
| PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 7ª TurmaAPELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5135881-38.2025.4.03.9999 RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA APELANTE: L. M. A. O. Advogados do(a) APELANTE: CLAUDIO MARCIO DE ARAUJO - SP262598-N, APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP R E L A T Ó R I OA EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora): Trata-se de apelação interposta pela parte autora contra a r. sentença (fls. 103/104) que julgou improcedente o pedido de concessão do Benefício de Prestação Continuada, condenando-a ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) do valor da causa, suspensa a execução, por ser beneficiária da assistência gratuidade de justiça. Em suas razões de apelação (fls. 113/122), sustenta a parte autora que se encontram presentes os requisitos para a concessão do benefício assistencial. Prequestiona, para efeito de recurso especial ou extraordinário, ofensa a dispositivos de lei federal e de preceitos constitucionais. Pugna pela reforma da sentença. Sem contrarrazões, os autos foram remetidos a esta E. Corte Regional. Parecer do Ministério Público Federal pelo provimento da apelação (fls. 129/134). É o relatório.V O T OA EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora): Recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015 e, em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil. MÉRITOO Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da Lei 8.742/1993. O Benefício da Prestação Continuada (BPC) consiste na garantia de um salário mínimo mensal ao idoso com 65 anos ou mais ou pessoa com deficiência de qualquer idade com impedimentos de natureza física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo, que os impossibilite de participar, em igualdade de condições, com as demais pessoas da vida em sociedade de forma plena e efetiva. Tratando-se de benefício assistencial, não há período de carência, tampouco é necessário que o requerente seja segurado do INSS ou desenvolva alguma atividade laboral, sendo imprescindível, porém, a comprovação da hipossuficiência própria e/ou familiar. O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal garante o benefício em comento às pessoas com deficiência que não possuam meios de prover à sua própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. A previsão deste benefício guarda perfeita harmonia com a Constituição de 1988, que hospedou em seu texto princípios que incorporam exigências de justiça e valores éticos, com previsão de tarefas para que o Estado proceda à reparação de injustiças. A dignidade humana permeia todas as matérias constitucionais, sendo um valor supremo. E a cidadania não se restringe ao seu conteúdo formal, sendo a legitimidade do exercício político pelos indivíduos apenas uma das vertentes da cidadania, que é muito mais ampla e tem em seu conteúdo constitucional a legitimidade do exercício dos direitos sociais, culturais e econômicos. Os Princípios Fundamentais previstos no artigo 3º da Constituição Federal de 1988, voltados para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, objetivando a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais e regionais, dão suporte às normas públicas voltadas ao amparo de pessoas em situação de miséria. No mais, destaco que o julgamento dos casos de LOAS, pela análise do cabimento ou não da percepção do Benefício de Prestação Continuada (BPC), contribui para o cumprimento da Meta 9 do CNJ, que prevê a integração da Agenda 2030 da ONU pelo Poder Judiciário, guardando especial consonância com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável de números 1 e 2 (ODS 1 e 2) desta Agenda, quais sejam: "erradicação da pobreza; e fome zero", especialmente com as metas 1.3 "Implementar, em nível nacional, medidas e sistemas de proteção social adequados, para todos, incluindo pisos, e até 2030 atingir a cobertura substancial dos pobres e vulneráveis (...)"; e 2.1 "Até 2030, acabar com a fome e garantir o acesso de todas as pessoas, em particular os pobres e pessoas em situações vulneráveis, incluindo crianças, a alimentos seguros, nutritivos e suficientes durante todo o ano." É com esse espírito que o benefício assistencial previsto no artigo 203, inciso V, da Carta Magna deve ser compreendido. O parágrafo 2º do artigo 20 da Lei 8742/1993 define pessoa com deficiência como "aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas". O conceito adotado pela ONU (Organização das