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DIREITO CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. CONTAGEM RECÍPROCA. COMPENSAÇÃO FINANCEIRA ENTRE REGIMES PREVIDENCIÁRIOS. TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANT...

Data da publicação: 03/11/2025, 07:08:52

DIREITO CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. CONTAGEM RECÍPROCA. COMPENSAÇÃO FINANCEIRA ENTRE REGIMES PREVIDENCIÁRIOS. TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR A 1991. NECESSIDADE DE INDENIZAÇÃO DAS CONTRIBUIÇÕES. CERTIDÃO DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO COM EFEITO DECLARATÓRIO. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação de São Paulo Previdência – SPPREV contra sentença que julgou improcedente pedido de compensação financeira entre regimes previdenciários no valor de R$ 26.451,48, referente ao período de atividade rural de 31/10/1964 a 20/11/1973, reconhecido pelo INSS na CTC nº 21730002.1.00065/98-0, emitida em 28/05/1998, em favor do servidor estadual José Antônio de Oliveira Neto. A sentença condenou a autora em honorários de 10% sobre o valor da causa. A recorrente sustenta distinção entre indenização pelo segurado para fins de contagem recíproca e repasse financeiro entre regimes após a aposentadoria, afirma a fé pública da CTC e requer a compensação. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO A questão em discussão consiste em definir: (i) se a ausência de ressalva na CTC quanto à necessidade de indenização das contribuições autoriza a contagem recíproca do período rural anterior a 1991; e (ii) se, ausente comprovação de indenização, há direito à compensação financeira entre o RGPS e o RPPS. III. RAZÕES DE DECIDIR A contagem recíproca entre RGPS e RPPS está condicionada à compensação financeira, conforme o art. 201, § 9º, da CF/1988, regulamentada pela Lei nº 9.796/1999 e pelo Decreto nº 10.188/2019. O cômputo de tempo de serviço rural anterior à Lei nº 8.213/1991 para fins de contagem recíproca exige a indenização das contribuições, nos termos do art. 96, IV, da Lei nº 8.213/1991. O STJ, no REsp 1.682.682 (Tema 609), firmou tese no sentido de que a expedição de CTC atesta o fato, mas o cômputo do tempo rural para contagem recíproca depende do comprovante de pagamento das contribuições, mediante indenização calculada na forma do art. 96, IV, da Lei nº 8.213/1991. O art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/1991 permite o aproveitamento de tempo rural sem contribuições apenas no âmbito do RGPS. A migração para o RPPS demanda indenização. A CTC expedida em 28/05/1998 constitui ato declaratório. A ausência de ressalva não dispensa a exigência legal de indenização. Não demonstrado o recolhimento das contribuições relativas ao período de 31/10/1964 a 20/11/1973, inexiste direito à compensação financeira pretendida. A alegação de excesso do Decreto nº 3.112/1999 não procede, pois a exigência de indenização decorre diretamente do art. 201, § 9º, da CF/1988. A gestão do RPPS exige a verificação da regularidade contributiva na concessão do benefício, à luz do art. 40 da CF/1988. Mantida a improcedência. Majorados os honorários em 1% sobre a sucumbência, nos termos do art. 85, § 11, do CPC. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Majoração dos honorários advocatícios em 1% (um por cento), nos termos do art. 85, § 11, do CPC. Tese de julgamento: “1. O cômputo, para contagem recíproca, de tempo de serviço rural anterior a 1991 exige a indenização das contribuições na forma do art. 96, IV, da Lei nº 8.213/1991; 2. A CTC tem natureza declaratória e não dispensa a comprovação do recolhimento; 3. Ausente a indenização, não há direito à compensação financeira entre regimes previdenciários.” Legislação relevante citada: CF/1988, art. 201, § 9º; CF/1988, art. 40; Lei nº 8.213/1991, art. 96, IV; Lei nº 8.213/1991, art. 55, § 2º; Lei nº 9.796/1999; Decreto nº 10.188/2019; Decreto nº 3.112/1999; CPC, art. 85, § 11. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.682.682/SP, Rel. Min. Og Fernandes, Primeira Seção, j. 25.04.2018, DJe 03.05.2018 (Tema 609); TRF-3, ApCiv 0000387-78.2004.4.03.6103, Rel. Des. Fed. Wilson Zauhy Filho, Primeira Turma, j. 17.02.2022, DJe 23.02.2022; STF, MS 28917 AgR, Rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, j. 13.10.2015, DJe 28.10.2015; STJ, REsp 1.579.060/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, j. 23.02.2016, DJe 30.05.2016. (TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5007915-33.2017.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal HERBERT CORNELIO PIETER DE BRUYN JUNIOR, julgado em 15/10/2025, DJEN DATA: 27/10/2025)


Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região

1ª Turma


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007915-33.2017.4.03.6100

RELATOR: Gab. 41 - DES. FED. HERBERT DE BRUYN

APELANTE: SAO PAULO PREVIDENCIA

Advogado do(a) APELANTE: ROMULO SILVA DUARTE - SP423402

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

OUTROS PARTICIPANTES:


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região

1ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007915-33.2017.4.03.6100

RELATOR: Gab. 41 - DES. FED. HERBERT DE BRUYN

APELANTE: SAO PAULO PREVIDENCIA

Advogado do(a) APELANTE: ROMULO SILVA DUARTE - SP423402

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

  

R E L A T Ó R I O

O Senhor Desembargador Federal Herbert de Bruyn (Relator): Trata-se de ação proposta por São Paulo Previdência – SPPREV em face do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, com o intuito de obter compensação financeira entre os regimes previdenciários no montante de R$ 26.451,48 (vinte e seis mil, quatrocentos e cinquenta e um reais e quarenta e oito centavos), relativa ao tempo de serviço rural exercido entre 31 de outubro de 1964 e 20 de novembro de 1973, reconhecido pela autarquia federal por meio da Certidão de Tempo de Contribuição (CTC) nº 21730002.1.00065/98-0, emitida em 28 de maio de 1998, em favor do servidor estadual José Antônio de Oliveira Neto.

O pedido foi julgado improcedente, condenando-se a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, do CPC.

Inconformada, apelou a SPPREV, alegando que há distinção jurídica entre a exigência de indenização pelo trabalhador rural para fins de contagem recíproca e o direito autônomo da autarquia estadual à compensação financeira após a concessão da aposentadoria. Argumenta que a sentença se equivocou ao aplicar precedentes que tratam da necessidade de indenização pelo segurado, enquanto a controvérsia dos autos diz respeito à fase posterior, ou seja, ao repasse financeiro entre os regimes de previdência. Destacou que a CTC emitida pelo INSS não continha qualquer ressalva quanto à necessidade de indenização, possuindo fé pública e devendo produzir todos os efeitos legais, conforme os princípios da segurança jurídica e da confiança legítima. Reforça que a negativa do INSS causa desequilíbrio financeiro e atuarial ao regime próprio de previdência, violando o art. 40 da CF. Assim, requer o provimento do recurso, determinando-se a compensação financeira em seu favor.

Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.

É o relatório.

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região

1ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007915-33.2017.4.03.6100

RELATOR: Gab. 41 - DES. FED. HERBERT DE BRUYN

APELANTE: SAO PAULO PREVIDENCIA

Advogado do(a) APELANTE: ROMULO SILVA DUARTE - SP423402

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

V O T O

O Senhor Desembargador Federal Herbert de Bruyn (Relator): Prevista no §9º, do art. 201, da Constituição da República, a contagem recíproca do tempo de contribuição entre o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) e os Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS), bem como entre os Regimes Próprios entre si está condicionada à necessária compensação financeira, estando regulamentada pela Lei nº 9.796/1999 e pelo Decreto nº 10.188/2019.

