
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006197-96.2024.4.03.6183
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: EDSON ANGELO BISPO
Advogado do(a) APELANTE: FLAVIA ANZELOTTI - SP286563-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006197-96.2024.4.03.6183
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: EDSON ANGELO BISPO
Advogado do(a) APELANTE: FLAVIA ANZELOTTI - SP286563-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Trata-se de ação objetivando a concessão de auxílio-acidente, previsto no artigo 86 da Lei n. 8213/91.
A sentença, prolatada em 25.04.2025, julgou improcedente o pedido inicial sob o fundamento de ausência de incapacidade laboral, conforme dispositivo que ora transcrevo: “Ante o exposto, julgo improcedente o pedido, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil. Condeno a parte requerente a pagar ao requerido honorários advocatícios que fixo em 10% sobre o valor da causa atualizado, nos termos do artigo 85, § 2º, do mesmo diploma legal, cuja execução fica suspensa pela concessão da gratuidade processual. Custas na forma da lei. Publique-se. Intimem-se. Não havendo recurso e certificado o trânsito em julgado, arquivem-se os autos.”
Apela a parte autora requerendo a reforma da sentença, alegando para tanto que apresenta restrições para o desempenho de suas atividades laborais, fazendo jus ao auxílio-acidente.
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006197-96.2024.4.03.6183
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: EDSON ANGELO BISPO
Advogado do(a) APELANTE: FLAVIA ANZELOTTI - SP286563-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
O auxílio-acidente deve ser concedido ao segurado, a título de indenização, quando as consolidações das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia:
“Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem seqüelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)
§ 1º O auxílio-acidente mensal corresponderá a cinqüenta por cento do salário-de-benefício e será devido, observado o disposto no § 5º, até a véspera do início de qualquer aposentadoria ou até a data do óbito do segurado. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)
§ 2º O auxílio-acidente será devido a partir do dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença, independentemente de qualquer remuneração ou rendimento auferido pelo acidentado, vedada sua acumulação com qualquer aposentadoria. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)
§ 3º O recebimento de salário ou concessão de outro benefício, exceto de aposentadoria, observado o disposto no § 5º, não prejudicará a continuidade do recebimento do auxílio-acidente. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)
§ 4º A perda da audição, em qualquer grau, somente proporcionará a concessão do auxílio-acidente, quando, além do reconhecimento de causalidade entre o trabalho e a doença, resultar, comprovadamente, na redução ou perda da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia. (Restabelecido com nova redação pela Lei nº 9.528, de 1997)”
Da leitura deste dispositivo, pode-se extrair que quatro são os requisitos para a concessão do benefício em tela: (a) qualidade de segurado; (b) a superveniência de acidente de qualquer natureza; (c) a redução parcial da capacidade para o trabalho habitual decorrente de sequela consolidada, e (d) o nexo causal entre o acidente a redução da capacidade.
O artigo 30, § 1º do Decreto nº 3.048/99 assenta que: “Entende-se como acidente de qualquer natureza ou causa aquele de origem traumática e por exposição a agentes exógenos, físicos, químicos ou biológicos, que acarrete lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou a redução permanente ou temporária da capacidade laborativa. (Incluído pelo Decreto nº 10.410, de 2020)”.
A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes.
No caso concreto.
A sentença de primeiro grau julgou improcedente o pedido inicial com base no conjunto probatório apresentado, tendo se convencido não estar configurada a condição necessária para a concessão do auxílio-acidente. Confira-se:
“Feitas estas considerações, passo ao exame do caso concreto.
A parte requerente faz referência a acidente (não de trabalho) sofrido em 1995. Entretanto, constata-se que, na época, lhe foi concedido auxílio por incapacidade temporária acidentário (código 91), ou seja, decorrente de acidente de trabalho, com DIB em 20/08/1995 (id 324194930).
Aduz que sempre trabalhou como motorista profissional, porém, da sua Carteiras de Trabalho e Previdência Social – CTPS, é possível verificar que exerceu outras funções anteriormente ao de motorista a partir de 18/06/2013, como de aplicador em empresa de revestimentos industriais, de 01/06/2007 a 15/02/2013 (id 324194934 - Pág. 15).