Nações Unidas), na Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, ingressou formalmente no ordenamento pátrio com a ratificação desta Convenção e promulgado pelo Decreto nº 6.949/2009. Em 2015, com a Lei 13.146/2015, o conceito de pessoa com deficiência foi ampliado. A norma preceitua que as barreiras limitadoras não precisam ser "diversas", não precisam se "somar", bastando a presença de única limitação. Ao mesmo tempo, verifica-se que as limitações de que trata a Lei atual ampliam a noção de incapacidade pura e simples para o trabalho e para a vida independente, para a análise da situação de vulnerabilidade do requerente pelo conjunto de circunstâncias capazes de impedir a integração justa, plena e igualitária na sociedade daquele que necessita de proteção social. Deveras, o parágrafo 6º do artigo 20 da Lei 8.742/93 prevê que, para concessão do benefício, o requerente deverá ser submetido às avaliações médica e social, devendo a primeira considerar as deficiências nas funções e nas estruturas do corpo do requerente, e, a segunda, os fatores ambientais, sociais e pessoais a que está sujeito o interessado. Para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, exige a configuração de impedimento de longo prazo com duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde o início do impedimento até a data prevista para a sua cessação. No que diz respeito ao requisito socioeconômico, ainda que o parágrafo 3º do artigo 20 da Lei 8.742/1993, com redação dada pela Lei 14.176/2021, considere como hipossuficiente para consecução deste benefício pessoa incapaz de prover a sua manutenção por integrar família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, fato é que a jurisprudência entende bastante razoável a adoção de ½ (meio) salário-mínimo como parâmetro, eis que os programas de assistência social no Brasil utilizam atualmente o valor de meio salário-mínimo como referencial econômico para a concessão dos respectivos benefícios, adotado pelos Programa Nacional de Acesso à Alimentação - Cartão Alimentação (Lei n.º 10.689/03); Programa Bolsa Família - PBF (Lei n.º 10.836/04); Programa Nacional de Renda Mínima Vinculado à Educação - Bolsa Escola (Lei 10.219/2001); Programa Nacional de Renda Mínima Vinculado à Saúde - Bolsa Alimentação (MP 2.206-1/2001); Programa Auxílio-Gás (Decreto n.º 4.102/2002); e Cadastramento Único do Governo Federal (Decreto 3.811/2001). Nesse sentido, o E. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 567.985/MT (18/04/2013), com repercussão geral reconhecida, revendo o seu posicionamento anterior (ADI nº 1.232/DF e Reclamações nº 2.303/RS e 2.298/SP), reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei 8.742/93, que estabelecia a renda familiar mensal per capita inferior a ¼ do salário-mínimo para a concessão de benefício a idosos ou deficientes, em razão da defasagem do critério caracterizador da miserabilidade contido na mencionada norma. Segundo o Relator do acórdão, Min. Gilmar Mendes, os programas de assistência social no Brasil utilizam atualmente o valor de meio salário-mínimo como referencial econômico. O parágrafo 11 do artigo 20, incluído pela Lei 13.146/2015, normatizou que a miserabilidade do grupo familiar e a situação de vulnerabilidade do requerente podem ser aferidas por outros elementos probatórios, além da limitação da renda per capita familiar. Com efeito, cabe ao julgador avaliar o estado de necessidade daquele que pleiteia o benefício, consideradas suas especificidades, não devendo se ater à presunção absoluta de miserabilidade que a renda per capita sugere: Precedentes do C. STJ: AgInt no REsp 1.831.410/SP, 1ª Turma, Rel. Min. REGINA HELENA COSTA, DJE 27/11/2019; AgInt no AgRg no AREsp 665.981/SP, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, dje 04/02/2019; AgRg no REsp 1.514.461/SP, 2ª Turma, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJE 24/05/2016). Nesse sentido: "PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. DEFICIÊNCIA COMPROVADA. HIPOSSUFICIÊNCIA RECONHECIDA. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TUTELA ANTECIPADA. RECURSO PROVIDO. 1. Apelação interposta pela parte autora, representada por sua genitora, contra sentença que julgou improcedente o pedido de concessão de benefício assistencial à pessoa com deficiência (BPC/LOAS), ao fundamento de ausência de hipossuficiência econômica. 2. O recurso requer a reforma integral da sentença, com a concessão do benefício desde o requerimento administrativo, datado de 10/10/2014, bem como a inversão do ônus da sucumbência. 