A controvérsia em exame versa sobre a compensação financeira relativa ao período de atividade rural prestada pelo servidor estadual José Antônio de Oliveira Neto, cujo tempo de serviço foi reconhecido pelo INSS por meio da CTC nº 21730002.1.00065/98-0, em cumprimento à sentença proferida nos autos da ação declaratória n. 945/95 (ID 104927768, p. 4). O referido documento foi expedido sem ressalva quanto à necessidade de indenização das contribuições previdenciárias.

Inicialmente, destaca-se que a relação jurídica nos presentes autos não diz respeito à comprovação dos requisitos para fins de contagem recíproca, mas sim à compensação financeira entre os regimes previdenciários, nos termos da legislação vigente.

É pacífico o entendimento dos Tribunais Superiores no sentido de que, para que o tempo de serviço rural anterior a 1991 possa ser considerado, é necessário o pagamento de indenização das contribuições previdenciárias relativas ao período que se pretende reconhecer, conforme o art. 96, IV, da Lei n. 8.213/1991.

O Superior Tribunal de Justiça, inclusive, no julgamento do REsp 1.682.678 (Tema 609), sob o rito dos recursos repetitivos, assim entendeu:

“PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ALEGAÇÃO DE MATÉRIA CONSTITUCIONAL. DESCABIMENTO. USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO STF. CONTAGEM RECÍPROCA. SERVIDOR PÚBLICO. TRABALHO RURÍCOLA PRESTADO EM PERÍODO ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI N. 8.213/1991. DIREITO À EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO. CABIMENTO. CÔMPUTO DO TEMPO PARA CONTAGEM RECÍPROCA. EXIGÊNCIA DE RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES NA FORMA PREVISTA PELO ART. 96, IV, DA LEI N. 8.213/1991. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO EM PARTE E, NESSA EXTENSÃO, NÃO PROVIDO. RECURSO JULGADO SOB A SISTEMÁTICA DO ART. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015, C/C O ART. 256-N E SEGUINTES DO REGIMENTO INTERNO DO STJ.

1. Na situação em exame, os dispositivos legais cuja aplicação é questionada nos cinco recursos especiais, com a tramitação que se dá pela sistemática dos repetitivos (REsps 1.676.865/RS, 1.682.671/SP, 1.682.672/SP, 1.682.678/SP e 1.682.682/SP), terão sua resolução efetivada de forma conjunta.
2. Não se pode conhecer da insurgência na parte em que pleiteia o exame de matéria constitucional, sob pena de, assim procedendo, esta Corte usurpar a competência do STF.
3. Reconhecido o tempo de serviço rural, não pode o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS se recusar a cumprir seu dever de expedir a certidão de tempo de serviço. O direito à certidão simplesmente atesta a ocorrência de um fato, seja decorrente de um processo judicial (justificação judicial), seja por força de justificação de tempo de serviço efetivada na via administrativa, sendo questão diversa o efeito que essa certidão terá para a esfera jurídica do segurado.

4. Na forma da jurisprudência consolidada do STJ, "nas hipóteses em que o servidor público busca a contagem de tempo de serviço prestado como trabalhador rural para fins de contagem recíproca, é preciso recolher as contribuições previdenciárias pertinentes que se buscam averbar, em razão do disposto nos arts. 94 e 96, IV, da Lei 8.213/1991" (REsp 1.579.060/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 23/2/2016, DJe 30/5/2016).

5. Descabe falar em contradição do art. 96, IV, com o disposto pelo art. 55, § 2º, da mesma Lei n. 8.213/1991, visto que são coisas absolutamente diversas: o art. 96, IV, relaciona-se às regras da contagem recíproca de tempo de serviço, que se dá no concernente a regimes diferenciados de aposentadoria; o art. 55 refere-se às regras em si para concessão de aposentadoria por tempo de serviço dentro do mesmo regime, ou seja, o Regime Geral da Previdência Social.

