:DEOLINDA STEFANO CUSMA
ADVOGADO:SP118135 YEDDA FELIPE DA SILVA
SUCEDIDO(A):WALDEMAR CUSMA falecido(a)
EMBARGADO(A):Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
ADVOGADO:SP267926 MAURICIO MARTINES CHIADO
:SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
No. ORIG.:95.00.00087-6 3 Vr SUZANO/SP

VOTO

O Exmo. Desembargador Federal Toru Yamamoto (Relator):


Trata-se de embargos infringentes (fls. 159/166) interpostos pela parte autora (Deolinda Stefano Cusma, sucessora de Waldemar Cusma) contra acórdão da Oitava Turma desta Corte (fls. 155/155vº), que, por maioria, negou provimento ao agravo legal, para manter a decisão terminativa de fls. 129/139, que havia, de ofício, declarado a inexigibilidade do título executivo judicial, com base no artigo 741, inciso II e parágrafo único, do CPC de 1973, julgando prejudicado o recurso de apelação do INSS, nos termos do voto do Exmo. Desembargador Federal David Dantas, com quem votou, com ressalva de entendimento, o então Exmo. Juiz Federal Convocado Carlos Delgado, vencido o Exmo Desembargador Federal Newton De Lucca, que dava provimento ao agravo legal, para conhecer da apelação da Autarquia.

A parte autora, então titular de aposentadoria especial, concedida em 18/06/1974, ajuizou a ação originária em 07/11/1995, objetivando a condenação do INSS "a proceder a revisão do seu benefício inicial, devidamente corrigido, mês a mês, (Súmula 260 do extinto TFR, C.F., artigo 201, §3º), com a apuração e manutenção da equivalência em salários mínimos, que tinha na data do início do benefício, com seus efeitos sobre o Abono Anual (13º salário), nos termos expostos, e ao pagamento das demais verbas cabíveis, inclusive com o acréscimo do percentual de 147,06%, sobre as diferenças apuradas (Súmula nº 11 do TRF da 5ª Região" (fls. 04) .


A sentença julgou procedente o pedido nos seguintes termos (fls. 58/60 dos autos em apenso):


"(...)
O Egrégio Tribunal Federal de Recursos já pontificou: "No primeiro reajuste do benefício previdenciário, deve-se aplicar o índice integral do aumento verificado, independentemente do mês de concessão, considerando nos aumentos subsequentes o salário mínimo então atualizados".
Portanto, no caso em exame, deve ser revista a renda mensal inicial do benefício, para adequá-lo aos termos da legislação supra vigente, apurando-se em liquidação de sentença as diferenças porventura ocorridas, que serão pagas ao autor, incidentes, também, sobre os abonos e, inclusive às concernentes ao percentual de 147,06%, acrescidas de juros de seis por cento ao ano, a partir da citação, e correção monetária, com base nos índices oficiais determinados pela lei, desde a data em que verificada a diferença, observada a prescrição quinquenal, contada da data da distribuição desta ação. Condeno, ainda, o requerido no pagamento de honorários advocatícios de dez por cento sobre o total da diferença apurada, sempre atualizada, e, tocante às prestações vincendas, observado o período de um ano, a partir de hoje."

Após a interposição de recursos pelas partes, a Segunda Turma desta E. Corte proferiu acórdão em 13/08/2002, dando provimento à apelação do INSS, somente para excluir da condenação a aplicação da Súmula nº 260 do TFR, em razão da prescrição das diferenças, e deu parcial provimento ao recurso adesivo da parte autora, para explicitar os critérios de incidência dos juros de mora (fls. 93/99 dos autos em apenso). O acórdão em questão transitou em julgado em 11/11/2002 e restou assim ementado:


PREVIDENCIÁRIO - REVISIONAL DE BENEFÍCIO - SÚMULA 260 DO TFR - INAPLICABILIDADE APÓS ABRIL/89 - OCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO DAS PARCELAS - ARTIGO 58 DO ADCT - TERMO FINAL - JUROS - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1 - É inaplicável a Súmula 260 do extinto TFR após 04.04.89, eis que a partir desta data os reajustes deveriam se pautar pelo disposto no artigo 58 do ADCT, até a regulamentação do Pano de Custeio e Benefícios (Decretos 356 e 357 de 1991).
2 - Tratando-se de revisão de proventos, indevidas as prestações vencidas anteriormente ao quinquênio que precedeu a propositura da ação, estando prescritas, portanto, as parcelas decorrentes da aplicação da Súmula 260 do extinto TFR.
3 - Não se aplica a equivalência salarial prevista pelo art. 58 do ADCT após a regulamentação da Lei 8213/91, pelo Decreto 357 de 09/12/91, que trouxe novos critérios para o reajustamento do benefício.
4 - Juros moratórios computados a partir da citação, no percentual de 0,5% a.m., incidindo sobre o total das diferenças atualizadas até tal data.
5 - Honorários advocatícios devem ser repartidos proporcionalmente em caso de sucumbência recíproca.
6 - Apelação provida e recurso adesivo parcialmente provido.

Por ocasião da execução do julgado, o autor apresentou memória de cálculo às fls. 113/120 dos autos em apenso.

O INSS interpôs embargos à execução, alegando excesso de execução (fls. 02/21).

Em atendimento à consulta da Contadoria Judicial de fls. 78, o MM. Juízo da Execução determinou que deveria ser adotado o índice ORTN para a atualização dos salários-de-contribuição para a apuração da RMI (fls. 80).

Diante disso, a Contadoria Judicial apurou o valor de R$ 4.474,50 para a RMI da aposentadoria especial em junho/1974, e fixou o valor da execução em favor da parte autora em R$ 91.817,74, referente a julho/2003 (fls.81/85).

A r. sentença julgou improcedentes os embargos à execução (fls. 99/101).

A Autarquia interpôs recurso de apelação (fls. 112/115), alegando não ser possível a correção de todos os salários-de-contribuição com base no ORTN, devendo ser aplicada a Lei nº 5.890/73 (vigente à época da concessão do benefício).

Após a apresentação de contrarrazões pela parte autora, os autos subiram a esta E. Corte, ocasião em que o INSS apresentou petição às fls. 124/128, alegando a impossibilidade de revisão dos 36 (trinta e seis) salários-de-contribuição com base na ORTN/OTN, em razão da inexistência de título executivo judicial nesse sentido, bem como pelo fato da DIB de seu benefício corresponder a 18/06/1974, ou seja, anteriormente à edição da Lei nº 6.423/77. Por fim, alega que, mesmo que se aplicasse a revisão com base na ORTN/OTN, apenas os primeiros 24 (vinte e quatro) salários-de-contribuição deveriam ser corrigidos.

O Exmo. Desembargador Federal David Dantas proferiu decisão terminativa declarando, de ofício, a inexigibilidade do título executivo judicial, nos termos do artigo 741, inciso II, do CPC de 1973. Tal decisão foi assim fundamentada (fls. 129/139):