3. Saber se a parte autora e sua família preenchem o requisito da hipossuficiência econômica, nos termos do artigo 20 da Lei nº 8.742/1993. 4. A condição de pessoa com deficiência é incontroversa e foi reconhecida a partir do laudo médico judicial, o qual atestou a existência de impedimento de longo prazo compatível com o conceito legal previsto no artigo 20, § 2º, da LOAS. 5. A situação de hipossuficiência restou evidenciada pelo conjunto probatório. A única renda do grupo familiar provém de aposentadoria por invalidez recebida pela genitora do autor, que, segundo o laudo social, não é suficiente para custear tratamentos indispensáveis à saúde e qualidade de vida do menor, como sessões de fonoaudiologia e fisioterapia, os quais não são providos pela rede pública local. 6. A jurisprudência do STF (Tema 27) e do STJ (Tema 185) admite a flexibilização do critério objetivo da renda, permitindo a análise do caso concreto e demais elementos de vulnerabilidade social. 7. Constatado o preenchimento dos requisitos legais, impõe-se a concessão do benefício assistencial, com termo inicial fixado na data do requerimento administrativo (10/10/2014), observada a prescrição quinquenal. 8. Concedida a tutela antecipada para imediata implantação do benefício, a ser cumprida pela autarquia em até 45 dias, sob pena de multa. 12. Recurso provido para conceder o benefício assistencial à parte autora desde 10/10/2014. Condenação do INSS ao pagamento de honorários advocatícios e à implantação do benefício no prazo de 45 dias. "1. A condição de pessoa com deficiência deve ser aferida a partir de impedimento de longo prazo que comprometa a participação plena e efetiva na sociedade. 2. A renda familiar per capita superior a ¼ do salário mínimo não impede, por si só, a concessão do BPC, desde que comprovada a situação de vulnerabilidade. 3. O termo inicial do benefício assistencial é a data do requerimento administrativo, desde que os requisitos estejam preenchidos nessa data."(TRF3, 10ª Turma, Apelação Cível n. 5001806-30.2022.4.03.6002, Rel. Des. Fed. Marcos Moreira de Carvalho, julgado em 13 ago. 2025, e-DJF3 14 ago. 2025.)(grifos nossos) "PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. RENDA DO NÚCLEO FAMILIAR. ENTENDIMENTO DO STF E STJ PELA RELATIVIZAÇÃO DO CRITÉRIO. LAUDO PERICIAL FAVORÁVEL. MISERABILIDADE CARACTERIZADA. APELAÇÃO PROVIDA. 1. Trata-se de apelação interposta pelo particular contra sentença que indeferiu o pleito com base na constatação de renda mensal per capita superior ao limite de ¼ do salário mínimo do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93. 2. Em seu recurso, a apelante pleiteia pela concessão da gratuidade de justiça e argumenta que restou comprovado por meio do Laudo Pericial Social o preenchimento das condições necessárias para o estabelecimento do benefício de prestação continuada (BPC). 3. Pede também pela aplicação de entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal Federal firmado no RE 580963/PR que considera o critério de ¼ do salário mínimo defasado para caracterizar a situação de miserabilidade. Pleiteia pela reforma da r. sentença para concessão do benefício assistencial pleiteado desde a data do requerimento. 4. Defiro o pedido de justiça gratuita por ter restado comprovado, por meio de documentos acostados aos autos, a condição de hipossuficiência do apelante. 5. A controvérsia tem fundamento na renda mensal familiar. O Juízo a quo alega que, no presente caso, tal renda não é inferior a ¼ do salário-mínimo, concluindo, assim, que o benefício é indevido. 6. No presente caso, conforme restou comprovado na documentação juntada ao laudo pericial social, o grupo familiar do apelado é composto por ele (deficiente mental), sua genitora (46 anos, dona de casa) seu primo (21 anos) e o companheiro da sua genitora (43 anos), os quais, atualmente, dividem a renda flutuante auferida em trabalho informal pelo companheiro da genitora do apelante (em média 2 .400,00 reais). 7. Ademais, o Juízo a quo, na fundamentação da decisão atacada, argumentou que, in verbis: "[...] Entende o juízo que estamos diante de família cuja renda total não é alta e que a doença de um dos entes da família acarreta forte dificuldade na organização financeira da casa. No entanto, encontra-se o Magistrado limitado pela Lei no presente caso. Certo é que a Jurisprudência possibilita, em alguns casos, ampliarmos a interpretação do mencionado dispositivo legal. No entanto, o caso concreto nos traz uma situação cuja renda da família ultrapassa de forma relativamente (considerando-se o padrão estabelecido pela Lei, esclareço) alta o piso legal para a concessão do benefício pleiteado, o que, na visão deste juízo singular, impede o deferimento do pedido . [...]". 