6. É descabido o argumento trazido pelo amicus curiae de que a previsão contida no art. 15, I e II, da Lei Complementar n. 11/1971, quando já previa a obrigatoriedade de contribuição previdenciária, desfaz a premissa de que o tempo de serviço rurícola anterior à vigência da Lei n. 8.213/1991 não seria contributivo. É que a contribuição prevista no citado dispositivo legal se reporta a uma das fontes de custeio da Previdência Social, cuja origem decorre das contribuições previdenciárias de patrocinadores, que não os próprios segurados. Ora, acolher tal argumento significaria dizer que, quanto aos demais benefícios do RGPS, por existirem outras fontes de custeio (inclusive receitas derivadas de concursos de prognósticos), o sistema já seria contributivo em si, independentemente das contribuições obrigatórias por parte dos segurados.

7. Não se há de falar em discriminação entre o servidor público e o segurado vinculado ao Regime Geral de Previdência Social, porque, para o primeiro, no tocante ao tempo de serviço rurícola anterior a 1991, há recolhimento das contribuições previdenciárias, o que não é exigido para o segundo. Cuida-se de regimes diferentes, e, no caso do segurado urbano e do rurícola, nada obstante as diferenças de tratamento quanto à carência e aos requisitos para a obtenção dos benefícios, ambos se encontram vinculados ao mesmo Regime Geral da Previdência Social, o que não ocorre para o servidor estatutário.

8. Tese jurídica firmada: O segurado que tenha provado o desempenho de serviço rurícola em período anterior à vigência da Lei n. 8.213/1991, embora faça jus à expedição de certidão nesse sentido para mera averbação nos seus assentamentos, somente tem direito ao cômputo do aludido tempo rural, no respectivo órgão público empregador, para contagem recíproca no regime estatutário se, com a certidão de tempo de serviço rural, acostar o comprovante de pagamento das respectivas contribuições previdenciárias, na forma da indenização calculada conforme o dispositivo do art. 96, IV, da Lei n. 8.213/1991.

9. Na hipótese dos autos, o aresto prolatado pelo Tribunal de origem está em conformidade com o posicionamento desta Corte Superior, porque, da leitura do voto condutor e do acórdão que resultou das suas premissas, não há determinação para que o tempo de serviço constante da respectiva certidão seja contado como tal para o caso de contagem recíproca, pelo que não tem esse efeito, salvo se houver o recolhimento das contribuições.
10. Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, não provido.

11. Recurso julgado sob a sistemática do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015 e do art. 256-N e seguintes do Regimento Interno do STJ.”

(REsp 1.682.682, Primeira Seção, Rel. Ministro Og Fernandes, v.m., j. 25/04/2018, p. 03/05/2018, grifos nossos)

Nesse sentido, o art. 55, §2º, da Lei n. 8.213/1991 autoriza a contagem de tempo rural sem contribuições apenas dentro do RGPS mas, para migração ao RPPS e futura aposentadoria estatutária, a indenização é obrigatória.

No presente apelo, argumenta a recorrente que a CTC n. 21730002.1.00065/98-0, emitida pela autarquia previdenciária, gera presunção de ter havido, por parte do INSS, a devida apuração das contribuições realizadas pelo servidor-segurado quanto ao tempo de serviço rural realizado entre 31/10/1964 e 20/11/1973, uma vez que não foi ressalvada a necessidade de indenização.

A CTC ora em discussão foi emitida em 28/05/1998, em decorrência da decisão judicial proferida nos autos do processo n.º 0034968-52.1996.4.03.9999 (ação declaratória n.º 0945/95) e, no tocante ao período reconhecido como atividade rural, procedeu à sua averbação e contagem. Entretanto, trata-se de um ato meramente declaratório, que apenas certifica a existência do tempo laborado, não conferindo automaticamente o direito à contagem recíproca entre regimes.