"Vistos,
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra a r. sentença que julgou improcedentes embargos à execução por ele opostos, oriundos de ação de revisão de benefício previdenciário (fls. 99-101, 109-110).
Aduz a parte recorrente que o julgado merece reforma, uma vez que o benefício da parte autora foi concedido em 18.06.74, o que não permite o recálculo da RMI nos termos da Lei nº 6.423/77 (fls. 112-115).
DECIDO
Com o intento de dar maior celeridade à tramitação dos feitos nos Tribunais, a redação dada pela Lei nº 9.756/98 ao art. 557, caput e parágrafo 1º-A, do CPC, permitiu ao Relator, em julgamento monocrático, negar seguimento ou dar provimento ao recurso, quando verificado entendimento dominante da própria Corte, do Colendo Supremo Tribunal Federal ou de Tribunal Superior, como ocorre in casu.
1 - INTRODUÇÃO
Nos autos da ação de cognição, a parte autora formulou pedidos de recálculo da renda mensal inicial mediante a atualização monetária dos salários de contribuição mês a mês, equivalência salarial do artigo 58 do ADCT e diferença do abono anual, acrescidos os valores vencidos dos consectários legais (fls. 02-04 do apenso).
A r. sentença acolheu os pedidos (fls. 58-60 do apenso), sendo que o v. acórdão proferido pela Segunda Turma deste E. TRF, decidiu:
"PREVIDENCIÁRIO - REVISIONAL DE BENEFÍCIO - SÚMULA 260 DO TFR - INAPLICABILIDADE APÓS ABRIL/89 - OCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO DAS PARCELAS - ARTIGO 58 DO ADCT - TERMO FINAL - JUROS - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. É inaplicável a Súmula 260 do extinto TFR após 04.04.89, eis que a partir desta data os reajustes deveriam se pautar pelo disposto no artigo 58 do ADCT, até a regulamentação do Plano de Custeio e Benefícios (Decretos 356 e 357 de 1991).
2. Tratando-se de revisão de proventos, indevidas as prestações vencidas anteriormente ao qüinqüênio que precedeu a propositura da ação, estando prescritas, portanto, as parcelas decorrentes da aplicação da Súmula 260 do extinto TFR.
3. Não se aplica a equivalência salarial prevista pelo art. 58 do ADCT após a regulamentação da Lei 8213/91, pelo Decreto 357 de 09/12/91, que trouxe novos critérios para o reajustamento do benefício.
4. Juros moratórios computados a partir da citação, no percentual de 0,5% a.m., incidindo sobre o total das diferenças atualizadas até tal data.
5. Honorários advocatícios devem ser repartidos proporcionalmente em caso de sucumbência recíproca.
6. Apelação provida e recurso adesivo parcialmente provido." (fls. 93-99 do apenso).
Em sede de embargos do devedor, o INSS sustentou o excesso de execução, sob o argumento de que o cálculo apresentado pela parte exequente está incorreto, mormente no que respeita à renda mensal inicial, cujo método de cálculo, nos termos da lei em vigor à época da concessão do beneplácito, consistia na simples correção monetária dos 24 (vinte e quatro) salários de contribuição, sem a incidência da Lei nº 6.423/77.
2 - SÚMULA 487 DO STJ E A POSIÇÃO DO STF
A bem da clareza, transcrevemos o inciso II e paragrafo único do art. 741, CPC:
"Artigo 741. Na execução contra a Fazenda Pública, os embargos só poderão versar sobre:
(...)
II- inexigibilidade do título;
(...)
Parágrafo único. Para efeito do disposto no inciso II do caput deste artigo, considera-se também inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou ato normativo tidas pelo Supremo Tribunal Federal como incompatíveis com a Constituição Federal."
Ab initio, cabe definir o âmbito de eficácia temporal do transcrito dispositivo.
Como esse paragrafo único foi acrescentado pela MP nº 2.180/2.001, discute-se se embargos à execução, amparados na inexigibilidade de titulo por incompatível com a interpretação da Lei Maior proferida pelo Supremo Tribunal Federal, apenas têm procedência quando o trânsito em julgado da decisão embargada se deu após a vigência do referido paragrafo único.
De plano, registramos nossa compreensão de que não seria necessária a introdução dessa regra processual para que se considerasse inexigível título judicial fundado em crédito cujo sustento legal tenha sido afastado pelo STF, por contrário à Constituição. Em outras palavras, o fundamento da inexigibilidade do titulo não é a lei processual, mas a própria Lei Fundamental, quando prevê o dever de o Estado tratar todas as pessoas sob sua soberania com igual respeito e consideração (artigo 5º, caput, CF/88), vetor normativo com o qual a segurança jurídica da coisa julgada deve dialogar e, em nosso sentir, ceder espaço.
Todavia, em nível legislativo (parágrafo único do artigo 741 do CPC), a questão foi tratada pelos tribunais, em especial pelo STJ, findando pela edição da Sumula 487:
"O parágrafo único do art. 741 do CPC não se aplica às sentenças transitadas em julgado em data anterior à da sua vigência" (DJUe 01/08/2012)
Mais recentemente, o Supremo Tribunal Federal externou o seguinte entendimento, in verbis:
"AGRAVO REGIMENTAL EM RECLAMAÇÃO. SÚMULA VINCULANTE Nº 10. VIOLAÇÃO CONFIGURADA. ACÓRDÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUE AFASTA A INCIDÊNCIA DA NORMA POR FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Ao dar provimento ao recurso especial, por decisão de órgão fracionário, o e. STJ afastou a incidência do art. 741, parágrafo único, do Código de Processo Civil por fundamento constitucional, sem a necessária submissão da matéria à cláusula de reserva de plenário, em afronta à autoridade do STF e à eficácia da Súmula Vinculante nº 10." (STF, AG. REG. NA RECLAMAÇÃO 8.037/AL, Rel. Min. Dias Toffoli, Pleno, v.u., j. 18.12.2013).
Transcrevo, também, o referido preceito sumular vinculante:
"Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta sua incidência, no todo ou em parte." (Súmula Vinculante nº 10).
Nessas condições, entendo que o óbice temporal inicialmente imposto pela Súmula 487 do E. STJ, em tese, não mais vigora, ao menos sob o ponto de vista formal, como expressamente alinhavado na r. decisão do Excelso Pretório; entrementes, passa-se à apreciação da questão posta nestes autos sob a óptica do acima aludido dispositivo legal (art. 741, II, § único, CPC), afeta à flexibilização da coisa julgada.
Destaque-se que o caso concreto está a demonstrar a ocorrência do trânsito em julgado em 11.11.2002 (fls. 101 do apenso), portanto, após a edição da acima referida Medida Provisória n º 2.180/2.001.
A questão que se nos apresenta, e que é absolutamente central na lide, é a de se saber se sobrevive título executivo judicial fundamentado em crédito justificado em interpretação incompatível com a Constituição Federal, segundo leitura do STF.
3 - PERSPECTIVA PÓSPOSITVISTA
Todo julgamento implica um olhar; olhar a partir de um ponto de vista. Não temos como nos aproximar de um caso judicial, sem alguma pré-compreensão teórica de como vemos o direito. Grosso modo, temos duas grandes perspectivas nesse olhar teórico: a positivista e a pós-positivista (Pode-se falar tanto em "pós-positivismos", como em "positivismo contemporâneo" ou "neoconstitucionalismo", ou ainda "positivismo principialista"). A grande diferença que existe entre ambas as abordagens está na forma como cada uma vê a relação entre o direito e a moral (entendida esta, não como ética existencial, mas moralidade política, que consagra princípios com Justiça, Equidade, Solidariedade, Dignidade Humana etc.). O positivismo [Os grandes representantes do pensamento positivista do Século XX são: H.L.A. Hart (El Concepto de Derecho. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1992) e Hans Kelsen (Teoria Pura do Direito. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998)] entende que é possível definir o que é regra de direito em uma sociedade prescindindo de valoração moral, ou seja, existe uma separação conceitual entre direito e moral. Já o pensamento pós-positivista [Despontaram na segunda metade do Século XX: Robert Alexy nos seguintes livros, (El Concepto de la Validez del Derecho. 2 ed. Barcelona: Editorial Gedisa, 1997); (Teoria da Argumentação Jurídica. A Teoria do Discurso Racional como Teoria da Justificação Jurídica, São Paulo: Landy Editora, 2001);(Teoria de los Derechos Fundamentales, 2 reimpresión, Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2001);(Sistema Jurídico, Princípios Jurídicos y Razón Práctica, trad. De Manuel Atienza, en Doxa, num. 5, 1988) e Ronald Dworkin, nos livros: (El Império de la Justicia, 2. ed. Barcelona: Gedisa Editorial, 1992); (Los Derechos en Serio. 4. reimpresión. Barcelona: Editorial Ariel, 1999); (O Império do Direito. 1. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999); (Uma Questão de Princípio, São Paulo: Martins Fontes, 2000)] vê o direito como conectado com a moral: não é possível definir uma regra jurídica, sem que essa candidata passe antes pelo crivo da concordância dos princípios de moralidade política. Embora grande parte dos princípios morais estejam contemplados nas constituições ocidentais (como nossa CF/88), o problema persiste, pois o positivista privilegia o valor segurança jurídica, acolhendo a ideia de norma válida em um plano absolutamente formal.
No caso em estudo, a questão, que envolverá o tema da relativização da coisa julgada, [Não achamos adequada a expressão "relativização da coisa julgada" pois não corresponde ao que realmente é feito quando se desconsidera direitos reconhecidos por sentenças transitadas em julgado. Seria relativização apenas se a coisa julgada fosse um princípio absoluto. Nesse caso seria mais que princípio, seria um dogma; e nós não poderíamos falar em teoria da coisa julgada, mas em doutrina. Porém, em uma democracia constitucional, não há espaço para princípios absolutos. Até mesmo o princípio democrático encontra limitações nos direitos fundamentais e nas clausulas pétreas (parágrafo 4, art. 60, CF). A coisa julgada, importante para a estabilização das relações humanas e, portanto, para a segurança jurídica, mormente em face dos atos de poder do Estado, convive com os demais princípios constitucionais e princípios morais que sustentam o próprio texto constitucional, visto este não com um pedaço de papel, mas como uma dinâmica sempre por receber novas concretizações.] será por nós abordada à luz da teoria pós-positivista dos princípios constitucionais, marcadamente desenvolvida pelo jus-filósofo norte-americano R. Dworkin e por Robert Alexy, na Europa continental. Primeiramente utilizaremos o conhecido método de ponderação - balancing; depois concretização inspirada na reflexão de Dworkin, com aproximação do direito como integridade (integrity).