8. O amparo assistencial no valor de um salário mínimo é devido ao idoso com 65 anos de idade ou mais e ao portador de deficiência que comprovem não ter condições de prover a própria manutenção ou tê-la provida pela família. Nos termos do art . 20 da Lei 8.742 /93, com a redação dada pela Lei n.º 12.435 /2011, é considerada família incapacitada de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou do idoso aquela cuja renda per capita seja inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo . 9. Todavia, ao apreciar os Recursos Extraordinários nºs 567985 e 580963, ambos com repercussão geral, o STF declarou inconstitucional parcial, sem pronúncia de nulidade, do artigo 20 , § 3º , da Lei nº 8.742 /93 por considerar que o critério previsto na LOAS passou por um "processo de inconstitucionalização", encontrando-se defasado para caracterizar a situação de miserabilidade, tendo em vista as mudanças no contexto socioeconômico do País desde a edição da citada Lei. 10 . O STF indicou como indicador razoável para a aferição da renda familiar, o valor de meio (1/2) salário mínimo per capita. 11. Além disso, é importante ressaltar que, conforme restou decidido pelo Superior Tribunal de Justiça, no Tema 185, a "limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo." 12 . No caso, a incapacidade do autor restou comprovada e foi declarada na referida sentença, não sendo, portanto, parte controvertida. Em seguida, ao apreciar o requisito de renda, o Juízo argumentou que, ipsis litteris: "Assim, como o grupo familiar em questão é formado por quatro pessoas e a renda mensal familiar é de R$ 2.400,00 (dois mil e quatrocentos reais) referente ao salário percebido pelo genitor do autor. Com isto percebemos facilmente que a renda conforme relatório socioeconômico no id 57031615 mensal per capita ultrapassa, de forma considerável, o limite do art . 20, § 3º, da Lei 8.742/93". 13. Aplicando o percentual de ½ do salário mínimo vigente (660,00 reais), indicado no julgamento de repercussão geral, a renda mensal familiar por pessoa do apelante é de seiscentos reais (600,00 reais) . Além do Laudo Pericial Social (Id.: 35415567), a representante do apelante apresentou ficha do cadastro único v7 ( bolsa família, Id.: 35415578 pág. 1/83) . Apresentou também receituário de controle especial e notas fiscais de compras em farmácias (Id.: 35415587 pág. 9/29). 15 . Em face dessas considerações, tendo em vista que a sentença reconheceu a condição de vulnerabilidade social do apelante e indeferiu o restabelecimento do benefício com fundamento exclusivo no critério de ¼ estabelecido no § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93, considerando que o direito ao benefício de prestação continuada derivado do texto normativo da Lei nº 8.742/93 não pressupõe, ou exige, a verificação de um estado de miserabilidade extremo, bastando estar demonstrada a insuficiência de meios para o beneficiário, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, bem como pelo fato da renda familiar por pessoa cumprir o requisito de ½ do salário mínimo indicado no RE 580963/PR, reputo caracterizada a miserabilidade, impondo-se a reforma da sentença para concessão do benefício . 16. No mesmo sentido vem entendendo outras Turmas deste Tribunal Regional: (TRF-5 - Ap: 08174146920184050000, Relator.: DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE LUNA FREIRE, Data de Julgamento: 13/02/2020, 1ª TURMA); (TRF-5 - Ap: 00014407220108171120, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL ELIO WANDERLEY DE SIQUEIRA FILHO, Data de Julgamento: 04/06/2020, 1ª TURMA); (TRF-5 - ApelRemNec: 00003212920088060061, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL EDILSON PEREIRA NOBRE JUNIOR , Data de Julgamento: 16/03/2021, 4ª TURMA). 17. Dá-se provimento à apelação, para condenar o INSS a conceder ao apelante o benefício de amparo assistencial à pessoa com deficiência e a pagar as parcelas vencidas desde a data do requerimento administrativo . 