Ora, os fatos e direitos não estão bem delineados, não sendo possível ver com clareza qual a função que exercia no momento do acidente e nexo causal entre o acidente sofrido em 1995 e eventual redução da capacidade laborativa.
Quanto à incapacidade, assentou o perito neurologista deste Juízo o seguinte: embora a parte requerente alegue crises de epilepsia, CID “G40, Epilepsia”, desde 2011/2012, não apresentou documentos médicos ou prontuário com dados que sugiram epilepsia de difícil controle. A conclusão da perícia judicial foi no sentido de que “não apresenta incapacidade para o trabalho e para vida independente”. Reafirmou, por mais duas vezes, que não existe incapacidade para o trabalho em geral, como profissões administrativa, de comércio e serviços (ids 336164038, 343341572 e 354613773).
Quanto ao posto de motorista profissional, o perito judicial chegou a confirmar a incapacidade para tal atividade. Entretanto, por não ser comprovadamente atividade que exercia habitualmente no momento do acidente e sendo possível laborar em outras funções que não a exponham a risco, não há falar em direito a benefício indenizatório por redução da capacidade laborativa, não verificada.
Ressalte-se que os autos foram remetidos para o Sr. Perito para prestar esclarecimentos complementares, diante das insurgências da parte requerente, tendo reafirmado, por mais duas vezes, a inexistência de incapacidade laborativa.
Desse modo, a parte requerente não faz jus a benefício previdenciário, notadamente porquanto não comprovada redução da sua capacidade laborativa decorrente de acidente de qualquer natureza, premissa para a concessão de auxílio-acidente neste Juízo Previdenciário.”
Da qualidade de segurado.
Consta no extrato do sistema CNIS ID 333377422 - Pág. 91 que o autor ingressou no Regime Geral da Previdência Social – RGPS em 1994, tendo mantido vínculo empregatício no período de 18.06.2013 a 01/2017, e que houve concessão de auxílio-doença no período de 26.06.2016 a 22.09.2016, estando demonstrada a condição de segurado do autor.
Da redução da capacidade laboral.
Afirma a parte autora que em 1995 sofreu acidente – queda de escada – que ocasionou trauma na cabeça, razão pela qual desenvolveu epilepsia, enfermidade que reduz sua capacidade laboral.
O laudo médico pericial ID 333377621, elaborado em 15.08.2024 e complementado em 22.08.2024 (ID 333377732) e em 18.02.2025 (ID 333377739), informa que o autor, motorista/pintor, com segundo grau completo e 48 anos de idade no momento da perícia, é portador de epilepsia, ocasionado por acidente com trauma na cabeça (ID 333377621 - Pág. 4), concluindo que há incapacidade laboral para a função de motorista profissional, entretanto, “Não existe incapacidade para o trabalho em geral em atividades que não a exponham a riscos maiores que os habituais em profissões administrativas, de comércio, de serviços etc.”
Da análise do conjunto probatório apresentado observa-se que o autor exerceu atividade de aplicador vinculado à empresa de revestimentos entre 2007 e 2013 e de motorista de 06/2013 a 01/2017.
Nesta seara, apontado o risco de queda e acidente vislumbra-se a redução da capacidade laborativa do autor, especialmente considerando que a função de pintor/aplicador de revestimento encontra restrição com relação ao uso de escadas e ambientes que possam oferecer risco de quedas.
Conclusão:
Demonstrada a redução da capacidade laborativa do autor para o desempenho de suas atividades habituais, de rigor a com concessão do auxílio-acidente a partir da cessação do auxílio-doença (22.09.2016), conforme tese firmada no julgamento do Tema 862 do Superior Tribunal de Justiça – STJ, observando-se, contudo, a prescrição quinquenal, conforme previsto no artigo 103, § único, Lei nº 8.213/91.
Da atualização do débito.
As parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora na forma estabelecida e pelos índices previstos no capítulo 4.3, do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, alterado pela Resolução CJF nº 784/2022, de 08 de agosto de 2022, ou daquele que estiver em vigor na data da liquidação do título executivo judicial.
Dos honorários advocatícios.