4 - COLISÃO ENTRE PRINCÍPIOS E PONDERAÇÃO
A distinção entre regras e princípios desponta com nitidez, no dizer de Alexy, ao redor da colisão de princípios e do conflito de regras: "Um conflito entre regras somente pode ser resolvido com a introdução em uma das regras de uma cláusula de exceção (o que elimina o conflito) ou declarando inválida pelo menos uma das regras"[Cf. R. Alexy, Teoria de los derechos fundamentales, p. 88. (tradução nossa)]. Para Alexy, uma norma "vale ou não vale juridicamente. Que uma regra é válida e aplicável a um caso, significa que também é válida sua consequência jurídica. Qualquer que seja a maneira pela qual sejam fundamentados, não é possível a validade de dois juízos concretos de dever ser reciprocamente contraditórios" [Cf. R. Alexy, ob. cit., p. 88 (tradução nossa)]. Equivale dizer, para o estudioso alemão, um conflito de regras só admite uma das seguintes soluções: a) declaração de invalidade de uma das regras; ou b) introdução de uma cláusula de exceção que elimine o conflito. Contrariamente ocorre - ainda para Alexy - na colisão de princípios em que a solução do caso não exige a perda de validade de um deles, nem muito menos que se formule uma cláusula de exceção com caráter geral. Evidentemente não teremos dupla ou múltipla incidência de princípios, mas "sobre outras circunstâncias a questão da procedência pode ser solucionada de outra maneira" [Cf. R. Alexy, ob. cit., p. 89 (tradução nossa)].
Dworkin vê a diferença entre princípios e regras como de natureza lógica. As regras são aplicadas de forma disjuntiva: se ocorrem os fatos previstos na norma, então ou a norma é válida - hipótese na qual deverá ser aceita a determinação normativa - ou inválida, e então não será considerado seu teor na solução do caso. Com os princípios, contrariamente, nem mesmo aqueles que mais se assemelham - em termos deontológicos - às normas estabelecem consequências jurídicas que se sigam automaticamente quando se satisfaçam as condições previstas.
Por esses motivos, elucida Dworkin, para se ter precisão nas regras - que têm sua incidência regida por um código binário: aplicam-se ou não ao caso -, estas devem ter enumeradas todas as suas exceções. Sem dúvida seria demasiado incômodo trabalhar com norma que carrega em seu seio todas as hipóteses de não aplicação. Porém Dworkin insiste que, "na teoria, pelo menos, poder-se-ia fazer uma lista de todas as exceções, e quantas exceções mais existam, mais completo será o enunciado da norma".
Diversamente das regras, para Dworkin, um princípio - apesar de válido - pode não ser aplicado. Continua válido, embora não aplicado ao caso. Poderá ser chamado a incidir em caso futuro. "Isso significa que os princípios não se anulam entre si, como as regras. De outra parte, as exceções à aplicabilidade dos princípios não são enumeráveis taxativamente: nem os princípios que mais se assemelhem a normas estabelecem consequências jurídicas que ocorram automaticamente uma vez satisfeitas as condições previstas em suas premissas".(Cf. David Diniz Dantas, Interpretação Constitucional no Pós-Positivismo. São Paulo: Madras, 2004, p. 68-69)
No caso que examinaremos a contraposição entre princípios se dará entre, por um lado, o princípio da intocabilidade da coisa julgada (art. 5º, inciso XXXVI, CF) e, de outro, o princípio constitucional implícito de prevalência do interesse público e o princípio da isonomia.
Os efeitos do caso definitivamente julgado podem ceder em situação em que as consequências do julgado ferem o interesse público, expressado este na exigência de constitucionalidade/legalidade das decisões, mormente as decisões que eventualmente condenam o erário público em vultosas quantias?
Vejamos, primeiramente, o plano dos princípios constitucionais e, ao depois, no ângulo do processo civil, embora ambos os universos se interseccionem.
5 - PRINCÍPIO DA INTOCABILIDADE DA COISA JULGADA X PRINCÍPIO DA PREVALÊNCIA DO INTERESSE PÚBLICO
5.1 - A PONDERAÇÃO IN CONCRETO
Como já consignamos no item 2 (Introdução), no caso vertente, ampliando a metodologia do balancing, examinaremos a contraposição entre princípios que se dará entre, por um lado, o princípio da intocabilidade da coisa julgada (art. 5º, inciso XXXVI, CF) e, de outro o princípio constitucional implícito de prevalência do interesse público e o princípio da isonomia.
Consagra o constituinte no art. 37 da Lei Maior os princípios que norteiam a Administração Pública e que caracterizam o regime jurídico administrativo (legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade entre outros), os quais, assinala-se já se faziam reconhecer pela doutrina e jurisprudência na vigência da Carta Magna pretérita.
Esses princípios constitucionais da Administração podem ser resumidos em dois: legalidade e prevalência do interesse público. O primeiro expresso na Constituição. O segundo, implícito, extraindo-se da exegese dos diversos dispositivos constitucionais, em que vemos o dedo do constituinte fazendo a nítida opção pelo interesse público quando confrontado com o interesse particular.
Feitas essas considerações e reiterando a opção política do constituinte em consagrar o princípio da finalidade pública, segue-se que a intelecção das normas em nível infraconstitucional (entre estas as criadoras do instituto da coisa julgada material/formal) deve ser feita de tal maneira que o teor da interpretação não se choque com os princípios constitucionais, os quais no âmbito da administração enaltecem a prevalência do interesse público sobre o particular (mas note-se: não se trata de prevalecer o interesse do Estado sobre o do cidadão/indivíduo). Mesmo os princípios constitucionais que aparentemente apresentem - não no plano abstrato, mas no plano concreto - contradições com o princípio do interesse público, devem receber interpretação que os compatibilize.
Por outro lado, a prevalência do interesse público ganha maior relevância quando associada ao princípio constitucional da isonomia que determina ao legislador - e, consequentemente ao juiz, uma vez que esse é o aplicador da lei - normatividade semelhante quando duas ou mais pessoas estiverem dentro do tipo legal. Portanto, todos os cidadãos que se encontram em situações subjetivas que guardam entre si o nexo da similitude, similitude esta em ponto absolutamente decisivo para a percepção de direitos conferidos pelo legislador/juiz, todos esses cidadãos terão a certeza moral de saber que cada um e todos receberão o mesmo tratamento por parte de quem foi incumbido de aplicar a lei.
O princípio do igual tratamento (igualdade) seria violado se admitíssemos que, enquanto todos os segurados com benefícios concedidos pela Previdência entre 21/06/77 e 05/10/88 tiveram a possibilidade de terem a renda mensal calculada de acordo com a variação da ORTN/OTN/BTN, o autor - em situação diversa dos demais segurados - com DIB em 1974 - tivesse reconhecido o mesmo direito, na espécie, adotado pela sentença transitada em julgado. A interpretação que recebeu o manto da coisa julgada contraria o princípio da isonomia, uma vez que possibilita ao Estado (por meio do órgão previdenciário) tratamento diverso para seus cidadãos. E o que é pior: tratamento diverso que não se justifica; pelo contrário, a única forma de justificá-lo é de se admitir que possam os cofres públicos enriquecer determinados cidadãos com base em ilegalidade.
A ponderação entre o princípio da coisa julgada e o do interesse público mostra que, no caso concreto, não há como desconstituir a sentença concessora do crédito, e, por consequência, prestigiar o interesse da coletividade em que sejam custeados apenas benefícios com apoio constitucional, sem que afetado seja o primeiro princípio. Entretanto, esse arranhão sofrido pela segurança jurídica é menor que o interesse público na manutenção da liceidade dos pagamentos feitos pela Previdência Social e no tratamento isonômico dos segurados.
5.2 - INTEGRIDADE, PRINCÍPIOS E INTERPRETAÇÃO
Além do balancing, modelo de ponderação de princípios acima sumariamente descrito, contemporaneamente (já que o balancing foi introduzido por Dworkin no início dos anos 60), este filósofo do Direito passou a desenvolver um modelo de aproximação dos casos difíceis que recebeu formatação completa em seu livro Law's Empire. Pode ser útil, uma vez que nos permite resolver situações de conflito entre princípios sem arbitrariedade/discricionariedade.
Resumidamente, o Direito como integridade é uma teoria não cética das pretensões juridicamente protegidas (Cf. Ronald Dworkin, O império do direito, p. 186.): sustenta que as pessoas têm como pretensões juridicamente protegidas todos os direitos que são patrocinados pelos princípios que proporcionam a melhor justificativa da prática jurídica como um todo. Esses princípios são (recorde-se que Dworkin fala a partir da realidade norte-americana): a justiça, a equidade e o devido processo legal (legalidade) (O ideal interpretativo da integridade, como proposto por Dworkin, no Brasil exigiria que alguns princípios fizessem parte desse conjunto fundante e estruturante, sobremaneira dois: princípio da solidariedade e o princípio da dignidade da pessoa humana. Uma sociedade pobre, miserável como a nossa, em que poucos ganham muito e muitos ganham pouco, que possui problemas sociais que vão desde a existência de trabalho escravo até a exploração da prostituição infantil, sem dúvida que dever-se-ia exigir que todas as decisões políticas tomadas contribuíssem - direta ou indiretamente - para, se não eliminar, pelo menos reduzir esses vícios sociais.). Assim, para Dworkin, os juízes que aceitam o ideal interpretativo da integridade decidem os casos difíceis tentando encontrar, em um conjunto de princípios coerentes sobre os direitos e deveres das pessoas, a melhor interpretação construtiva da estrutura política e da doutrina jurídica de sua comunidade (Cf, Ronald Dworkin, El império de la justicia, p. 183/184.). O princípio da integridade desempenha o papel de equilibrar a justiça, a equidade e a legalidade. É um chamado aos juízes para que atuem com "coerência narrativa" na captação do fenômeno jurídico [Cf. Marisa Iglesias Vila, El problema de la discreción judicial - uma aproximación al conocimiento jurídico, p. 154].