18. Com a inversão do ônus da sucumbência, condena-se o recorrido em honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) do valor do proveito econômico a ser apurado, a teor do art. 85, § 3º, CPC. 19 . Aplica-se a Súmula 111 do STJ, que limita a incidência dos honorários de sucumbência às parcelas vencidas até a data do acórdão, tendo em vista o recente julgado do STJ, Tema 1105, no qual decidiu manter a aplicação da Súmula 111 após o advento do CPC/2015. 20. Por fim, determina-se, de ofício, para cálculo dos valores atrasados, a aplicação da correção monetária pelo INPC e juros moratórios segundo o índice oficial da Caderneta de Poupança, entre a data DER até a entrada em vigor da Emenda Constitucional n. 113/2021 (9/12/2021), a partir da qual incidirá somente a Taxa SELIC a título de correção monetária e de juros até o efetivo pagamento. (TRF-5 - APELAÇÃO CÍVEL: 0800380-13.2021.8.15 .0211, Relator: SEBASTIÃO JOSÉ VASQUES DE MORAES, Data de Julgamento: 21/03/2023, 6ª TURMA)(grifos nossos) Assim sendo, o inconformismo da parte autora procede, devendo ser reformada a r. sentença monocrática. No caso dos autos, no que tange à incapacidade da parte autora, foi comprovada pelo laudo pericial (fls. 69/73), cujos principais trechos destaco a seguir: "a) Com o problema de saúde apresentado, é possível concluir ser a requerente pessoa com deficiência? R: Autor se enquadra nos critérios de deficiência. (...) A) A parte tem impedimento de longo prazo (mais de dois anos) de natureza física, mental, intelectual ou sensorial? R: Sim. (...) DISCUSSÃO E CONCLUSÃO Analisando todos os laudos médicos emitidos, de interesse para o caso e correlacionando-os com a história clínica atual, antecedentes profissiográficos, concluo que o periciado é portador de transtornos globais do desenvolvimento; retardo mental leve; transtorno específicos do desenvolvimento da fala e da linguagem; retardo do desenvolvimento fisiológico normal. Diante do exposto, destituído de qualquer parcialidade ou interesse, a não ser contribuir com a verdade, com base na história clínica, no exame físico, nos laudos médicos apresentados, exames de imagem e demais documentos constantes nos autos, posso concluir afirmando: - Autor se enquadra nos critérios de deficiência." No que pertine à miserabilidade, destaco que o estudo social evidencia a insuficiência de recursos da parte autora, sendo forçoso reconhecer o quadro de pobreza e extrema necessidade que se apresenta (fls. 57/60): "O autor reside com seus genitores em imóvel cedido. O mesmo é edificado em alvenaria, sem forro e piso de cimento queimado. É composto por dois quartos, uma sala, uma cozinha e um banheiro interno. (...) A sra. Natália expôs que está fora do mercado de trabalho devido que dispensa cuidados a Lucas de forma integral. Pontuou ser a responsável por acompanha-lo em consultas médicas e exames. Explica que o sr. Gabriel está exercendo atividade laboral com registro em carteira como serviços gerais desde 28/05/2024, recebendo a quantia aproximada de R$ 2.000,00 (dois mil reais), mas não soube dar maiores detalhes. A família está cadastrada no CadÚnico - porta de entrada para acesso de benefícios de transferência de renda, recebendo o valor de R$ 375,00 (trezentos e setenta e cinco reais) do programa Bolsa Família. Na avaliação da genitora a renda obtida não supre as necessidades da família. Oportuno informar que a sra. Natália comentou haver algumas contas de energia em atraso, e que isso se deu devido ao desemprego do genitor de Lucas, mas que iria organizar-se para quitar assim que o sr. Gabriel recebesse o primeiro salário completo. (...) A genitora declarou como despesas: Alimentação R$ 1.130,00 (um mil cento e trinta reais), Água R$ 70,00 (setenta reais), Energia Elétrica R$ 263,00 (duzentos e sessenta e três reais), Gás R$ 100,00 (cem reais), Fraldas R$ 200,00 (duzentos reais) TOTAL R$ 1.763,00 (um mil setecentos e sessenta e três reais) (...) Assim, dividindo-se a renda do genitor no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), pelo número de membros do grupo familiar, num total de 03 (três) pessoas, obtémse como renda per capita a quantia de R$ 666,66 (seiscentos e sessenta e seis e sessenta e seis centavos), fazendo com que o presente grupo familiar esteja inserido em meio social compatível com a grande parte da população brasileira." Assim, da análise dos autos verifica-se que o núcleo familiar do requerente era composto por ele e seus genitores. Destes, apenas o genitor aufere renda formal, advinda de vínculo empregatício, no valor de R$ 2.000,00 mensais. Esta quantia, diferentemente do que fora consignado nas conclusões do estudo social e na sentença, se revela insuficiente para garantir