Considerando o provimento do recurso do autor, inverto o ônus da sucumbência e condeno o apelado INSS ao pagamento de honorários de advogado, ora fixados em 10% do valor da condenação, considerados os valores vencidos até a data deste acórdão, nos termos dos incisos I ou II do §3º do artigo 85 do CPC/2015, da Súmula 111 e Tema 1105 do C. STJ.
Das custas.
Aplica-se ao INSS a norma do art. 4º, I, da Lei 9.289/96, que estabelece que as autarquias federais são isentas do pagamento de custas processuais nos processos em trâmite perante a Justiça Federal. Entretanto, consoante disposto no parágrafo único do mencionado art. 4º, compete-lhe o reembolso dos valores eventualmente recolhidos a esse título pela parte vencedora.
Ante o exposto DOU PROVIMENTO à apelação da parte autora para determinar a concessão do auxílio-acidente, nos termos da fundamentação exposta.
É o voto.
E M E N T A
Ementa: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. AUXÍLIO-ACIDENTE. REQUISITOS PREENCHIDOS. QUALIDADE DE SEGURADO. REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORATIVA DEMONSTRADA. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. CRITÉRIOS DE ATUALIZAÇÃO DO DÉBITO. MANUAL DE CÁLCULOS DA JUSTIÇA FEDERAL. INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. CUSTAS. RECURSO PROVIDO.
I – CASO EM EXAME
1. Recurso de apelação da parte autora, objetivando a reforma da sentença de primeiro grau que julgou improcedente o pedido de concessão de auxílio-acidente.
II – QUESTÕES EM DISCUSSÃO
2. A questão em discussão consiste em: (i) verificar se a parte autora preenche os requisitos para a percepção do auxílio-acidente, em especial a existência de redução da capacidade laborativa;
III – RAZÕES DE DECIDIR
3. O auxílio-acidente deve ser concedido ao segurado, a título de indenização, quando as consolidações das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia. Artigo 86 da Lei n. 8213/91.
4. A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes. Demonstrada a condição de segurado do autor no momento do início da incapacidade.
5. “Entende-se como acidente de qualquer natureza ou causa aquele de origem traumática e por exposição a agentes exógenos (físicos, químicos e biológicos), que acarrete lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte, a perda, ou a redução permanente ou temporária da capacidade laborativa.”. Artigo 30, § único do Decreto nº 3.048/99.
6. Laudo médico pericial informa que a enfermidade que acomete a parte autora deriva de acidente e que ocasiona restrição para o desempenho de sua atividade laborativa habitual.
7. Preenchidos os requisitos necessários para a concessão do auxílio-acidente.
8. Termo inicial do benefício fixado na data da cessação do auxílio-doença, observando-se a prescrição quinquenal. Tema 862 STJ. Art. 103, § único da Lei n. 8213/91.
9. As parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora na forma estabelecida e pelos índices previstos no capítulo 4.3, do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, alterado pela Resolução CJF nº 784/2022, de 08 de agosto de 2022, ou daquele que estiver em vigor na data da liquidação do título executivo judicial.
10. Inversão do ônus da sucumbência. Honorários de advogado fixados em 10% do valor da condenação, considerados os valores vencidos até a data deste acórdão. Incisos I ou II do §3º do artigo 85 do CPC/2015. Súmula 111. Tema 1105 do C. STJ.
11. O Instituto Nacional do Seguro Social - INSS é isento do pagamento de custas processuais nos processos em trâmite na Justiça Federal, exceto as de reembolso. Art. 4º, I, da Lei 9.289/96
IV – DISPOSITIVO E TESE
12. Apelação da parte autora provida. Sentença de improcedência reformada.
_________________________________
Legislação citada: Lei nº 8.213/91, artigos 86; Decreto nº 3.048/99, artigo 30, § único. Lei n. 8213/91, artigo 103, §; Lei n. 13.105/2015, Incisos I ou II do §3º do artigo 85 do CPC/2015
Jurisprudência: Tema 862 do STJ; Súmula 111 do STJ e Tema 1105 do C. STJ.
ACÓRDÃO
Desembargador Federal