Em termos de um modelo prático, para solução de casos difíceis - que denominamos como "máxima coerência" [Esse método, que passamos a chamar de máxima coerência que tem sido objeto de nossa reflexão atual, busca inspiração não apenas na integrity de Dworkin, como na ética do discurso de Jürgen Habermas] - ver o direito como integridade implica não ver conflito entre os princípios; mas ver o caso difícil sendo abordado por duas possibilidades de solução (proposições jurídicas): a) o título executivo é legítimo de vez que criado por sentença condenatória, que reconheceu o crédito do autor e transitou em julgado; b) O título executivo é ineficaz por ter origem em crédito criado por sentença condenatória fundada em interpretação contrária à Lei Maior.
Qual dessas proposições deve prevalecer?
A integridade não trabalha conflito entre princípios (coisa julgada e interesse público), mas irá responder à questão acima com a seguinte proposta metodológica: qual dentre as proposições - candidatas a norma em concreto - mantém mais coerência com o conjunto de princípios constitucionais estruturantes de nosso direito? Note-se: não se avaliam os ganhos e perdas de cada um dos dois princípios (que apoiam cada uma das proposições), como em um duelo. Pelo contrário, olha-se a integridade do direito e se pergunta: qual dentre as proposições maximiza, torna superlativo, esse conjunto de princípios reprodutores da ordem jurídica?
Esse conjunto de princípios inclui não somente aqueles positivados, com esteio na Constituição, mas também aqueles princípios morais que dão sustentáculo para as leis e para a própria Constituição (v.g., o princípio que veda auferir vantagem financeira com base em ilícito).
Na nossa história encontramos luta constante por temperar a segurança jurídica (respeito aos contratos, ao direito de propriedade e à liberdade) com princípios de justiça, igualdade/equidade (no sentido político do termo), liberdade, dignidade da pessoa humana e solidariedade [A teoria de Dworkin, do direito como integridade (integrity), assim como sua posição de que existe apenas uma resposta certa para os conflitos jurídico/éticos, recebeu, entre outras, a recente adesão do filósofo alemão Jürgen Habermas. Mais especificamente na relação entre a segurança jurídica e os demais princípios, Habermas, secundando Dworkin, afirma: "A segurança jurídica apoiada sobre o conhecimento de expectativas de comportamento inequivocamente condicionadas, representa ela mesma um princípio que pode ser contraposto, in casu, a outros princípios. Em troca, a postulada teoria do direito possibilita unicamente decisões corretas, que garantem a segurança jurídica, num outro nível. Os direitos processuais garantem a cada sujeito de direito a pretensão a um processo equitativo, ou seja, uma clarificação discursiva das respectivas questões de direito e de fato; deste modo, os atingidos podem ter a segurança de que, no processo, serão decisivos para a sentença judicial argumentos relevantes e não arbitrários. Se considerarmos o direito vigente como um sistema de normas idealmente coerentes, então essa segurança, dependente do procedimento, pode preencher a expectativa de uma comunidade jurídica interessada em sua integridade e orientada por princípios de tal modo que a cada um se garantem os direitos que lhe são próprios". (Cf. Jürgen Habermas, Direito e Democracia I entre facticidade e validade, p. 273/274). Devemos impedir que em nome da estabilidade e certeza das relações econômico/contratuais/previdenciárias se perpetue, em realidade, uma injustiça travestida de formal legalidade. Basta se debruçar sobre a origem do domínio de terras no Brasil (capitanias hereditárias e sesmarias) ou, mais recentemente, as relações contratuais de consumidores antes do advento do Código do Consumidor, para se perceber que a segurança com injustiça pouco significa para uma sociedade democrática. Na verdade tem um significado: essa sociedade é doente crônico. Vale dizer, a segurança jurídica não é um princípio absoluto, como não o é o da coisa julgada, ou qualquer outro princípio - mesmo com foro constitucional. Aceita-se e tem importância, no entanto, a segurança jurídica e a coisa julgada; mas não se aceita a segurança que foi obtida a partir de ilegalidade e no tratamento desigual entre cidadãos. Por quê? Porque faz, também, parte de nossa história buscar prevalecer um princípio moral muito caro, embora às vezes desrespeitado: é vedado a quem quer que seja tirar proveito econômico de um ilícito. Sobretudo quando toda a comunidade suportará o custo desse benefício ilícito.
Aceitar que o autor perceba dos cofres da Previdência recursos aos quais não têm direito, seria tirar daqueles que tem efetivamente direito (viúvas, órfãos e doentes), dificultando as possibilidades de o orçamento da Previdência dar conta de todos os benefícios da seguridade social (contra o princípio da solidariedade).
Nesse último âmbito, do direito como integridade - que não escondemos preferir ao método de ponderação/balancing - entre as duas proposições (entre manter o título e, consequentemente, prevalecer a coisa julgada; e se eliminar o benefício auferido pelos autores por contrário à interpretação da Constituição), compreendemos que esta última - desconstitutiva do título - contempla em sua melhor luz os princípios da igualdade (a grande maioria, na mesma situação dos autores, não recebeu esse crédito), da solidariedade (já que segurados necessitados terão mais disponibilidade), interesse público (na preservação da legalidade e moralidade) e princípio moral que nos une enquanto comunidade: é vedado a todo cidadão tirar proveito de um ilícito em detrimento de toda a coletividade. Achamos que esta proposição (e a solução que alvitra) mantém a máxima coerência com o conjunto de princípios estruturantes relevantes para o caso, sem ofensa à segurança, pois a comunidade saberá que a certeza e definitividade só alcançará relações jurídicas delineadas em procedimentos que não ignoram a moralidade política que a mantém coesa.
6 - PLANO PROCESSUAL
A busca por coerência entre o exercício dos direitos e os ditames constitucionais foi estimulada pelo legislador processual. Consoante a atual redação do art. 741, CPC, bem como de seu parágrafo único:
"Art. 741. Na execução contra a Fazenda Pública, os embargos só poderão versar sobre:
(...)
II - inexigibilidade do título;
(...)
Parágrafo único. Para efeito do disposto no inciso II do caput deste artigo, considera-se também inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou ato normativo tidas pelo Supremo Tribunal Federal como incompatíveis com a Constituição Federal."
Entendemos que tanto a decisão do STF proferida em controle concentrado (ADIn, ADC ou ADPF), como aquela proferida em controle difuso v.g., Recurso Extraordinário), podem fundamentar a ineficácia do título executivo estampada no transcrito parágrafo único do art. 741 (nesse sentido, Antonio Carlos Marcato, Código de Processo Civil Interpretado, tópico 9, comentando o art. 741, pág. 2.102/2.103).
Na espécie, o título judicial que aparelha a execução das diferenças atrasadas da revisão de benefícios previdenciários, ora impugnada, considerou aplicável o artigo 201, parágrafo 3º, da Constituição Federal, em sua redação original, dando azo à incidência da Lei nº 6.423/77, tendo determinado, a correção monetária do benefício a partir da média dos 36 (trinta e seis) últimos salários de contribuição, mês a mês.
O benefício de aposentadoria especial foi concedido ao segurado em 18.06.74 (fls. 12 do apenso), na vigência do Decreto-lei nº 72, de 21 de novembro de 1966, que, em seu artigo 3º, inciso II e § 1º, com as alterações do artigo 2º da Lei nº 5.980, de 08 de junho de 1973, preceituava:
"Art. 3º O valor mensal dos benefícios de prestação continuada, inclusive os regidos por normas especiais, será calculado tomando-se por base o salário-de-benefício, assim entendido:
I - para o auxílio-doença, a aposentadoria por invalidez, a pensão e o auxílio-reclusão, 1/12 (um doze avos) da soma dos salários-de-contribuição imediatamente anteriores ao mês do afastamento da atividade, até o máximo de 12 (doze), apurados em período não superior a 18 (dezoito) meses;
II - para as demais espécies de aposentadoria, 1/48 (um quarenta e oito avos) da soma dos salários-de-contribuição imediatamente anteriores ao mês do afastamento da atividade, até o máximo de 48 (quarenta e oito) apurados em período não superior a 60 (sessenta) meses;
III - para o abono de permanência em serviço, 1/48 (um quarenta e oito avos) da soma dos salários-de-contribuição imediatamente anteriores ao mês da entrada do requerimento, até o máximo de 48 (quarenta e oito), apurados em período não superior a 60 (sessenta) meses.
§ 1º Nos casos dos itens Il e III deste artigo, os salários-de-contribuição anteriores aos 12 (doze) últimos meses serão previamente corrigidos de acordo com coeficientes de reajustamento, a serem periodicamente estabelecidos pela Coordenação dos Serviços Atuariais do Ministério do Trabalho e Previdência Social.
§ 4º O salário-de-beneficio não poderá, em qualquer hipótese, ser inferior ao valor do salário-mínimo mensal vigente no local de trabalho do segurado, à data do início do benefício, nem superior a 20 (vinte) vezes o maior salário-mínimo vigente no País."
O raciocínio que se desenvolvia era o de que se o cálculo dos proventos dos segurados havia sido elaborado com desprezo da correção monetária dos últimos 12 (doze) meses, deveria ser reformulado para que, também, fosse realizada a plena correção dos mesmos.
Destarte, o cálculo dos benefícios em tela deve observar as regras insertas no Decreto-lei nº 72, de 21 de novembro de 1966, em seu artigo 3º, inciso II e § 1º, com as alterações do artigo 2º da Lei 5.980, de 08 de junho de 1973, já transcrito.
Como o beneficio originário (Salvador Daniel) foi concedido em 1976, antes, portanto, que viesse à lume a Lei n º 6.423/77, não se há falar em aplicação das ORTN/OTN/BTN na correção monetária dos salários-de-contribuição.
De conseguinte, lei não pode retroagir, a não ser que essa faculdade conste expressamente de seu texto. A irretroatividade da lei age em prol da estabilidade das relações jurídicas.
Ressalte-se que ao atualizar os salários-de-contribuição, a autarquia procedeu em conformidade ao que estabelecia a lei vigente à época, fazendo incidir os indexadores estabelecidos pelo MPAS.
Nesse sentido, o entendimento do Colendo Superior Tribunal de Justiça:
"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO ESPECIAL. ATUALIZAÇÃO DOS SALÁRIOS-DE-CONTRIBUIÇÃO. ÍNDICE APLICÁVEL. BENEFÍCIO CONCEDIDO ANTES DE 1977. INCIDÊNCIA DA LEI Nº 5.890/73. OMISSÃO. OCORRÊNCIA.
(...)