A argumentação da apelante no sentido de que o Decreto nº 3.112/1999 -- ao exigir indenização ao RGPS -- excede os limites do poder regulamentar não se sustenta, uma vez que a referida imposição deriva diretamente do comando constitucional insculpido no art. 201, §9º da Constituição de 1988, com a redação da EC 20/98:

“§ 2º - Para efeito de aposentadoria, é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos sistemas de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei.” (grifos nossos)

Portanto, não prospera a alegação de que a omissão da CTC quanto à necessidade de indenização implicaria a presunção de sua não obrigatoriedade. Caso se aceitasse a tese da apelante, a mera apresentação da CTC garantiria automaticamente a contagem recíproca do tempo de contribuição, sem a observância das exigências legais. Assim, não tendo havido a comprovação do recolhimento das contribuições exigidas, não faz jus a parte autora, à compensação financeira requerida.

Ademais, revela-se juridicamente questionável a concessão da aposentadoria, pelo Estado, sem a devida apuração da regularidade das contribuições previdenciárias, em afronta ao dever de diligência que lhe incumbe na gestão do RPPS, nos termos do art. 40 da Constituição Federal. Referido entendimento é corroborado pelo Parecer 499/2015, exarado pela PGE-SP, que assevera “37. Ora, se a compensação financeira é atributo constitucional da contagem recíproca, conforme art. 201, § 9º, da Constituição Federal, não é possível a contagem no serviço público de tempo de serviço rural não indenizado ao INSS” (ID 104927935, p. 22). No mesmo sentido, manifesta-se a Diretoria de Benefícios da SPPREV, ao consignar que “haverá IMPOSSIBILIDADE de solicitação de compensação previdenciária relativamente ao período constante desta certidão, visto que foi elaborada após 10/1996 e não houve indenização do referido período ao INSS” (ID 104927935, p. 02).

Este Tribunal Regional Federal da 3ª Região já teve a oportunidade de se manifestar em situações semelhantes, conforme abaixo:

ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. SERVIDOR. CONTAGEM RECÍPROCA. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. AVERBAÇÃO. INDENIZAÇÃO DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. EFEITOS DE APOSENTADORIA NO REGIME PRÓPRIO. CÁLCULO DE INDENIZAÇÃO. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL À ÉPOCA DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. PRECEDENTES TRF-3. LEI 9.032/95. MP 1.523/1996. EXCLUSÃO DA INCIDÊNCIA DE JUROS E MULTA. BASE DE CÁLCULO. APELAÇÃO DO AUTOR PROVIDA. APELAÇÃO E REMESSA NECESSÁRIA NÃO PROVIDAS.

(...) 5. Tem-se que a necessidade de indenização do tempo de trabalho rural advém da própria Constituição Federal, que prevê a compensação entre os diversos regimes previdenciários, no caso, o Regime Geral e o Regime Próprio dos Servidores: "Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) [...] § 9º Para efeito de aposentadoria, é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos regimes de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei. (Incluído dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) [...]”

6. Da leitura do dispositivo, se dessume que é possível a averbação de tempo de contribuição prestado no Regime Geral de Previdência Social para obter aposentadoria no Regime Próprio de Previdência Social (ou vice e versa), desde que observados os critérios da legislação previdenciária.

7. A questão se encontra pacificada no âmbito do STF, quanto ao cômputo de tempo de serviço rural para fins de aposentadoria no Regime Próprio, pela necessidade de recolhimento das contribuições previdenciárias como condição para a contagem recíproca de tempo de serviço rural, exercido anteriormente à Lei nº 8.213/91. Precedente: MS 28917 AgR, Relator(a): ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 13/10/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-216 DIVULG 27-10-2015 PUBLIC 28-10-2015.