uma vida digna ao menor. Nota-se que os gastos mensais básicos da família com alimentação, água, energia, gás e fraldas quase ultrapassam, recorrentemente, o valor mensalmente recebido pelo pai do apelante. Em determinados meses, a quantia auferida sequer se mostra suficiente, motivo pelo qual necessitam de ajuda de terceiros para assumir a integralidade de tais despesas. Ressalta-se ainda que não se incluem nas despesas acima mencionadas gastos com lazer, vestuários, medicamentos e tratamento especializado para a deficiência apresentada pelo menor, rubricas que se revelam imprescindíveis para assegurar um desenvolvimento saudável para o autor. Evidencia-se, portanto, que o valor recebido é insuficiente para manutenção digna do seio familiar. Dentro desse cenário, entendo que a autora demonstrou preencher os requisitos legais, comprovando estar em situação de vulnerabilidade, fazendo jus ao benefício assistencial requerido. O termo inicial do benefício, em regra, deve ser fixado à data do requerimento administrativo, requisito indispensável para a propositura da ação em face do INSS, consoante a decisão do E. STF com repercussão geral, no RE 631.240 - ou, ainda, na hipótese de benefício cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício. No caso, o termo inicial do benefício deve ser fixado a partir de 17/05/2024, data do requerimento administrativo. Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices e critérios previstos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, vigente na data da execução. Vale ressaltar que o referido manual foi instituído pelo Conselho da Justiça Federal com o objetivo de unificar os critérios de cálculo a serem aplicados a todos os processos sob sua jurisdição, na fase de execução, e seus parâmetros são estabelecidos com base na legislação vigente e na jurisprudência dominante, por meio de Resolução, devendo ser observado, sem ofensa à coisa julgada, a versão mais atualizada do manual. Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos Tribunais Superiores. Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% do valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ). No que se refere às custas processuais, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, tanto no âmbito da Justiça Federal (Lei nº 9.289/96, art. 4º, I) como da Justiça Estadual de São Paulo (Lei 9.289/96, art. 1º, § 1º, e Leis Estaduais nºs 4.952/85 e 11.608/2003). Tal isenção, decorrente de lei, não exime o INSS do reembolso das custas recolhidas pela parte autora (artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96), inexistentes, no caso, tendo em conta a gratuidade processual que foi concedida à parte autora. Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação da parte autora, para reformar a r. sentença e condenar o INSS ao pagamento do benefício assistencial com DIB em 17/05/2024 e pagamento dos honorários advocatícios, na forma antes delineada. Proceda a Subsecretaria à expedição de e-mail ao INSS, instruído com cópia dos documentos da parte autora, para que, com fundamento no artigo 497 do CPC/2015, a autarquia cumpra a obrigação de fazer consistente na imediata implantação do benefício, no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de multa diária no valor de R$ 100,00 (cem reais). É COMO VOTO./gabiv/rrios E M E N T AEmenta: DIREITO CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA (BPC/LOAS). PESSOA COM DEFICIÊNCIA. HIPOSSUFICIÊNCIA DEMONSTRADA. RELATIVIZAÇÃO DO CRITÉRIO ECONÔMICO. TERMO INICIAL FIXADO NA DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
III. RAZÕES DE DECIDIR
IV. DISPOSITIVO E TESE
Tese de julgamento:
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 1º, III, 3º, 203, V; Lei 8.742/1993, arts. 20, §§ 2º, 3º, 6º e 11, 21; Lei 13.146/2015; Decreto 6.949/2009; CPC/2015, arts. 497 e 1.011; Lei 9.289/96, arts. 1º e 4º. Jurisprudência relevante citada: STF, RE 567.985/MT, Rel. Min. Gilmar Mendes, Plenário, j. 18.04.2013 (RG - Tema 27); STF, RE 580.963/PR, Plenário; STJ, Tema 185; STJ, AgInt no REsp 1.831.410/SP, Rel. Min. Regina Helena Costa, 1ª T., j. 27.11.2019; STJ, AgInt no AgRg no AREsp 665.981/SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 04.02.2019; STJ, AgRg no REsp 1.514.461/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., j. 24.05.2016. A C Ó R D Ã OVistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento ao recurso de apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. INES VIRGINIA Desembargadora Federal |