2. Em havendo o acórdão embargado deixado de apreciar a alegada violação do artigo 21, inciso II, parágrafo 1º, da CPLS, constante das razões recursais deduzidas pela autarquia previdenciária, é de se reconhecer a existência de omissão no decisum.
3. Para os benefícios concedidos antes de 21 de junho de 1977, data de vigência da Lei nº 6.423, os salários-de-contribuição anteriores aos doze últimos meses devem ser corrigidos de acordo com os coeficientes de reajustamento a serem periodicamente estabelecidos pela Coordenação dos Serviços Atuariais do Ministério do Trabalho e Previdência Social e, não, pela variação da ORTN/OTN, que só deve ser aplicada aos benefícios concedidos após à entrada em vigor da Lei 6.423/77.
4. 'Se cada litigante for em parte vencedor e vencido, serão recíproca e proporcionalmente distribuídos e compensados entre eles os honorários e as despesas.' (artigo 21, caput, do Código de Processo Civil).
5. Embargos de declaração acolhidos."
(Edcl no Resp 138263/1997/0045065-1, Rel. Hamilton Carvalhido, 6ª T., DJU 04.08.2003, p.444).
"PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. BENEFÍCIO CONCEDIDO ANTES DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL VIGENTE. SALÁRIO-DE-CONTRIBUIÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA. LEI N.º 5.890/73. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO.
DECISÃO
Vistos, etc.
(...)Trata-se de recurso especial interposto pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS com fundamento na alínea a do permissivo constitucional, em face de acórdão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, assim ementado, no essencial (...)
Assim, para os benefícios concedidos na vigência da Lei n.º 5.890/70, ou seja, entre 8 de junho de 1973 e antes de 21 de junho de 1977, terão os salários-de-contribuição anteriores aos doze últimos meses corrigidos de acordo com os coeficientes de reajustamento a serem periodicamente estabelecidos pela Coordenação de Serviços Atuariais do Ministério do Trabalho e Previdência Social, nos termos do seu artigo 3º:
'Art 3º O valor mensal dos benefícios de prestação continuada, inclusive os regidos por normas especiais, será calculado tomando-se por base o salário-de-benefício, assim entendido:
I - para o auxílio-doença, a aposentadoria por invalidez, a pensão e o auxílio-reclusão, 1/12 (um doze avos) da soma dos salários-de-contribuição imediatamente anteriores ao mês do afastamento da atividade, até o máximo de 12 (doze), apurados em período não superior a 18 (dezoito) meses;
II - para as demais espécies de aposentadoria, 1/48 (um quarenta e oito avos) da soma dos salários-de-contribuição imediatamente anteriores ao mês do afastamento da atividade, até o máximo de 48 (quarenta e oito) apurados em período não superior a 60 (sessenta) meses;
III - para o abono de permanência em serviço, 1/48 (um quarenta e oito avos) da soma dos salários-de-contribuição imediatamente anteriores ao mês da entrada do requerimento, até o máximo de 48 (quarenta e oito), apurados em período não superior a 60 (sessenta) meses.
§ 1º Nos casos dos itens II e III deste artigo, os salários-de-contribuição anteriores aos 12 (doze) últimos meses serão previamente corrigidos de acordo com coeficientes de reajustamento, a serem periodicamente estabelecidos pela Coordenação dos Serviços Atuariais do Ministério do Trabalho e Previdência Social.'
Dessa forma, tratando-se no caso dos autos do benefício de aposentadoria por invalidez concedido anteriormente à Constituição Federal vigente, a saber em novembro de 1975 (fl. 27), (...)
Ante o exposto, com fulcro no art. 557, § 1º-A, do Código de Processo Civil, CONHEÇO E DOU PROVIMENTO ao recurso especial, a fim de afastar a aplicação da Lei nº 6.423/77 para a correção dos salários-de-contribuição ao benefício da Autora Alzira Papa.
Publique-se. Intimem-se."
Brasília (DF), 18 de outubro de 2007.
MINISTRA LAURITA VAZ Relatora (REsp nº 986841, 2007/0214924-7, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU 26.10.2007)
Também o entendimento da Oitava Turma desta E. Corte:
"PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. RECÁLCULO DA RMI. LEI Nº 6.423/77. PENSÃO POR MORTE, APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-DOENÇA. INAPLICABILIDADE. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA DO DÉBITO JUDICIAL. NORMAS DE CÁLCULO DA COGE E DO CJF. APLICABILIDADE. JUROS DE MORA. APRESENTAÇÃO DE NOVOS CÁLCULOS. SEM CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DAS VERBAS SUCUMBENCIAIS.
- Não se afigura factível o recálculo dos benefícios segundo as ORTN/OTN/BTN aos benefícios concedidos antes da edição da Lei nº 6423/77, nem das pensões por morte, aposentadorias por invalidez e auxílios-doença. (Decreto-lei nº 72, de 21 de novembro de 1966, em seu artigo 3º, inciso II e § 1º, com as alterações do artigo 3º da Lei 5.890, de 08 de junho de 1973, e Decretos nº 77.077/76, 83.080/79 e 89.312/84).
- Reconhecida a prescrição qüinqüenal parcelar (art. 103, parágrafo único, da Lei 8.213/91, c/c art. 219, § 5º, do CPC, com a redação dada pela Lei 11.280/06, e art. 1.211 do CPC).
- Havendo divergência quanto à questão da utilização de determinado indexador em favor de uma das partes litigantes, deve a mesma ser solucionada com o auxílio técnico da Contadoria Judicial, órgão auxiliar da Justiça.
- Apuração de diferenças decorrentes da aplicação da Súmula 260 do extinto TFR. Necessidade de refazimento dos cálculos.
- Aludidos cálculos devem respeitar as normas dos Provimentos COGE nº 24, 26 e 64, da 3º Região, bem como das Resoluções 242/01 e 561/07 do CJF, atendendo à coisa julgada, aplicando-se a correção monetária das diferenças a partir da data do vencimento de cada parcela.
- Quanto aos juros de mora, o artigo 1.062 do Código Civil de 1.916 mandava aplicá-los à base de 0,5% (meio por cento) ao mês, desde que não convencionado de modo diverso. Nos débitos da União e respectivas autarquias, bem como nos previdenciários, incidiam na forma do estatuto civil (art. 1º da Lei nº 4.414/64). O artigo 406 do novo Código Civil (Lei nº 10.406/02, em vigor a partir de 11.01.03), alterou tal sistemática e preceituou que devem ser fixados conforme a taxa que estiver em vigor, relativamente à mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional. O art. 161, § 1º, do CTN reza que, se lei não dispuser de modo diverso, o crédito tributário não pago no vencimento é acrescido de juros calculados à taxa de 1% (um por cento) ao mês. Assim, a taxa de juros moratórios dos débitos previdenciários é regulada pelo Código Civil a partir de sua entrada em vigor, que, de seu turno, se reporta à taxa incidente nos débitos tributários, e é, atualmente, de 1% (um por cento) ao mês, calculada de forma englobada até a citação e, após, de forma decrescente.
- Sem condenação ao pagamento de verbas sucumbenciais, dado o caráter de acertamento de valores dos presentes embargos à execução.
- Reconhecida, de ofício, a prescrição quinquenal parcelar. Apelação parcialmente provida." (TRF3, AC 98.03.092189-4, Rel. Des. Fed. Vera Jucovsky, Oitava Turma, v.u., DJUe 16.09.2010).
Portanto, somente a partir da data de publicação da Lei 6.423/77 afigura-se possível a aplicação dos critérios por ela instituídos para a atualização monetária dos salários-de-contribuição que integram a base de cálculo da renda mensal inicial do benefício.
In casu, não bastasse a indevida aplicação do dispositivo constitucional retrocitado (artigo 201, parágrafo 3º, CF/88) no cálculo do benefício, demasiado seria atribuir-lhe efeito retroativo.
Até em razão da não autoaplicabilidade do disposto no artigo 202, caput, da CF/88, coube ao legislador ordinário a devida complementação (integração legislativa), por meio das Leis nº 8.213 e 8212, a fim de outorgar plena eficácia à norma constitucional enfocada, o que naturalmente implicou na definição dos critérios de cálculo e concessão dos benefícios previdenciários.
Nessa linha de argumentação, a Lei nº 8213/91, regulamentando o art. 202 da Constituição Federal, estabeleceu o Col. STF:
"CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. AUTO-APLICABILIDADE DO ARTIGO 202 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ALEGAÇÃO IMPROCEDENTE. SUPERVENIÊNCIA DAS LEIS 8.212/91 E 8.213/91. INTEGRAÇÃO LEGISLATIVA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO NÃO CONHECIDO.
1. O art. 202, caput, da Constituição Federal não é auto aplicável, por necessitar de integração legislativa, para complementar e conferir eficácia ao direito nele inserto.
2. Superveniência das Leis nº 8.212/91 e 8.213/91, normas sem as quais a vontade da Lei Maior não se cumpria.
3. Recurso Extraordinário não conhecido. (STF, Pleno, Rel. para acórdão Min. Maurício Corrêa, Recurso Extraordinário 193456-5/RS, DJU 07-11-1997)
DECISÃO Vistos. Higino Vieira de Almeida interpõe agravo de instrumento contra a decisão que não admitiu recurso extraordinário assentado em contrariedade aos artigos 194, inciso IV, 201 e 202 da Constituição Federal. Insurge-se, no apelo extremo, contra acórdão da Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, assim ementado: "PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. AGRAVO LEGAL. RENDA MENSAL INICIAL. TETO. PRIMEIRO REAJUSTE. BENEFÍCIO CONCEDIDO APÓS A CF/88. I - Na sentença proferida na primeira instância não foi acolhido o pedido referente ao recálculo da renda mensal inicial, deixando o agravante de recorrer do julgado, pelo que indevido insurgir-se contra o tema em sede de agravo legal interposto contra a r. decisão monocrática que deu provimento à remessa oficial. II - Os benefícios concedidos posteriormente à promulgação da Constituição da República de 1988 não se sujeitaram ao critério de integralidade quando do primeiro reajuste. III - Recurso desprovido" (fl. 24). Opostos embargos de declaração (fls. 57/58), foram rejeitados (fls. 59/60). Decido. Anote-se, inicialmente, que o acórdão dos embargos de declaração foi publicado em 25/9/06, conforme expresso na certidão de folha 61, não sendo exigível a demonstração da existência de repercussão geral das questões constitucionais trazidas no recurso extraordinário, conforme decidido na Questão de Ordem no Agravo de Instrumento nº 664.567/RS, Pleno, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, DJ de 6/9/07. Não merece prosperar a irresignação, haja vista que a decisão agravada está em consonância com a jurisprudência desta Corte, consolidada no sentido de que era de eficácia contida a regra do artigo 202 da Constituição Federal, em sua redação original, e que a regulamentação infraconstitucional necessária para sua aplicação é que deveria definir os critérios de preservação do valor real do benefício, nos termos dos artigos 194 e 201 da Constituição. Destarte, ao benefício concedido após a Constituição Federal de 1988 e anteriormente à edição da Lei nº 8.213/91, a ele não se aplicam os critérios previstos no art. 58 do ADCT, bem assim não há falar na correção dos 36 últimos salários-de-contribuição, desde a concessão do benefício, nos termos do artigo 202 da Constituição Federal, uma vez que a norma inscrita naquele dispositivo constitucional não é auto-aplicável. Sobre o tema, anote-se: "1. Agravo regimental: motivação da decisão agravada: necessidade de impugnação. 