8. O STJ, por sua vez, no REsp 1682671, Tema Repetitivo 609 (trânsito em julgado em 28/06/2018), fixou a seguinte tese: “O segurado que tenha provado o desempenho de serviço rurícola em período anterior à vigência da Lei n. 8.213/1991, embora faça jus à expedição de certidão nesse sentido para mera averbação nos seus assentamentos, somente tem direito ao cômputo do aludido tempo rural, no respectivo órgão público empregador, para contagem recíproca no regime estatutário se, com a certidão de tempo de serviço rural, acostar o comprovante de pagamento das respectivas contribuições previdenciárias, na forma da indenização calculada conforme o dispositivo do art. 96, IV, da Lei n. 8.213/1991”.

9. Há que se diferenciar o caso dos autos, da hipótese do art. 55, §2º, que permite a dispensa de indenização para a contagem recíproca de tempo de serviço rural para fins de concessão de aposentadoria no mesmo Regime Geral de Previdência Social, diferentemente, o caso dos autos se trata de contagem recíproca do tempo de serviço rural para fins de aposentadoria no Regime Próprio de Previdência Social.

10. A normatização infraconstitucional do direito à contagem recíproca de tempo de serviço surgiu com a edição da Lei 8.213/91. O regramento sobre a matéria contido na Lei de Benefícios da Previdência Social sofreu modificações ao longo do tempo.

11. O regime da redação original do art. 96, inciso IV, da Lei 8.213/91, previu na seção relativa à contagem recíproca de tempo de serviço, como regra geral, a necessidade da indenização das contribuições relativas ao tempo de serviço anterior ou posterior à obrigatoriedade de filiação à Previdência Social para que ele pudesse ser computado. Contudo, no inciso V, a lei previa uma exceção, no caso de tempo de atividade rural, que poderia ser computado sem o recolhimento das contribuições correspondentes.

12. Por seu turno, o regime instituído pela MP 1.523, de 11 de outubro de 1996, posteriormente convertida na Lei 9.528/97, sofreu modificações substanciais em relação à contagem recíproca. A saber, foi extirpado o inciso V do art. 96 da Lei 8.213/91, aquele que previa o cômputo do tempo de serviço de trabalhador rural/pescador anterior à lei sem o recolhimento das contribuições, para fins de contagem recíproca. Ao mesmo tempo, foi mantida a regra do inciso IV do mesmo artigo, prevendo expressamente a necessidade de indenização das contribuições previdenciárias relativas ao período anterior à filiação obrigatória à Previdência como requisito para a contagem de tempo de contribuição no serviço público.

(...) 21 Apelação do autor provida. Apelação do INSS e remessa necessária não provida.”

(Apelação Cível 0000387-78.2004.4.03.6103, Primeira Turma, Rel. Des. Federal Wilson Zauhy Filho, v.m., j. 17/02/2022, p. 23/02/2022, grifos nossos).

Mantida a sentença impugnada, majoro os honorários em 1% do valor correspondente à sucumbência anteriormente fixada, nos termos do §11, do art. 85, do CPC.

Ante o exposto, nego provimento à apelação.

É o meu voto.

Herbert de Bruyn

Desembargador Federal Relator



E M E N T A

DIREITO CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. CONTAGEM RECÍPROCA. COMPENSAÇÃO FINANCEIRA ENTRE REGIMES PREVIDENCIÁRIOS. TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR A 1991. NECESSIDADE DE INDENIZAÇÃO DAS CONTRIBUIÇÕES. CERTIDÃO DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO COM EFEITO DECLARATÓRIO. RECURSO DESPROVIDO.

I. CASO EM EXAME

  1. Apelação de São Paulo Previdência – SPPREV contra sentença que julgou improcedente pedido de compensação financeira entre regimes previdenciários no valor de R$ 26.451,48, referente ao período de atividade rural de 31/10/1964 a 20/11/1973, reconhecido pelo INSS na CTC nº 21730002.1.00065/98-0, emitida em 28/05/1998, em favor do servidor estadual José Antônio de Oliveira Neto.