2. Benefício previdenciário de prestação continuada: limitação do valor ao teto dos respectivos salários de contribuição, nos termos da L. 8.213/91: acórdão recorrido que se harmoniza com o entendimento do STF no sentido de que cabe ao legislador ordinário definir os critérios para a preservação do valor real do benefício(art. 202, caput, da CF - redação primitiva); precedente (AI 279377 AgR-ED, Ellen Gracie, DJ 22.6.2001)" (AI nº 479.518/SP-AgR, Primeira Turma, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, DJ de 30/4/04). "DIREITO CONSTITUCIONAL, PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA. CÁLCULO DO BENEFÍCIO. ART. 202, 'CAPUT', DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ARTS. 29 E 33 DA LEI 8.213/91. AGRAVO. 1. Mesmo admitido que os temas constitucionais (artigos 201, § 3º, e 202 da C.F.) tenham sido focalizados no acórdão recorrido, nem por isso o R.E. se torna viável. 2. É que, em caso semelhante, decidiu a 1a. Turma, no julgamento do AGAED nº 279.377, DJU de 22.05.2001, Relatora a eminente Ministra ELLEN GRACIE: "EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIOS-DE-BENEFÍCIO. TETO (ARTS. 29 E 33 DA LEI 8.213/91 E 202 DA CF). - A norma inscrita no art. 202, caput, da CF (redação anterior à EC nº 20), que assegura o benefício da aposentadoria com base na média dos trinta e seis últimos salários de contribuição, corrigidos monetariamente, mês a mês, não é autoaplicável, necessitando, para sua complementação, de integração legislativa, a fim de que lhe seja dada plena eficácia. Constitui, portanto, disposição dirigida ao legislador ordinário, a quem cabe definir os critérios necessários ao seu cumprimento - o que foi levado a efeito pelas Leis 8.212 e 8.213, ambas de 1991. Tem-se, portanto, que o benefício deve ser calculado de acordo com a legislação previdenciária editada. - Ademais, a ofensa, se existente, seria indireta. - Por outro lado, os embargos de declaração não se prestam a rediscutir a matéria de fundo, como pretendem os embargantes. Embargos rejeitados". 3. Adotados os fundamentos deduzidos nesse precedente, o presente Agravo fica improvido' (AI nº 206.807/RS-AgR, Primeira Turma, Relator o Ministro Sydney Sanches, DJ de 28/6/02). Nego provimento ao agravo. (...)". (AI 674180, Relator(a): Min. MENEZES DIREITO, julgado em 01/08/2008, publicado em DJe-151 DIVULG 13/08/2008 PUBLIC 14/08/2008).
Compreendemos que o título executivo judicial que embasa a execução perde eficácia, uma vez que alcançado pela interpretação do parágrafo único do art. 741.
É verdade que o referido dispositivo considera inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo STF, texto este que não se aplica ao caso presente. No caso, o título executivo exequendo não está fundado em Lei declarada inconstitucional, no todo, ou em parte, pelo STF. Em nossa situação concreta, cuida-se de título fundado na aplicação do artigo 201, parágrafo 3º, da CF. Por conseguinte, a segunda parte do parágrafo único do art. 741, também considera inexigível o título judicial fundado em aplicação ou interpretação da lei ou ato normativo tidas pelo STF como incompatíveis com a Constituição Federal. Ou seja, se a interpretação da lei for de tal maneira que se contraponha à Constituição Federal, e essa interpretação for aquela que sustenta o direito de crédito que está sendo executado, não sobrevive eficácia do título. Compreendemos que nesta última hipótese enquadra-se a situação sub judice, desde que se entenda a expressão "lei ou ato normativo" em sentido amplo de forma a albergar o próprio texto constitucional. Assim, quando o STF deu intelecção definitiva ao determinados dispositivos constitucionais, tornou incompatível com a Lei Maior todas as outras interpretações que criaram direitos creditícios diante da Previdência para segurados que postularam revisão de seus benefícios com esse fundamento.
Como já observado nas considerações iniciais, é possível a relativização da coisa julgada, mesmo que o trânsito em julgado no processo de conhecimento (condenatório) haja ocorrido em data anterior à vigência da Medida Provisória nº 2.180/2001 (que acrescentou o parágrafo único ao art. 741, CPC), a teor do julgamento da Reclamação nº 8.037/AL, Rel. Min. Dias Toffoli, Col. STF.
Anote-se, nesse sentido, acórdão da relatoria da culta Desembargadora Federal Marianina Galante:
"EMBARGOS À EXECUÇÃO. PREVIDENCIÁRIO. PRELIMINAR. ART. 202, CAPUT - NORMA DESTITUÍDA DE AUTO-APLICABILIDADE. ART. 144 DA LEI 8.213/91. PAGAMENTO ADMINISTRATIVO. ARTIGO 58 DO ADCT. BENEFÍCIO CONCEDIDO APÓS A PROMULGAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. INAPLICABILIDADE. TÍTULO INCOMPATÍVEL COM A ORDEM CONSTITUCIONAL. INEXIGIBILIDADE. ART. 741 DO C.P.C. RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA. APLICAÇÃO DA SÚMULA 260. LIMITAÇÃO A ABRIL DE 1989. SEM DIFERENÇAS. EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO.
I. O reexame necessário, previsto no art. 475, II, do Código de Processo Civil, providência imperativa na fase de conhecimento, sem a qual não ocorre o trânsito em julgado da sentença, é descabido em fase de execução de sentença, prevalecendo a disposição do art. 520, V, do CPC.
II. O título que se executa determinou a aplicação das normas contidas no artigo 201, § 3º e 202 da Constituição Federal, além da equivalência salarial prevista no art. 58 do ADCT e da Súmula 260 do TFR, condenando o INSS no pagamento das diferenças daí advindas, observada a prescrição qüinqüenal.
III - Os benefícios dos autores Mathias Dell' Áquila e Dirce Miralha Abreu têm DIB, respectivamente, em 29/04/1989 e 01/07/89.
IV - O E. STF já reconheceu não ser auto-aplicável o artigo 202, caput da CF/88 e afastou a aplicabilidade do art. 58 do ADCT a benefício concedido após a promulgação da Carta Magna (RE nº 193.456-5/RS, Rel. para acórdão Min. Maurício Corrêa, DJ de 07/11/97).
V - Os segurados teriam direito apenas a revisão nos moldes do art. 144 da Lei nº 8.213/91, a partir de junho de 1992, o que já foi efetuado, conforme informação prestada pelo INSS e nos termos da consulta ao sistema Dataprev, que faz parte integrante desta decisão.
VI - O título que se executa, determinando a aplicação do art. 202 da CF/88 e o art. 58 do ADCT aos benefícios das autoras, mostra-se incomparável com a ordem constitucional.
VII - A relativização da coisa julgada é gênero de que a coisa julgada é espécie.
VIII - 'Não é legítimo eternizar injustiças a pretexto de evitar a eternização de incertezas'. A coisa julgada não pode 'fazer de albo nigrum e mudar falsum in verum'.
IX - Para reconstrução da sistemática então vigente é necessário adotar-se critérios racionais e equilibrados, sopesando valores, circunstâncias e os remédios corretos de que dispõem os litigantes na tentativa de liberarem-se do vínculo que a res judicata representa. Não se trata de minar sua autoridade ou transgredi-la. É preciso pontuar as situações extraordinárias, excepcionais, em que visualize flagrante incompatibilidade com esse sistema.
X - Neste caso, não se cuida de declaração de inconstitucionalidade que comportaria o exame de seus efeitos. Parte do título que se executa é reconhecidamente incompatível com a Constituição.
XI - De longa data, o E. STF vem decidindo pela impropriedade, não apenas da aplicação imediata do art. 202, em sua redação original, como também pelo descompasso entre a adoção da equivalência salarial, para os benefícios concedidos após outubro de 1988, a o art. 58 do ADCT. No julgamento do RE 193.456-5/RS, em sessão plenária de
26/02/97, reconheceu não ser auto-aplicável o art. 202, caput, e a matéria relativa ao art. 58, após reiteradas decisões, que remontam a maio de 1995, acabou sendo sumulada através da Súmula 687, publicada em 09/10/2003. A partir de então, não há como deixar de reconhecer a inexigibilidade do título, nos termos do inciso II e § único do art. 741 do C.P.C.
XII - A 3ª Sessão desta Corte, à unanimidade, vêm sistematicamente acolhendo a tese para desconstituir coisa julgada incompatível com a Constituição, inclusive em hipóteses análogas à destes autos.
XIII - O primeiro reajuste dos benefícios ocorreu após o término da vigência da Súmula 260 do TFR (abril de 1989), razão pela qual não há como debitar à Autarquia a responsabilidade por qualquer diferença no pagamento do benefício que seja decorrente do procedimento irregular que culminou com a edição da mencionada Súmula.
XIV - Execução que se extingue.
XV - Recuso provido." (AC 866455, UF SP, TRF300122041, Rel. Des. Fed. Marianina Galante, Oitava Turma, Data Julgamento 11/06/2007, DJU 11/07/2007, p. 472).
7 - CONCLUSÃO
Dessa maneira, tanto no âmbito dos princípios constitucionais (balancing e integrity), quanto no âmbito do processo civil (art. 741, II e parágrafo único, CPC), especificamente no que diz respeito ao recálculo da renda mensal inicial, não subsiste a eficácia do título executivo que sustenta a execução.
Por fim, tendo sido integralmente quitadas em sede administrativa as parcelas decorrentes do artigo 58 do ADCT, bem como os abonos anuais (art. 201, § 6º, CF/88, redação original) a partir da Lei nº 8.114/90, não há valores a serem apurados em decorrência do título executivo judicial, sob o fundamento da extinção da obrigação.
8- DISPOSITIVO
DO EXPOSTO, DE OFÍCIO, DECLARO A INEXIGIBILIDADE DO TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL, NOS TERMOS DO ART. 741, II E PARÁGRAFO ÚNICO DO CPC, RESTANDO INDEVIDAS QUAISQUER DIFERENÇAS DECORRENTES DO DECISÓRIO PROFERIDO NA AÇÃO DE CONHECIMENTO. JULGO PREJUDICADO O RECURSO DE APELAÇÃO. SEM CONDENAÇÃO ÀS VERBAS SUCUMBENCIAIS, POR SE TRATAR DE BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA.
Decorrido o prazo recursal, tornem os autos ao Juízo de origem.
Intimem-se. Publique-se." (grifos nossos)