  2. A sentença condenou a autora em honorários de 10% sobre o valor da causa. A recorrente sustenta distinção entre indenização pelo segurado para fins de contagem recíproca e repasse financeiro entre regimes após a aposentadoria, afirma a fé pública da CTC e requer a compensação.

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO

  1. A questão em discussão consiste em definir: (i) se a ausência de ressalva na CTC quanto à necessidade de indenização das contribuições autoriza a contagem recíproca do período rural anterior a 1991; e (ii) se, ausente comprovação de indenização, há direito à compensação financeira entre o RGPS e o RPPS.

III. RAZÕES DE DECIDIR

  1. A contagem recíproca entre RGPS e RPPS está condicionada à compensação financeira, conforme o art. 201, § 9º, da CF/1988, regulamentada pela Lei nº 9.796/1999 e pelo Decreto nº 10.188/2019.

  2. O cômputo de tempo de serviço rural anterior à Lei nº 8.213/1991 para fins de contagem recíproca exige a indenização das contribuições, nos termos do art. 96, IV, da Lei nº 8.213/1991.

  3. O STJ, no REsp 1.682.682 (Tema 609), firmou tese no sentido de que a expedição de CTC atesta o fato, mas o cômputo do tempo rural para contagem recíproca depende do comprovante de pagamento das contribuições, mediante indenização calculada na forma do art. 96, IV, da Lei nº 8.213/1991.

  4. O art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/1991 permite o aproveitamento de tempo rural sem contribuições apenas no âmbito do RGPS. A migração para o RPPS demanda indenização.

  5. A CTC expedida em 28/05/1998 constitui ato declaratório. A ausência de ressalva não dispensa a exigência legal de indenização.

  6. Não demonstrado o recolhimento das contribuições relativas ao período de 31/10/1964 a 20/11/1973, inexiste direito à compensação financeira pretendida.

  7. A alegação de excesso do Decreto nº 3.112/1999 não procede, pois a exigência de indenização decorre diretamente do art. 201, § 9º, da CF/1988.

  8. A gestão do RPPS exige a verificação da regularidade contributiva na concessão do benefício, à luz do art. 40 da CF/1988.

  9. Mantida a improcedência. Majorados os honorários em 1% sobre a sucumbência, nos termos do art. 85, § 11, do CPC.

IV. DISPOSITIVO E TESE

  1. Recurso desprovido. Majoração dos honorários advocatícios em 1% (um por cento), nos termos do art. 85, § 11, do CPC.

Tese de julgamento: “1. O cômputo, para contagem recíproca, de tempo de serviço rural anterior a 1991 exige a indenização das contribuições na forma do art. 96, IV, da Lei nº 8.213/1991; 2. A CTC tem natureza declaratória e não dispensa a comprovação do recolhimento; 3. Ausente a indenização, não há direito à compensação financeira entre regimes previdenciários.”


Legislação relevante citada: CF/1988, art. 201, § 9º; CF/1988, art. 40; Lei nº 8.213/1991, art. 96, IV; Lei nº 8.213/1991, art. 55, § 2º; Lei nº 9.796/1999; Decreto nº 10.188/2019; Decreto nº 3.112/1999; CPC, art. 85, § 11.

Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.682.682/SP, Rel. Min. Og Fernandes, Primeira Seção, j. 25.04.2018, DJe 03.05.2018 (Tema 609); TRF-3, ApCiv 0000387-78.2004.4.03.6103, Rel. Des. Fed. Wilson Zauhy Filho, Primeira Turma, j. 17.02.2022, DJe 23.02.2022; STF, MS 28917 AgR, Rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, j. 13.10.2015, DJe 28.10.2015; STJ, REsp 1.579.060/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, j. 23.02.2016, DJe 30.05.2016.



ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Primeira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
HERBERT DE BRUYN
Desembargador Federal


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