Após a interposição de agravo legal por parte da autora, a Oitava Turma, por maioria, manteve a decisão terminativa que declarara de ofício a inexigibilidade do título executivo judicial.


Por seu turno, o voto vencido (fls. 173/176), da lavra do Exmo. Desembargador Federal Newton De Lucca, foi assim fundamentado:


"Trata-se de embargos à execução opostos pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, nos quais se insurge a autarquia contra os cálculos apresentados pela exequente, sustentando a existência de excesso de execução.
O MM. Juiz a quo julgou improcedentes os embargos à execução (fls. 99/101).
A fls. 109/110, o Juízo de primeiro grau deu provimento aos embargos de declaração opostos pela parte autora, sem modificar, porém, o julgamento de improcedência dos embargos à execução.
Contra a sentença, interpôs o INSS a apelação de fls. 112/115, motivo pelo qual os autos subiram a esta E. Corte.
A autarquia, a fls. 124/125vº, apresentou manifestação, alegando nada ser devido à parte autora.
A fls. 129/139vº, o E. Desembargador Federal Relator, de ofício, declarou "A INEXIGIBILIDADE DO TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL, NOS TERMOS DO ART. 741, II E PARÁGRAFO ÚNICO DO CPC, RESTANDO INDEVIDAS QUAISQUER DIFERENÇAS DECORRENTES DO DECISÓRIO PROFERIDO NA AÇÃO DE CONHECIMENTO" (fls. 139), julgando "PREJUDICADO O RECURSO DE APELAÇÃO" (fls. 139).
Na sessão de 29/06/15, esta E. Oitava Turma, por maioria, negou provimento ao agravo interposto pela parte autora (V. Acórdão de fls. 147/155vº).
Em seu voto, expôs o E. Desembargador Federal Relator que "tanto a decisão do STF proferida em controle concentrado (ADIn, ADC ou ADPF), como aquela proferida em controle difuso v.g., Recurso Extraordinário), podem fundamentar a ineficácia do título executivo estampada no transcrito parágrafo único do art. 741 (nesse sentido, Antonio Carlos Marcato, Código de Processo Civil Interpretado, tópico 9, comentando o art. 741, pág. 2.102/2.103)" (fls. 151/151vº), e que "tanto no âmbito dos princípios constitucionais (balancing e integrity), quanto no âmbito do processo civil (art. 741, II e parágrafo único, CPC), especificamente no que diz respeito ao recálculo da renda mensal inicial, não subsiste a eficácia do título executivo que sustenta a execução." (fls. 153vº).
Peço venia ao E. Desembargador Federal Relator para divergir da orientação fixada em seu voto.
Como tive oportunidade de expor em outros precedentes sobre o tema, tenho a convicção de que o perfil constitucional traçado pela Constituição Federal de 1988 para o regime processual civil brasileiro em vigor é incompatível com a possibilidade de relativização da coisa julgada, sobretudo diante da relevantíssima garantia prevista no art. 5º, inc. XXXVI, da CF, ao estabelecer que "a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada".
Assim, mesmo sem desconhecer a elevada importância do debate teórico contemporâneo a respeito da interpretação, ponderação e aplicação de princípios constitucionais e de normas de direitos fundamentais, vejo com reservas a possibilidade de se promover uma ampla revisão jurisdicional de decisões transitadas em julgado, de maneira a autorizar a irrestrita renovação, dentro da mesma lide, de debates e atos processuais já exaustivamente desenvolvidos - não raro ao longo de inúmeros anos - durante a fase de conhecimento do processo.
Sem prolongar-me demasiadamente na análise da questão, adoto a posição externada pelo E. Ministro Celso de Mello no julgamento do Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 592.912/RS (C. STF, Segunda Turma, v.u., j. 03/04/12, DJe 21/11/12), cuja ementa ora reproduzo:
"RECURSO EXTRAORDINÁRIO - COISA JULGADA EM SENTIDO MATERIAL - INDISCUTIBILIDADE, IMUTABILIDADE E COERCIBILIDADE: ATRIBUTOS ESPECIAIS QUE QUALIFICAM OS EFEITOS RESULTANTES DO COMANDO SENTENCIAL - PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL QUE AMPARA E PRESERVA A AUTORIDADE DA COISA JULGADA - EXIGÊNCIA DE CERTEZA E DE SEGURANÇA JURÍDICAS - VALORES FUNDAMENTAIS INERENTES AO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO - EFICÁCIA PRECLUSIVA DA 'RES JUDICATA' - 'TANTUM JUDICATUM QUANTUM DISPUTATUM VEL DISPUTARI DEBEBAT' - CONSEQUENTE IMPOSSIBILIDADE DE REDISCUSSÃO DE CONTROVÉRSIA JÁ APRECIADA EM DECISÃO TRANSITADA EM JULGADO, AINDA QUE PROFERIDA EM CONFRONTO COM A JURISPRUDÊNCIA PREDOMINANTE NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - A QUESTÃO DO ALCANCE DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 741 DO CPC - MAGISTÉRIO DA DOUTRINA - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.
- A sentença de mérito transitada em julgado só pode ser desconstituída mediante ajuizamento de específica ação autônoma de impugnação (ação rescisória) que haja sido proposta na fluência do prazo decadencial previsto em lei, pois, com o exaurimento de referido lapso temporal, estar-se-á diante da coisa soberanamente julgada, insuscetível de ulterior modificação, ainda que o ato sentencial encontre fundamento em legislação que, em momento posterior, tenha sido declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, quer em sede de controle abstrato, quer no âmbito de fiscalização incidental de constitucionalidade.
- A superveniência de decisão do Supremo Tribunal Federal, declaratória de inconstitucionalidade de diploma normativo utilizado como fundamento do título judicial questionado, ainda que impregnada de eficácia 'ex tunc' - como sucede, ordinariamente, com os julgamentos proferidos em sede de fiscalização concentrada (RTJ 87/758 - RTJ 164/506-509 - RTJ 201/765) -, não se revela apta, só por si, a desconstituir a autoridade da coisa julgada, que traduz, em nosso sistema jurídico, limite insuperável à força retroativa resultante dos pronunciamentos que emanam, 'in abstracto', da Suprema Corte. Doutrina. Precedentes.
- O significado do instituto da coisa julgada material como expressão da própria supremacia do ordenamento constitucional e como elemento inerente à existência do Estado Democrático de Direito."
(AgR no RE nº 592.912/RS, Segunda Turma, Rel. Min. Celso de Mello, v.u., j. 03/04/12, DJe 21/11/12, grifos meus)
Na oportunidade, expôs o E. Ministro Celso de Mello:
"Torna-se importante rememorar, considerado esse contexto processual, o alto significado de que se reveste, em nosso sistema jurídico, o instituto da 'res judicata', que constitui atributo específico da jurisdição e que se projeta na dupla qualidade que tipifica os efeitos emergentes do ato sentencial: a imutabilidade, de um lado, e a coercibilidade, de outro.
(...)
Nem se diga, ainda, para legitimar a pretensão jurídica da parte ora recorrente, que esta poderia invocar, em seu favor, a tese da 'relativização' da autoridade da coisa julgada, em especial da (impropriamente) denominada 'coisa julgada inconstitucional', como sustentam alguns autores (JOSÉ AUGUSTO DELGADO, 'Pontos Polêmicos das Ações de Indenização de Áreas Naturais Protegidas - Efeitos da coisa julgada e os princípios constitucionais', 'in' Revista de Processo nº 103/9-36; CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO, 'Relativizar a Coisa Julgada Material', 'in' Revista de Processo nº 109/9-38; HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, 'A Reforma do Processo de Execução e o Problema da Coisa Julgada Inconstitucional (Código de Processo Civil, artigo 741, Parágrafo Único)', 'in' Revista dos Tribunais, vol. 841/56/76, ano 94; TERESA ARRUDA ALVIM WAMBIER e JOSÉ MIGUEL GARCIA MEDINA, 'O Dogma da Coisa Julgada - Hipóteses de Relativização', 2003, RT; TEORI ALBINO ZAVASCKI, 'Embargos à Execução com Eficácia Rescisória: Sentido e Alcance do Art. 741, Parágrafo Único, Do CPC', 'in' Revista de Processo, vol. 125/79-91, v.g.).
Tenho para mim que essa postulação, se admitida, antagonizar-se-ia com a proteção jurídica que a ordem constitucional dispensa, em caráter tutelar, à 'res judicata'. Na realidade, a desconsideração da 'auctoritas rei judicatae' implicaria grave enfraquecimento de uma importantíssima garantia constitucional que surgiu, de modo expresso, em nosso ordenamento positivo, com a Constituição de 1934.
A pretendida 'relativização' da coisa julgada - tese que tenho repudiado em diversos julgamentos (monocráticos) proferidos no Supremo Tribunal Federal (RE 554.111/RS - RE 594.350/RS - RE 594.892/RS - RE 594.929/RS - RE 595.565/RS, dos quais sou Relator) - provocaria consequências altamente lesivas à estabilidade das relações intersubjetivas, à exigência de certeza e de segurança jurídicas e à preservação do equilíbrio social, valendo destacar, em face da absoluta pertinência de suas observações, a advertência de ARAKEN DE ASSIS ('Eficácia da Coisa Julgada Inconstitucional', 'in' Revista Jurídica nº 301/7-29, 12-13):
'Aberta a janela, sob o pretexto de observar equivalentes princípios da Carta Política, comprometidos pela indiscutibilidade do provimento judicial, não se revela difícil prever que todas as portas se escancararão às iniciativas do vencido. O vírus do relativismo contaminará, fatalmente, todo o sistema judiciário. Nenhum veto, 'a priori', barrará o vencido de desafiar e afrontar o resultado precedente de qualquer processo, invocando hipotética ofensa deste ou daquele valor da Constituição. A simples possibilidade de êxito do intento revisionista, sem as peias da rescisória, multiplicará os litígios, nos quais o órgão judiciário de 1º grau decidirá, preliminarmente, se obedece, ou não, ao pronunciamento transitado em julgado do seu Tribunal e até, conforme o caso, do Supremo Tribunal Federal. (...)
Por tal motivo, mostra-se flagrante o risco de se perder qualquer noção de segurança e de hierarquia judiciária. (...)'"
(AgR no RE nº 592.912/RS, Segunda Turma, Rel. Min. Celso de Mello, v.u., j. 03/04/12, DJe 21/11/12, grifos meus)
Outrossim, filio-me ao entendimento doutrinário segundo o qual a aplicação do art. 741, parágrafo único, do CPC somente é possível nas hipóteses em que a decisão do C. STF - que declara a inconstitucionalidade da norma sobre o qual se funda o título judicial - for anterior ao trânsito em julgado do decisum exequendo. Sobre o tema, reproduzo a abalizada opinião dos Professores Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery:
"Aplicação do CPC 741 par.ún. Abstraindo-se da inconstitucionalidade da norma, apontada nos dois comentários precedentes, o que fazemos apenas para argumentar, não seria materialmente inconstitucional a norma ora comentada quando aplicada apenas numa situação: somente a decisão anterior do STF, proclamando a inconstitucionalidade de lei ou de ato normativo ou a aplicação ou interpretação de norma tida como incompatível com a CF em ADIn (v. comentários seguintes) é que poderia atingir o título executivo judicial que transitasse em julgado posteriormente à decisão do STF. Apenas e unicamente nesse caso é que teria aplicabilidade a norma sob análise - reiteramos que o raciocínio é ad argumentandum tantum."
("Código de processo civil comentado e legislação extravagante", 13ª edição, Revista dos Tribunais, 2013, pp. 1.298/1.299, grifos meus)
No mesmo sentido, ensina o Professor Cândido Rangel Dinamarco, com brilhantismo:
"Um caso muito específico de inexistência de título executivo, expresso em lei, é o da sentença 'fundada em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal ou em aplicação ou interpretação tidas como incompatíveis com a Constituição Federal' (CPC, art. 475-L, §1º, e 741, par.). Os parágrafos que assim dispõem, de deplorável qualidade técnica porque redigidos sem o mínimo conhecimento da teoria do título executivo e do conceito de inexigibilidade, têm o significado de mandar que se considere inexistente o título nas hipóteses ali consideradas; não tem o menor significado a idéia de que um direito deixasse de ser exigível quando o título fosse assim viciado. Pelo aspecto substancial, essa arbitrária disposição ao menos resvala na inconstitucionalidade por atentar contra a garantia constitucional da coisa julgada. Sua única salvação consistirá em interpretá-la restritivamente, no sentido de que não há título com eficácia para a execução forçada quando a sentença houver sido proferida (a) depois de declarada a inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal ao cabo de um controle concentrado (ação direta), porque esse julgamento produz a ineficácia da norma inconstitucional, retirando-a incontinenti da ordem jurídica; b) depois de suspensa a eficácia da norma inconstitucional pelo Senado Federal, em caso de controle difuso (Const., art. 52, inc. X). Nesses dois casos, subtraída a eficácia da lei pelo órgão máximo encarregado da vigilância constitucional, é até natural que se repute privado de eficácia um julgado com apoio na lei declarada inconstitucional. Se porém a sentença condenatória foi proferida antes, passou em julgado e só depois disso sobreveio a declaração de inconstitucionalidade por um daqueles meios, o parágrafo do art. 741 não pode ter aplicação porque seria inconstitucional ele próprio (garantia constitucional da coisa julgada - Const., art. 5º, inc. XXXVI - supra, n. 955)."
("Instituições de Direito Processual Civil", vol. IV, 3ª edição, Editora Malheiros, 2009, pp. 792/793, grifos meus)
In casu, o processo de conhecimento foi ajuizado em 07/11/95, tendo o V. acórdão da 2ª Turma deste E. Tribunal transitado em julgado em 11/11/02 (fls. 101 do apenso).
A sentença proferida em fase de conhecimento declarou que "a Carta Magna, em seus parágrafos no art. 201, assegurou aos beneficiários a correção monetária de todos os salários de contribuição, a fim de preservar em caráter permanente o valor real dos benefícios, tornando inadmissível e percepção de benefício mensal inferior ao salário mínimo e garantindo a gratificação natalina igual aos proventos do mês de dezembro" (fls. 59 do apenso). Registrou, ainda, que "O Egrégio Tribunal Federal de Recursos já pontificou: 'No primeiro reajuste do benefício previdenciário, deve-se aplicar o índice integral do aumento verificado, independentemente do mês de concessão, considerando nos aumentos subsequentes o salário mínimo então atualizados'." (fls. 59 do apenso).
Por fim, o pedido inicial foi julgado procedente, nos seguintes termos: "Portanto, no caso em exame, deve ser revista a renda mensal inicial do benefício, para adequá-lo aos termos da legislação supra vigente, apurando-se em liquidação de sentença as diferenças porventura ocorridas, que serão pagas ao autor, incidentes, também, sobre os abonos e, inclusive às concernentes ao percentual de 147,06%, acrescidas de juros de seis por cento ao ano, a partir da citação, e correção monetária, com base nos índices oficiais determinados pela lei, desde a data em que verificada a diferença, observada a prescrição quinquenal, contada da data da distribuição desta ação." (fls. 59/60 do apenso).
O V. acórdão da 2ª Turma deste E. Tribunal, no julgamento da apelação interposta pela autarquia e do recurso adesivo do autor, assim decidiu: "Por tais fundamentos, dou provimento à apelação da autarquia, para excluir da condenação a aplicação da Súmula 260 do TRF, em razão da prescrição das diferenças, e dou parcial provimento ao recurso adesivo do autor, apenas para explicitar o critério de incidência dos juros de mora." (fls. 98 do apenso).
A sentença, portanto, foi mantida quanto à determinação de aplicação de correção monetária a todos os salários-de-contribuição.
Logo, inexistindo declaração de inconstitucionalidade pelo C. Supremo Tribunal Federal quanto à referida matéria, pronunciada em sede de controle concentrado, em data anterior à prolação da decisão exequenda, entendo impossível a aplicação do art. 741, II e parágrafo único, CPC/73 à hipótese dos presentes autos.
Desta forma, tenho que o título executivo, o qual regularmente constituído por processo judicial desenvolvido com observância ao contraditório e ao devido processo legal, foi formado de forma legítima, sendo apto a amparar a prática de atos de execução.
Por este motivo, penso que o agravo interposto pela parte autora merece provimento, para que apelação, julgada prejudicada na decisão agravada, seja submetida a apreciação judicial.
Ante o exposto, voto no sentido de dar provimento ao agravo, para conhecer da apelação.
É o meu voto."

Da análise das transcrições acima, verifica-se que a divergência ocorrida no julgamento pela Oitava Turma se refere à possibilidade de aplicação do artigo 741, inciso II e parágrafo único do CPC de 1973, ao presente caso.

De início, observo que o trânsito em julgado do acórdão proferido no processo de conhecimento se deu em 11/11/2002 (fls. 101 dos autos em apenso), ou seja, após a entrada em vigor da MP nº 2.180-35, de 24.08.2001.

Assim, não se aplica o óbice da Súmula nº 497 do C. STJ, que assim dispõe: "O parágrafo único do art. 741 do CPC não se aplica às sentenças transitadas em julgado em data anterior à da sua vigência".

Desse modo, embora não haja declaração de inconstitucionalidade pelo C. STF, o voto majoritário afastou a aplicação da correção em todos os salários-de-contribuição, sobretudo com a utilização do ORTN/OTN, pois tal interpretação iria de encontro à Constituição Federal.

De fato, tendo em vista que a aposentadoria da parte autora foi concedida em 18/06/1974, e a ORTN/OTN foi implementada pela Lei nº 6.423/1977, não poderia ter sido utilizado tal índice na correção do salários-de-contribuição.

Contudo, em que pese a argumentação do voto majoritário, entendo no presente caso ser inaplicável a regra do artigo 741, inciso II, e paragrafo único, do CPC de 1973.

Isto porque, ao contrário do que constou do voto majoritário, a sentença proferida na ação de conhecimento em nenhum momento determinou a correção dos salários-de-contribuição com base no ORTN/OTN, tendo apenas determinado a atualização dos salários-de-contribuição de acordo com a legislação vigente.

Destarte, foi o MM. Juízo da Execução, às fls. 80, que determinou de forma errônea a correção dos salários-de-contribuição com base no ORTN/OTN.

Assim, como bem apontado pelo INSS às fls. 124/128, inexiste qualquer determinação no título executivo no sentido de atualizar os salários-de-contribuição pelo ORTN/OTN. Por conseguinte, o título executivo não apresenta qualquer incompatibilidade com a Constituição Federal.

Com efeito, foi a decisão proferida pelo Juízo da Execução que determinou a aplicação do ORTN/OTN, ultrapassando os limites impostos pela coisa julgada formada no processo de conhecimento.

Desse modo, a meu ver, descabe falar em declaração de inexigibilidade do título executivo judicial, com base no artigo 741, II, e parágrafo único do CPC de 1973.

Portanto, ainda que por fundamento diverso, entendo deva prevalecer o voto vencido, que não declarava a inexigibilidade do título executivo e conhecia da apelação do INSS.

Por fim, eventual alegação do INSS de que inexistem parcelas vencidas, em razão de já ter sido feita a revisão administrativa do benefício, deverá ser objeto de apreciação da Turma Julgadora por ocasião do julgamento da apelação, tendo em vista que tal questão não pode ser apreciada nos presentes embargos infringentes, por não ter sido objeto de divergência.

Ante o exposto, dou provimento aos embargos infringentes, a fim de que prevaleça o voto vencido, que dava provimento ao agravo legal para conhecer da apelação da Autarquia, com a consequente remessa dos autos à E. Oitava Turma (órgão judicante natural), para que possa haver seu pronunciamento quanto ao mérito do recurso de apelação do INSS.

É Como Voto.


TORU YAMAMOTO
Desembargador Federal


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